sábado, 12 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2752: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (14): Acampamento Osvaldo Vieira (II)





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento Osvaldo Vieira, nas proximidades de Madina do Cantanhez, na picada entre Iemberem e Cabedu > Simpósio Internacional de Guiledje > Domingo, de manhã, 2 de Março de 2008 > Visita guiada e animada por antigos guerrilheiros e população local, ao Acampamento (Baraca) Osvaldo Vieira , outro dos momentos gratificantes da nossa viagem à pátria de Amílcar Cabral (1) > Neste vídeo, um dos homens grandes da região conta como foram os primórdidos da luta... Infelizmente não consegui fixar o seu nome. Creio que é nalu. Entrou no mato, como ele diz, em 1962. Ou seja: passou à clandestinidade, depois de aderir ao PAIGC. A designação deste acampamento não tem nada a ver a verdade fáctica, histórica: é apenas uma homenagem, póstuma, a um dos heróis do PAIGC (cujos restos mortais repousam na Amura, a antiga fortaleza colonial de Bissau transformada em panteão nacional) : Osvaldo Vieira actuou no Oio (Frente norte), não no Cantanhez (Frente sul).

"Éramos só sete nessa altura. O comandante do grupo era o José Condição. Ficámos no mato de Caboxanque, aqui perto. Numa barraca, parecida com esta"... Fala num crioulo difícil. O Pepito vai traduzindo. Vê-se que nem sempre percebe o antigo guerrilheiro...

E a narrativa continua: Até que chegou à região de Tombali o Capitão Curto. Atenção, diz o Pepito, com confundir com o outro Capitão Curto, que andou a espelhar o terror no chão manjaco (Devia estar a referir-se ao Cap António Curto, comandante da CCAÇ 5, conhecida pela Companhia Manjaca de Bachil… Esse Cap Curto devia ser o mesmo que tinha fama de cortar cabeças. .. No filme-documentário As Duas Faces da Guerra, de Flora Gomes e Diana Andringa, um dos entrevistados, antigo combatente do PAIGC, também evoca esse famigerado Cap Curto... A crer no depoimento do antigo guerrilheiro, o Cap Curto cortava as cabeça dos seus prisioneiros e, depois ia apresentá-las às mães das vítimas, nas suas tabancas... O Cap Curto do Tombali também era dos duros.

Enfim, não tive, no Cantanhez, oportunidade de confirmar esta história (macabra) nem saber mais pormenores sobre eventuais métodos de trabalho sujo, resultantes da colaboração entre Exército, PIDE, polícia administrativa, etc., nos anos de chumbo que antecederam a guerra... Também não achei apropriado o momento, que era de festa e de reconcialição, para falar deste e de doutros homens que não podem ser tomados como representativos do exército português, e muito menos dos militares portugueses que fizeram a guerra, entre 1963 e 1974....

Na mesma altura apareceu o Nino. O tal Cap Curto cercou Darsalame, entrou aos tiros na tabanca, mandou toda a gente pôr as mãos na cabeça… Das cinco da tarde às cinco da manhã, a aldeia esteve cercada e as pessoas foram interrogadas… O Nino ficou muito preocupado e quis saber o que se passava. Reuniu os camaradas, entre eles o Mão de Ferro, com a missão de ir a Darsalame saber o que se estava a passar e tentar ajudar o povo. Não deixou ir o José Condição. Foi também nessa altura que o grupo, que tinha aumentado, já não cabia em Caboxanque. “Este mato é pequeno. Não vamos ficar aqui, disse eu… E foi então que fomos para o mato de Cantomboi” (um dos catorze actuais matos do Canhanez)…

Vídeo (4' 52 ''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Alojado em: You Tube >Nhabijoes




A memória de Cabral (que conheceu bem a região de Tombali, como engenheiro agrónomo, antes de se tornar o fundador e o líder histórico do PAIGC) bem como da luta de libertação nacional está ainda bem viva entre as mulheres e os homens da região de Tombali... Uma das mulheres, presentes na cerimónia, canta uma das canções revolucionárias da época, dando vivas à Guiné e ao Partido.

Vídeo (0' 55''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Alojado em: You Tube >Nhabijoes





Cabral fala sábi...


Vídeo (20''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Alojado em: You Tube >Nhabijoes

"A unidade foi a melhor arma nos momentos difíceis dos camaradas" - pode ler-se num pequeno monumento, tosco, de cimento, encimado pela estrela negra, erguido na antiga barraca da guerrilha... Testemunho do passado, recado para o presente, pensa a Alice que, como muitos portugueses e portuguesas, não fazia a mínima ideia das reais condições do terreno (e do clima) onde se operava a guerrilha e a contra-guerrilha na Guiné....

O que pensarão estes miúdos ? Quais são os seus sonhos ? Para onde estão a olhar ? O que serão daqui a 15/20 anos ? O que sabem da luta pela independência, levada a cabo pelos seus avós ? Quem serão hoje os seus ídolos, os seus heróis ?

Sabotagem ? Provocação ?... Não, é apenas uma camisola do craque do Manchester United e da Selecção Nacional de Futebol de Portugal, Cristiano Ronaldo, um herói do mundo global e mediatizado de hoje...

As mulheres do Cantanhez exemplificaram como cozinhavam no mato, sem fazer fumo, iludindo a observação aérea do IN... Os combatentes tinham apenas direito a uma refeição po dia... Ainda hoje será difícil comparar a sua à nossa fome... Nas unidades de quadrícula ou nas operações no mato, o tuga sonhava com comida e sobretudo com bebida... Muita, fresca!

Uma guerra de libertação (ou subversiva, como diziam as nossas chefias militares...) não se faz sem as mulheres, como a antiga enfermeira do PAIGC, Francisca Quessangue, que participou na batalha de Guileje....

Actores, figurantes, assistência... Nos bastidores ou no placo.... As mulheres são parte fundamental da luta do povo da Guiné, ontem como hoje: pela paz, pela liberdade, pela democarcia, pelo desenvolvimento, pelo direito à história....

À esquerda, o Luís Moita e o Paulo Santiago seguem com atenção, desvelo e carinho, o inédito espectáculo de representção teatral que nos deram, a todos, os antigos guerrilheiros e a população local ddo Cantanhez...

Um verdadeira lição, ao vivo, de história, de antropologia, de ciência política, de arte da guerra, de gestão, de humor, de humanidade, de sobrevivência, de dignidade, de amizade, de esperança no futuro...


De acordo com as coordenadas do GPS do Nuno Rubim (2), tiradas no centro da clareira onde decorreu a cerimónia, este sítio fica a 11º 12' 46" N - 15º 03' 10" W, ou seja, à esquerda da picada que vai de Iemberém para Cadique (a oeste) e Cabedu (a sudoeste), nas proximidades de Madina do Cantanhez, entre Iemberém e Cachamba Sosso... Uma das linhas de fuga do acampamento, que ficava numa pequena elevação, ia dar directamente ao Rio Bomane, afluente do Rio Chaquebante, este por sua vez afluente do Rio Cacine, desaguando justamente frente a Cacine, perto de Cananime (onde iremos almoçar nesse domingo).

Fotos e legendas: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

Continua

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Notas de L.G.:

(1) Vd. os três últimos últimos postes desta série:

5 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2721: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (13): Visita ao Acampamento Osvaldo Vieira (I)

31 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2704: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (12): Que o Nhinte-Camatchol te proteja, Guiné-Bissau

29 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2695: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (11): Iemberém, uma luz ao fundo do túnel (I)

(2) Vd. poste de 7 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2731: Cantanhez, Acampamento Osvaldo Vieira: Coordenadas GPS (Nuno Rubim)

Guiné 63/74 - P2751: Convite (3): Projecção de As Duas Faces da Guerra na Malaposta em 24 de Abril de 2008 (Diana Andringa)


Centro Cultural Malaposta – Municípália EM
Rua Angola, Olival Basto
2620-492 Odivelas
Tel: 21 938 31 00 – Fax: 21 938 31 09
http://www.blogger.com/www.malaposta.pt

1. Em 7 de Abril de 2008 recebemos uma pequena mensagem da nossa tertuliana Diana Andringa, dando notícia de mais uma projecção pública do seu co-documentário As Duas Faces da Guerra.

Caro Carlos Vinhal,
Como está?
Não sei se ainda vale a pena avisar da projecção de As Duas Faces da Guerra. Mas, caso achem que vale a pena, aqui fica a informação de que vai passar na Malaposta, a 24 de Abril, pelas 21H30.

Melhores saudações,
Diana Andringa

2. Transcrição do Convite acima publicado

O Núcleo de Administração da Municipália EM
Tem o prazer de convidar V.Exa para a projecção do filme
AS DUAS FACES DA GUERRA
DE DIANA ANDRINGA E FLORA GOMES
Produção: Lx-Filmes
[COM A PRESENÇA DE DIANA ANDRINGA]
que terá lugar dia 24 de Abril de 2008
pelas 21H30, no Auditório do Centro Cultural Malaposta
no âmbito das Comemorações do 25 de Abril de 1974
M/12 - Entrada Livre


A jornalista Diana Andringa e o realizador guineense Flora Gomes, autores do Documentário As Duas Faces da Guerra

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2750: Ói pessoal... ou o regresso do filho pródigo (Vitor Junqueira / Carlos Vinhal)

1. Confesso-me admirador de alguns dos nossos camaradas quanto ao seu modo de escrever. Seja pelo sentido de humor, pelo seu poder de memória que lhes permite, ao fim de tantos anos, ter presente as mais diversificadas situações, ao ponto de as contar com o mais ínfimo pormenor, pelo modo como viveram uma guerra, contornando o aspecto bélico, servindo-se dela para prestar serviço humanitário, quer pelo português correcto com que se exprimem, etc.

