Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 24 de janeiro de 2019
Guiné 61/74 - P19432: Pelotões Independentes em Gadamael: A Memória (Manuel Vaz, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 798) (4): 3 - Os Pelotões de Artilharia que estiveram em Gadamael (Continuação)
1. Continuação da publicação do trabalho sobre os Pelotões Independentes que estacionaram em Gadamael, da autoria do nosso camarada Manuel Vaz (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 798, Gadamael Porto, 1965/67).
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Nota do editor
Poste anterior de 10 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19388: Pelotões Independentes em Gadamael: A Memória (Manuel Vaz, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 798) (3): 3 - Os Pelotões de Artilharia que estiveram em Gadamael
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quarta-feira, 23 de janeiro de 2019
Guiné 61/74 - P19431. A Galeria dos meus Heróis (20): - A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (III e última Parte ) (Luís Graça)
Luís Graça, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, Guiné, Contuboel, junho de 1969
A Galeria dos Meus Heróis: A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento - III (e última) Parte
por Luís Graça
Continuação (*)
11. (...)Eis, em resumo, alguns excertos da longa conversa que eu tive, mais recentemente, com a Nucha, permitindo completar o “puzzle” do retrato do seu ex-companheiro e da narrativa sobre a relação de ambos, que terminou num já longínquo mês de junho de 2016:
− De qualquer modo, houve uma punição legal e uma reparação material…
− Ele teve uma pena suspensa, caricata, e foi obrigado a indemnizar-me por danos físicos e morais…
− De mal o menos…− Se eu fosse uma verdadeira lutadora, ter-me-ia esforçado por provar que vivíamos juntos a maior parte do ano, em união de facto… Por uma questão de orgulho, não o fiz… Claudiquei!... Nunca me tinha visto num tribunal, com montes de gajos a despirem-me, mentalmente, de alto a baixo!
− Ias pôr em causa o teu autoconceito de mulher livre e independente ?!
− Posso estar a ser burra, mas assim foi-me mais fácil varrê-lo completamente da minha vida e das minhas memórias…
− Não reconheço esta Nucha…
− Sou uma mulher do Minho… de pêlo na venta e nas pernas!... Nisso sou uma cópia da minha mãezinha, que era capaz ser má como as cobras, quando lhe pisavam os caules!
− Que disparate!
− Portanto, tecnicamente não houve violência… doméstica! Não éramos um casal, o juiz deve pensado que eu era um cabra, julgou o caso como uma simples agressão corporal…
−… na cama!
− Foi tudo muito sórdido!... Ele [o Vaz C…] tinha massa, arranjou um advogado, conhecido aqui na praça, que lhe deve ter levado umas massas valentes, mas limpou-lhe a barra, que era pesada…
− E inverteram-se os papéis, não ?!
− Sim, às tantas, eu é que era a má da fita, a fria e astuta Eva que ludibriou o pobre e indefeso Adão!... Tive de reconstituir não sei quantas vezes a cena dessa maldita noite!...
− Vais ter que me contar, desta vez, essa cena com todos os pormenores escabrosos… Os amigos têm direito à verdade…
− Poupa-me, por favor!
− Como é que eu posso defender-te quando as pessoas vêm insinuar que fizeste uma cena de teatro só para provocar o teu ex ?
− Foi o que o advogado dele procurou demonstrar perante o juiz, passando da defesa ao ataque… A minha advogada era uma jovem, minha conhecida, que estava mais atrapalhada do que eu!...
− Sei as coisas muito por alto, da primeira vez que falámos ao telemóvel, ainda estavas muito transtornada...
- Sabes, ele era um tipo misterioso… Deixa-me falar dele como sendo um fantasma do passado!... Pensava que o conhecia minimamente, que estupidez a minha!...Vivi com um animal estranho, durante oito anos, se não foram oito, anda por lá perto, com muitos intervalos pelo meio entra a casa da Foz e a rua da Alegria…
− Ele falou-me em tiros de G3, deu a entender que andou na guerra colonial… Não quis aprofundar o assunto, seria indelicado da minha parte...
− Sim, ele esteve na Guiné, entre 1963 e 1965, se não erro… Não sou boa em datas. Regressou com 25 anos e só depois é que acabou o curso de engenharia, faltava-lhe um ano ou coisa assim… Deve ter apanhado a crise estudantil de 62… Não te sei dizer.
− Nasceu portanto em 1940 ou por aí…
− Sim, ele era mais velho do que eu uma boa dúzia de anos… Eu sou de 1952.
− Falava-te da guerra ?
− Pouco ou muito raramente... Sim, quando fomos à Guiné, ou melhor, à ilha de Orango, no arquipélago dos Bijagós… Fomos de avioneta, diretamente de Dacar para Orango… Em rigor, não estivemos na parte continental da Guiné-Bissau. Nesses dias, que adorei, vi os estranhos hipopótamos que vivem tanto em água doce como salgada, e que vão desaparecer com a subida do nível do mar, daqui a algumas décadas… Sim, nesses dias, ele falou-me por alto de algumas recordações do tempo da Guiné… Tinha estado em Bubaque, em 1964, numas curtas férias…
− Mas nunca te falou em episódios de guerra ?!... De um prisioneiro que terá tentado fugir e que foi abatido à queima-roupa...
