quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13469: Memórias da CCAÇ 1546 (Domingos Gonçalves) (5) - Reportagens da Época (1967): Guidaje

1. Mensagem do nosso camarada Domingos Gonçalves, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68) com data de 4 de Agosto de 2014:

Prezado Luís Graça:
Em primeiro lugar, votos de boas férias, e de bom repouso, no sossego da Lourinhã.
Depois, procedo ao envio de mais umas dicas, - relato do que aconteceu em Guidage, à distância de, precisamente, 47 anos -, que se o entender conveniente, poderá publicitar.

Um abraço amigo para todos os navegantes do blogue,
Domingos Gonçalves



MEMÓRIAS DA CCAÇ 1546 (1967) 
- REPORTAGENS DA ÉPOCA


5 - GUIDAJE 1967

Mês de Agosto
Dia 5

O tempo continua muito chuvoso. O destacamento não passa de um autêntico lamaçal.
Os abrigos transformaram-se em verdadeiras covas escuras, húmidas e insalubres.
As valas que fazem a ligação entre esses abrigos são verdadeiros pântanos. A água aparece em todos os lados e coloca em perigo todas as construções que por aqui se foram fazendo... Os tipos que substituíram a Engenharia Militar para fazer isto, ou que orientaram quem aqui trabalhou, estão todos chumbados... Não passam de uns incompetentes... Autênticos nabos.


Dia 6

Às seis horas e meia da manhã levantei-me. Às sete, como aliás quase todos os dias, peguei na caçadeira e fui às rolas.
Pelas oito, o Patron (nosso interprete) foi procurar-me nas imediações do arame farpado, para me dizer que durante a noite Guidage esteve cercada por mais de duzentos turras.

Fiquei incrédulo. Custou-me a acreditar. Como é que isso podia ser! O pessoal do destacamento nunca os tinha incomodado! Depois, como podia ser possível que um grupo tão numeroso, carregado de armas e munições, tivesse cercado Guidage, instalado as armas e, de seguida, sem disparar um tiro, tivesse ido embora? Não. Aquilo não podia ser verdade. Mas, como o Patron insistiu, ainda cheio de muitas dúvidas, entrei no aquartelamento, troquei a caçadeira pela G3, e acompanhado por dois soldados fui confirmar o que se tinha passado.

Efectivamente, verifiquei-o com os meus próprios olhos, a informação era verdadeira. Durante a noite, três grupos de turras, provenientes da área do Dungal, de Cumbamory e de Samboyá, tinham cercado Guidage. Pelos vestígios que deixaram calculei que, efectivamente, deveria tratar-se de um grupo constituído por cerca de 150 a 200 homens. A aproximação que fizeram tinha sido perfeita. Pelos vestígios que deixaram no terreno, capim e culturas calcadas, verifiquei que nos tinham feito um cerco perfeito, em meia lua, com o intuito de dirigir o fogo directamente sobre o aquartelamento, no sentido da linha de fronteira.

Regressei ao aquartelamento, e com mais pessoal e armamento, fui seguir-lhes o rasto. Confirmei que retiraram pela estrada que leva a Samoje e Facã, por onde, parte deles, tinham feito a aproximação a Guidage. O grupo que veio do Dungal retirou também para o mesmo lado.
O território do Senegal foi o destino que escolheram após terem desistido de nos atacar.
A cerca de dois quilómetros, já do outro lado da bolanha, na estrada que segue para Bigene, encontrei uma granada de morteiro 82mm, abandonada pelos gajos durante a retirada.

Todos os vestígios que recolhi indicavam que eles retiraram calmamente, sem qualquer precipitação. Em rigor, não efectuaram um ataque em força porque não quiseram. Poderiam, se tivessem atacado, ter destruído outra vez Guidage, ter queimado tudo e, quem sabe, ter mandado alguns de nós para o outro lado da vida. Mas não o fizeram. Não nos atacaram. Retiraram ordeiramente, sem quaisquer problemas, quando quiseram e como quiseram. E tudo isto aconteceu ali mesmo, a cerca de 400 metros do arame farpado, precisamente no local onde os holofotes da iluminação externa já não iluminam nada. Estiveram ali, nas nossas barbas, sem que as sentinelas se apercebessem do que se estava a passar. Tudo tinha sido feito discretamente, com todo o rigor táctico, dentro do cumprimento quase perfeito dos ensinamentos que a gente estudou nos manuais da guerrilha. Estes turras estudaram mesmo numa boa escola!

Apenas há uma coisa que não consigo entender:
- Qual a razão que os terá levado a retirar, sem terem disparado um único tiro sobre o meu reino?

É um mistério que me vai acompanhar para sempre. Efectivamente, só uma razão muito forte pode estar na origem desta desistência de última hora, e desta retirada ordeira sem uma razão aparente. Mas, felizes de nós pela decisão acertada que eles tomaram. Que nos cerquem quando muito bem entenderem, desde que, depois, calmamente, se retirem.

Antes de regressar ao aquartelamento, na área da referida estrada, mas do outro lado da bolanha, coloquei, por precaução, três potentes armadilhas (minas). Tanto podiam ser úteis, como não servir para nada. Que eles voltariam, não me restavam dúvidas. O local por onde iriam fazer a aproximação é que eu não poderia adivinhar. Como, regra geral, a partir do entardecer ficamos quase sempre confinados aos limites estreitos do arame farpado, eles podem aproximar-se sem qualquer receio, escolhendo o local que lhes parecer mais seguro. A noite é praticamente deles. Quando nos atacam dentro dos aquartelamentos fazem-no quase sempre de madrugada, para lhes restar tempo para se retirarem ainda a coberto da noite.

Ao fim da manhã, vindo do Senegal, chegou um informador a dizer que os tipos, durante a retirada, tinham passado por Secunaya e Corumbo, e que não concretizaram o ataque pelo facto de não ter chegado um outro grupo que também deveria participar na festa que desejavam fazer em Guidage.
É uma razão.
Mas eles já dispunham de tanta gente à nossa volta! Tinham da parte deles o efeito surpresa e a escuridão da noite, um grupo numeroso de combatentes e sei lá quantas armas. E não quiseram aproveitar nada disso...

Durante o dia nada mais aconteceu de anormal. A população trabalhou serenamente a terra, e a tropa permaneceu mergulhada na doce estupidez de cada dia.
À noite recomendei a todos, soldados e população, que se mantivessem junto dos abrigos e que ficassem atentos. O perigo não tinha passado. Tínhamos de ser prudentes e cautelosos.

Pelas dez horas da noite, sensivelmente, explodiu uma das armadilhas que deixei do outro lado da bolanha, precisamente a que tinha mais potência. A explosão teve lugar a cerca de dois quilómetros, mas pareceu-nos que aconteceu mesmo ao lado do arame farpado. Efectivamente, para além da carga normal, eu coloquei ao lado da armadilha bastantes granadas velhas e garrafas de cerveja cheias de munições de G3, já fora de uso. Daí que o rebentamento, de todos aqueles explosivos, tenha causado um barulho terrível Mesmo brutal...
As casas dos nativos estremeceram e as paredes largaram caliça. Foi um barulho enorme. Medonho...
Depois, disparei para o local algumas granadas de morteiro 81mm, os soldados e a população mantiveram-se nos abrigos, armas em punho, tudo pronto a abrir fogo ao mais pequeno sinal, à espera que o pior acontecesse.