Claro que não vou falar em nomes, pois a alguns deles já expressei a minha maneira de pensar.

Hoje vou falar de um camarada, que eu considero neste grupo e que esteve ausente durante quase um ano, em parte incerta, em termos de blogue falando, entenda-se.

Telefonei-lhe no Natal para lhe desejar Boas Festas, já que por mail não obtive resposta, fazendo-lhe sentir o quanto era notada no Blogue a sua ausência.
Contou-me que estava com problemas técnicos na sua linha telefónica e que não tinha Net.
Fiz-lhe sentir que pessoas como ele não podem deixar de alimentar esta página com as suas estórias, ora de guerra, ora de humor e muito mais importante, com os seus conhecimentos técnicos na área da saúde.

Estou a falar do nosso Dr. Vitor Junqueira, que na Guiné foi Alf Mil At Inf da CCAÇ 2753, operacional dos quatro costados, e a quem foi atribuída uma medalha que ele teima em não dizer por que motivo.

Nunca é demais lembrar que a ele devemos a organização do último encontro nacional em Pombal, que eu quero que sirva de exemplo, em número de participantes, para este ano.

Foi com grande alegria que encontrei hoje na minha caixa de correio uma mensagem sua, que a seguir transcrevo.

C.V.



Vitor Junqueira,
ex-Alf Mil Inf
CCAÇ 2753 - Os Barões
Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá ,
1970/72


2. Mensagem de Vitor Junqueira

Data: 11 de Abril de 2008

Assunto: O gajo deu à costa

Ói, pessoal!

A toda a malta amiga que se inquietou com a minha sabática ausência, amigos do coração e do reviralho, quero dizer-vos que todos me fizeram falta; tive saudades de vós.

Devo-vos satisfações pelo ocorrido.

Há cerca de um ano, devido a uma encrenca com a instalação telefónica, tive uma zanga com a PT. Sob o impulso, pedi-lhes que retirassem os seus pertences da minha residência ...e lá se foi a linha e o meu acesso à rede!

Começou então um folhetim protagonizado por outra operadora que no seu sítio ia adiando de mês para mês a cobertura da minha zona. Até que foi comprada, ao que me dizem, pelo ti Belmiro.

E nunca mais se ouviu falar dela. Fiquei no mato sem cão! Pensei então na hipótese do serviço móvel, mas a velocidade de transmissão de dados era tão fraquinha que bastava um emílo trazer uma fotografia em anexo para me levar aos píncaros da irritação. Até que há cerca de duas semanas, constatei que um conhecido batráquio estava mais espertinho, espevitou, pelo que resolvi adoptá-lo.

Fui então a uma loja onde por setenta paus adquiri uma péne, apetrecho parecido com um isqueiro preto, cuja cabecinha introduzi num buraquito das traseiras do meu pêcê, e ... eis que vi a luz finalmente. Estou ligado à néte, feliz por estar de novo convosco.

De resto, está tudo bem, comigo. A família está OK e quanto à saúde ... vamos andando.

Iniciei o ano com um raide pela américa do sul (Uruguai, Argentina, Chile, Paraguai e Brasil) de onde regressei há pouco. Em Buenos Aires fui parar ao hospital por causa de um tréco que me deu no realejo. Vi jeitos de passar à caçarola, mas já está tudo bem.

Então meus caros, aqui vai um abração do Vitor Junqueira e até breve.
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Nota de C.V.:

Vd. postes de:

7 de Novembro de 2006> Guiné 63/74 - P1255: Dicas para o viajante e o turista (1): A experiência e o saber do Vitor Junqueira

18 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1084: O guerrilheiro desconhecido que foi 'capturado' no K3 por um básico da CCAÇ 2753 (Vitor Junqueira)

23 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1110: Do Bironque ao K3 ou as andanças da açoreana CCAÇ 2753 pela região de Farim (Vitor Junqueira)

11 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1266: Estórias de Bissau (1): Cabrito pé de rocha, manga di sabe (Vitor Junqueira)

31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1475: A chacun, sa putain... Ou Fanta Baldé, a minha puta de estimação (Vitor Junqueira)

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1581: O elogio dos pára-quedistas das 121ª e 122ª CCP (Nuno Mira Vaz / Vitor Junqueira)

Guiné 63/74 - P2749: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (27): Quando os mortos abrem os olhos aos vivos

"Fotografia do Carlos Sampaio, nas suas últimas férias. É nestas férias que este meu querido amigo destrói toda a sua obra. Regressará a Moçambique em Dezembro [de 1969], falecerá no Norte, perto de Mocímboa da Praia. Uma parte importante da minha juventude morreu com ele" (BS).

Fotos (e legendas): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1), enviado em 22 de Janeiro de 2008:


Operação Macaréu à vista - Parte II > Episódio n.º XXVII > OS MORTOS AOS VIVOS ABREM OS OLHOS (2)
por Beja Santos


(i) Ó vida feita uma detida morte


Ó vida feita uma detida morte.
Ó morte feita um inocente amor.
Amor que as asas sobre o corpo nu
fecha tranquilas no possuir da sorte.


Jorge de Sena


Os males não vêm rogados. Quando nos preparávamos para as obras da ponte de Udunduma, a ponte cedeu pela calada da noite, houve rebuliço, saímos todos dos abrigos quando as pilastras começaram a esfarelar, até se pensou ter havido uma carga de trotil posta à sorrelfa. Não, a ponte deu um gemido pela idade sem manutenção e pelos os excessos de colunas com GMC e Unimog, e até gruas, depois o início do alcatroamento do troço Xime-Amedalai precipitou a crise.

De madrugada, consternados pelos barulhos da ponte, e verificado que não havia terramoto, recorremos à pedra, ao cascalho e à cimentação. Assim se iniciaram com carácter de urgência os arranjos da ponte, com a supervisão do Queirós. Estávamos na ponte de Udunduma e não estávamos. Imprevistamente, fomos duas vezes ao Xitole, outra vez a Sansacuta. Uma ocasião houve em que mandaram gente da CCS de Bambadinca para a ponte e nós para a emboscada do Bambadincazinho.

Foi um tempo virulento de trabalho faxina. Mas com compensações. Por exemplo, chegou uma ordem do Quartel General para mandar uma praça gozar vinte dias de repouso em Bolama, com piscina, cinema e outras diversões. Chamei o Domingos, avisei que a escolha não teria influências de ninguém, seriam as praças entre si a nomear aquele que partia para férias. O Pel Caç Nat 52 provou as suas qualidades elegendo o bonzão do Doutor, um mortificado Quebá Sissé, agora a ser ouvido no auto instruído pelo o Ismael Augusto.

O Queirós mostrou-se infatigável nos arranjos da ponte, era vê-lo sem descansar a picareta, abnegado e disciplinador, de facto nunca tive uma equipa de cabos tão boa como agora. Albino Amadu Baldé, Príncipe Samba para os amigos, volta a visitar-me e dá a boa notícia: vai ficar a andar sem defeitos, as fracturas nas tíbias e fémures não o deixarão defeituoso. Motivo de preocupação é Cherno: desmaia com regularidade, derrama líquidos viscosos dos ouvidos, foi visto pelo Vidal Saraiva que considera que tudo isto são consequências do traumatismo craniano de 16 de Outubro de 1969. Missirá passou a estar na mira de Madina, a todo o tempo.

Com a preparação da 1ª Companhia de Comandos Africana, em Fá Mandinga, o PAIGC ameaça com a instabilidade, em escassos dias foram detectadas cinco minas perto de Missirá. Como se previa um ataque a Fá, Missirá foi temporariamente reforçada por outro pelotão. Uma morança dos Nhabijões foi pelos ares com grande recheio de explosivos, tudo parecia ir arder à volta e um bravo condutor atirou-se às chamas para salvar uma viatura em vias de explosão.

Na ponte de Udunduma, ou onde quer que me encontre, mando aerogramas à Cristina: “Escreve para eu saber que nem tudo endurece à minha volta”. Mando-lhe um corrupio de banalidades, como se ela tivesse que saber a agenda diária de Bambadinca e arredores: o capitão Neves saiu de Mansambo e foi para o Pelundo; o Emílio Rosa escreve do Beng 447 perguntando se eu não ia de férias e quando é que havia casamento, etc.

Ora, num sábado à tarde, consegui acordar com D. Leontina, a funcionária dos correios de Bambadinca, que iria telefonar para Lisboa no domingo de manhã. À hora aprazada, vindo da ponte de Udunduma, apresentei-me no correio, a ligação fez-se sem problemas. Eu estava eufórico, a Cristina cautelosa, perguntando-me vezes sem conta se eu já tinha recebido a sua última carta. Eu feliz em poder ouvi-la em condições mais do que aceitáveis, vendo da janela soldados meus a fazerem compras na feira, mas a ficar cada vez mais intrigado com cautelas tão insistentes. Como já se tornara um hábito, a agenda socio-militar de Bambadinca passa dos aerogramas para a chamada telefónica. De concreto, do outro lado do oceano, fiquei a saber que a Cristina visita os meus doentes, a que se juntou agora o major Cunha Ribeiro, e menos concreto apurei que a Cristina pondera vir até Bissau, em data a negociar.