− Não... Acredito que não deve ter sido fácil para ele. Mas eu também não queria saber nada sobre esse passado obscuro. E muito menos da merda da guerra!... Às vezes apanhava-o a falar...sozinho!
− Deve ter tido também um divórcio litigioso… E deve ter havido, aí, no passado dele, mais episódios de violência doméstica, não ?!
− É bem possível, mas era assunto tabu entre nós. Nunca falámos da ex-mulher dele.
− O passado de cada um de nós é sempre uma caixinha de Pandora.
− E eu que o diga, meu amigo!
− Percebi que também perdeu os pais, ainda relativamente cedo…
− Sim, num estúpido acidente automóvel, nas vésperas de Natal quando iam para Viana do Castelo. Há uns trinta e tal anos. Ele é que ia a conduzir. Os velhotes iam atrás. Ficaram esmagados pelo embate de um camião TIR, que ficou sem travões…
− Não o amavas assim tanto…
− Vamos lá a ver: habituámo-nos à companhia um do outro. Tínhamos, de facto, algumas coisas em comum. Por exemplo, éramos cinéfilos, adorávamos o cinema italiano do pós-guerra... Ele era um gajo culto, para os padrões burgueses do Porto… Gostava de ir ao teatro, gostava de ouvir um bom concerto sinfónico, etc. Mas, amor, amor… É uma palavra demasiado forte que eu não gosto de pronunciar em vão… Andei toda a vida à procura do grande amor da minha vida, como quem joga no Euromilhões… Desisti, comecei a jogar à raspadinha, ou seja, ao Centimomilhões!
− Somos utópicos…
− Somos mas é estúpidos, pelo menos nós, as mulheres, somos mais estúpidas do que vocês…
− Não digas isso, estás ainda magoada ao fim deste tempo todo.
− O meu sexto sentido, a minha inteligência emocional, falhou desta vez… Aliás, tem falhado mais vezes. Afinal, nunca acertei com os gajos que passaram pela minha vida, ou pela minha cama, que são coisas que deveriam ser diferentes!
− Não, quando se tem vinte anos!...
− Sim, nessa altura o sexo era tudo… E ainda não havia, felizmente, a Sida!.... Mas já tínhamos a pílula, ao menos… Nós, as mulheres!... E vocês, homens, esfregaram as mãos de contentes... Lembras-te ? Dizíamos que era o "amor livre"!...
− Mas, afinal, ainda o odeias, ao último ex ?
− Se queres que te seja franca, tenho-lhe um pó danado, só consigo fazer o luto de uma relação, através do ódio… Ainda não deixei de o odiar... E não quero encontrá-lo, o que é difícil para quem vive numa cidade como o Porto: evito, por exemplo, ir à Foz, e aos locais que frequentávamos... Felizmente que ele não vai ao Parque da Cidade nem faz parte da nossa tertúlia (**)... Vivi um ano quase enclausurada como uma monja...
− O amor e o ódio são as duas faces da mesma moeda… Mas como é que se risca uma pessoa da nossa vida ?... Foram oito anos de vida juntos… Vocês partilhavam algumas coisas boas da vida: as exposições de arte, as galerias, o teatro, o cinema, a música, a boa comida, as viagens…
− Até o nosso álbum de fotografias destrui, num acesso de raiva, as férias “maravilhosas” que ele me proporcionou na ilha do Príncipe ou na ilha de Orango… Rasguei todas as fotos em que aparecíamos juntos. É assim que faço o luto de uma relação quando as coisas acabam mal por culpa dos gajos…
− Parece-me que o teu ódio também é contra a injustiça da justiça, não ?!
A Nucha fez questão de me acompanhar ao comboio, apanhámos o metro até Campanhã. Pelo caminho foi-me então contando, mais descontraída, o que se passara nessa noite de junho de 2016…
− A brincar, a brincar, já lá vão dois anos…
Vim no comboio, de regresso a Lisboa, a tentar reconstituir, por escrito, o longo monólogo que a Nuncha teve na cama com ele, o Vaz C…, e que terá sido o “móbil do crime”… Ou pelo menos a gota de água que fez transbordar o copo de uma relação já há muito desgastada pela usura do tempo e da rotina…
"Em boa verdade, já nos tínhamos encontrado antes, uma vez, em Barcelona, há uns poucos anos atrás, recordava-me do seu nome... Era o último da lista, o Zacarias, mas nem ele reparou em mim nem eu nele. Também era mais novo e desconhecido. Desta vez, em Lisboa, ele era a estrela da companhia. Intelectualmente brilhante, fisicamente atraente. O encontro foi de dois dias, 5ª e 6ª. No primeiro dia, à noite, houve o tradicional jantar de gala, oferecido pela organização. O sítio não podia ser mais romântico e inspirador, no terraço coberto de um hotel de charme, um antigo palacete do séc XVIII, revestido a fabulosos azulejos da época, e que milagrosamente sobreviveu ao terramoto... Com vista para a Baixa e o estuário do Tejo, estás a ver ?!... A noite estava perfeita, com uma temperatura já de verão, e Lisboa estava em festa com a proximidade dos santos populares.