E um silêncio profundo dominou a tabanca e o aquartelamento durante algumas longas horas, feitas de stress e angustiosa expectativa. Aquela foi para todos uma longa noite, em que o tempo dava a sensação de estar parado. Mas nada de anormal aconteceu. Mesmo nada. Foi mais uma noite igual a tantas outras. Mantivemo-nos é certo, mais atentos, à espera, mas não fomos minimamente incomodados. Apenas o medo nos incomodou... O medo que obriga as pessoas a estar despertas, sempre à espera, o medo que nos rouba o sono e que faz todos os homens corajosos e heróis.
Heróis que só desejam vivamente que não aconteça nada daquilo que se é obrigado a esperar indefinidamente ao longo destas intermináveis noites.
Heróis que apenas desejam que permaneça sempre longe a oportunidade de praticar actos irracionais, capazes de fazer deles esses homens invulgares que as páginas da história vão registando.
É que, ninguém deseja ser herói, nem mesmo aqueles que de facto o foram. O herói é um produto do acaso, ou talvez da irracionalidade da vida.

Já de madrugada, antes de adormecer, eu apenas me interrogava:
- Será que foi um bicho a detonar a armadilha? Será que foram os tipos que vinham de novo com a boa intenção de fazer uma festa nas imediações de Guidage?

E o meu pensamento, ou a minha imaginação, ficaram-se por esta dúvida, na expectativa, aguardando que algo de pior pudesse ainda acontecer.
E, apesar de tudo, ainda dormi um sono, não muito longo, mas suficientemente repousante.


Dia 7

Pela manhã, levando comigo mais de metade dos homens de que dispunha, bem armados e municiados, fui verificar a causa do rebentamento da armadilha. Efectivamente tinha sido accionada pelos turras que, outra vez, e por certo a sério, se dirigiam para Guidage, no intuito de efectuar um ataque.

A explosão da armadilha deixou no chão um buraco enorme. Ao lado, por entre o capim calcado, havia muito sangue, pedaços de vestuário e vestígios da presença de muitos feridos, ou mortos. Perto do local da explosão, encontrámos um ferido abandonado. Tratava-se de um rapaz novo, que não teria mais de 15 anos. Encontrava-se totalmente nu. Era, por certo, um dos muitos carregadores utilizados no transporte das armas e das munições. Pensando que estava mesmo morto, deixaram-no abandonado entre o capim, absolutamente despido, sem qualquer elemento que o pudesse identificar.

No meio de todo aquele ambiente pesado, ouviu-se a voz de um soldado que, mesmo a meu lado, satisfeito, dizia:
- “Os filhos da puta vinham cá para nos foder, mas eles é que foram pró caralho.”

E, mais baixinho, outros soldados foram murmurando:
- Sim... desta vez eles é que foram pró caralho. Esses caragos, bem que nos podiam deixar em paz. Mas, desta vez quem lerpou foram eles.

Levámos para o aquartelamento o rapaz que os tipos abandonaram e tratámo-lo o melhor possível. Depois, pediu-se uma evacuação para o Hospital Militar, que não chegou a concretizar-se porque, entretanto, ele morreu.
Aparentemente ele tinha apenas algumas escoriações. Devia, no entanto, ter algum traumatismo interno a cujas consequências não resistiu. Deve ter sido projectado pelo sopro causado pela explosão da armadilha e, ao embater no chão, os órgãos internos devem ter ficado muito afectados.
A população quando nos viu chegar com o prisioneiro ficou satisfeitíssima.
Fizeram festa. Bateram palmas. Afinal, ele era dos que vinham atacar e destruir as suas casas, matar pessoas e destruir bens.

Enterraram-no.
Verifiquei com tristeza que a população efectuou o funeral sem qualquer cerimónia, com desprezo e ódio, como que se de um simples animal se tratasse. Intimamente senti-me chocado com toda aquela frieza.
O que ali estava era o cadáver de um homem ainda muito jovem, obrigado, por certo, a colaborar com a guerrilha. Um jovem a quem a guerra acabava de destruir...

De tarde voltei à estrada de Samoje e coloquei novas armadilhas. Na estrada de Binta fiz a mesma coisa. Eu sei que mais dia menos dia os tipos vão tentar de novo... Temos que estar sempre atentos...

O objectivo deles, é dar cabo de nós.
O nosso objetivo, é dar cabo deles.
Somos todos loucos.
Era preferível acabar de vez com isto, com esta guerra que não vai levar a lado nenhum.

Domingos Gonçalves
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13444: Memórias da CCAÇ 1546 (1966) - Reportagens da Época (Domingos Gonçalves) (4): A morte do Furriel Moreira

Guiné 63/74 - P13468: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (2): "Poesia africana di rivolta!", por Giuseppe Tavani - Poesia de revolta dos tempos anticoloniais, em português

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Julho de 2014:

Queridos amigos,
A poesia foi o género literário de eleição dos intelectuais independentistas africanos.
Lendo desapaixonadamente hoje este acervo, não é difícil concluir que esta poesia engajada, na sua maior parte, não tem assento na posteridade. Por ironia, bebe da tradição lírica portuguesa, na maior parte dos casos.
A propaganda tentou endeusar nomes como o de Agostinho Neto, mas não passam de poetas menores, aquele estro poético teve o seu espaço e o seu tempo, cumpriu a função e depois evaporou-se. Não é drama nenhum, contam-se com os dedos das mãos os bons poemas de Amílcar Cabral, quanto ao mais foram bonitos exercícios escolares quase parnasianos.
Mas o registo histórico desta poesia é obrigatório.

Um abraço do
Mário


Biblioteca em férias (2)

Poesia de revolta dos tempos anticoloniais, em português

Beja Santos

Trata-se de uma edição italiana para revelar, no fim dos anos de 1960, uma panorâmica da poesia africana escrita em português exaltando a negritude, protestando contra o trabalho-escravo e a repressão, e, sobretudo, exultando uma visão independentista.
Uma antologia onde constam Agostinho Neto, Costa Andrade, José Craveirinha, Kaoberdiano Dambará, Alda do Espírito Santo, Aguinaldo Fonseca, Mário Fonseca, Armando Guebusa, António Jacinto, Marcelino dos Santos, Gabriel Mariano, Ovídio Martins, e mais outros.
Giuseppe Tavani prefacia, falando do colonialismo e da revolta poética. Contextualiza o que está subjacente a esta poesia de revolta, de âmbito socioeconómico e cultural: racismo social, situação dos assimilados, papel do colonialismo externo em contraposição à ocupação direta; distingue Angola e Moçambique dos pequenos territórios da Guiné, Cabo Verde e São Tomé.

De seguida, qualifica o nacionalismo africano, como se expressa o tímido protesto poético ao nível metropolitano e depois espraia-se sobre a produção poética das elites negras e mestiças, por um lado integradas na cultura europeia e, por outro, à procura de identidade comunicando em português e em crioulo. Releva a incipiência do fenómeno literário em termos de autonomia local, chamando à atenção para os trabalhos de Deolinda Rodrigues em quimbundo, de Costa Andrade em umbundo, de Tomás Medeiros e Kaoberdiano Dambará em crioulo, respetivamente de São Tomé e Cabo Verde.

Nunca se fala em nenhum poeta guineense a não ser para dizer que o canto da guerrilha se exprime em crioulo. Estranha-se a observação e as omissões, Giuseppe Tavani consultou Mário de Andrade, neste tempo ainda era desconhecida a poesia de Vasco Cabral, mas era conhecida a poesia de Amílcar Cabral. Coisas incompreensíveis.

A África-mãe é invocada com bastante persistência, e o protesto anticolonial é dado pelo negro na luta, é nessa luta que todo o projeto colonial se tornará matéria comburente, é esta a mensagem daquele que será, porventura, o grande poema desta antologia, da autoria de José Craveirinha, hoje Prémio Camões,

“Grito negro”

Eu sou carvão!
E tu arrancas-me brutalmente do chão
e fazes-me tu a mina, patrão.

Eu sou carvão
e tu acendes-me patrão
para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não, patrão.