Meditabundo com esta conversa telefónica, subo lentamente a rampa de Bambadinca. O que se passou a seguir nunca mais me saiu da mente nem do coração. O tenente Pinheiro está a fechar a porta da secretaria, é a hora do almoço, traz o correio dos oficiais, acena-me e entrega-me algumas cartas e aerogramas. Vou até o meu quarto para deslindar o enigma dessa última carta da Cristina que ainda não li. É uma carta um pouco volumosa, abro com o dedo e salta uma notícia necrológica que cai no chão. Apanho e vejo do fotografia do morto, incrédulo, aturdido: é o Carlos Sampaio, está lá o nome dele por extenso, fala-se de uma missa do 7º dia, aproximo a notícia e diz claramente que morreu em combate.

Como se um tiro me derrubasse, encosto-me à parede e soluço aos gritos, aos uivos, sou uma besta cercada por cães de caça que lança olhares em todas as direcções, à procura de uma nesga para se salvar. É nisto que se abre a porta e entra o Abel que passa rapidamente da estupefacção para a compreensão de que algo muito duro aconteceu. Aliás, na semana passada, o Machado, do pelotão Daimler, que parte em breve, recebeu a notícia da morte do cunhado num desastre aéreo em Angola, ficou silencioso, abúlico, só depois é que trovejou debaixo da emoção, foi passear de jeep durante horas, depois acalmou.

É o Abel quem me vai chamar à realidade, ele tinha uma voz ciciante, naturalmente apaziguadora, sentei-me, serenei e li a carta da Cristina. O que ali vem escrito esclarece a última carta do Carlos Sampaio (3). Tudo se passou na região de Cabo Delgado, uns dos locais mais assolados pela guerra. Rebentou uma mina durante uma coluna, ele desceu da viatura e pisou um sistema de minas anti-pessoais. Na agonia, perguntou se tinha sido o único ferido e balbuciou: “Deus foi misericordioso com os meus soldados”. Fez um largo sinal da Cruz sobre o peito e morreu.

É esta descrição tão serena que me faz voltar à vida e me aplaca o grito de revolta. Depois, lavei a cara e fui almoçar. À tarde escrevi à Cristina, agradecendo a delicadeza que ela pusera nos documentos enviados, as lembranças doces de uma amizade que também a envolvera tanto. Sabe-se lá com que sofrimento, ponho no aerograma:

“Estou inconsolável, acabo de perder a mais pesada das âncoras da minha juventude. Só me recordo de um abalo destes que teve paralelo quando vi o Fodé estropiado e na discussão lancinante que tive com um capitão junto de uma fossa onde um soldado agonizava e o Fodé gemia. Há momentos em que não consigo reprimir as lágrimas, o Carlos Sampaio está associado aos meus últimos dez anos. Como te disse já, recebera uma extensa e linda carta, há poucos dias. Ele falava-me de viaturas despedaçadas, êxitos operacionais, continuava a acalentar o projecto em comum para a livraria Sampedro, sonhava ser nosso compadre, padrinho do nosso primeiro filho. Da adolescência até agora, foi uma amizade plena, com longos serões, vejo-o na sua bata de pintor, oiço-lhe a sede do infinito. Sabes muito bem que nunca foi uma amizade fácil. Pouco antes de eu partir para a Guiné, fez-me comentários aos esboço da peça de teatro infantil “O soldadinho de fogo”. Trocávamos manuscritos, eu saía de madrugada de casa para ir à Praça Pasteur ouvir os seus últimos escritos. A sua fotografia mais recente tenho-a eu, é a que vem na pagela necrológica que me enviaste. É um olhar de penumbra e recatada tristeza, o mesmo olhar que o pintor Fausto Sampaio fixou na tela, retrato dele com sete anos, que está na sala de jantar da Praça Pasteur. Sim, estou inconsolável. Vem-me à recordação a sua continência tímida quando o fui visitar a Mafra, em Maio de 1968. O que me abranda a dor é saber que ele não precisa das nossas orações, ele já está sentado à direita de Deus Pai. Vou agora escrever à Sr.ª D. Maria José a quem porei à disposição os escritos do Carlos e o quadro a óleo que ele me deu, salvo erro o único que subsistiu à destruição que fez de todas as suas obras. Por favor, quando procurares a Sr.ª D. Maria José e as irmãs do Carlos diz-lhes que eu perdi o anjo pascalino, o companheiro mais querido de toda a minha juventude”.

(ii) Uma conversa com o major Sampaio

No dia seguinte, sou chamado de urgência a Bambadinca, o major Sampaio quer uma reunião. Recebe-me com um ar grave e vai direito ao assunto:
- Consigo não faço rodeios, preciso de si a dar o seu melhor e no Xime. Tenho aquela companhia muito em baixo. No princípio do mês, foram flagelados durante uma operação, houve um morto, feridos graves e ligeiros; a seguir, ardeu a tabanca do Enxalé e logo depois um ataque a Ponta Varela fez a destruição de uma embarcação civil; em meados do mês, depois de destruírem grande quantidade de arroz numa batida, foram novamente flagelados e o capitão Maltez ficou sinistrado, embora ligeiramente. Temos de lamber as feridas e passar ao ataque. Falei com o nosso comandante e as coisas vão-se passar da seguinte maneira: V. vai planear inteiramente uma operação e logo a seguir outra; vai para o Xime e levanta o moral das tropas; não peça mais efectivos daqueles que eu posso dar, quanto muito, leva algumas secções de milícias de Finete e de Amedalai; é fundamental afastar o inimigo das proximidades do Xime e de Ponta Varela; levantar o moral das tropas tem de significar o fim desse medo em emboscadas a escassos quilómetros do quartel; limpe tudo à volta e faça com que o Poidom e Ponta Varela deixem de ser considerados invulneráveis; findo este objectivo, quero que V. percorra tudo até à Ponta do Inglês e mostre aos soldados do Xime que nós podemos ir a qualquer sítio; vem aqui para a sala, olha para o mapa o tempo que precisar, defina o que quer, escreva os efectivos que vai levar, logo a seguir dar-lhe-ei pormenores sobre as datas das operações. A primeira, a ter lugar no início de Março, é a “Rinoceronte Temível”. E nem uma palavra sobre este assunto com ninguém, nem aqui com os oficiais nem com os seus soldados.

Discretamente, passei as tardes seguintes na sala de operações e fazia inúmeras perguntas ao furriel Pinto dos Santos: onde, exactamente, os guerrilheiros atacam os barcos em Ponta Varela? quem escolhe os guias no Xime? há fotografias aéreas do Poidom? qual é o alcance das peças de artilharia? é possível ver os relatórios para perceber qual a cobertura que tem o inimigo quando flagela entre Madina Colhido e Gundaguê Beafada? onde é que pernoita a população civil no Poidom? O Pinto dos Santos respondia como podia e sabia.

A 3 de Março [de 1970], o documento preparatório estava pronto, a 4, discutimos o documento com Jovelino Corte Real, que aprova, a 5, ao amanhecer, o major Sampaio e eu partimos para um RVIS para percorrer toda a região do Xime. É a primeira vez que sobrevoo milimetricamente um dos nossos mais conturbados teatros de operações. A DO passa pelo Xime e seguimos por toda a estrada até à Ponta do Inglês.

É impressionante o número de trilhos que saem do mato denso de Gundaguê Beafada até Ponta Varela, é um inimigo afoito e combativo que soube impor-se e dominar o território. A bolanha do Poidom está igualmente sulcada por caminhos que vêm da foz do Corubal e que atravessam a estrada da Ponta do Inglês até à direcção do Buruntoni. À volta do Buruntoni, como já aprendi, é tudo inextricável, a floresta-galeria tudo dissimula do ar.

O major Sampaio pede ao piloto para se sobrevoar o devastado aquartelamento do Enxalé, que perdeu a sua tabanca. Pois é precisamente quando entramos no Cuor que se nos depara um cenário fantástico: lá em baixo os pára-quedistas estarão a atacar Madina, vêm-se grandes rolos de fumo, os T6 largam bombas, o heli-canhão anda às voltas, parece um cão de caça, o Cuor está revolto, tudo tem a dimensão de uma resposta implacável a quem queimou a tabanca do Enxalé.

É nisto que surge outra avioneta que nos dá ordem de retirada, não podemos estar a interferir na operação. Guardo a imagem dos pára-quedistas a correr em meia lua, uma das barracas de Madina a arder, sobre a protecção do heli-canhão. E regressámos à região do Xime, passámos sobre o Buruntoni, é espantoso como este quartel é completamente invisível do ar. Se dúvidas houvesse, estou esclarecido: as dificuldades serão imensas, duas tremendas operações estão à nossa espera. Dentro de dias, e durante um mês vou terminar muitos dos meus aerogramas à Cristina da seguinte maneira: “Logo que regresse, escrevo-te”.


(iii) O anjo pascalino

Na ponte de Udunduma, olhando ao fundo a floresta e os palmeirais de Demba Taco, escrevo o último aerograma ao Carlos Sampaio:

Sei da tua morte e ponho o teu nome a rodopiar
até uma ilha de coral.
Aviso-te: neste local vicejante, de lodos e águas fecundas para o arroz,
o vento incendeia os palmeirais. Trazes trigo nos cabelos,
és o meu sonho morto dos trópicos
Aqui o choro não me dá consolo,
é como se uma febre de falcão te trouxesse no meu lamento,
tu apareces pregado num lenho da savana.
Sei irremediavelmente da tua morte e soletro a palavra paz:
paz das entranhas, paz inquestionável, paz circum-navegante,
paz para fecundar este sílex que arremesso para o fim da terra.
É o último aerograma que te escrevo.
No entanto, tu és enzima de semeadura,
tu falas-me da rapsódia dos adolescentes, o meu mito da juventude.
Com os meus mortos, com este chão adubado de sangue,
no teu largo sinal da cruz e no teu tálamo de poeira,
eu choro o meu maior amigo,
e temo todo o imprevisto da vida que se vai seguir.