"Comeu-se bem e bebeu-se melhor, sabes como são os estrangeiros quando vêm cá, a Lisboa ou ao Porto, em negócios ou trabalho, gostam de juntar o útil ao agradável, o dever e o prazer. São muito trabalhólicos mas à noite tiram a gravata e o casaco, o mesmo é dizer, a máscara. O ambiente era descontraído, e desinibido, e havia uma tremenda carga de energia positiva no ar.
"Os trabalhos, no dia seguinte, só recomeçavam às 10h00, por alteração de última hora do programa. Esperava-se a presença do ministro. Ainda fomos ao Bairro Alto, mais para ver o ambiente e andar um pouco a pé. Depois regressámos ao hotel, que não era longe, estávamos alojados no mesmo sítio, e por coincidência no mesmo piso. Como estava sem sono e, em boa verdade, sentia-me 'very, very free, cool, happy', uma sensação que há muito não experimentava.
"Apesar da nossa diferença de idades, para aí vinte, o Mastroianni quis ser gentil comigo, ficou mais tempo na conversa, bebemos o último copo 'para a sossega' (, fez ele questão de mo oferecer!), acabámos por subir juntos, no elevador, despedimo-nos com um beijo e eu aí..., tive uma sensação estranha, um impulso, agarrei, qual leoa, com as duas mãos, aquela cabeça de Apolo e,zás!, ..."
− Foi nesse preciso momento que o gajo, que estava a um canto da cama, a fingir que me ouvia, saltou como o tigre da Malásia, ferrou-me o pescoço com os dentes, tapou-me a boca com uma mão, puxou-me os cabelos com a outra, e deu um urro que ecoou pela casa toda: "Cala-te, sua...!"... E tentou estrangular-me, quase até à asfixia total. Tive uma fração de segundo de lucidez para perceber o que estava a acontecer e que ele me ia matar... Foi aí que consegui, num derradeiro esforço hercúleo, libertar a minha perna esquerda e dar-lhe uma joelhada fortíssima no baixo ventre. Deu um urro de morte: "Sua....caaaaa... braaaaa!!!!"... E, "in extremis", largou-me, desistiu, bloqueou, caiu exausto na cama, teve um ataque de choro, histérico ... O resto já sabes...
− Sim, conseguiste chamar o 112...
− Saltei da cama, cheia de dores, num estado miserável, desgrenhada, a roupa rasgada, pedi socorro ao 112... Não ofereceu resistência quando chegou a polícia... Só o voltei a ver no tribunal. Há um ano e picos. O processo correu célebre.
− E tu é que foste... a cabra!!!
− O gajo ficou completamente desvairado com a cena que eu estava a contar, em voz alta, mais para mim do que para ele... Na sua imaginação pornográfica viu-me agarrada ao grego, a rebolar na cama!... O gajo tratou-me como uma puta, privativa, a quem pagava, de vez em quando uns jantares em restaurantes de luxo, só para eu ser dele!
− E não aconteceu rigorosamente "mais nada" com o teu grego ?!...
− Não vou dizer que não estava excitada... Se calhar até era capaz de ir para cama com ele, mas fiquei por ali, peguei-lhe na cabeça com as duas mãos, como uma mãe faria a um filho, dei-lhe um longo beijo de boas noites ... e de despedia!... No dia seguinte, trocámos olhares cúmplices, acabou a conferência, ele apanhou o avião para Atenas e eu o comboio para o Porto... Nem sequer sei onde mora!...
De confidência em confidência, a Nucha ainda me disse:
− No fundo, fiquei com uma pena danada de não dormir com ele nessa noite, irrepetível! Ainda hoje não sei porque é que não o fiz... Muito provavelmente porque ele não me deu "luz verde"... Sou muito intuitiva nestas coisas, dou muito importância ao comportamento não verbal dos meus parceiros... Senti atração por ele, não senti atração dele por mim...
− O teu Apolo não estava nos dias dele... Os deuses são caprichosos... tão ou mais que os humanos...
− Claro que eu fui completamente idiota ao contar esta história ao meu ex... Se calhar até fui cruel, sem intenção de o ser... Ou, se calhar, inconscientemente, quis provocá-lo, testar os seus limites de racionalidade... Dir-me-ás, também tu, que, antes de seres meu amigo, és macho, que as mulheres não podem brincar com o fogo...
− Foi por isso que os homens, com medo, vo-lo roubaram!... É um dos mitos mais antigos da humanidade!