Eu sou carvão
e tenho que arder, sim
e queimar tudo com a força da minha combustão.

Eu sou carvão
tenho que arder na exploração
arder vivo como alcatrão, meu irmão
até não ser mais a tua mina, patrão.

Eu sou carvão
tenho que arder
queimar tudo com o fogo da minha combustão

Sim!
Eu serei o teu carvão, patrão!

Giuseppe Tavani recorda que alguns destes poetas assumem o peso da tradição portuguesa, no tratamento dos temas do amor, há mesmo sonetos na tradição de Petrarca, sobressai a relação homem-mulher e os seus tormentos. Poderá mesmo falar-se poetas africanos de língua portuguesa há procura de espaço próprio na sua exaltação da negritude e totalmente identificados com o sonho independentista.

Mário de Andrade, em apêndice, discorre sobre a evolução e tendências atuais desta poesia africana de expressão portuguesa, também ele enfatiza os temas da reconquista da soberania nacional e destaca a originalidade da poesia de Francisco-José Tenreiro. Indo mais atrás, observa a escola jornalista angolana que começou a dar os seus primeiros passos a partir de 1880, com o estudo das línguas autóctones, fala mesmo do grupo de intelectuais que publicaram “A voz de Angola clamando no deserto” publicado em 1901.

Dá-nos igualmente uma visão do particularismo regionalista de Cabo Verde e a importância que teve a revista “Claridade”, a partir de 1936. Mas o fulcro da sua atenção está centrado nos acontecimentos políticos da independência do continente africano, o termo da II Guerra Mundial.
Este ensaio escrito em Argel, em Dezembro de 1967, Mário de Andrade fala dos novos nomes de poetas oriundos das colónias em revolta e termina dizendo que a poesia africana de expressão portuguesa, fiel ao próprio húmus, anuncia já um mundo novo da libertação do homem.

Andrade destaca Francisco Tenreiro, um são-tomense que morreu em Lisboa em 1963 e que era do centro universitário como uma das vozes de eleição dessa originalidade da poesia de revolta e por isso publica-lhe a

Canção do “Obô”

O sol golpeia as costas do negro
e rios do suor ficam correndo.

Ardor!

O machim golpeia o pau
e rios de seiva correndo.

Ardor!

Os olhos do branco
como chicotes
ferem o mato que está gritando…

Só a água sussurrantemente calma
corre p’ra o mar

tal qual a alma da terra!
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Nota do editor

Primeiro poste da série de 30 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13449: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (1): Francisco Marques Geraldes, um herói militar português na Guiné

Guiné 63/74 - P13467: Tabanca Grande (442): Fernando de Jesus Sousa, ex-1.º Cabo da CCAÇ 6 (Bedanda, 1970/71)

1. Mensagem do nosso camarada e novo amigo Fernando de Jesus Sousa, ex-1.º Cabo da CCAÇ 6, Bedanda, 1970/71, com data de 31 de Julho de 2014:

Luís Graça,
Primeiro deixe que me apresente.
Sou Fernando de Jesus Sousa, nascido a 24 de Dezembro de 1948, ex-1.º Cabo n.º 18954869.

Embarquei para a Guiné no navio Niassa em 20 de Maio de 1970.

Regressei, creio que em Novembro de 1971, evacuado para o HMP de Lisboa, por ter sido gravemente ferido, onde estive internado até Abril de 1973.

Fiz a minha comissão de serviço em Bedanda, integrado na CCAÇ 6.

Luís Graça, já nos encontrámos numa sardinhada em Peniche, promovida por um grande Bedandense e bom amigo Belmiro da Silva Pereira. Logo ali prometi-lhe que me iria associar a este fantástico grupo.

Acredite que foi por causa deste blogue que tudo fiz para aprender um pouco de internete, a fim de poder acompanhar tudo o que dissesse respeito à Guiné. Só eu sei, as emoções que sentia, com as vossas imagens e questões ligadas àquela terra, fotos e comentários de amigos em comum.

Por tudo isto obrigado.

Quero também anunciar-lhe que já acabei a escrita do meu livro, que irá ser publicado em Novembro.
Logo após isso irei enviar-lhe alguns enxertos de textos sobre a Guiné, que escrevi, onde abordo muitas questões pertinentes e falo abertamente do acidente de que fui vítima.

Fernando Sousa


CCAÇ 6 - Bedanda - Guiné - 1970/1972 - Trabalho do camarada José Carvalho publicado no Youtube


2. Comentário do editor:

Caro camarada Fernando Sousa,
Muito bem-vindo à Tabanca Grande.

É para um nós um orgulho saber que somos lidos por muitos camaradas. Pena que a maioria não se manifeste e não se dê a conhecer, tal como tu fizeste agora.

Pede-me o Luís para te dizer que aqui na Tabanca nos tratamos todos por tu, independentemente dos antigos (e actuais) postos, da nossa idade, da nossa formação académica, profissão, etc.

Une-nos aquele pedaço de África que nos marcou para sempre.

Pelo que nos dizes, és deficiente das Forças Armadas resultado do acidente de que nos falarás um dia. É um dos assuntos que só o próprio sabe como e quando aflorar. A nossa página pretende, entre outras coisas, ser um meio de catarse, pelo que estamos ao teu dispor.

Dizes que irás publicar um livro onde relatas episódios da tua comissão na Guiné, e que o mesmo será apresentado em Novembro. Fica desde já o nosso Blogue ao teu dispor para dar notícia desse evento. Quando quiseres, manda-nos por mail um convite digitalizado, assim como a capa do livro para publicarmos em devido tempo.

Posto isto, resta-me enviar-te o abraço de boas-vindas em nome da tertúlia e dos editores que esperam muitos textos e fotos teus para publicação.

Ao teu dispor, o camarada e amigo
Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13383: Tabanca Grande (441): Mário Jorge Figueiredo Lourenço, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CCAV 2639 (Binar, Pete, Bula, Ponta Consolação e Capunga, 1969/71)

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13466: História da CCAÇ 2679 (68): Flagelação muito concentrada e certeira (José Manuel Matos Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 4 de Agosto de 2014:

Viva Carlos!
Tem paciência, aguenta lá com esta!

Um grande abraço
JD




HISTÓRIA DA CCAÇ 2679

68 - FLAGELAÇÃO MUITO CONCENTRADA E CERTEIRA

Aconteceram muitas e variadas situações inopinadas durante a guerra que travámos na Guiné.
Não me lembro de todas em que participei, ou de alguma maneira fui envolvido; ainda não contei todas de que retenho memória, e julgo que algumas não contarei, por constituírem testemunhos merecedores do maior repúdio social, e já antes, por breves abordagens aos insondáveis desígnios humanos, recebi reparos de leitores que se sentiram ofendidos, na crença de que vivíamos na melhor das civilizações, apesar de nem terem sido beliscados nos conteúdos que subscrevi.
Somos assim, e eu não tenho a veleidade de mudar o mundo, mas se pudesse... ah! com certeza.

O que me proponho agora trazer a público, não tem nenhuma revelação estrénua, nem de cobardia, nem ofensiva da moral e dos bons costumes, apesar do insólito, e da atrapalhação gerada. E todos se salvaram, conforme o nosso propósito ao embarcarmos com destino à Guiné.

 Como se recordam, pelas dezoito horas, nas lonjuras de Bajocunda, o sol mergulhava nos confins do ocidente até se diluir no escuro da noite, que um bocado depois começava a evidenciar o estrelar faiscante do firmamento, numa profusão de riquezas diamantinas, que nos deixava de olhares sequiosos como quem espera ser compensado por tão longa deslocação.
Se uns se regalavam naquela contemplação, outros entregavam-se a Morfeu, e alguns ainda liam, escreviam, ou faziam lerpas batoteiras, antes de pregar olho.