Termino este aerograma esmagando o aparo, depois de ter escrito:

morreu o meu fula, o meu mandinga branco.

Levei um gira-discos a pilhas para a ponte de Udunduma e oiço música. Primeiro, o retemperador Dido e Eneias, de Purcell. É uma ópera cénica exemplar, cativa-me a frescura e a dimensão dramática, todo o lamento de Dido é uma despedida sublime. A seguir, mergulho na sinfonia Ressurreição, de Mahler. É uma versão espantosa pela orquestra Philarmonia, dirigida por Otto Klemperer. Oiço e volto a ouvir o quarto andamento, em que surge a voz do contralto louvando: “Deus que é bom vai dar-me a sua luz e vai iluminar-me até à vida eterna”.


"Capa do disco Dido And Eneias, de Purcell. Gosto muito de The Fairy Queen, King Arthur e do Hino a Santa Cecília, mas Dido e Eneias é a sua obra-prima absoluta. Tem brilho, frescura, é retumbante e sofredora. O lamento de Dido acompanhou o meu sofrimento, quando perdi o mais querido dos amigos" (BS).


"Capa de Pietr, o Letão, de Georges Simenon, nº 145 da Colecção Vampiro, tradução de Mascarenhas Barreto, capa primorosa de Lima de Freitas. Um Simenon cheio de emoção e forte comoção. Um colaborador de Maigret , Torrence, será assassinado durante as investigações, Maigret faz uma longa e alucinante directa até ouvir uma pungente confissão,assistindo ao suicídio do criminoso, ferido e exausto. Dois irmãos canalhas, a história de um grande amor, uma delirante expiação" (BS).

Com o ânimo mais serenado, pego então nos livros. Num ápice, devoro Pietr, o Letão, mais uma pedra preciosa de Georges Simenon. As polícias de toda a Europa avisam a Polícia Judiciária de Paris que está a chegar de combóio um escroque de alta-roda, Pietr, o Letão. Maigret va para a Estação do Norte, Pietr apresenta-se e vais para um dos hotéis mais luxuosos de Paris, o Majestic. No comboio aparece um cadáver. Assim se inicia uma trepidante investigação, Maigret é baleado mas está imparável. Virá a descobrir-se que existem dois irmãos, há uma história de vingança, é um texto literário fabuloso, cheio de emoção e comoção. O que mais aprecio é a obstinação de Maigret que desafia todas as suas energias até derrubar a resistência psicológica do criminoso.

"Capa de Porta de Minerva, de Branquinho da Fonseca, nº25 da Colecção Contemporânea, Portugália Editora. É um livro desencantado sobre a vida estudantil, em Coimbra.Faz apreciações duríssimas às praxes e à vida dentro das repúblicas,desmonta o fascínio da sabedoria académica e o nível cultural na Academia.Tem capa de Tóssan" (BS).


Porta de Minerva, de Branquinho da Fonseca, inicia-me nas praxes e rituais da vida académica coimbrã: a perseguição ao caloiro, a vida nas repúblicas, a boémia, os estudos insípidos, a verborreia declamatória, as lutas entre os estudantes e a polícia. Admito que literariamente o livro não traga nada de novo, mas o personagem Bernardo Cabral leva-nos a um pequeno mundo dominado pelas praxes donde ele sai licenciado e liberto do pesadelo. Aprovado no último exame é rodeado de colegas que o despojam de toda a roupa, foge somente com a sua capa, nu como num regresso simbólico à pureza primitiva.

Concentro-me nos planos da Rinoceronte Temível. Será a única operação que comandarei. Terei razões para me orgulhar dela. Como passo a escrever.

_____________

Notas de L.G.:
(1) Autor de Diário da Guiné: 1968-1969: Na terra dos Soncó. Lisboa: Temas & Debates. 2008. Uma obra de que o nosso blogue se orgulha de apoiar e de ter visto nascer. Começou por ser uma série, publicada semanalmente no nosso blogue, ao longo do ano de 2007. Está prevista a saída de um 2º volume, no próximo verão. Título provisório: Diário da Guiné: 1969-1970: Tigre Vadio. Sisponível também no Círculo de Leitores.

(3) Sobre o amigo do autor, Carlos Sampaio (Anadia, 19 de Novembro de 1946 / Moçambique, Nambude, 2 de Fevereiro de 1970), vd. os seguintes postes, além do já citado em (2):

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2748: Para o estimado Jorge Picado (Afonso Sousa)


1. Mensagem do nosso camarada Afonso M. F. Sousa (ex-Fur Mil TRMS da CART 2412, Bigene, Binta, Guidage e Barro, 1968/70) enviada ao ex-Cap Mil Jorge Picado, com conhecimento ao nosso Blogue:

Para o estimado Jorge Picado, em Ílhavo.

...e nós que andámos muitos meses na procura de testemunhos para fundamentar as crónicas de dois momentos de saliente infortúnio para as nossas hostes!

Um que ocorreu na zona do Pelundo, em Abril de 1970, e outro na região de Mansoa (Infandre), em Outubro do mesmo ano.

Quem havia de dizer que aqui tão perto, na região aveirense, estava alguém que, pela sua responsabilidade e experiência alicerçada nos muitos locais de tensão que suportou, entre os quais os acima referidos, poderia, provavelmente, ter dado qualificadas e objectivas achegas para a redacção da memória desses acontecimentos.

Que seja bem-vindo à Tabanca Grande, o ilustre ilhavense Jorge Picado.

Peço-lhe que quando estiver no interior desta tabanca não deixe, também, de dar uma olhadela a esse espaço memorial e fazer, caso queira, alguma objecção, aprofundamento ou complemento de narração, pois pressuponho avalizado o seu testemunho.

Um abraço
Afonso Sousa
(um ex-militar na Guiné - 1968/1970)

Nota:
Para visualizar as crónicas em referência, poderá o Jorge, no espaço em branco (campo superior esquerdo), escrever, um a um, como termos de pesquisa, os seguintes: P2162 - P1641 - P1642 - P1643 - P2004 - 1436 - P1445 - P1446 - P1500 - P1549 - P1566 - P1603.


2. Comentário de Carlos Vinhal

Caro Jorge Picado, para lhe facilitar a vida, deixo em rodapé os endereços das postagens a que se refere o Afonso. Basta que clic em cima de cada endereço.

Vale o esforço de ler toda esta informação, analisar e, se achar conveniente, dar alguma achega para aumentar o conhecimento colectivo. São muitas as pessoas que nos lêem, nem todas ex-militares, o que muito nos orgulha.

Aproveito para reforçar o desafio do nosso camarada Afonso, para que nos conte as suas estórias que serão imensas face ao número de aquartelamentos por onde passou.
CV
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Notas dos editores:

(1) Vd. postes de:

17 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1436: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F.Sousa) (1): Perguntas e respostas

18 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1445: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F.Sousa) (2): O papel da CCAÇ 2586 (Júlio Rocha)

19 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1446: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M. F. Sousa) (3): O depoimento do 1º sargento da CCAÇ 2586, João Godinho

6 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1500: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (5): Homenagem ao Ten-Cor J. Pereira da Silva (Galegos, Penafiel)

25 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1549: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (8): O contexto político-militar (Leopoldo Amado) - Parte I

6 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1566: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (9): O contexto político-militar (Leopoldo Amado) - Parte II

17 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1603: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (10): O contexto político-militar (Leopoldo Amado) - Parte III (Fim)

3 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P1641: A morte do 1º Cabo José da Cruz Mamede, do Pel Caç Nat 58 (1): Onde e em que circunstâncias ? (Afonso M. F. Sousa)

na mesma data > Guiné 63/74 - P1642: A morte do 1º Cabo José da Cruz Mamede, Pel Caç Nat 58 (2) : Em Infandre, a 13 km de Mansoa (Afonso M. F. Sousa)

e ainda > Guiné 63/74 - P1643: A morte do 1º cabo José da Cruz Mamede, do Pel Cacç Nat 58 (3): 10 mortos em emboscada com luta corpo a corpo (César Dias)

27 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2004: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (Anexo A): Depoimento de Fur Mil Lino, CCAÇ 2585 (Jolmete, 1970)

7 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2162: O fatídico dia 12 de Outubro de 1970 - Emboscada no itinerário Braia/Infandre (Afonso M. F. Sousa)

Guiné 63/74 - P2747: Convívios (51): CART 6250/72, Unidos, Mampatá (1972/74): Maia, 28 de Junho de 2008 (José Manuel Lopes)

1. Em 8 de Abril de 2008, o nosso camarada José Manuel Lopes, ex-Fur Mil Op Esp da CART 6250, mandou-nos esta mensagem:

Bom dia camaradas.

Tenho duas boas notícias.

O encontro da minha Companhia, em que até 1986 nunca participei, mas de depois de uma lavagem do amigo Carvalho, Furriel Enfermeiro ou melhor Furrié Dótó nunca mais perdi até hoje.

É um encontro muito original, sempre em casa de um dos Unidos se tiver condições para tal ou na sede da Freguesia da sua terra.

Cada um leva o seu merendeiro com as especialidades da sua região. O País gastronómico está lá. Quem nada levar basta levar o apetite e vai visitando os vários farnéis. Todos são bem-vindos, pois todos vão por bem e por vezes o Gastão, o nosso Zeca Afonso leva o violão.

