domingo, 29 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20789: Em busca de... (303): Alguém do Blogue que conheça Domingos Ferreira da Costa, da CCAÇ 2317 / BCAÇ 2835, natural de Seixo Alvo, Olival, V. N. Gaia, morto em combate, nas imediações de Guileje, em 28/3/1968 (Rosa Cruz, sobrinha)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 2317 (Gandembel, Balana e Cansissé, 1968/69) > Março de 1968 > Na fase de carregamento dos cibes: algum destes militares pode ser o Domingos Ferreira Costa, municiador da metralhadora MG 42, que irá morrer em combate em 28/3/1969.
Foto (e legenda): © Idálio Reis (2007). Todos os direitos Direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: logue Luís Graça & Camaradas da Guiné.]


1. Mensagem da nossa leitora Rosa Cruz:

Date: sexta, 27/03/2020 à(s) 16:28
Subject: Domingos Ferreira da Costa, RI15, 28 de Março 1968

Boa tarde, tomo a liberdade de lhe enviar este e-mail.

O meu tio, Domingos Ferreira da Costa, serviu o exército, RI 15. Faleceu na Guiné em 28 de Março de 1968, em combate.
Nunca o conheci (, nasci em 1977), mas sempre ouvi falar dele. Os meus avós... era o filho mais velho. Acho que nem os meus avós, nem os meus tios e minha mãe superaram a sua morte.

O meu avô faleceu em 1999, a minha avó em 2013. Vivi com eles muitos anos (mudaram-se para a nossa casa quando eu teria uns 14 ou 15 anos). Todos os anos, sem excepção, do dia 28 de Março ao dia 1 de Abril, ficavam quietos, calados, agarrados a um missal e a um terço. Eles só receberam o telegrama a comunicar a sua morte no dia 1 de Abril de 1968.

Talvez alguém no seu blogue conhecia o meu tio Domingos Costa?!... Poderão ter alguma foto dele, alguma história que possam contar para a minha mãe?...
Agradeço desde já qualquer informação.

Bem-haja
Rosa Cruz


2. Informação do nosso colaboração permanente, José Martins, a quem pedimos uma dica, um pista, como só ele sabe dar...
sexta, 27/03, 23:10

Boa noite, Luís.

Por aqui tudo bem, ao 15º dia de confinamento.

Quanto ao caso, e devido ao confinamento, só sei que foi ferido em Guilege, e morreu no HM de Bissau.

Suponho que o que a Rosa Cruz pretende, será uma foto. Mesmo que a haja, não havendo nenhuma referência à CCaç 2317 que pertenceu ao BCaç 2835 (o do Virgilio Teixeira), que esteve em Nova Lamego, não o conhecemos.

A hipótese seria conseguir autorização para consultar o processo do Domingos Ferreira da Costa, fotografando a foto do processo, mas estas consultas, depois de passada esta crise, ainda vão demorar, pois cada vez há menos gente nos arquivos para ler os mails,  sendo dada prioridade para se tratar de pedidos de contagem de tempo, para as reformas e para a esmola anual que é dada aos ex-combatentes em outubor

Por aí está tudo bem? Abreijos para todos, incluindo a neta.
Zé Martins


3. Comentário do editor LG:

Obrigado, Zé... Já é um pista, saber que o nosso infortunado camarada pertencia à CCAÇ 2317 (Gandembel e Ponte Balana, Nova Lamego, 1968/69).

É companhia do Idálio Reis, e temos mais de uma centena de referências a esta subunidade!... E muitas fotos...

O batalhão era de facto o BCAÇ 2835 (, o do Virgílio Teixeira era o BCAÇ 1933...). Este BCAÇ 2835 era o do teu amigo, o capelão Libório... Se confirmas a Companhia, temos muitas pistas e podemos dar a referência à sobrinha, que quer saber histórias destes martirizados construtores, defensores e coveiros de Gandemel (que o Domingos Costa não já chegou a conhecer)... Vou dar conhecimento ao Idálio Reis e à Rosa Cruz.

Vamos aguentando.
Abraço grande.
Luis

PS - Se o Domingos Ferreira da Costa foi ferido em combate em Guileje em 28 de Março de 1968, já não conheceu Gandembel, no sul, na Região Tombali, e muito menos Cansissé (Região Gabu, no Nordeste)...
Vamos perguntar ao Idálio Reis, que de resto publicou um livro sobre a epopeia da CCAÇ 2316 (também com muitas fotos). Haverá seguramente alguma referência ao Domingos Ferreira da Costa, e ao episódio em que foi ferido ou morreu....


4. Resposta do Zé Martins, com data de ontem, às 22h48

Boa noite.
O 2835 era o batalhão do Padre Libório [, é do tempo do BCAÇ 1933, do Virgílio Teixeira].  O Domingos Ferreira da Costa é, de facto, da CCaç 2317. O livro do Idálio Reis, que tenho aqui, fala da composição da unidade, estando o nome do Domingos na página 12. A acção está contada nas páginas 66 a 68. O livro tem muitas fotos: provavelmente, o Idálio Reis poderá identificar se, nalgumas delas, está o nosso camarada. Como o mail também lhe é dirigido, aguardemos.