− Estás a ver ?!...Uma muher não pode ter desejos, não pode ser proativa em matéria de sexo...E muitos menos se tiver cabelos grisalhos... Uma gaja aos 64, era a idade que eu tinha na altura, em 2016, não pode desejar um homem, vinte anos mais novo... Grego, lindo com o Apolo!... Sabes ?!, tenho reconhecer que estou velha e acabada!...
− Que disparate!... Ainda estás aí para as curvas, como dizem os machos... Ou, como dizem aqui no Norte, ainda és uma gaja boa como o milho...
Não voltei a ver a minha amiga Nucha desde a nossa última conversa, em Campanhã, há uns meses atrás. Desejo-lhe, ainda a tempo, bons augúrios para 2019. E, nomeadamentem, mais sorte aos amores, já que a não tem tido ao jogo.
Alfragide, 21 de janeiro de 2019
Texto e foto: © Luís Graça (2019). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Notas do editor:
(*) Vd.postes anteriores da série >
(*) Vd.postes anteriores da série >
21 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19426: A Galeria dos Meus Heróis (18): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte I) (Luís Graça)
22 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19428: A Galeria dos Meus Heróis (19): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte II) (Luís Graça)
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19352: A Galeria dos Meus Heróis (16): Os caminheiros do parque da cidade - Parte I (Luís Graça)
22 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19428: A Galeria dos Meus Heróis (19): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte II) (Luís Graça)
(**) Vd. também:
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19352: A Galeria dos Meus Heróis (16): Os caminheiros do parque da cidade - Parte I (Luís Graça)
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19353: A Galeria dos Meus Heróis (17): Os caminheiros do parque da cidade - II (e última) parte (Luís Graça): com os meus votos para o novo ano que aí vem, o 2019. Porque a saúde, afinal, não serve para mais nada... a não para sermos livres e felizes! (Luís Graça)
Guiné 61/74 - P19430: Historiografia da presença portuguesa em África (146): Meu Corubal, meu amor (5) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Junho de 2018:
Queridos amigos,
Este último texto parece-nos significativo quanto ao espírito que os republicanos instituíram nas colónias com vista a identificar os grupos étnicos, as diferentes manifestações da sua vida material, os procedimentos da vida social, as práticas agrícolas, a navegação, artes e ofícios, habitação, narrativas orais, lazeres, entre outros aspetos. Nunca vi qualquer trabalho referente à riqueza deste repositório, e se de facto tais informações enformavam a vida governativa, tanto em Bolama como em Bissau. Estes inquéritos e questionários perdurarão por décadas, convém recordar que mesmo Sarmento Rodrigues exigia tais documentos, que o seu adjunto Teixeira da Mota coordenou um inquérito à habitação, documento da maior valia, e que o mesmo Teixeira da Mota incitou, a partir do Centro de Estudos da Guiné Portuguesa à elaboração de monografias. Podemos ter sérias reticências quanto à atividade governativa e administrativa mas não se pode negar que ao longo de décadas se produziram documentos de diagnóstico sobre uma profusão de regiões do mosaico étnico.
O lastimável é que tantas propostas meritórias não tenham tido seguimento.
Um abraço do
Mário
Meu Corubal, meu amor (5)
Beja Santos
Nos Reservados da Sociedade de Geografia de Lisboa consta um dossiê assim apresentado: Província da Guiné – Relatório de autor ignorado (mas que julgamos ter sido elaborado pelo antigo administrador de Buba, Capitão José António de Castro Fernandes, natural da Índia, cujo filhos residem, ainda, na Guiné. O original existia em poder do falecido Capitão Alberto Soares, antigo Administrador do Concelho de Bolama, combatente das campanhas de pacificação). Quem datilografou em 1931 diz que faltam as primeiras páginas, o que reproduz inicialmente está cheio de tracejado, é manifestamente incompreensível. O manuscrito, como iremos ver, é da década de 1910.
O documento datilografado (presumivelmente em 1931) começa por dizer tratar-se de Cópia – Extraída de um relatório, feito por autor desconhecido. Quem terá datilografado foi António Pereira Cardoso, funcionário colonial vastamente referido em diferentes relatórios das décadas de 1930 e 1940.
Creio que o leitor que tem tido a paciência de acompanhar os textos anteriores já se apercebeu que este documento tem valor histórico e alto significado para conhecer um ponto fulcral do Sul da Guiné, na década de 1910. O autor fala com rigor dos recursos hídricos, descreve as etnias, as produções, os sistemas de justiça indígena, os tipos de habitação, o grau de civilização. Mas a sua observação é de uma minúcia sem rival. Perguntado sobre os géneros ou artigos que os indígenas mais apreciam, tem resposta pronta: cola, açúcar, panos do país ou imitações de importação, contaria, âmbar, bandas, tabaco e álcool (evidentemente os que não professam a religião de Maomé). Diz também que são poucas ou nenhumas as relações comerciais com os povos da colónia vizinha e as que havia consistiam na compra de cavalos e de cola, na venda de grandes cabaças. Perguntado sobre o armamento, também tem resposta pronta: possuem armas de espoleta e pedreneira, somente os régulos possuem espingardas aperfeiçoadas.