Depois de bem comer e melhor beber, cantamos o nosso hino Mampapa pata pata pata.

Eu levo o meu vinho que é o motivo da segunda boa notícia. Ganhou uma medalha de prata no WINE MASTERS CHALLENGE, este ano realizado em Portugal no Estoril, entre cerca de 4000 vinhos de todo o mundo.

Até breve camaradas

Nota: 2 inscrições no convívio da Tertúlia, eu e a Luisa, minha mulher.


2. Programa do Encontro


CART 6250
Caros Camaradas e Amigos

Passou mais um ano e aproxima-se uma data muito importante para todos nós, o Encontro Anual dos Amigos de Mampatá.

Este ano e como combinado no ano passado, realizar-se-á a 28 de Junho de 2008 na bela Cidade da Maia, sendo um enorme prazer receber-vos a todos vós amigos e respectivas famílias.

Como manda a tradição todos trazem o farnel e a alegria, para que este dia não seja apenas mais um nas nossas vidas.

Por fim espero que o dia chegue depressa para vos poder rever.

Desejo-vos a todos boa viagem. Um enorme abraço dos vossos camaradas Raúl Jorge Aroso Alves Moreira e José Carlos Ferreira Ribeiro.

P.S. - Segue em anexo todas as indicações para chegarem ao destino.

Raúl Moreira - 229 489 630 / 919 477 095

José Ribeiro - 229 604 117 / 934 670 699

Unidos
Moreira e Ribeiro

Guiné 63/74 - P2746: Guileje, colónia penal (2): Terra ingrata, de mau signo, terra de bandidos, terra da fome (Nuno Rubim)

Guiné > Região de Tombali > Guileje >Outubro de 1968 > "Guileje, Colónia Penal, Terra Ingrata, de Mau Signo, Terra de Bandidos, Terra da Fome"... Nesta altura, a unidade de quadrícula de Guileje era a CCAÇ 2316 (Mai 1968/Jun 1969) (contacto: Cap Vasconcelos).

Foto : © Gabriel Chasse /
Nuno Rubim (2008). Direitos reservados.



1. Texto do Nuno Rubim, Coronel de Artilharia na situação de Reforma, especialista em história militar e especialmente em história da artilharia, e sobretudo nosso querido amigo e camarada:

Caro Luís:

Continuando com a saga de Guileje, Colónia Penal (1)...

Pois parece-me que nos tempos modernos fui eu quem deu continuidade a essa triste fama..

De facto, no final de 1965, enquanto Cmdt da Companhia de Comandos da Guiné e em virtude de um contencioso que se abriu com o Cmdt do CTIG ( relacionado, a meu ver, com a indevida utilização que estava a ser dada aos Grupos de Comandos da Companhia ), tive um dia uma acesa discussão com o referido senhor.

O resultado não se fez esperar ! Mandou-me sair imediatamente do seu gabinete e disse-me que no dia seguinte receberia guia de marcha para seguir imediatamente para Guileje !

Lá fui ,pois ... substituir o Cmdt da CCAÇ 726, Companhia que na altura já tinha cerca de 16 meses de comissão, em finais de Janeiro de 1966 (2).

Mas isto não ficou por aqui ! Ainda durante a permanência desta companhia em Guileje, chegou a CCAÇ 1424, que a ia render. Pois retiraram-na do comando do seu Capitão, que a tinha formado em Portugal e que o pessoal muito estimava e puseram-na sob as minhas ordens ! Incrível, mas assim aconteceu !

Depois há um vácuo temporal ... ou possívelmente não, mas não me foi dado saber se até 1973 houve mais casos de corrécios despachados para lá ... O que é certo é que me deparei, no AHM [ Arquivo Histórico Militar,] com mais dois casos, já em 1973.

Segundo notas da 1ª Rep / CTIG, a 22 de Janeiro é transferido do GA 7 para o COP 5, o Alf Mil Art José A. C. Branco da Costa, por motivo disciplinar. E logo a seguir, a 9 de Fevereiro, o Fur Mil Op Esp Delfim J. Marques dos Santos, é transferido da CCAÇ 3373 para a CCAV 8350 (2), pelo mesmo motivo !

Realmente a inscrição que amavelmente o nosso camarada Gabriel Chasse, que esteve em Guileje, me enviou (ver foto acima ), sintetiza melhor do que quaisquer palavras o que foi o inferno naquele local.

Um abraço

Nuno Rubim
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Notas de L.G.:


(1) Vd. poste de 8 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2734: Guileje, colónia penal (1): Em 1897 havia um posto militar fronteiriço, português, em Sare Morsô (Nuno Rubim)

(2) Vd. postes de:

14 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726) ...

27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

28 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2487: Guileje, 22 de Maio de 1973 (2): Por mor da verdade dos factos (Nuno Rubim)

26 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2584: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (23): O diorama está pronto e é uma obra-prima (Pepito / Luís Graça)

25 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2681: CCAÇ 2617, Os Magriços do Guileje (Guileje, Mar 1970 / Fev 1971) (José Crisóstomo Lucas / Abílio Pimentel)

Guiné 63/74 - P2745: Tabanca Grande (61): Valentim Oliveira da CCAV 489 / BCAV 490 (1963/65)

1. Mensagem do Valentim Oliveira, de 8 de Abril de 2008


Camarada Luís Graça:

É com muita admiração que leio todas as Histórias escritas por ti e por todos os outros camaradas que participaram na GUERRA DA GUINÉ.

Também sou veterano da mesma Odisseia: era da CCAV 489 do BCAV 490. Participei na grande Operação Tridente, na Ilha do Como.

Segui para Farim, onde por toda aquela zona muitas coisas boas e más se passaram. Também passei no inferno de Guidaje. Como tal também tenho muitas Histórias boas e más para escrever.

Peço permissão para entrar como membro da equipa dos Camaradas da Guiné.

Um grande abraço,
Valentim Flor Oliveira

PS - Por favor coloca esta minha mensagem no blogue.


2. Comentário do co-editor Virgínio Briote:

Caro Valentim,

Chamo-me Briote e fui Alf Mil da CCAV 489. Fui substituir um Camarada (do 3º Pel?) que foi evacuado para Lisboa.

O Cmdt da CCAV 489 era o Cap Pato Anselmo até ser substituído pelo Cap Mil Tavares Martins, que esteve convosco até ao fim da vossa comissão.

Estive poucos meses em Cuntima. Cheguei lá em finais de Janeiro de 1965 e saí em Maio.

Infelizmente muitas das minhas fotos de Cuntima extraviaram-se, restam-me pouco mais de meia dúzia. Envio-te uma dos alferes da Companhia. O único que não está na foto é o Ferreira (o que tinha aspecto de indiano), que talvez estivesse de férias.



Na estrada que vinha do Senegal e atravessava a povoação de Cuntima (mais tarde conhecida pela Avenida do Senegal), a fotografia dos oficiais da CCAV 489. Da esq para a dir, o Adilson, o médico Dr. Lourenço (açoreano da Terceira), o Cap Pato Anselmo (mais tarde tornado famoso por se ter rendido em 25/4 ao Cap Salgueiro Maia, com os carros na Baixa lisboeta), eu e o outro alferes maçarico (que era assim que se chamavam na altura os recém-chegados), chamado Carvalho.
Foto: © Tantas Vidas, Blogue de Virgínio Briote, Lisboa (2008). Direitos reservados.


Há distância de 43 anos, alguma destas figuras não te devem dizer muito. Eu e o meu pelotão dormíamos no celeiro, em frente à casa do capitão, do rádio e do posto de socorros.

Ficamos à espera das tuas histórias, das boas e más e das fotos que talvez ainda guardes. Sê bem vindo a à nossa tertúlia, em meu nome e dos restantes editores, Luís Graça e Carlos Vinhal, e dos demais amigos e camaradas da Guiné que formam este blogue.

__________

Notas de vb:

1. Estive há duas semanas com o Cor Cavaleiro, está com 91 ou 92 anos e com a cabeça em muito bom estado.

2. Batalhão de Cavalaria nº 490:

Sob o comando do Ten Cor Fernando Cavaleiro, o Batalhão integrava a CCS e as CCAV 487, 488 e 489. Arrancou de Estremoz, do RC 3, com a divisa "Sempre em Frente".

A estadia na Guiné iniciou-se em Julho de 1963 e a comissão foi dada como finda em Agosto de 1965.

Da actividade operacional, destaca-se a participação na Op Tridente (Ilha do Como/Komo), uma das maiores operações militares efectuadas pelas tropas portuguesas em territórios então designados como ultramarinos.

Mas a acção do Batalhão não se resumiu a essa operação. Após o desembarque, com base em Bissau, desenvolveu várias acções na zona do Oio. Partiu para as Ilhas do Como, Caiar e Catunco em 14 de Janeiro de 1964 e só de lá saiu quando a acção foi dada por terminada, em 24 de Março de 1964.

Passou então à quadrícula. Em 31 de Maio do mesmo ano assumiu a responsabilidade do sector de Farim, que compreendia os subsectores de Cuntima, Jumbembem, Bigene e Farim e a partir de 29 de Junho o de Binta.

Em 25 de Março de 1965 preparou-se para ocupar Canjambari (que estava dentro do sector à sua responsabilidade e que na altura estava totalmente nas mãos da guerrilha). Foi uma acção violenta, com flagelações contínuas e a ocupação, apesar da vasta experiência das tropas do Batalhão, só se deu por concluída em 31 de Maio de 1964.