Bom resto de fim de semana, que é mais curto 1 hora. Bom seria que pudéssemos avançar também um ano, no calendário.

Fiquem bem, com um grande abraço extensível à Rosa que, por ser sobrinha de um camarada nosso, nossa sobrinha é.

Um grande abraço para o Idálio Reis, que não vejo já há alguns anos, fazendo votos de que tudo esteja bem com ele.

Zé Martins


5. Resposta enviada hoje à Rosa Cruz:

Rosa, bom dia...
Obrigado por nos ter contactado...
Já teve conhecimento, em modo C/C, de algumas trocas de mensagens entre camaradas nossos que fazem este blogue, o José Martins e o Idálio Reis (, um dos alferes milicianos da Companhia de Caçadores 2317, que comandou o pelotão a que pertencia o seu tio, Domingos Costa, e que tem um livro publicado sobre a epopeia destes nossos bravos camaradas).

O Idálio Reis, hoje engenheiro agrónomo reformado, a viver em Castanheira de Pera, tem aqui, no nosso blogue, uma série, "Fotobiografia da CCAÇ 2317"... E neste poste (clicar no link), faz uma referência explícita ao nome do seu tio Domingos Costa, e às circunstâncias dramática em ele, que era municiador de metralhadora MG42, e outro camarada, o Meireles, municadiador da bazuca 8.9, foram mortos. Além do encontro fatal com uma força inimiga, houve um tremendo ataque de abelhas selvagens.
O corpo do seu tio teve que ser resgatado, num gesto heróico do 1.º Cabo Carmo, o "Lamego". (*)

(...) A acção heróica do 1.º cabo Carmo, de alcunha o Lamego

Com o casaco do camuflado a cobrir a cabeça [, por causa das abelhas], há um que sem dizer palavra dirige-se ao local onde o companheiro [, Domingos Ferreira Costa,] jazia, levanta-o sobre o ombro esquerdo e junta-se ao grupo que abandona o local. E, antes da coluna de reabastecimentos entrar, um grupo de combate da tropa periquita [o pelotão do alf mil Idálio Reis,] assome a Guileje em desespero, silenciadas as palavras, com os olhos marejados de lágrimas de pranto e de dor a libertarem-se em fios copiosos sobre o rosto abaixo, com 2 camaradas mortos.

Acabávamos de perder os primeiros dois elementos de um dilatado rol: o Domingos Costa, da freguesia de Olival, em Vila Nova de Gaia, e o Manuel Meireles Ferreira, de Pópulo, em Alijó. (...)

Leia o texto, que a vai emocionar, leia-o  por inteiro, pausadamente mas poupe os pormenores à sua mãe, quando falar com ela. Vamos tentar saber mais, se o nosso camarada Idálio Reis (, que estava mais perto do Meireles do que do seu tio,] nos puder contactar: temos o seu mail e o seu nº de telemóvel... (**)

Força de ânimo para si e demais família, nestes tempos difíceis...
Um grande beijinho de todos nós.
Luís Graça

PS - Mais referências ao Domingos Costa (***)
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 de março de 2007 > Guiné 63/74 - P1576: Fotobiografia da CAÇ 2317 (1968/70) (Idálio Reis) (2): os heróis também têm medo

(**) Último poste da série > 13 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20728: Em busca de... (302): instruendos do CISMI, Tavira, a tirar a especialidade de atiradores de infantaria, 6º Pelotão / 3ª Companhia, outubro de 1968: "Eu, o Torres, o Joaquim Fernandes, o Loureiro e o Saramago fomos todos para o CTIG...mas dos outros gostava de saber do paradeiro"... (Eduardo Francisco Estrela, ex-fur mil at inf, CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71; vive em Cacela)

(***) Vd. poste de 6 de outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2160: Militares mortos em campanha, no sul, entre Fevereiro de 1968 e Janeiro de 1969 (J. C. Abreu dos Santos)

> (...) – 5.ª feira 28Mar68 † DOMINGOS FERREIRA DA COSTA
nat. Seixo Alvo, freg. Olival, conc. Vila Nova de Gaia
Sold Inf Mun MG42 da CCAÇ 2317/BCAÇ 2835-RI15 (a 2 meses da chegada e há 8 dias no local)
e
† MANUEL JOAQUIM MEIRELES FERREIRA
nat. Vale de Cunho, freg. Pópulo, conc. Alijó
Sold Inf Mun LGF 8.9 da CCAÇ 2317/BCAÇ 2835-RI15 (a 2 meses de início c/8 dias no local) morrem ao início da tarde durante contra-emboscada no entroncamento Guileje> Ganturé> Gadamael. (...)

