domingo, 18 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25183: S(C)em Comentários (28): Graduados e desgraduados, o drama dos antigos comandos africanos: o caso do Amadu Djaló (Cherno Baldé,Bissau)

1. Comentário do Cherno Baldé ao poste P25177 (*), aqui recolhido para a série "S(C)em Comentários" (****);


(...) Há um pequeno grande pormenor que salta à vista no âmbito das informações sobre o BCmds que, para os leigos,  não parecia ser de todo importante, mas que, no caso do Amadu Djaló e, provavelmente, para muitos dos elementos guineenses do BCmds da Guiné, representará, mais tarde, motivo de tristeza e grande desilusão. 

Enquanto os oficiais comandantes metropolitanos eram Capitães e Majores ‘tout court’, todos os outros, oficiais e cmdts de recrutamento local, das 3 companhias  eram graduados. Como não sabia o significado da palavra “graduado”  fui ao dicionário "online" e a resposta é bem clara: militar que tem a honra e a distinção de um posto, sem ter as vantagens correspondentes.

Com esta resposta tive a curiosidade de voltar a verificar a carreira militar do Amadu Djalo, tendo constatado o seguinte quadro:

A carreira militar de Amadu Bailo Djaló em datas:

• 1º cabo em 1Jan66;
• Furriel graduado em 6Fev70;
• 2º sargento graduado em 7Nov71;
• Alferes graduado em 28Jun73, até à passagem à disponibilidade;
• Desgraduado (sem o seu acordo), por despacho de 18Nov86, com efeitos a partir de 1Jan75, (Fonte: P25166) (**)  

(...) Assim, diante dos factos, que eles se calhar ignoravam durante todo o tempo em que estiveram em serviço, e parecendo injusta a despromoção (com ou sem acordo) no momento crucial da sua reforma em 1986/87, na realidade somente o posto de 1º cabo não era graduado, por outras palavras, somente este posto não era um simples “trapo” nos seus ombros, como o homem de segurança do PAIGC, Pedro Nazi, fez questão de o lembrar no encontro que tiveram em Saliquenhé, perto da fronteira, após o 25A74, nos seguintes termos, extraidos do P25143 (***) (...)
_________

Notas do editor:
(**) Vd. poste de 13 de fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25166: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Anexos: I. Algumas notas biográficas

(***) Vd. poste de 7 de fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25143: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLIII: Nuvens negras (maio / junho de 1974): ameaças e promessas do PAIGC em relação aos 'colaboracionistas'

(****) Último poste da série > 4 de fevereiro de  2024 > Guiné 61/74 - P25136: S(C)em Comentários (27): Amadu Djaló 'versus' Abdulai Jamanca ? Um, filho de pais "estrangeiros" (originários da Guiné-Conacri), seria "uma espécie de mercenário, a soldo do regime"; o outro, "era da nobreza fulacunda, cioso de defender o chão fula" (Cherno Baldé, Bissau, "dixit")

7 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Cherno, não estou por dentro do assunto da graduação dos comandos... Temos que apurar como era o processo e a sua base legal. Mas houve aqui, por seguramente, falhas de comunicação, de pedagogia, etc. Não gostaria de fazer juízos apressados, arranjar bodes expiatórios, etc. Os exércitos são estruturas muito burocráticas. O PAIRC sempre quis subordinar o poder das armas ao poder político mas quando chegaram ao poder todos comandantes quiseram ser generais...

Cherno Baldé disse...

Caro amigo Luís Graça,

O veterano Eduardo Estrela falou muito forte (no Post anterior), usando a expressão "descartáveis", mas eu quero acreditar que havia razões objetivas para tal, é isso que gostaríamos de saber pela mão e boca dos conhecedores do assunto.

-Porque é que nas 3 companhias todos eram graduados, tendo em conta que alguns vinham de 1961/62 e outros como o Adulai Djaló, o Ten Jamanca, já tinham frequentado o curso de comandos de 1964, feito em Angola.

Então quais eram os critérios para a promoção em que um soldado que tivesse 1/12 anos de serviços militares distintos ainda não o tivesse merecido?

E será que à esses militares graduados eram dadas as necessárias informações sobre implicações futuras?

Ou se calhar tudo se resumia ao proverbial desenrascanço "Tuga", mas que não era extensivo aos metropolitanos que, naturalmente, eram letrados e vacinados ?...

O PAIGC que eram os "bandidos" Turras, fizeram o contrário, do menor para o maior, isto porque, na vida não é como começa é como acaba e a parte final é sempre a mais complicada e difícil.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

Carlos Vinhal disse...

Parece-me haver aqui muita confusão entre promoção vs despromoção e graduação vs desgraduação.
Um familiar meu, furriel miliciano, durante a sua comissão de servço foi graduado em alferes. Quando passou à disponibilidade passou à situação de furriel miliciano.
Quando embarcávamos, antes dos 18 meses de tempo de tropa, éramos graduados em furriéis, o mesmo acontecendo com os oficiais, julgo, que eram graduados em alferes. Se por qualquer motivo regressássemos à situação de desmobilizados, éramos automaticamente "promovidos" a cabos milicianos e aspirantes, respectivamente.
Como embarquei com 12 meses de tropa, em Abril de 70, fui graduado em furriel miliciano e só em outubro de 1970 saiu a minha promoção.
Comigo na Função Pública, passou-se algo semelhante porque, sendo Técnico Auxiliar, de carreira, assumi uma chefia em comissão de serviço por 3 anos. Ao fim deste tempo fui reconduzido por mais 3 anos. Se tal não tivesse acontecido passaria à minha função anterior de Técnico Auxiliar com a respectiva baixa no vencimento.
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Cherno, meu "irmãozinho", já estou a chamar nomes, sem querer, aos homens do PAIGC (e não PAIGR)... Fiz este comentário no telemóvel... E com os meus recentes problemas de visão, troco facilmente letras, neste caso o "C" pelo "R"... Mas percebeste a mensagem...