Certa noite, provavelmente habitada por inúmeras recordações da juventude, por projectos de futuro, por requisição de momentos passados, ou inquietações perenes, sei lá por quê, dois furriéis que tinham frequentado o mesmo colégio, e cimentado entre si uma cumplicidade maluca, ficaram à conversa sem se darem conta da passagem do tempo.
Por alguma razão, que não vem ao caso, deram-se conta de que os restantes já dormiam a bom dormir. Cá para mim, devem ter imaginado os diferentes comportamentos quando desaba uma flagelação inimiga, que é uma coisa que ninguém aprecia, sobretudo, quando está a viver tal género de acontecimento. Algum deve ter imaginado confrontar a hipótese com a realidade e, de outro ângulo, apreciarem as reacções. Não acuso, especulo.

A fonte de luz lunar deve tê-los inspirado daquelas estórias fantasmagóricas, com sombras reflectidas na penumbra, sons suspeitos na passagem de cada porta, medo na travessia da escuridão e dos encontrões precipitados, entre os ingredientes do humor negro que já firmou autores de renome mundial que, ainda não é desta, não me proponho a alcançar. Essas reacções de medo, cagaço, incerteza, sangue, dor, e outras consequências drásticas, devassavam o cortex de muitos combatentes, que preferiam estar aninhados junto com as namoradas, já que ali não se conheciam adeptos de outro género.

Fez-se um plano de acção.
Estavam tão lúcidos os dois furriéis, que nem carecia de revisão, ia resultar em cheio.
Um deles foi buscar um rolo de corda à oficina, que se mostrava necessidade premente para temperar a situação de ficção em realidade. O outro abordou-se do local onde se juntava o lixo de garrafas vazias, que também constituía outra necessidade essencial no conjunto dos ingredientes para a acção, e reuniu algumas delas, que colocou em lugar estratégico. Entraram dentro do edifício com três quartos onde os restantes chonavam, e àqueles que se mostravam mais profundamente desligados da realidade perigosa, ataram os pés aos pés da cama, com um nó simples mas desencadeador de todos os cagaços. Depois, deram execução ao plano.

Enquanto no exterior, um deles bombardeava o telhado de zinco com tanta cadência de garrafas quanto possível, o outro andava pelos quartos aos berros que anunciavam ataque do IN, e já identificava um morto. Gerou-se uma atrapalhação, com gajos a imaginarem o céu a cair-lhes em cima, e outros que saltavam desajeitadamente sobre os atingidos, tudo num lapso de tempo escuro, que evidenciou o perigo da malta se deitar sem lembrança de quartos de sentinela.

Sucederam-se uns minutos impróprios de relatar aqui, mas pouco depois as inconscientes vítimas, empregavam novamente a roncar de profundo sono.

P.S. - Por respeito à vontade dos provocadores, omito as suas identidades.
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Nota do editor

Último poste da série de 7 de Abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12942: História da CCAÇ 2679 (67): Requerimento, talvez inédito (José Manuel Matos Dinis)

Guiné 63/74 - P13465: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (35): Pepito (1949-2014): rei morto, rei (de)posto ?...



Carlos Schwarz da Silva, Pepito (1949-2014). Lisboa, Escola Nacional de Saúde Pública, 2007. 

Foto (e legenda): © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados.

1. Não temos sabido notícias dos nossos amigos da AD - Acção para o Desenvolvimento, de que o saudoso Pepito (1949-2014) foi um dos cofundadores,  "alma mater", lider, figura de proa e seu diretor executivo até à hora da sua morte, inesperada, em Lisboa, ... Poi isso deixámos, em 18 de julho passado, na página do Facebook da AD, a seguinte mensagem;

Tabanca Grande Luís Graça 18/7 às 16:31

Os amigos de Portugal estão preocupados, mais do que isso, inquietos, e ainda mais do que isso, angustiados, com o silêncio dos nossos amigos da AD!... Queremos continuar a apoiar, através da AD, os nossos muitos amigos que contamos na Guiné-Bissau, de norte a sul, de leste a oeste. Não deixemos morrer o sonho de um grande visionário, líder e ser humano que pertenceu (e continua a pertencer) aos nossos dois mundos... Refiro-me ao Pepito!... Mantenhas para todos/as. Luis Graça

Resposta da ONG Acção para o Desenvolvimento

Obrigado, caros amigos e parceiros, a AD continua e as sua ações continuam mesmo. A publicação no site e no facebook parou por causa de problemas técnicos de edição, mas vamos retomar. Há  muitas atividades feitas durante este ano tais como: Forum de Cacheu, Encontro das Rádios e TV comunitárias, encerramento de cursos profissionais na EAO (Escola de Artes e Oficios), recepção e distribuicao de livros sobre plantas medicinais etc... Nós todos vamos lutar para que o sonho de Pepito seja realizado. [Negrito e realce a amarelo,. nosso, LG]


2.  Uma semana depois recebemos a seguinte mensagem da filha mais nova do Pepito e da Isabel, a Catarina Schwarz:

Data: 25 Jul 2014 17:36:41 +0100
Assunto: Desabafo e protesto


Aos meus amigos, e a outros muito poucos, que não o são, mas que tinham de ser colocados na lista,

Muitas vezes sentimo-nos injustiçados sem saber o que fazer... O sentimento de impotência destrói os pedacinhos de esperança que tínhamos de reserva...

O meu pai, o meu conselheiro, o meu amigo já cá não está... Mas deu-me, juntamente com a minha mãe, uma educação que muitas vezes aqui em Bissau é confundida com falta de educação... Sou mulher, tenho voz e voto na matéria, tenho dignidade e devo manifestar-me contra tudo o que para mim for entendido como injustiça... Paciência para quem não goste.

Estamos habituados a esconder as nossas intenções e opiniões para não nos sair o tiro pela culatra ou para ganharmos vantagem...

Não há muito que os outros possam fazer porque como sempre cá em Bissau, o MEDO (perder o trabalho, ser vítima de macumbas, levar uma tareia, ser posto de lado, etc.) é grande demais para se  pôr a boca no trombone.

Hoje, em jeito de protesto e de desabafo, partilho convosco algo aparentemente insignificante, que descobrimos...

Um abraço,

Catarina



3. Comentário de L.G.:


Li com esperança e alegria a promessa da ONG AD, pós-Pepito, de que nós todos vamos lutar para que o sonho de Pepito seja realizado... A resposta ao meu comentário na página do Facebook não vem assinada por nenhum dos atuais dirigentes da AD, mas é tomo-a como autênctica, válida e sincera.

Sei que até às próximas eleições o diretor executivo interino é o eng agr Tomané Camará, ex-tesoureiro, e que os restantes órgãos de gestão continuam em funções, Se não erro, a Isabel Miranda ("Beloca") é a presidente da direção (, aliás, já o era), sendo o Nelson Dias o presidente do Conselho Fiscal. A Isabel e o Nelson são cofundadores da AD. Conheci em 2008 estas três pessoas, o Tomané Camará, a Isabel Miranda e o Nelson Dias, apresentadas pelo Pepito, juntamente com o falecido Roberto Quessangue, como elementos do "núcleo duro" da AD, seus próximos colaboradores, vixinhos, camaradas de luta, visitas de casa e amigos do peito... Fiquei, de todos eles, uma impressão, mas não são pessoas das minhas relações, nem sequer tenho um contacto (email, telemóvel...) deles

Não posos, à partida, fazer qualquer juízo de intenções e pensar que estão a trair a memória do Pepito e a destruir o seu legado... Tenho por norma, por formação pessoal e deformação profissional (como sociólogo), ouvir e tentar compreender todas as partes envolvidas num conflito... E, de resto, só poderei ajudar os contendores se conseguir perceber: (i) o problema; (ii) o que está em jogo; (iii) o contexto; e (iv) os atores e as suas estratégias de poder... Também não tenho por hábito meter-me em conflitos intestinos. Mas estou disponível para ajudar, no que puder, na resolução pacífica de eventuais problemas que possam degenerar em conflito e que envolvam pessoas de quem gosto, como o são "os nossos amigos da AD . Bissau".

