quinta-feira, 28 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23209: O Cancioneiro da Nossa Guerra (13): a "Spinolândia", com letra (parodiada) e música de "Os Bravos", de Zeca Afonso: uma preciosidade encontrada no sítio de "Os Leões de Madina Mandinga", a 1ª CART/BART 6523/73 (1973/74)




Guião do BART 6523/3 (Nova Lamego, 1973/74). 

Cortesia: coleção de Carlos Coutinho (2009)



1. No sítio dos Leões de Madina Mandinga - 1ª Cart / Bart 6523 (1973/74) fomos encontrar uma deliciosa cantiguinha satirizando o Spínola e a política "Por uma Guiné Melhor". 

A letra é uma paródia da uma canção tradicional da Ilha da Terceira, Açores, popularizada por Zeca Afonso (Os Bravos, in "Baladas e Canções", LP, 1964).

Para conhecimento dos nossos leitores, e enriquecimento de "O Cancioneiro da Nosssa Guerra", e com a devida vénia aos "Leões de Madina Mandinga" (e aos seus editores), tomamos a liberdade de reproduzir aqui a letra da "Spinolândia".  

Há outros versos que vale a pena ler, na secção "Cancioneiro", uma boa parte deles recolhidos pelo  António Costa, ex-fur mil. Como ele próprio diz, "na nossa casa de Madina Mandinga, durante o dia e parte da noite, sempre o nosso amigo Gaipo e a sua viola a animar as tropas com as suas canções. Obrigado, furriel Gaipo"(, de seu nome completo, José Graça Gaipo, a viver em Ponta Delgada). 

Não sabemos quem é o autor da letra. Nem muito menos a data, mas pelas referências (Gadamael, ataque a Bissau, foguetões, Santo António de Bissau), deverá ser de meados de 1973, quando o género António Spínola ainda era  o com-chefe e governadot-geral.

Spinolândia

Eu fui à Spinolândia,
Bravo, meu bem,
Pra ver se embravecia (bis),
Cada vez fiquei mais manso,
Bravo, meu bem,
Com os tiros que lá ouvia (bis).

A malta do comechefe,
Bravo, meu bem,
Não conhece Gadamael (bis),
Quando atacaram Bissau,
Bravo, meu bem,
Esgotaram o papel (bis).

Santo António de Bissau,
Bravo, meu bem,
De todos o mais casmurro (bis),
Quer do preto fazer branco,
Bravo, meu bem,
E do branco fazer burro (bis).

Qualquer pobre de Bissau,
Bravo, meu bem,
Daqueles com pouca roupa (bis),
Não está livre de apanhar,
Bravo, meu bem,
Com um foguetão na sopa (bis).

[ Revisão / fixação  de texto: LG  ]


Recorde-se, entretanto,  que o 1º sargento desta companhia era o nosso saudoso amigo e camarada Fern
ando Brito (1932-2014), que ainda entrou pelo seu pé na nossa Tabanca Grande, com o posto de major SGE, reformado... Era um grande fadista e foi um grande pai e avô para o nosso amigo Cláudio Brito... Fez duas comissões na Guiné, como 1º srgt, CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) e 1ª C / BART 6523 (Madina Mandinga, 1973/74), Era carinhosamente tratado pelos "leões de Madina Mandinga" por Ti Brito.


Ficha de unidade > Batalhão de Artilharia 6523/73

Identificação: BArt 6523/73
Unidade Mob: RAL 5 - Penafiel
Cmdt: TCor Inf João Damas Vicente
Maj Art Óscar José Castelo da Silva
2.° Cmdt: Maj Art Óscar José Castelo da Silva
Cap Art Carlos Alberto Ramalhete
OInfOp/Adj: Cap Art Carlos Alberto Ramalhete (acumulava)
Cmdts Comp: CCS: Cap SGE José Manuel Rijo | 1ª Comp: Cap Mil Inf José Luís Borges Rodrigues  (Lisboa,  1948 - Santarém, 2019) |2ª Comp: Cap Mil Inf Franquelim Bartolomeu Viçoso Vaz | 3ª Comp: Cap Mil Inf Rui Alberto Nunes dos Santos| Cap Mil Inf António Francisco Dias Vieira
Divisa: "Honra e Dever"
Partida: Embarque em 06Ju173; desembarque em 13Ju173 ! Regresso: Embarque em 07Set74

Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, com as suas companhias, de 16Jul73 a 12Ag073, no CMl, em Cumeré, seguiu, em 13Ag073, para o sector de Nova Lamego, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com o BCav 3854.

Em 08Set73, assumiu a responsabilidade do Sector L3, com sede em Nova Lamego e abrangendo os subsectores de Madina Mandinga, Cabuca, Canjadude e Nova Lamego

Em 20Ju174, o subsector de Piche foi integrado na sua zona de acção, após desactivação do Sector L4. As suas subunidades mantiveram-se sempre integradas no dispositivo e manobra do batalhão até à extinção do sector.

Desenvolveu intensa actividade operacional, com realização de patrulhamentos, emboscadas, escoltas a colunas e segurança e protecção dos itinerários e das populações. As suas forças intervieram e colaboraram em acções de reacção a flagelações e ataques aos aquartelamentos e aldeamentos e na promoção socioeconómica das populações.

Comandou e coordenou a execução do plano de retracção do dispositivo e a desactivação e entrega dos aquartelamentos ao PAIGC, sucessivamente efectuadas nos subsectores de Madina Mandinga e Cabuca, em 20Ag074 e de Piche, em 29Ag074.