Entre outras, nas operações Jocoso, Vouga e Invento foram capturados não só guerrilheiros e subtraída população ao IN, como também apreendidas significativas (na altura) quantidades de material de guerra (1 ML, 19 PMs, 36 Espingardas Simonov e outras, 10 minas e cerca de 10.000 munições), numa época em que o PAIGC estava a fazer todos os esforços para o introduzir na zona Norte, em particular o Oio, utilizando para isso todo o chamado corredor de Sitató, que partia do Senegal, atravessava Canjambari e ia até Morés, donde irradiava para toda a zona limítrofe.

Em 15 de Junho foi substituído no sector pelo BART 733 (Cmdt Ten Cor Glória Alves), tendo recolhido a Brá, onde ficou alojado até à data de regresso à metrópole.

Fonte: Extracto da História do Batalhão de Cavalaria 490

Guiné 63/74 - P2744: Fórum Guileje (14): Folclore (Cap Inf José Belo) ou Gratidão (Cor Art Coutinho e Lima) ? A homenagem da população local

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guileje (1 a 7 de Março de 2008)> Um excerto da comunicação do Cor Art Ref Coutinho e Lima sobre a sua missão, enquanto comandante do COP 5, e a sua decisão de retirar Guileje, em 22 de Maio de 1973. Na apresentação da comunicação, o militar português, agora na situação de reforma, apresentou-se com o traje que lhe ofertado pelo régulo e população de Guileje (que hoje vive em Mejo), em gesto de homenagem e de gratidão (LG).

Vídeo (1' 38''): ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojados em: You Tube >Nhabijoes


1. Mensagem do José Belo (ou Joseph Belo)com data de 6 de Abril último. O nosso camarada, antigo Cap Inf, vive hije na Suécia, há mais de 30 anos. Foi Alf Mil na CCAÇ 2381, Os Maiorais ( Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).

Assunto - Folclore

Li, com muito interesse, tudo o surgido no blogue quanto ao encontro do Guileje. Os seus organizadores estão, sem dúvida, de parabéns.

De entre as variadas fotos,surpreendeu-me uma. Um dos participantes,o Sr. Coronel de Artilharia, do Exército de Portugal, na situação de Reforma, envergando um bonito trajo típico local (1) . Ideia original e, por certo, com simpáticas intenções para com os Guinéus.

A ser,em futuro próximo,organizado em Portugal um encontro semelhante,e não propunha Aljubarrota,porque aí,frente a inimigo também mais numeroso,e por certo "melhor municiado",as nossas gentes mantiveram-se no terreno (talvez, porque como os Guinéus do Guileje,lutámos no nosso "chão",e pela nossa independencia)..

Mas, e de qualquer modo, a realizar-se tal encontro na nossa terra,será que os antigos Oficiais do PAIGC, participantes, nos irão aparecer vestidos de Campinos, Pescadores da Nazaré ou Pauliteiros de Miranda, em retribuição do gesto simpático do Sr. Coronel?

Estocolmo 6 de Abril 2008. José Belo(Capitão de Infantaria na situção de Reforma).

2. Dei conhecimento prévio do teor desta menagem ao Cor Art Ref Coutinho e Lima, que é também membro (recente) da nossa tertúlia, e com quem privei recentemente na Guiné-Bissau, por ocasião do Simpósio Internacional de Guileje (29 de Fevereiro a 7 de Março de 2008):

Meu caro amigo:

Aqui tem o comentário (bem humorado...) do José Belo, que foi Alf Mil da CCAÇ 2381 (Empada, Buba, Quebo, Mampatá, 1968/70) e que, depois do 25 de Novembro de 1975, foi para a Suécia, onde vive... Mande-me o que entender, como reposta...

Aqui tem alguns textos anteriores do José Belo:

26 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2068: Da Suécia com saudade (José Belo, ex-Alf Mil, CCAÇ 2381, 1968/70) (6): Milícias e Soldados guineenses ao serviço do colonialismo

19 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2062: Da Suécia com saudade (José Belo, ex-Alf Mil, CCAÇ 2381, 1968/70) (5): O General que não gostava de bigodes

11 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2041: Da Suécia com saudade (José Belo, ex-Alf Mil, CCAÇ 2381, 1968/70) (4): Aventuras de Maiorais

5 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74-P2029: Da Suécia com saudade (José Belo, ex-Alf Mil, CCAÇ 2381, 1968/70) (3): Soldado Salvaterra ou mais uma peça de carne para canhão

26 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 – P1883: Da Suécia com saudade (José Belo, ex-Alf Mil, CCAÇ 2381, 1968/70 (2): Periquitos, no Rio Cacheu, sem munições

6 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1818: Da Suécia com saudade (José Belo, ex-Alf Mil, CCAÇ 2381, 1968/70) (1): Hino à Guiné que nós conhecemos


PS- Há dias estive a falar com o seu camarada de curso, o Cor Jales Moreira, que esteve em Bambadinca (1972/74)... O seu Batalhão, o BART 3873, vai reunir-se e queriam convidar-me... Eu estive em Bambinca mas foi em 1969/71...

Um abraço.

Luís Graça

3. Resposta do Coutinho e Lima:


Caro amigo Luís Graça

Recebi o mail do José Belo, que agradeço.

Relativamente ao comentário, o meu amigo sabe tão bem como eu, que a população que estava em GUILEDJE em Maio de 1973 e que agora ocupa MEJO, resolveu oferecer-me a túnica branca dos velhos e dos sábios, em reconhecimento da decisão que tomei naquela data, retirando toda a tropa, milícia e população para GADAMAEL.

Não posso deixar de referir que da MISSÃO atribuida ao COP 5, com sede em GUILEDJE e de que eu era o Comandante, constava, no que diz respeito à população: " Assegura a defesa eficiente dos aglomerados populacionais ocupados pelas NT...".

Porque, na situação concreta vivida em GUILEDJE, em 21 de Maio de 1973,não podia garantir a defesa eficiente da população, foi esse factor, além de outros, que me levaram a tomar a decisão de efectuar a operação de retirada, em 22 de Maio de 1973;
a retirada foi uma surpresa para o PAIGC, que não só não se apercebeu dela, como só entrou em GUILEDJE em 25 de Maio de 1973, isto é, 3 dias depois.

A distinção que a população resolveu atribuir-me, em 1 de Março de 2008, foi para mim totalmente inesperada, porquanto, no depoimento que o Cipaio, representante da população (na ausência do Régulo), prestou no processo que me foi instaurado, declarou que a população não queria sair de GUILEDJE.

Ao fim de quase 35 anos, o Régulo UMARU DJALÓ [, filho mais novo do velho régulo Suleimane Djaló,]foi intérprete da gratidão das suas gentes, concluindo que a decisão que tomei em 21 de Maio de 1973, foi adequada à situação e permitiu que não houvesse nenhuma baixa. Recusar a atitude da população era uma grande indelicadeza da minha parte. A última parte do texto não me merece qualquer comentário, por considerar a comparação sem pés nem cabeça.

O meu amigo, em função do que eu escrevi, dará ao José Belo a resposta que entender.

Saudações amigas do
Coutinho e Lima

__________

Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima

Guiné 63/74 - P2743: Convívios (50): Convívio da CCAÇ 2700/BCAÇ 2912, em Fátima, no dia 26 de Abril de 2008 (Fernando Barata)

Guiné > Subsector de Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2700 (1970/72) > Mortos da companhia > Memorial executado pelo Furriel Timóteo > Vítimas mortais: António Jacinto da Conceição Carrasqueira (10/8/70, mina a/c); António Guimarães (18/2/71 / mina a/c); José Augusto Dias de Sousa (18/2/71; mina a/c); José Guedes Monteiro (1/10/71; combate); Rogério António Soares (1/10/71; combate); Luís Vasco Fernandes (5/10/71; mina a/c); Adriano Francisco (8/3/72, doença).

Antes Quebrar que Torcer, lema da CCAÇ 2700



1. Hoje, 10 de Abril, recebemos uma mensagem do nosso camarada Fernando Barata, ex-Alf Mil da CCAÇ 2700/BCAÇ 2912, dando notícia do encontro, deste ano, da sua Companhia.

Carlos
Agradecia-te a divulgação, no Blogue, do 17.º Encontro da minha Companhia.
Abraço
Fernando Barata

2. Programa do 17.º Encontro da CCAÇ 2700

Fátima
26 de Abril de 2008 (Sábado)

10h30 – Início da concentração junto à porta principal da nova Basílica (Igreja da Santíssima Trindade).

11h00 – Missa na Capelinha das Aparições (facultativo).

12h40 – Partida com destino ao Restaurante D. Nuno, situado em Boleiros, a 6km de Fátima, na estrada para Minde.

13h00 – Almoço

Confirmações até ao dia 16 de Abril de 2008 para:

Timóteo Santos— Canada do Sarilho, 17 / 9700-192 Angra do Heroísmo
Telefone 295 213 923 – Telemóvel 962 497 110
e-mail: timoteomemoria@gmail.com

Guiné 63/74 - P2742: Blogoterapia (46): Promessa de comando: vou retomar as minhas crónicas de guerra (Amílcar Mendes, 38ª CCmds)

Guiné > Zona Leste > COP7 > Margem esquerda do Rio Corubal > Gampará > 38ª Companhia de Comandos > Agosto / Dezembro de 1972 > O Comando Amílcar Mendes, cujo último relato foi o de uma operação helitransportada, no dia 13 de Setembro de 1972 (nome de código: Acção Águia Errante), na região de Lagoa de Bionrá, e em que participaram 3 Gr Comb da 38ª CCmds.