Cherno, a "indignação" às vezes não é boa conselheira... Vemos isso cada vez no debate político (que o é cada vez menos, "debate" e "político"; ou nas "redes sociais" onde tropeçamosm a cada comentário, com o insulto gratuito...).

Mas nós fomos feitos de carne e osso e emoções e a verdade é que o desfecho da história dos nossos camaradas guineenses que lutaram ao nosso lado, "do lado errado ou não da História" (quem somos nós para fazer esse juizo final ?), podia ter sido outro, salvaguardando valores como a liberdade, a equidade, a justiça, a dignidade, a verdade, etc., valores que estão na base das nossas democracias (e que também faziam parte, de resto, do pensamento e do discurso do Amílcar Cabral).

Fale alguém que saiba mais de tropa do que nós... (Tu, ainda por cima nunca foste tropa....). Recordo, entretanto, que na Guiné os capelães nem seuwer eram "milicianos", eram "alferes graduados", a enfermeiras também (sargentos ou alferes, conforme as habilitações académicas e a carreira profissional)...

E, convém lembrar, houve alferes milicianos graduados em capitães. E por causa dos capitães QEO (quadro especial de oficiais), ou "capitães-proveta" (passe o "insulto", era feitos em 6 meses), houve "uma grande revolta na caserna"...

Todas as "corporações" têm este problema: professores universitários, magistrados, etc.

O problema é que o regime do Estado Novo já não tinha grandes soluções para o impasse da "guerra de África" (como se diz hoje na Academia Militar)...

Uma em duas armas na Guiné estava nas mãos dos guineenses,do recrutamento local, voluntários ou "voluntários à força" (incluindo milícias)...

É o insuspeito general Bethencourt Rodrigues, da escola americana, quem o diz no seu testamento político-militar (depoimento de 1977, publicado no livro dos 4 generais, "África: A Vitória Traída") (*):

(...) "Assinala-se que o efetivo em pessoal armado era constituído, em percentagem superior a 50%, por elementos naturais da Guiné", pág. 130).(...)

__________

(*) África: A Vitória Traída. (Joaquim da Luz Cunha, Kaulza de Arriaga, Bethencourt Rodrigues, Silvino Silvério Marques).Braga: Intervenção, 1997, 279 pp.

Tabanca Grande Luís Graça disse...


De Luís Graça para o Zé Martins (by email)

Data - 18 fev 2024 13:23
Assunto - Consultório militar

Zé: Como vai isso ? Não tens dado notícias... Espero que não tenhas ainda retirado a tabuleta do teu "consultório militar"...

Se assim for, vê se nos dás aqui umas dicas ("guide lines" em inglês, que é mais pomposo) sobre a esta questão da graduação / desgraduação na tropa... E, já agora, "pós-graduação"...

Saúde, e um abraço fraterno. Luis.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Temos mais casos de ex-militares, de origem guineense, com conflito de "patentes": por exemplo, o caso do tenente-coronel "cmd" "graduado" Marcelino da Mata que alegadamente recebia como "capitão"...

Na minha CCAÇ 12 só havia um primeiro cabo guineense, o José Carlos Suleimane Baldé,já falecido: tinha pelo menos a 3 a. classe da instrução primária...

Depois havia uma dezena de soldados arvorados que faziam as vezes de cabos...Mas não ganhavam como tal... E eram bons operacionais...

Alguns terão ido para os Comandos e para a CCAÇ 21 como "graduados"... A sua história, triste, está por contar... Por falta de cronistas...





Anónimo disse...

José Marrtins (by email)

domingo, 18/02/2024, 18:17


Boa tarde

Apesar de "não presente" continuo ativo. Vou tentar enviar um texto sobre o 16 de Março, coisa que só tem três marcadores no blogue. Felizmente uma é com fotos do Juvenal (Guiné 63/74 - P8359: A rebelião das Caldas da Rainha, em 16 de Março de 1974, lembrada pelas fotos de Luís Sacadura), que são um autêntico achado.

Quanto a graduações e desgraduações...

Quanto a mim, é a investidura num cargo que requer determinada graduação ou posto, e, portanto, durante o tempo em que a exerce, tem o posto e as benesses atribuída a esse posto.

Por exemplo: Durante as férias do comandante da companhia, Capitão, o cargo era exercido pelo Alferes mais antigo, e assinava como comandante interino. Mas, se a colocação nesse posto for por necessidade de serviço ou não haver outro da graduação necessária, é graduado, ou seja, mantém o posto enquanto exercer esse cargo.

Outro caso que observei no AHM (Arquivo Histórivo-Militar): Uma senhora estava a pesquisar sobre um tio que, ainda antes do início da luta armada, foi para Angola a pedido. Na altura, era Tenente do Exército e, portanto, pertencia ao Ministério do Exército ou da Guerra.

Como foi "pelo pedir", ou seja, esta expressão significa que foi para África a seu pedido.

Quando embarcou foi graduado em Capitão, já que ia ocupar o lugar de um capitão, mas ainda não tinha tempo decorrido para a promoção. Teve todas as prerrogativas como capitão: vencimento, honrarias, etc.

Porém, não se deu com o clima, adoecendo e requerendo o fim da sua prestação em África. Regressou e voltou ao posto de Tenente, até chegar a altura da sua promoção a Capitão.

Espero ter sido explícito sobre a matéria.

Abração