Dito isto, fico muito triste, magoado e indignado pelo tratamento a que foram votados os pertences do Pepito, encaixotados e remetidos para um canto... O Pepito é mais do que a AD, foi meu amigo pessoal, foi amigo de muitos de nós, foi (e continuará a ser) membro da nossa Tabanca Grande. A AD, por sua vez, é (e espero que continue a ser) parceira da nossa Tabanca Grande e vice-versa.

Pessoalmenmte gostaria de ouvir (ou de ler), da boca de um ou mais dos atuais dirigentes da AD, um comentário, uma explicação e eventualmente uma justificação sobre a forma, aparentemente menos digna, com que o legado e a memória do Pepito estão a ser tratados em Bissau, no edifício-sede da ONG AD, no bairro do Quelelé. Espero bem que o subtítulo que pus neste poste não corresponda, de todo. à verdade: rei morto, rei (de)posto...

Para os sues amigos de Portugal, e seguramente para os seus amigos da Guiné-Bissau, e de todo o mundo, Pepito ca mori... Será sempre bom lembrar que foi um privilégio conhecê-lo e sobretudo-lo como amigo e parceiro da nossa Tabanca Grande. Como todos os seres humanos, também tinha os seus defeitos... Mas vii nele uma qualidade que lhe dava uma grande nobreza, e que eu estimo particularmente, a gratidão... Pepito era, entre muitas outras qualidades humanas, um homem de gratidão... Saibamos imitá-lo e tentar igualá-lo. (LG)
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Nota do editor:

Último poste da série > 17 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12849: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (34): Homenagem nacional e internacional ao Pepito, organizada pelos seus amigos e colaboradores, um mês depois da sua morte: 3ª feira, 18 de março, em Bissau, no Quelelé, no seu "chão"... Seguramente que ele não quereria um "choro" à moda tradicional, mas sim uma festa onde os seus valores, os seus sonhos, os seus projetos e a sua equipa fossem celebrados como um legado vivo, fecundo e proativo... (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P13464: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte V: Junho de 1972: Tentativa frustrad de golpe de mão do Xitole, por parte do IN... Por sua vez, o gen Spínola preside á cermónia de encerramento do 2º turnmo de instrução de milícias...

1. Continuação da publicação da história da unidade - BART 3873 (Bambadinca, 1972/74). Cópia digitalizada gentilmente disponibilizada pelo António Duarte.

[António Duarte, ex-fur mil da CART 3493, companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972/74; foi voluntário para a CCAÇ 12 (em 1973/74); economista, bancário reformado, foto atual à esquerda].

Destaque, no mês de junho de 1972,  para:

(i) início da estação das chuvas; (ii) tentativa frustrada de um golpe de mão, em preparação, pelo PAIGC, ao aquartelamento do Xitole; (iii) conclusão da capinagem do troço Mansambo-Candamã; (iv) o Xime, pela sua posição estratégica no setor L1,  continuava a ser o principal alvo dos ataques e flagelações do PAIGC; (v) desserção de população balanta sob controlo do PAIGC: apresentação de 4 elementos pop em Mero, outros tantos em Enxalé (na margem esquerda do Rio Geba, frente ao Xime) e 5 em Nhabijões (um dos maiores reordenamentos do CTIG, com c. 300 moranças); (vi) Bambadinca era cada vez mais um importante centro de formação de milícias; (vii)  o gen Spínola presidia á cermónia de encerramento do 2º turno de instrução de milícias; (viii) "na guerra, construindo a paz"  era  o lema do BART 3873, batralão a que perteNceream diversos membros da nossa Tabanca Grande... LG


A nova força africana... O major Fabião, na altura (1971/73)  comandante do Comando Geral de Milícias, e o gen Spínola, passando revista a uma formatura de novos milícias (em Bambadinca ?... Não tenho a certeza...) (LG)

Foto reproduzida com a devida vénia,. Fonte: Afonso, A., e  Matos Gomes, C. - Guerra colonial: Angol,a Guiné, Moçambique. Lisboa: Diário de Notícias, s/d. , pp. 332 e 335. Autor da foto: desconhecido.
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Guiné 63/74 - P13463: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XIX: A guerra dos colchões em que também esteve envolvido o Carlos Simôes, ex-fur mil op esp



Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2533 (1969/71) >  O ex-1º cabo cripto Luís Nascimento, em Farim, à noite, na cama, lendo uma revista, possivelmente a Flama... Cada militar tinha direito a um colchão... de espuma, fbricado na metrópole, e que era "frio no inverno e quente no verão"... Alguém deve ter ganho, no tempo da guerra,  uma pipa de massa com estes colchões  "ecológicos antes da letra",,,

Foto : © Luís Nascimento (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legenagem: L.G.]


1. Histórias da CCAÇ 2533 > Parte XIX (Carlos Simões, ex.fur mil op esp, 1º pelotão):
Continuamos a publicar as "histórias da CCAÇ 2533", a partir do documento editado pelo ex-1º cabo quarteleiro, Joaquim Lessa, e impresso na Tipografia Lessa, na Maia (115 pp. + 30 pp, inumeradas, de fotografias). (*)

Desta vez, o Carlos Simões dá-nos a sua versão da guerra dos colchões em que ele, regressado de férias, esteve envolvido... Quem, de nós, não travou também  guerras destas ? No final da minha comissão, em março de 1971, recordo-me de me terem cobrado um colchão que faltava... Camarada de coração de manteiga, requisitei um colchão para um amigo de passagem por Bambadinca... O colchão deve ter levado sumiço... No final da guerra, tive que acertar as contas com o quarteleiro... LG

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segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13462: Efemérides (169): A primeira guerra total 1914-18, Revista do Expresso 12-07-2014: tiive o privilégio de ser um dos entrevistados, e de falar do meu tio avô, ten-cor Manuel Carmona Gonçalves, que esteve em África (Luís Gonçalves Vaz)

1. Mensagem do nosso grã-tabanqueiro Luís Vaz:
Data: 12 de Julho de 2014 às 16:05

Assunto: A primeira guerra total 1914-18 > Revista do Expresso 12-07-2014

Olá,  Luís:

Nesta Revista do Expresso (12/07/2014), e na página 54, inicia-se o artigo ´"África", da autoria do jornalista/escritor Ricardo Marques, onde fala sobre a "Frente menos conhecida", a de África, através dos relatos dos familiares de ex-combatentes. 

Eu tive o privilégio de ser um dos entrevistados, onde falei do meu tio avô (Tenente-coronel Manuel Carmona Gonçalves). A espada que empunho na fotografia era do Tio Manuel Carmona Gonçalves.

Boas leituras. Abraço

Luís Gonçalves Vaz
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P13461: Notas de leitura (619): Revista África - Literatura e Cultura - “Três provérbios em crioulo, uma aproximação à universalidade dos ditos” da autoria de Teresa Montenegro e Carlos Morais (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Janeiro de 2014:

Queridos amigos,
É inteiramente impossível estudar a cultura crioula, penetrar na sua filosofia, sem atender à riqueza dos seus provérbios.
O erudito e padre Marcelino Marques de Barros, o guineense que primeiro estudou o crioulo e repertoriou o seu dicionário elementar, recorreu frequentemente aos provérbios. Na sua tese de doutoramento na Sorbonne, Benjamim Pinto Bull também se apoiou na riqueza dos provérbios. E os estudiosos portugueses, como o divulgador Manuel Belchior, também se sentiu atraído por esta memória das experiências que confluem para a tradição oral e que são o espelho da experiência, dos valores e dos princípios de um poderoso compromisso cultural das etnias que deixam fundir a sua história e transmiti-la na língua veicular, o crioulo.