30 de setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2145: António Pereira Moreira, última baixa mortal da CCAÇ 2317 (J. C. Abreu dos Santos / Idálio Reis)
19 dre abril de  2006 > Guiné 63/74 - P704: Um sobrevivente de Gandembel/Ponte Balana (Idálio Reis, CCAÇ 2317)

(...) A tal passagem por Guilege, onde se encontrava a CART 1613, foi curta - de 20 de Março a 8 de Abril de 1968 - e serviu essencialmente como local de depósito de materiais destinados à construção de um aquartelamento [, em Gandembel]  junto ao célebre corredor de Guileje, por onde o PAIGC fazia passar grande parte dos seus reabastecimentos originários da ex-Guiné-Conacri.

Nesse lapso de tempo, várias colunas se fizeram desde Gadamael; numa missão de protecção, a 28 de Março, no cruzamento de Guilege, o meu grupo de combate num baptismo de fogo externo demasiado intenso (vimos militares não negros, porventura cubanos!), perdeu dois homens, a quem presto a minha sentida homenagem: Domingos Ferreira da Costa e Manuel Joaquim Meireles Ferreira. (...)

2 comentários:

Zé Manel Cancela disse...

Caroa amigos,Luis e Zé Martins.
Há um outro elemento que pertencia
á comp. 2317.Náo sei se é membro da nossa
Tabanca,mas vai regularmente aos nossos
convívios,para se encontrar com o Idálio. Chama-se Joaquim
Gomes Soares,e vive no Porto,tem pagina no F.B.
Espero que seja útil,esta dica…..

Um abração,a toda a Tabanca...

Anónimo disse...

Caros camaradas em quarentena,
Vi agora este Poste por causa do email enviado. A curiosidade de se falar em Guileje, levou a ir lendo, e vi o meu nome associado ao assunto, por lapso do camarada Zé Martins.
Realmente o BCAÇ2835 foi render o meu BCAÇ1933 em finais de Fevereiro de 68. Mas julgo que apenas o Comando e CCS, as Companhias não sei, porque a passagem do testemunho foi muito rápida, não deu para conhecer ninguém. Em Março de 68 passamos o mês nos Adidos em Bra, e faz anos agora que fomos Rio Cacheu acima para S. Domingos, e terá sido nesta altura que se deu esse trágico acontecimento.
Como já referi antes, eu tenho um amigo de infância o Mário Ferreira que esteve em Guileje, pertencia ao BAC1 - era soldado municiador dos Obuses, ou 20 ou 21, sei lá. Num dos ataques em Março de 68, ele foi ferido num braço, foi evacuado para Bissau, e porque eu andava por lá esse nesse mês todo, encontramo-nos por acaso, fizemos uma festa, e levei-o a jantar comigo ao Grande Hotel, foi um ronco dos diabos, pois estava lá a passarada toda das estrelas, e ele estava fardado com calções, botas, camisa aberta, suada, e de braço ao peito, ainda tive de o ajudar a comer, fomos servidos por aquela rapaziada, os empregados pretos e de luvas brancas, tal e qual como agora eu, estou a escrever com luvas brancas, por por outras razões de pele.
Meti este introito, pois há muito que não venho aqui, eu normalmente para dizer uma palavra, vou dar a volta ao quarteirão completo, sou assim e não sei como mudar.

Sobre o nosso desafortunado camarada de armas morto em combate ao fim de dois meses de ter chegado, não há palavras para tanta dor, e eu não sou psicólogo, mas sinto cá por dentro, e sei de histórias das abelhas assassinas que me poem os cabelos em pé.
É natural que o meu amigo Mário possa ter conhecido ou saber de alguma coisa, mas já tentei por várias vezes que ele me fale, mas não quer. Não tem foto nenhuma, e andou por vários sitos, Gadamael, Gileje, e tantos outros que não me lembro.
Agora, morava aqui no Porto, mas como ia ser despejado da casa onde vivia de aluguer, com a loucura do tal turismo louco, antecipou-se e vive agora em Arouca, com vistas para o Douro, juntamente com a mulher, que é desses sítios.

Não vou perguntar nada pois ele nada sabe, já o conheço, e a unidade dele era de andar por vários sítios com os Obuses, logo não conhece tanta gente na intimidade.
Para si Rosa Cruz que vive tão perto de mim, só lhe quero desejar boa sorte e julgo que nesta comunidade fechada vai aparecer alguém que fale dele, do seu tio, um combatente, que morreu há 52 anos.

Louvo do fundo do coração, as pessoas da sua geração, que ainda hoje se preocupam com os velhos da nossa geração.
Não lhe posso mandar um abraço, muito menos um beijo, por causa desta maldita 'sorte' que nos veio aparecer agora, depois do que passamos há 50 e 60 anos atrás.
Bem haja para sempre,

Virgilio Teixeira