Foto: © Amilcar Mendes (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do Amílcar Mendes, taxi driver na praça de Lisboa, ex-1º Cabo Comando, 38ª CCmds (Guiné, 1972/74):

Assunto - As minhas crónicas de guerra

Amigo Luis Graça e camaradas da tertúlia, reconheço que estou em falta com aquilo que te prometi (1). Interrompi as minhas crónicas por vontade própria e porque aquilo que ia transmitindo foram notas tomadas durante situações de stress, algumas delas memorizadas debaixo de fogo, e em que o pensamento na altura pertencia a um jovem e arrogante gerreiro que inchava de vaidade, quando a intervalos das operações descia a cidade da Bissau e se pavoneava de orgulho, exibindo para a plateia o seu camufulado - para que saibas, eramos a única tropa autorizada a fazê-lo na cidade -, o lenço preto e a boina com fitas pretas.

Eramos já nesse tempo admirado por uns e odiado por outros. Nunca compreendi o olhar de desprezo com que alguns camaradas nos brindavam, [em Bissau]. E porquê? A maioria dos soldados que frequentavam a 5ª Rep (Café Bento), Pelicano, Zé da Amura, Ronda, Império, etc... eram militares em trânsito para regressar ao mato e que de alguma forma já tinham colado a orelha ao chão connosco em alguma picada, trilho ou destacamento. Podíamos até nem comungar dos mesmos ideais mas no perigo eramos gémeos.

Só muito mais tarde e com as mudanças da sociedade a nível político consegui decifrar o significado dos olhares que me eram dirigidos no tempo de guerra e em época posterior, já então no Regimento de Comandos da Amadora. Percebi que esses olhares vinham de algums camaradas mais esclarecidos(ou manipulados) em política e em que para eles tropas especiais era o que havia de mais desprezível no teatro de guerra. Assassinos. Comedores de criancinhas, frios e calculistas, sem ponta de emoção. Já na Amadora e com a liberdade esses ódios declararam-se e fui cuspido e chamado frontalmente de assassino.

Vem isto a propósito de quê? Quando comecei a escrever no Blogue, comecaram logo a aparecer ums vozes críticas que eu fui ignorando, direi mais, desprezando, porque realmente já 'tou farto de guerrilheiros do arame farpado e chegou ao ponto de haver aqui quem insinuasse que nós, os COMANDOS, só eramos valentes em grupo, o que quer dizer que isolado sou um cobarde.

Nunca, amigo Luis Graça, isso me imcomodou, até ao dia em que as mensagems aónimas começaram a chegar. Aí parei.Mas não foi por medo. Foi por achar que tais pessoas (?) não mereciam partilhar daquilo que me é muito íntimo. O que me pode afectar são acontecimentos e não pessoas. Sou um cota simpático, tentando alegrar os dias que vão passando e em que muita coisa já me passa ao lado e não percebo como ainda existe gente que, decorridas quase quatro décadas, ainda vive ressentida por aquilo que outros fizeram já tão longe.

Bem, amigo Luis, longe já vai este mail e o que te queria dizer é que te vou cumprir o que prometi e vou-te mandar mais apontamentos do meu diário de guerra e isso porque, se há quem não goste, há muito mais quem goste.

AMILCAR MENDES
1º Cabo Comando
38ª Companhia de Comandos (Guiné, 1972/74)
AUDACES FORTUNA JUVATE
[em latim, A Sorte Protege os Audazes]

2. Comentário de L.G.:

Camarada e amigo Amílcar:

Como já te oportunidade de te dizer (e agira passo a partillhar com o o resto dos camaradas e amigos da nossa Tabanca Grande), fico feliz pela tua decisão, sensata e generosa.

Abertamente, no nosso blogue, nunca ninguém te tratou mal... Que eu saiba, ou que me lembre, pelo menos... De qualquer modo, a malta foi aprendendo, nestes últimos 3 anos, a conviver uns com os outros e a respeitar-se, como camaradas, independentemente da arma a que cada um pertencia, do ano em que foi mobilizado, do sítio onde esteve, das ideias e valores que defendia (ou defende), etc. São mais as coisas que nos unem do que as que nos separam... O hífen, o traço de união tem sido a nossa terra, a nossa pátria, Portugal, e a Guiné, país-irmão, a que nos ligam, para além da história e da língua, afectos, emoções, memórias, vivências, amizades...

Por outro lado, e como sabes, é regra de outro, entre nós, não fazer juizos de valor sobre o comportamento militar de cada de um nós enquanto esteve no TO da Guiné... Não somos juízes e muito menos carrascos de ninguém. Agora, já não posso impedir que te mandem, cobardemente, emails anónimos... A única hipótese é ocultar (ou não divulgar mais) o teu endereço de correio electrónico... Mas não adianta. Tu não tens que ter vergonha do que escreves, pelo contrário: fostes um homem e um português do teu/nosso tempo, e que te portaste à altura, e queres dar testemunha disso... aos teus camaradas, aos teus amigos, aos teus filhos e netos, aos teus concidadãos, às gerações do futuro... Ninguém te pode roubar esse direito de contar a tua história de vida... Quem sabe até se não poderás (ou não poderemos), um dia, reunir em livro os teus escritos...

Que fique bem claro: tu e os teus camaradas, comandos, serão sempre bem vindos. Este blogue é teu, é nosso... Não fazemos distinção entre tropas especiais e tropa-macaca, a não a ser às vezes na brincadeira... Também nunca puxa dos galões, nem se rama em herói... E tu já deste mais contributos para este trabalho (colectivo) de preservação, defesa e divulgação da nossa memória de guerra, da memória da nossa geração, do que a grande maioria dos que estão cá estão inscritos, como tu, na tertúlia...

Vá, manda-me os teus textos, as tuas notas (e, se possível fotos), que tens pelo menos em mim um leitor interessado e fiel... Não te esqueças que ficaste em Gampará, f... e esfomeado, lá para o mês de Setembro ou Outubro de 1972... Aqui tens os teus dois últimos postes... Podes clicar e ver o conteúdo (2)...

Vá, recebe um Alfa Bravo do tamanho do Corubal, onde há dias estive, no Saltinho, e entre o Saltinho e o Xitole, na margem direita, em Cusselinta...

Luís Graça
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Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 4 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2719: Guidaje, Maio de 1973: Só na bolanha de Cufeu, contámos 15 cadáveres de camaradas nossos (Amílcar Mendes)

(2) Vd. postes de:

7 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1930: Diários de um Comando: Gampará (Ago-Dez 1972) (A. Mendes) (1): Um sítio desolador

16 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1956: Diários de um Comando: Gampará (Ago-Dez 1972) (A. Mendes) (2): Passa-se fome, muita fome

Guiné 63/74 - P2741: III Encontro Nacional da Nossa Tertúlia (2): Inscrições aceitam-se (Carlos Vinhal / J.Mexia Alves)

Foto de família tirada em Pombal em 2007. Não vamos deixar que a próxima se pareça com a de um grupo excurcionista que se deslocou num único autocarro.

1. Como havíamos prometido, publicamos a lista actualizada dos inscritos para o III Encontro Nacional da Tertúlia, a realizar em Monte Real no dia 17 de Maio próximo.

Lembramos os nossos amigos que ainda não se inscreveram, mas sabem de antemão que podem comparecer, que devem manifestar a sua vontade, pois assim podemos ir trabalhando na feitura de crachás e reserva de alojamento para os interessados em ficar de um dia para o outro.

Aqui fica a lista actualizada. Os nomes em falta não são da nossa responsabilidade.

Álvaro Basto e esposa Fernanda
A. Marques Lopes, esposa Gena e filho Francisco
António Santos e esposa Graciela
Artur Manuel Soares
Carlos Esteves Vinhal e esposa Dina
Carlos Marques Santos e esposa Teresa
Carlos Silva e esposa Maria Germana
David Guimarães e esposa
Delfim Rodrigues
Fernando Franco e esposa Margarida
Henrique Matos
Joaquim Mexia Alves
Jorge Cabral
José Armando Almeida e esposa Teresa
José Casimiro Carvalho
José Luís Vacas de Carvalho
José Manuel Lopes e esposa Luísa
José Martins e esposa Maria Manuela
José Teixeira
Leopoldo Amado
Luís Graça e esposa Maria Alice
Mário Fitas e esposa Maria Helena
Maurício Esparteiro
Paulo Santiago e esposa Teresa
Raúl Albino
Victor Alves
Virgínio Briote e esposa Maria Irene
Vitor Junqueira

Neste momento, com 28 camaradas e 16 acompanhantes inscritos, estamos muito longe dos 52 camaradas e 32 acompanhantes que o nosso Dr. Vitor Junqueira conseguiu juntar em Pombal.

A partir de hoje a palavra de ordem será: - Todos em Força Para Monte Real.
____________________

Nota dos editores:

Vd. poste de 3 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2716: III Encontro Nacional da Nossa Tertúlia (1): Inscrições, aceitam-se (Carlos Vinhal / Joaquim Mexia Alves)

Guiné 63/74 - P2740: Convívios (49): CCAÇ 4150 em Fátima no dia 27 de Abril de 2008 (Albano Costa)

CCAÇ 4150, cuja divisa era: Força, União e Vontade

Recebemos, em 9 de Abril, uma mensagem do nosso camarada Albano Costa dando conta do próximo Almoço/Convívio da sua Companhia

Caros amigos Luís, Vinhal e Briote
Aqui vai mais um pedido de publicação, para o nosso blogue, se assim o entenderem e se houver disponibilidade para tal.