Um abraço do
Mário


A riqueza dos provérbios guineenses

Beja Santos

A saudosa revista “África”, um acontecimento cultural de grande significado entre os anos 1970 e 1978, dirigida pelo escritor Manuel Ferreira, publicou com regularidade alguns materiais da cultura guineense. No seu número 11, de janeiro a junho de 1978, apareceu um artigo intitulado “Três provérbios em crioulo, uma aproximação à universalidade dos ditos” da autoria de Teresa Montenegro e Carlos Morais, que vale a pena aqui enunciar.

Em primeiro lugar, os autores debruçam-se sobre a sapiência da cultura crioula a partir da tradição oral. É do conhecimento geral que a tradição oral é uma das pedras angulares de qualquer cultura africana. Os autores referem o facto de em 1941, Amadeu Uadé, um letrado de Dogam, no Senegal, ditou em wolof uma crónica do reino do Oualo com uma lista de 52 soberanos que permitia uma reconstituição até às origens dos wolofos, no princípio do século XIII, versão esta que permitiu o seu confronto com os relatos da viagem de Cadamosto, no século XV.

Passando aos três provérbios, temos que no primeiro a mensagem é a seguinte: “Por muito velho que sejas, não assististe à juventude da tua mãe”. O que obriga também a uma explicação. Uma pessoa pode ser mais velha do que o “pai” – recorde-se que é costume designar-se por “pai” o marido da mãe, que pode ser mais novo que os filhos desta – mas não pode ser mais velho do que o seu irmão mais velho. Uma pessoa velha presenciou muita coisa, os muitos mais anos dão hipóteses de assistir a muitos acontecimentos. Mas há coisas que são manifestamente impossíveis, é o caso de alguém ter assistido a acontecimentos que precederam a sua própria existência – a juventude da sua própria mãe, a “bajudeza” de quem nos dá a vida. Procurando interpretar o provérbio, observam os autores: não tens experiência que chegue para afirmares o que afirmas ou para provar o que dizes; eu, que te conheço, sei que isso para ti é tão impossível como teres assistido à “bajudeza” da tua mãe. É frequente usar-se este provérbio quando se trata de sobrelevar a nossa experiência em qualquer campo, tem a vertente moralizante de pôr termo à prosápia de quem procura dar-se ares de eficiente e sabedor.

Reza o segundo provérbio: “Os gafanhotos a arder dão pontapés uns aos outros”, o que tem subjacente um dado elementar, que os autores comentam. Quando se queimam gafanhotos (dentro ou fora da panela) ressalta o movimento das suas patas. É como se estivessem continuamente a dar pontapés uns aos outros até morrerem. Os gafanhotos andam sempre juntos e pega-se-lhes fogo para proteger as culturas dos estragos provocados pelas pragas. Ardem do mesmo modo quando se faz uma queimada num sítio onde haja gafanhotos. Temos agora a aplicação do provérbio à sabedoria guineense.

Indissociável de grande parte das coisas que comemos, a panela é um dos nossos lugares mais comuns. O mundo é igualmente o lugar onde todos temos que comer. E quando acontece o caldeirão aquecer e nós estamos lá dentro, a situação afeta-nos a todos por igual. Reagir como os gafanhotos, agredindo-nos mutuamente, não será a forma mais indicada de melhorar a situação: não é dando pontapés uns aos outros que conseguimos apagar o fogo ou sair da panela. O provérbio ilustra uma situação condenável, se bem que corrente, que consiste em reagirmos a uma violência de qualquer tipo de que somos vítimas com agressividades laterais e desviadas da sua verdadeira origem. Moral da história: quando partilhamos a mesma má sorte o melhor é encontrarmos juntos a melhor saída.

E passamos para o terceiro provérbio: “A galinha ao colo não se apercebe da distância nem das agruras do caminho”. Recorde-se que as galinhas são uma riqueza, uma moeda. Nos Bijagós o preço de uma vaca era há pouco tempo 100 galinhas e o de uma cabra apenas 10. Na viagem, as galinhas são transportadas dentro de uma gaiola feita de tara. Se as gaiolas foram mais do que uma, podem ir atadas nos extremos de um pau, e este carregado ao ombro. Em qualquer dos casos, a galinha percorre o caminho sempre pendurada. É este o contexto para se perceber a moralidade implícita. Quem não percorre o caminho pelos seus próprios pés, como é o caso das galinhas, não se cansa porque não despende esforço nenhum, e não tem ideia das canseiras que uma longa viagem representa. É como as pessoas quando fruem benefícios de certas situações para as quais não tiveram que contribuir, limitaram-se a receber e não têm ideia dos custos. Estão a leste das dificuldades e nunca sabem o trabalho que cada coisa pode exigir porque a eles não lhes custa nada.

Os autores debruçam-se sobre o crioulo guineense encarando-o como produto da interação secular de diferentes grupos culturais, a língua espelha a diversidade da origem dos sinais e a sua originalidade, é, pois, o espaço síntese de comunidades culturais que não deixaram de existir e faz com que nem tudo o que se exprime em português, Mandinga, Fula, Manjaco, Balanta, etc. encontre a sua formulação correspondente em crioulo. A língua crioula acolhe e fixa o que há de mais fértil nesse encontro.

Se quisermos partir de referentes culturais portugueses, não será arriscado supor que um provérbio transmontano do estilo “em tempo nevado um alho vale um cavalo” não tivesse grandes hipóteses de se fixar em crioulo formulado em termos idênticos. O proverbio crioulo é isso mesmo: instrumento de comunicação dos diversos grupos culturais que têm este aspeto surpreendente de que um proverbio longínquo que na aparência nos é alheio – e o é de facto, na forma – é objeto de reconhecimento profundo, porque o tema somos nós, sabemos que é de nós próprios que também se pode estar a falar.

Usamos duas xilogravuras do artista guineense Uri Sissé, de rara beleza.


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Nota do editor

Último poste da série de 1 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13453: Notas de leitura (618): “Guiné-Bissau - Páginas de História Política, Rumos da Democracia", por F. Delfim da Silva (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P13460: Parabéns a você (766): José Nunes, ex-1.º Cabo Mec Electricista do BENG 447 (Guiné, 1968/70) e Rui Alexandrino Ferreira, TCor Reformado (Guiné, 1965/67 e 1970/72)


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Nota do editor

Último poste da série de 31 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13450: Parabéns a você (765): Manuel Augusto Reis, ex-Alf Mil Cav da CCAV 8350 (Guiné, 1972/74)

domingo, 3 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13459: Manuscrito(s) (Luís Graça) (38): Que viva la (mo)vida... e o choco frito do Bar da Peralta!

Gracias à la (mo)vida

Por Luís Graça


La vida és la movida.
É sagres.
É boémia.
É choco frito.
Tudo o que a gente gosta.
Uma esplanada à beira-mar.
O sol.
A maresia.
A boa vida.
A sorna.
O fado.
A morna.
O dolce far niente.
Com a gente de quem se gosta.
Mais a Nossa Senhora dos Milagres
que te acode, quando aflito.
enquanto a maré sobe,
e a noite espreita
e a morte não pré-avisa.
Olha a moreia da costa,
que é a melhor do mundo!

A vida é pregão,
a vida é merda,
a vida é sagres, é boémia,
a vida é hipoglissémia,
a vida é adrenalina,
a vida é prego a fundo,
a vida é stresse.