Indústrias? Não existiam, há tecelões em número diminuto.
Fala-se do fanado dos homens e das mulheres e o que o Capitão Castro Fernandes informa é por demais conhecido. Questionado sobre o trabalho das mulheres e crianças, comenta do seguinte modo:
“Entre sete para oito anos, tanto os rapazes como as raparigas começam a dedicar-se ao trabalho. Os rapazes pastoreiam o gado, fazem mondas nos terrenos cultivados, as raparigas auxiliam as mães nos trabalhos domésticos.
Aos 35 anos, é raro o indígena, principalmente o Fula, aparentar ter menos de 50 anos, podendo-se assim dizer que entre 40 a 45 é o período em que chega à velhice. A miséria orgânica, o temperamento linfático dos Fulas, acrescido com doenças venéreas, vulgar nesta raça, noutras o excesso de bebidas alcoólicas, as insuficiências alimentares são causa de cedo envelhecerem.
Com excepção da raça Beafada, em todas as outras é o homem que classicamente se dedica à lavoura e as mulheres ao trabalho doméstico. O Beafada e mesmo o Mandinga oriundo da raça Beafada faz da mulher uma besta de carga”.
Se o inquérito obriga a respostas de grande amplitude devido aos assuntos versados, o Capitão Castro Fernandes não parece constrangido: descreve o vestuário das mulheres e até os seus adornos, sabe como se vestem as Fulas, as Mandingas e as Beafadas, e o mesmo se dirá do vestuário masculino, fala-se até das superstições e nos curandeiros. Perguntado se o gado é castrado, dá uma resposta direta e seca: “Castram o gado por um processo bárbaro do esmagamento dos testículos entre dois maços de pedra, passando um ferro em brasa, quando estão reduzidos a uma massa”. E segue-se uma pergunta direta para a qual a resposta não tem hesitação: Aplica castigos corporais? E segue-se a resposta: “Durante 25 anos de serviço efectivo, sendo mais de 13 como oficial, nunca apliquei castigos corporais a quem quer que seja; contudo, durante esta minha longa carreira, tenho dado uma ou outra bofetada ou chicotada nos meus subordinados de categoria baixa, soldados ou mesmo guardas da Administração, que pelo seu procedimento incorrecto e por necessidade de correctivo imediato a isso me obrigam, mas essas vezes talvez nem mesmo cheguem a umas seis”.
Parece que há uma gama de assuntos melindrosos que são deixados para o fim, neste caso é-lhe perguntado se no momento da cobrança passa recibos individuais ou coletivos e responde que passa recibos aos chefes de moranças, os recibos eram passados em nome dos chefes das povoações, mas no caso dos Fulas, Brames e Manjacos, os recibos eram emitidos com o nome dos chefes das moranças. O imposto de palhota era todo cobrado na sede da circunscrição, mas havia exceções, havia imposto pago no posto de Fulacunda e o pagamento do imposto de palhota dentro das concessões era feito por intermédio dos proprietários dessas concessões. Havia quem não queria pagar, é certo, ele comenta a situação: “É vulgar entre os indígenas pedir insistentemente para se lhe dispensar o pagamento de palhota, invocando a seu favor motivos que tendem eludir o arrolamento ao incauto que não esteja prevenido dos ardis de que o indígena se serve para se esquivar ao pagamento de uma ou mais palhotas”. São descrições saborosas em que se faz alusão à contagem de camas, à história dos diferentes arrolamentos efetuados, à distinção de palhota por grupo de cada duas camas, o comportamento de cada uma das etnias para tentar ludibriar a autoridade.
Já perto do final, o assunto inquirido tem a ver com caça, as espécies que mais abundam, se há elefantes e búfalos e ele responde que há caça em abundância e fala nas principais espécies.
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Nota do editor
Postes anteriores de:
26 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19336: Historiografia da presença portuguesa em África (141): Meu Corubal, meu amor (1) (Mário Beja Santos)
2 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19356: Historiografia da presença portuguesa em África (142): Meu Corubal, meu amor (2) (Mário Beja Santos)
9 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19386: Historiografia da presença portuguesa em África (143): Meu Corubal, meu amor (3) (Mário Beja Santos)
16 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19408: Historiografia da presença portuguesa em África (144): Meu Corubal, meu amor (4) (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Este último texto parece-nos significativo quanto ao espírito que os republicanos instituíram nas colónias com vista a identificar os grupos étnicos, as diferentes manifestações da sua vida material, os procedimentos da vida social, as práticas agrícolas, a navegação, artes e ofícios, habitação, narrativas orais, lazeres, entre outros aspetos. Nunca vi qualquer trabalho referente à riqueza deste repositório, e se de facto tais informações enformavam a vida governativa, tanto em Bolama como em Bissau. Estes inquéritos e questionários perdurarão por décadas, convém recordar que mesmo Sarmento Rodrigues exigia tais documentos, que o seu adjunto Teixeira da Mota coordenou um inquérito à habitação, documento da maior valia, e que o mesmo Teixeira da Mota incitou, a partir do Centro de Estudos da Guiné Portuguesa à elaboração de monografias. Podemos ter sérias reticências quanto à atividade governativa e administrativa mas não se pode negar que ao longo de décadas se produziram documentos de diagnóstico sobre uma profusão de regiões do mosaico étnico.