O comando do batalhão recolheu a Bissau em 29Ag074, a fim de aguardar o embarque de regresso, mantendo-se um pelotão da CCS em Nova Lamego até  sua desactivação e entrega ao PAIGC, em 04Set74.


***
A 1ª Comp seguiu em 13Ag073 para Madina Mandinga, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCav 3406. Em 08Set73, assumiu a responsabilidade do subsector de Madina Mandinga, com um pelotão no destacamento de Dara.

Com a retracção do dispositivo, efectuou a desactivação e entregaao PAIGC do aquartelamento de Madina Mandinga em 20Ag074 e do destacamento de Dara em 27Ag074, tendo seguido para o subsector de Bambadinca, na zona de acção do BCaç 4616/73, onde substituíu a CCSIBCaç 4616/73.

Em 02Set74 foi substituída pela 2ª Comp/BCaç 4616/73 e recolheu seguidamente a Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso.

***

A 2ª Comp seguiu em 13Ag073 para Cabuca, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCav 3404.

Em 08Set73, assumiu a responsabilidade do subsector de Cabuca, cedendo um pelotão para reforço da guarnição de Madina Mandinga.

Em 20Ag074, efectuou a desactivação e entrega do aquartelamento de Cabuca ao PAIGC e seguiu para o subsector de Xime, na zona de acção do BCaç 4616/73, a fim de substituir transitoriamente a CCaç 12, que fora entretanto extinta e onde se manteve até ser rendida pela 2ª Comp/BCaç 4518/73 em 31Ago74, tendo então seguido para Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***
A 3ª  Comp seguiu em l3Ago73, para Nova Lamego, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCav 3405.

 Em 08Set73, assumiu a responsabilidade do subsector de Nova Lamego, cm um pelotão destacado em Cansissé.

Em 27Ago74, foi rendida pela 1ª Comp/BCaç 4518/73 e seguiu em  29Ag074 para Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações -  Tem História da Unidade (Caixa n." 122 - 2ª Div/4ª  Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné - 1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pp. 248/ 249.
______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de fevereiro de  2014 > Guiné 63/74 - P12747: In Memoriam (180): Fernando Brito (1932-2014), major art ref, ex-1º srgt, CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) e 1ª C / BART 6523 (Madina Mandinga, 1972/74)

(**) Último poste da série > 16 de novembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20352: O Cancioneiro da Nossa Guerra (12): "Até p'ró ano outra vez", um "faduncho" do Francisco Santos (ex-1º cabo radiotelegrafista, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65; poeta popular de Sarilhos Grandes, Montijo): "Mas nós cá vamos passando, /As lembranças vão ficando, / Conservando alguma fé; / Nem que seja de bengala, / Eu reúno em qualquer sala / P'ra relembrar a Guiné"...

3 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quando se chega a este ponto, o de ridicularizar o comandante-chefe de um exército, pode-se dizer que o moral da tropa estava mesmo muito em baixo...

E não era só dois ou três furriéis milicianos que cantavam baladas "dissolventes e desmoralizadoras" (como diria o agente da PIDE lá da localidade se tivesse acesso a estes "antros subversivos" que o bar e a messe de sargentos...), o 1º. sargento e o capitão dos "leões de Mandina Mandinga", lá no cu de Judas, parece que também ajudavam à paródia...

Estas e outras peças do nosso Cancioneiro mostram à saciedade quanto esta guerra era...popular e o quanto o pessoal estava disposto a morrer... pela pátria... "dos que comiam tudo e não deixavam nada"...

Valdemar Silva disse...

Madina Mandinga.
Faz parte dos meus registos ter passado por Madina Mandinga, fazendo o meu Pelotão a segurança a uma coluna de reabastecimento, principalmente de munições à guarnição de milícias.
Munições, aqui é que está a razão deste meu poste.
Não me recordo perfeitamente, talvez o Abílio Duarte se lembre melhor, da localização de Madina Mandinga em relação a Nova Lamego. E, também, não encontro num mapa.
Agora, em relação a munições.
Uma noite, começamos a ouvir um dos habituais 'embrulhanços' na região e havia logo o tentar acertar quem estava a 'embrulhar', mas desta vez não nos parecia dos lados habituais.
E devia ser um grande ataque por demorar muito tempo o barulho dos rebentamentos.
Fomos logo manhã cedo fazer a segurança a uma coluna a Madina Mandinga que tinha 'embrulhado' toda a noite e precisavam de munições.
Constou-se, e foi muito falado, que aquele ataque em que foram gastas ao ponto de esgotar munições, granadas de morteiro e bazuca foi orquestrado pela milícia e não ter havido nenhum ataque do IN. Parece que houve um falso alarme com imediata resposta da fogo de G3 de um abrigo que se estendeu rapidamente por toda a tabanca e com todo o armamento disponível até quase ao esgotamento das munições. Esta foi uma versão secreta, a versão oficial foi um grande ataque do IN de várias lados da tabanca. Apurou-se mais tarde não haver a mínima pista do IN ter estado atacar naquela noite.
Quem se lembrar deste acontecimento, atire mais informações.
Pensamos ter sido orquestrado pela milícia por se sentirem 'abandonados'.
Passado uma semana, em finais de Out/1969, fixamo-nos por uns dias em Madina Mandinga a fazer segurança à instalação/fixação de uma Companhia.

Saúde da boa.
Valdemar Queiroz

Manuel Luís Lomba disse...

A propósito e salvo erro ou melhor opinião, esse "cancioneiro" era do conhecimento do Capitão Salgueiro Maia, costumava trauteá-lo ante os seus comandados, em Bula, - e o General Spínola chamou-o à pedra.
Abr.
Manuel Luís Lomba