Sexta-feira à tarde, ao fim da tarde,
uma hora antes do pôr do sol,

no primeiro dia do nosso querido mês de agosto.
A vida é festa.
La fiesta, amigo.
Vengo de la altiva Castilla!

No TGVê espanhol que não paga imposto
único
de circulação.
Que o futuro não paga imposto,
nuestro hermano.
Pressupuesto, amigo.
Que viva la siesta!
Que viva la (mo)vida!


Mas agora que chegou a crise,

para ficar,
como é que tu chegas à ponta mais
acidental
da Europa ?
Para comer o teu choco frito,
no bar da Peralta,
a las cinco de la tarde.
Com navios negreiros,
fantasmagóricos,
na linha do horizonte,
a quinze milhas.
Com os jacobinos do Junot
na película da memória,
o Vimeiro aqui tão perto.
Com autos de fé,
mouros, judeus, corsários,
no teu ADN de português
sem história,
maçarico, maltrapilho, errante.
No mar onde naufragam
todas as boas consciências
e se afinam as ciências,
as ditas duras e as mais moles.

Com as Berlengas a afundarem-se
na plataforma continental.
E com elas o teu querido Portugal...

Um homem sorri com meia-cara,
o sorriso amarelo do cinismo.
Aqui, no cabo da terra,
onde se proclama a ditadura do sucesso,
e do novo riquismo.
Com o isco
da vã glória de ganhar
a medalha olímpica,
o minuto de fama,

o título de caixa alta,
a vida eterna,
o Nobel,
um lugar no paraíso ou na cama
da dama do regime,
ou o lugar de comissário
dos bons costumes e salamaleques.
Em última análise,

o Olimpo,
condomínio fechado dos deuses,
que dos perdedores não reza a História.

A vida é la movida no Peralta Bar,
que não vem na lista do Espesso
da Cama, Mesa & Roupa Lavada.
Haja lugar à mesa, comprida,
e valha-nos Baco, velho compincha.
Viva o Portugal do petisco!
Viva o nosso querido mês de Agosto!


 Quem disse que a vida é bela,
e que as mães é que dão cabo dela ?
Desliga o botão da televisão,
puxa o reposteiro da janela
donde vês o mundo a cor de rosa,
arruma o cavalete
e as tintas desbotadas do arco-íris,
e pede uma posta de moreia frita
e um copo de tinto.
É a hora da doce melancolia
e do leve sentimento de culpa
e da idiota reflexão sobre a idiossincrasia
de se ser velho, europeu e português,
na ponta da navalha
da economia,
da política,
da demografia,
da geografia
e da puta da sociologia que te calhou na rifa.

Não escolheste nascer,
não escolheste pai e mãe.
não escolheste o pedaço de chão onde foste parido.
Nem a língua com que expressas a angústia essencial
de ser livre, afinal.
E não sabes  o que fazere com este poema,
que não vale um algoritmo
nem um simples teorema,
e que não conta para a contabilidade nacional.
E que não é de protesto
nem é manifesto,
muito menos panfleto promocional 
do Bar da Peralta!
Entre a ciência da morte
e a crença da ressurreição,
haverá sempre uma santa
que te valha.
Ou uma azinheira ou uma carvalha
onde possas pôr uma vela a uma santa aparecida
que te salve da má consciência
de la (mo)vida.

Lourinhã, Montoito, Praia da Peralta, 1/8/2014




Lourinhã > ; Montoito > Praia da Peralta >  2014 > O choco frito do meu amigo Vitor, do Peralta Bar...Acompanhe-se com broa de milho e Boémia...Aproveitem enquanto houver aéreos no nosso bolso... e moedas em Bruxelas.




Lourinhã, Montoito/Atalaia, Praia da Peralta, Peralta Bar > 2014 > Cardápio e precário, mais contactos... Tomem boa nota, que eu gosto de partilhar as coisas boas que ainda há na nossa terra...
 É um dos meus recantos favoritos na costa portuguesa... Felizmente que os gajos do Espesso, da Cama, Mesa & Roupa Lavada,  ainda não o descobriram... (Ou já descobriram ?)

Fotos: ©   Luís Graça  (2014). Todos os direitos reservados.-

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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P13458: Blogues da nossa blogosfera (67): Jovens da Aldeia de Molianos na Guerra da Guiné, no Blogue Molianos, viajando no tempo (António Eduardo Ferreira)

1. Transcrição de uma publicação do Blogue Molianos, viajando no tempo, do nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga e Bissau, 1972/74), dedicada aos seus conterrâneos que prestaram serviço no TO da Guiné:


JOVENS DA ALDEIA DE MOLIANOS NA GUERRA DA GUINÉ

Durante os últimos 13 anos de domínio colonial português, cerca de 40 jovens naturais da aldeia de Molianos foram mobilizados para a guerra que se desenrolava nas colónias portuguesas, Angola, Guiné e Moçambique. Três, com um pouco mais de “sorte” foram mobilizados para Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor.

Este trabalho  procura dar a conhecer, ainda que resumidamente, o que foi a passagem pela Guiné dos 14 jovens de então, que, naquela que poderia ter sido a melhor fase da sua vida, tiveram de deixar tudo e partir para um local onde a única certeza era a de ir para um cenário de guerra.
Todos caminhámos por aquelas picadas de terra vermelha, muitos rios, bolanhas, matas que nos tempos de hoje certamente são lindas de ver, mas naquele tempo, para quem tinha de as percorrer debaixo de um sol tórrido ou de chuvas torrenciais, correndo o risco de pisar uma mina, ser atravessado por uma bala, ou crivado de estilhaços, as coisas eram bem diferentes.

mira


gustavo

O José Gustavo da Silva assentou praça em julho de 1963, foi o primeiro  militar da nossa aldeia a ser mobilizado para a Guiné, foi com o posto de soldado e especialidade de armas pesadas.
Na foto podemos ver a sua companheira inseparável nos momentos de maior incerteza, a bazuca.
Embarcou no navio Quanza no dia 8 de janeiro de 1964.
Pertenceu à CCAÇ 618, que esteve em S. Domingos, Varela e Binar. Tiveram seis baixas na companhia, duas por acidente, afogamento no rio… e quatro em combate.
Regressou à metrópole no navio Uíge a 2 de fevereiro de 1966.

geirinhas

Manuel da Silva Ferreira, foi mobilizado com o posto de soldado e especialidade de corneteiro, pertenceu à CCAÇ 1426, que esteve em Geba, Camacudo, Banjara e Catacunda.
Embarcou com destino à Guiné em 18 de agosto de 1965 chegando seis dias depois a Bissau.
Na foto está junto a uns bidons, que depois de vazios de combustível, não raramente, eram cheios de terra e utilizados em abrigos para proteção de fogo inimigo.
No regresso à metrópole embarcou a 3 de maio de 1967.
Chegou no dia 9 a Lisboa.(*)


silva


José da Silva assentou praça a 25 de outubro de 1975.
Embarcou para a Guiné a 20 de abril de 1966, com o posto de soldado. Pertenceu à CCAÇ 1549, que esteve em Tite, Fulacunda e Quinhamel.
Na foto vêm-se alguns troncos que podem ser apenas árvores derrubadas, ou, a cobertura de  algum abrigo subterrâneo.
Embarcou de regresso à metrópole a 26 de dezembro de 1977.(*)



Peralta

Alberto Pedro Ferreira Peralta, 1.º cabo com a especialidade de atirador, embarcou para a Guiné no navio Uíge a 14 de julho de 1967.
Pertenceu à CCAV 1749, que esteve em Mansoa e Mansabá. Durante alguns meses desempenhou as funções de cabo de rancho.
O acontecimento que mais o marcou durante a comissão, foi quando sofreram uma emboscada em que as nossas tropas sofreram duas baixas. A companhia teve oito baixas todas em combate.
Regressou à metrópole no navio Niassa a 13 de junho de 1969.