O lastimável é que tantas propostas meritórias não tenham tido seguimento.
Um abraço do
Mário
Meu Corubal, meu amor (5)
Beja Santos
Nos Reservados da Sociedade de Geografia de Lisboa consta um dossiê assim apresentado: Província da Guiné – Relatório de autor ignorado (mas que julgamos ter sido elaborado pelo antigo administrador de Buba, Capitão José António de Castro Fernandes, natural da Índia, cujo filhos residem, ainda, na Guiné. O original existia em poder do falecido Capitão Alberto Soares, antigo Administrador do Concelho de Bolama, combatente das campanhas de pacificação). Quem datilografou em 1931 diz que faltam as primeiras páginas, o que reproduz inicialmente está cheio de tracejado, é manifestamente incompreensível. O manuscrito, como iremos ver, é da década de 1910.
O documento datilografado (presumivelmente em 1931) começa por dizer tratar-se de Cópia – Extraída de um relatório, feito por autor desconhecido. Quem terá datilografado foi António Pereira Cardoso, funcionário colonial vastamente referido em diferentes relatórios das décadas de 1930 e 1940.
Creio que o leitor que tem tido a paciência de acompanhar os textos anteriores já se apercebeu que este documento tem valor histórico e alto significado para conhecer um ponto fulcral do Sul da Guiné, na década de 1910. O autor fala com rigor dos recursos hídricos, descreve as etnias, as produções, os sistemas de justiça indígena, os tipos de habitação, o grau de civilização. Mas a sua observação é de uma minúcia sem rival. Perguntado sobre os géneros ou artigos que os indígenas mais apreciam, tem resposta pronta: cola, açúcar, panos do país ou imitações de importação, contaria, âmbar, bandas, tabaco e álcool (evidentemente os que não professam a religião de Maomé). Diz também que são poucas ou nenhumas as relações comerciais com os povos da colónia vizinha e as que havia consistiam na compra de cavalos e de cola, na venda de grandes cabaças. Perguntado sobre o armamento, também tem resposta pronta: possuem armas de espoleta e pedreneira, somente os régulos possuem espingardas aperfeiçoadas.
Indústrias? Não existiam, há tecelões em número diminuto.
Fala-se do fanado dos homens e das mulheres e o que o Capitão Castro Fernandes informa é por demais conhecido. Questionado sobre o trabalho das mulheres e crianças, comenta do seguinte modo:
“Entre sete para oito anos, tanto os rapazes como as raparigas começam a dedicar-se ao trabalho. Os rapazes pastoreiam o gado, fazem mondas nos terrenos cultivados, as raparigas auxiliam as mães nos trabalhos domésticos.
Aos 35 anos, é raro o indígena, principalmente o Fula, aparentar ter menos de 50 anos, podendo-se assim dizer que entre 40 a 45 é o período em que chega à velhice. A miséria orgânica, o temperamento linfático dos Fulas, acrescido com doenças venéreas, vulgar nesta raça, noutras o excesso de bebidas alcoólicas, as insuficiências alimentares são causa de cedo envelhecerem.
Com excepção da raça Beafada, em todas as outras é o homem que classicamente se dedica à lavoura e as mulheres ao trabalho doméstico. O Beafada e mesmo o Mandinga oriundo da raça Beafada faz da mulher uma besta de carga”.
Se o inquérito obriga a respostas de grande amplitude devido aos assuntos versados, o Capitão Castro Fernandes não parece constrangido: descreve o vestuário das mulheres e até os seus adornos, sabe como se vestem as Fulas, as Mandingas e as Beafadas, e o mesmo se dirá do vestuário masculino, fala-se até das superstições e nos curandeiros. Perguntado se o gado é castrado, dá uma resposta direta e seca: “Castram o gado por um processo bárbaro do esmagamento dos testículos entre dois maços de pedra, passando um ferro em brasa, quando estão reduzidos a uma massa”. E segue-se uma pergunta direta para a qual a resposta não tem hesitação: Aplica castigos corporais? E segue-se a resposta: “Durante 25 anos de serviço efectivo, sendo mais de 13 como oficial, nunca apliquei castigos corporais a quem quer que seja; contudo, durante esta minha longa carreira, tenho dado uma ou outra bofetada ou chicotada nos meus subordinados de categoria baixa, soldados ou mesmo guardas da Administração, que pelo seu procedimento incorrecto e por necessidade de correctivo imediato a isso me obrigam, mas essas vezes talvez nem mesmo cheguem a umas seis”.