O Almoço-Convívio da CCAÇ 4150 "Os Apaches do Norte", que esteve em Bigene e Guidage, vai realizar-se no próximo dia 27 de Abril de 2008, em Vale das Barreiras - Fátima.

A concentração vai ser a partir das 10h30, junto à nova Igreja da Santíssima Trindade, com visita à mesma, seguida de visita à "Pia do Urso".

Segue-se depois em caravana para o Restaurante Arisol.

Na ementa não podia faltar o respectivo bacalhau e a seguir uns medalhões de vitela e porco.
Sobremesa variada e a respectiva pinga.
Para finalizar o bolo com o símbolo da Companhia, (que pena no tempo de guerra, bolo nem vê-lo, pelo menos no mato.

O preço por pessoa é de 22,50€.

As marcações estão a cargo de:
Ari Alves, telefones 244002446 - 918174263;
Duarte Frade, telefones 249849019 - 912919581.

Um abraço para todos,
Albano Costa

Guiné 63/74 - P2739: Poemário do José Manuel (7): Recuso dizer uma oração ao Deus que te abandonou...

Guiné > Mampatá > Região de Tombali > Mampatá > CART 6250 (1972/74), Os Unidos de Mampatá > Finalmente a minha filha me ensinou a mexer nisto [ ou seja, a digitalizar as fotos do meu álbum...]. Aqui estou eu com um elemento do PAIGC em Maio de 1974. Trocámos lembranças, eu dei-lhe livros e ele me ofereceu um emblema do PAIGC.

Eu e o Furriel do pelotão de nativos , o madeirense Gomes, um grande amigo que nunca mais vi até hoje. Me disseram na Madeira que imigrou para o Canadá.

Eu a reler o que havia escrito, numa pausa durante a protecção a uma coluna de Bula para Aldeia Formoso.

Fotos e legendas: © José Manuel (2008). Direitos reservados.

1. Poemas da semana de 29 de Março a 3 de Abril... Ássinados pelo Josema, pseudónimo de José Manuel Lopes, da Quinta da Senhora Graça, no Douro, ex-Fur Mil Op Esp, da CART 6250 (Mampatá, 1972/74). Finalmente, vieram três fotografias do nosso camarada-poeta... Já lhe podemos tirar a pinta: a avaliar pelas chapas, parece ser bom rapaz... Mas ele, hoje, estava particularmente feliz por dois motivos. Vejamos porquê... O melhor é reproduzir o seu mail:

"Bom dia camaradas. Tenho duas boas notícias. O encontro da Minha Companhia, em que até 1986 nunca participei, mas de depois de uma 'lavagem' do amigo Carvalho, Furriel Enfermeiro, ou melhor Furrié Dotô, nunca mais perdi até hoje.

"É um encontro muito original, sempre em casa de um dos Unidos, se tiver condições para tal, ou na sede daFreguesia da sua terra. Cada um leva o seu merendeiro com as especialidades da sua região. O País gastronómico está lá. Quem nada levar, basta levar o apetite e vai visitando os vários farnéis. Todos são benvindos, pois todos vão por bem e por vezes o Gastão, o nosso 'Zeca Afonso', leva o violão. Depois de bem comer e melhor beber, cantamos o nosso hino 'Mampapa pata pata pata'.

"Eu levo o meu vinho que é o motivo da segunda boa notícia. Ganhou uma medalha de prata no WINE MASTERS CHALLENGE, este ano realizado em Portugal no Estoril, entre cerca de 4000 vinhos de todo o mundo.

"Até breve camaradas.

"Nota: 2 inscrições no convívio da Tertulia eu e a Luisa, minha mulher".


Já agora os camaradas e amigos da Guiné ficam a saber que o nosso Josema, ou melhor, o José Manuel Lopes, é produtor de dois excelentes vinhos, tintos, DOC, da Região do Douro... na sua quinta de 3 hectares, a Quinta Sr.ª da Graça, S. João de Lobrigos, 5030 - 429 Santa Marta de Penaguião, Telef 254 811609 / Fax 254 811609. Ele e a esposa, Luisa Valente.

As suas criações vinícolas são o Penedo do Barco (produzido desde 1999) e o Pedro Milanos (desde 2003), à base das seguintes castas: Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz, Tinta Barroca e Tinta Amarela (Penedo do Barco, colheita de 2004; produção: 3400 garrafas); Touriga Franca, Tinta Roriz e Tinta Barroca (Pedro Milanos, colheita de 2005; produção: 7000 garrafas).

Aqui fica a informação, sem intuitos publicitários, já que a nossa filosofia bloguística é também a de valorizar o que os nossos camaradas fazem... sobretudo se fazem bem.

Parabéns ao José e à Luísa. Espero poder conhecê-los e provar os seus nectares em Monte Real, no dia do nosso III Encontro Nacional. E agora vamos ao poema, nosso, de cada dia... (LG)


Recuso dizer uma oração
ao Deus que te abandonou
não sei se é do nó
que me aperta a garganta
ou da revolta que brota do meu peito
só sei que não consigo
desculpa...
sinto ganas de arrancar
o fio preso ao teu pescoço
e atirar dentro da mata essa cruz
no local...
onde encontraste a tua
onde perdeste a vida
e eu a minha fé entorpecida
recuso deixar de pensar
no que aqui nos trouxe
para onde nos levam
quero encontrar respostas
a todas as perguntas
que se soltam em turbilhão
dentro de mim
quero encontrar
algo que justifique
achar uma razão
por pequena que seja
irmão
para acalmar esta dor
e não encontro
e não encontro...não.

Bolama 1972
josema


Escuta mãe
espero como nunca um conselho
mas não consigo ouvir a tua voz
aguardo um aviso
um sussurro de alguém
e só me responde o silêncio
como é duro estar só
espreito por cima do ombro
e não vejo nada além da névoa
só sinto o peso da arma
e das ideias que me assaltam
de novo aprendiz da morte
ideias que correm p’ra longe
que fogem do pensamento
logo ao primeiro tiro
mas... na verdade
o que eu quero
é tão simples
eu...
eu só quero
um dia voltar
encostar-me no teu colo
ver-te estender a roupa
ver meus irmãos a brincar
a bola no largo a saltar
ver o Benfica vencer
ao Guto e ao Minota gritar
saborear a comida gostosa
ver o Douro a correr
e sei...
e sei que não quero morrer.

Nhácuba 1973
josema


Este pó que nos seca a garganta
este calor húmido que sufoca
esta terra vermelha
que se cola ao corpo
estes estranhos odores
tão diferentes dos nossos
mas também com os seus encantos
não têm
é o cheiro a rosmaninho
a mosto e a alecrim
são coisas novas também belas
de estranhas sensações
que temos de desvendar
e aprender a conhecer
as mangas as papaias
as castanhas de caju
os sons diferentes da mata
o brilho intenso da luz
a filosofia de Amadu
os pensamentos de Seidi
os sorrisos de africanas
o corpo esguio da mulata
há que lutar pela vida
longe da casa de xisto
entre o barro da cubata.

Mampatá 1972
Josema


Não quero os dias todos iguais
nem águas da mesma cor
pois a vida não é só
alegrias e beleza
e ainda muito menos
só a dor e a tristeza
não quero os dias todos iguais
já que a vida
é o espanto da surpresa
é a descoberta do amor
é o gozar da solidão
é o abraço da multidão
é confiar num amigo
é enfrentar um inimigo
é estar quente
é conforto
é estar frio
é o perigo
é a coragem
é o medo
é pisar a terra amada
é ver novos horizontes
pode ser um lar
ou um imenso navegar
por tudo isso
não quero os dias todos iguais.

Bissau 1974
josema

Como eram belasas miúdas que conheci
as amigas as amantes
as de amores realizados
as de amores imaginados
as que ficavam distantes
todas todas
todas sem excepção
quero beijá-las quero amá-las
para matar a solidão
não há raparigas más
não existem rostos feios
só vejo corpos esbeltos
só vejo pernas e seios

Bissau 1974
josema


Ao Santos de Leça (*)

Um dia nunca passava
sem que escrevesse uma carta
à mulher que tanto amava
como se fosse promessa
todas elas numeradas
como a que testemunharem
a grande paixão do Leça.

Mampata 1974


(*) Leça foi um Furriel da Cart 6250
que escreveu tantas cartas como dias esteve na Guiné,
todas elas numeradas,
a nº1 no dia 24 de Junho de 1972,
dia da nossa chegada
ao aeroporto de Bissau.

________________

Notas de L.G.:

(1) Vd. postes anteriores:

27 de Fevereiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2585: Blogpoesia (8): Viagem sem regresso (José Manuel, Fur Mil Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74)

3 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2608: Poemário do José Manuel (1): Salancaur, 1973: Pior que o inimigo é a rotina...

9 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2619: Poemário do José Manuel (2): Que anjo me protegeu ? E o teu, adormeceu ?

13 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2630: Poemário do José Manuel (3): Pica na mão à procura delas..., tac, tac, tac, tac, tac, TOC!!!

19 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2665: Poemário do José Manuel (4): No carreiro de Uane... todos os sentidos / são poucos / escaparão com vida ? / não ficarão loucos ?

28 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2694: Poemário do José Manuel (5): Não é o Douro, nem o Tejo, é o Corubal... Nem tudo é mau afinal.... Há o Carvalho, há o Rosa...

5 de Abril de 2008 Guiné 63/74 - P2723: Poemário do José Manuel (6): Napalm, que pões branca a negra pele, quem te inventou ?