Atalivio


Atalívio Alexandre Ferreira,  1.º cabo, foi mobilizado com a especialidade de cozinheiro, da nossa aldeia para aquela província foi o único, embarcou para a Guiné em Lisboa no dia 28 de Outubro de 1967 no navio Uíge. Chegou a Bissau a 2 de novembro.
Integrou a companhia 1787 que esteve em Empada.
No regresso à metrópole, embarcou a 23 de agosto de 1969.
Desembarcou em Lisboa a 28 do mesmo mês.



carreira
José Fernando Carreira Coelho assentou praça no mês de novembro de 1967, soldado com a especialidade de condutor auto, embarcou para a Guiné no navio Uíge no dia 11 de agosto de 1968.
Pertenceu à CART 2410, “Os Dráculas” que esteve em Bissau, Cacheu, Bachil, Gadamael Porto, Ganturé e Guileje. Tiveram três baixas na companhia, uma das muitas ocorrências que apesar do tempo que passou  não mais esqueceu, foi a mina que os picadores levantaram na picada à frente da viatura que conduzia.
Regressou à metrópole no navio Ana Mafalda a 18 de abril de 1970.
Viajem atribulada na maior parte do trajeto, só porque era o regresso a casa  a amenizou um pouco, mas ainda recorda o desconforto por que passaram.


escriturario

António Reis Pavoeiro assentou praça em julho de 1969.
Foi mobilizado em rendição individual para a Guiné com o posto de 1.º Cabo e especialidade de escriturário, viajou no navio Alfredo da Silva, um dos vários que fazia transporte de pessoal e mercadorias entre a metrópole e aquela província.
Passou toda a comissão em Bolama, local, em que durante o tempo que lá esteve foi flagelado apenas duas vezes, à distância, com foguetões, sem consequências.
Regressou à metrópole em avião no dia 3 de agosto de 1972.




faust
José Fernando Pimenta Faustino, assentou praça em agosto, soldado condutor auto embarcou para a Guiné em 12 de março de 1971 no navio Uíge. Foi em rendição individual.
Esteve seis meses em Teixeira Pinto, CAOP 1, o resto da comissão foi passado em Bissau. Veio uma vez de férias à metrópole.
Regressou por via aérea a 8 de fevereiro de 1973.
Ainda tem em seu poder os recibos do ordenado que recebia, 1.157 escudos, dos quais, 150 correspondiam ao chamado prémio de viatura.





Francisco Pereira Louro, embarcou para a província da Guiné em 12 de março de 1971, foi em rendição individual, esteve no Pelundo

Única informação disponível. (*)

Berna

José dos Reis Pavoeiro foi mobilizado para a Guiné com a especialidade de corneteiro, para onde embarcou a 16 de setembro de 1971.
Esteve em Teixeira Pinto.
Foi juntar-se ao irmão, António, que já lá se encontrava há cerca de 13 meses.
Durante o tempo que durou a guerra colonial nas várias frentes, da nossa aldeia foram os únicos irmãos a estarem ao mesmo tempo e na mesma província, um em Teixeira Pinto e o outro em Bolama, mas poucas vezes se encontraram.




António Ferreira da Silva Inácio, pertenceu à polícia militar, o único da nossa aldeia que passou todo o tempo de comissão em Bissau.

canalha

Foto tirada na esplanada do café Bento, local de encontro não só para quem prestava serviço na cidade, mas  também para  muitos que pelas mais variadas razões passavam por Bissau. Os três que estão trajados à civil não eram da nossa aldeia, com o posto de primeiro sargento enfermeiro prestavam serviço no hospital militar de Bissau. O que está com o copo na mão era nosso vizinho, de Alcobaça, primeiro Canha. Dos que estávamos com farda militar, o do centro era eu Jerónimo a primeira vez que vim de férias, o que está sinalizado com a seta era o Inácio, e o último da direita era o Faustino. Era cerca de meia noite quando a foto foi tirada, estávamos todos muito animados…


mamadu António Eduardo Jerónimo Ferreira assentou praça no dia 25 de janeiro de 1971.
1.º Cabo condutor auto viajou em avião rumo à Guiné na madrugada do dia 24 de janeiro de 1972, com escala em Cabo Verde. Chegou ao fim do dia ao destino.
Esteve cerca de um mês em Bissau antes de chegar à companhia, a CART 3493, depois de treze meses em Mansambo, breve passagem por Fá Mandinga, Cobumba Ver aqui  e Bissau.
Veio de férias à metrópole duas vezes.
A companhia teve três baixas, duas vítimas de explosão de uma mina que rebentou na arrecadação para onde tinha sido levada depois de detetada e levantada na picada (eu estava de serviço de condutor nesse dia …) e uma por acidente com uma viatura já em Bissau, vários feridos graves todos em consequência do rebentamento de engenhos explosivos.
A companhia durante a comissão teve cinco viaturas destruídas por minas anticarro, das quais quatro em Cobumba.
Regressou à metrópole por via aérea no dia 2 de abril de 1974.


cafalo José Bértolo Coelho assentou praça no mês de maio de 1973. 1.º Cabo, apontador de bazuca, viajou para a Guiné em avião no dia 23 de Setembro do mesmo ano.
Pertenceu à CCAÇ 4544/73, que esteve no Cumeré e Cafal Balanta.
Foram muitos os momentos difíceis por que passou, mas aquele que recorda como tendo sido o pior, aconteceu no dia 30 de novembro de 1973, o primeiro ataque ao arame que durou cerca de duas horas, ainda na companhia dos “velhinhos”.
A CCAÇ 4544/73 teve cerca de seis dezenas de feridos, alguns graves, todos em consequência do rebentamento de minas, desses, vários já depois da revolução de abril.
Regressou à metrópole de avião no dia 8 de setembro de 1974.



vila
Carlos Alberto Ferreira Pavoeiro, dos que passámos pela Guiné, foi o único da nossa aldeia que não prestou serviço no exército, assentou praça no quartel da marinha em Vila Franca de Xira, foi mobilizado para a Guiné com o posto de grumete eletricista, passou todo o tempo de comissão integrado na guarnição do NRP Sagitário, onde era conhecido por o Lisboa, nome da cidade para onde ainda criança foi viver com os pais.
Esteve na Guiné nos anos de 1968 a 1969.

Nota: (*) já falecidos.

Este trabalho foi elaborado, graças à colaboração prestada pelos ex-militares da nossa aldeia que passaram pela então província portuguesa da Guiné a quem agradeço.
Um obrigado muito especial aos familiares dos que já não estão connosco, pois só assim foi possível que informação referente a todo o grupo ficasse para memória futura.
Foram anos muito difíceis, não só para os que tivemos de ir para a guerra, mas também para familiares, vizinhos e amigos. Os anos iam passando e, mesmo aqueles que eram ainda crianças quando a guerra começou, quase todos lá foram parar.
Apesar das dificuldades por que passámos, tendo em conta os perigos que nos acompanhavam a cada momento, podemos dizer que tivemos alguma “sorte,” regressámos todos.
Mas, a pátria (naquele tempo) não estava preparada para receber aqueles que tinham sido forçados a ir para a guerra. Quando regressaram queriam trabalhar e estar juntos dos seus, mas metade dos que vieram, passado pouco tempo, tiveram que emigrar à procura de uma vida diferente, que lhe permitisse encarar o futuro para si e para os seus, com mais esperança.

António Eduardo Jerónimo Ferreira
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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Abril de 2014 > Guiné 63/74 - P13035: Blogues da nossa blogosfera (66): Coisas da Vida - A Vida como ela é - A Bochecha de Boi (Jorge Teixeira - Portojo)