Parece que há uma gama de assuntos melindrosos que são deixados para o fim, neste caso é-lhe perguntado se no momento da cobrança passa recibos individuais ou coletivos e responde que passa recibos aos chefes de moranças, os recibos eram passados em nome dos chefes das povoações, mas no caso dos Fulas, Brames e Manjacos, os recibos eram emitidos com o nome dos chefes das moranças. O imposto de palhota era todo cobrado na sede da circunscrição, mas havia exceções, havia imposto pago no posto de Fulacunda e o pagamento do imposto de palhota dentro das concessões era feito por intermédio dos proprietários dessas concessões. Havia quem não queria pagar, é certo, ele comenta a situação: “É vulgar entre os indígenas pedir insistentemente para se lhe dispensar o pagamento de palhota, invocando a seu favor motivos que tendem eludir o arrolamento ao incauto que não esteja prevenido dos ardis de que o indígena se serve para se esquivar ao pagamento de uma ou mais palhotas”. São descrições saborosas em que se faz alusão à contagem de camas, à história dos diferentes arrolamentos efetuados, à distinção de palhota por grupo de cada duas camas, o comportamento de cada uma das etnias para tentar ludibriar a autoridade.
Já perto do final, o assunto inquirido tem a ver com caça, as espécies que mais abundam, se há elefantes e búfalos e ele responde que há caça em abundância e fala nas principais espécies.
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Nota do editor
Postes anteriores de:
26 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19336: Historiografia da presença portuguesa em África (141): Meu Corubal, meu amor (1) (Mário Beja Santos)
2 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19356: Historiografia da presença portuguesa em África (142): Meu Corubal, meu amor (2) (Mário Beja Santos)
9 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19386: Historiografia da presença portuguesa em África (143): Meu Corubal, meu amor (3) (Mário Beja Santos)
16 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19408: Historiografia da presença portuguesa em África (144): Meu Corubal, meu amor (4) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P19429: Parabéns a você (1565): Augusto Santos Silva, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3306 (Guiné, 1971/73); Francisco Godinho, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2753 (Guiné, 1970/72) e José Albino, ex-Fur Mil Art do Pel Mort 2117 e BAC 1 (Guiné, 1969/71)
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Nota do editor
Último poste da série de 22 de Janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P19427: Parabéns a você (1564): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67) e Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando, CMDT do Grupo Os Diabólicos (Guiné, 1965/67)
terça-feira, 22 de janeiro de 2019
Guiné 61/74 - P19428: A Galeria dos Meus Heróis (19): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte II) (Luís Graça)
Luís Graça, CCAÇ 12, Guiné, Contuboel, jumho de 1969
A Galeria dos Meus Heróis > A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento-II Parte
por Luís Graça
(Continuação)(*)
7. (...) E exemplificou,o meu amigo psiquiatra:
− Com mais ou menos dor, os casais separam-se ou divorciam-se... Nalguns casos, mais raros, é o homem que "parte à aventura", mudando de casa ou até de cidade. Mas, para isso, é preciso ter liberdade económica. Neste caso a mulher ainda hoje está mais limitada do que o homem. No futuro, vão-se inverter os papéis...
− Mas não é o caso da minha amiga Nucha que saiu da casa do companheiro e, segundo parece, para não mais voltar.
− O que eu entendo, só se ela fosse masoquista... Mas, como médico e psiquiatra, já vi tudo ou quase tudo na vida... Como sabes, a capacidade de amar, odiar e perdoar é quase infinita, entre os seres humanos. A "fidelidade canina", entre nós, pode ser ainda maior do que nos cães... "O volta, querido, estás perdoado!", não é, infelizmente, uma figura de retórica do passado.
− Eu também não ponho as mãos no fogo por ninguém... Mas, repara, neste caso de que te falei por alto, são pessoas da chamada classe média ou classe média alta... São pessoas ditas cultas, adultas, viajadas, livres, que frequentam a Casa da Música e o Museu de Serralves, no Porto (ou a Fundação Gulbenkian e o CCB, se vivessem em Lisboa)...
− Mas não são muito diferentes dos mesmos, homens e mulheres, que tu vais encontrar, nos cruzeiros de verão, "low cost", quais "lobos e lobas solitários", à procura compulsiva do seu macho, da sua fêmea...
− Felizmente que − acrescentei eu − as pessoas têm hoje mais mobilidade e liberdade, do que no passado... Pelo menos, em teoria... E nem precisam de fazer cruzeiros para se encontrarem e encetarem novas relações... Tens as redes sociais, as festas, a "night"...
− E os idosos ? O banco de jardim, a universidade sénior, os centros de dia...
− Ah!, e a sala de espera dos nossos centros de saúde... Mas esses são os pobres e os remediados...
Continuando o seu raciocínio, disse-me o psiquiatra:
− Repara que, noutros casos, a maior parte dos casais idosos, reformados, da chamada classe média, não chegam a separar-se, ou melhor, cada um dorme na sua cama, em cantos diferentes da casa, um na parte nascente, outro na parte poente, um na cama de casal, outro no quarto que outrora foi dos filhos... Enfim,conforme a disposição e o tamanho das casas... Ou, então, quando a casa é suficientemente grande, constrói-se um imaginário "muro de Berlim"... Não se falam, evitam cruzar-se, passam mais tempo na cama, pagam as contas a meias, enfim, encontram um "modus vivendi", algo trágico-cómico. Claro que estas situações são transitórias e ilusórias... Correm o risco de acabar, mais tarde ou mais cedo, em depressão, doença, violência,e até suicídio...
Lembrei também, ao meu amigo, alguns casos, do meu conhecimento, do mundo académico que podem ter alguma relação ou analogia com o caso de que estávamos a falar, e que ilustram a dificuldade que os seres têm em lidar com a idade, o envelhecimento,a reforma, a "morte social"... É o mito do Elixir da Juventude ou da Fénix Renascida...
− Com mais ou menos dor, os casais separam-se ou divorciam-se... Nalguns casos, mais raros, é o homem que "parte à aventura", mudando de casa ou até de cidade. Mas, para isso, é preciso ter liberdade económica. Neste caso a mulher ainda hoje está mais limitada do que o homem. No futuro, vão-se inverter os papéis...
− Mas não é o caso da minha amiga Nucha que saiu da casa do companheiro e, segundo parece, para não mais voltar.
− O que eu entendo, só se ela fosse masoquista... Mas, como médico e psiquiatra, já vi tudo ou quase tudo na vida... Como sabes, a capacidade de amar, odiar e perdoar é quase infinita, entre os seres humanos. A "fidelidade canina", entre nós, pode ser ainda maior do que nos cães... "O volta, querido, estás perdoado!", não é, infelizmente, uma figura de retórica do passado.
− Eu também não ponho as mãos no fogo por ninguém... Mas, repara, neste caso de que te falei por alto, são pessoas da chamada classe média ou classe média alta... São pessoas ditas cultas, adultas, viajadas, livres, que frequentam a Casa da Música e o Museu de Serralves, no Porto (ou a Fundação Gulbenkian e o CCB, se vivessem em Lisboa)...
− Mas não são muito diferentes dos mesmos, homens e mulheres, que tu vais encontrar, nos cruzeiros de verão, "low cost", quais "lobos e lobas solitários", à procura compulsiva do seu macho, da sua fêmea...
− Felizmente que − acrescentei eu − as pessoas têm hoje mais mobilidade e liberdade, do que no passado... Pelo menos, em teoria... E nem precisam de fazer cruzeiros para se encontrarem e encetarem novas relações... Tens as redes sociais, as festas, a "night"...
− E os idosos ? O banco de jardim, a universidade sénior, os centros de dia...
− Ah!, e a sala de espera dos nossos centros de saúde... Mas esses são os pobres e os remediados...
Continuando o seu raciocínio, disse-me o psiquiatra:
− Repara que, noutros casos, a maior parte dos casais idosos, reformados, da chamada classe média, não chegam a separar-se, ou melhor, cada um dorme na sua cama, em cantos diferentes da casa, um na parte nascente, outro na parte poente, um na cama de casal, outro no quarto que outrora foi dos filhos... Enfim,conforme a disposição e o tamanho das casas... Ou, então, quando a casa é suficientemente grande, constrói-se um imaginário "muro de Berlim"... Não se falam, evitam cruzar-se, passam mais tempo na cama, pagam as contas a meias, enfim, encontram um "modus vivendi", algo trágico-cómico. Claro que estas situações são transitórias e ilusórias... Correm o risco de acabar, mais tarde ou mais cedo, em depressão, doença, violência,e até suicídio...
Lembrei também, ao meu amigo, alguns casos, do meu conhecimento, do mundo académico que podem ter alguma relação ou analogia com o caso de que estávamos a falar, e que ilustram a dificuldade que os seres têm em lidar com a idade, o envelhecimento,a reforma, a "morte social"... É o mito do Elixir da Juventude ou da Fénix Renascida...
Ele não deixou de sorrir quando eu lhe falei das chamadas "crises da andropausa dos senhores professores catedráticos"...
− Sabes, tão bem como eu, de casos de professores universitários que perdem a cabeça com alunas, 20 ou 30 anos mais novas, com quem têm "paixões escaldantes", efémeras umas, e outras que até dão em casamento ou uniões de facto... Miúdas novas, da idade dos filhos ou até dos netos... Paixões que os colegas de departamento procuram "abafar" a todo o custo para evitar estardalhaço...
− Quem diz alunas, diz alunos − corrigiu o psiquiatra.
− Ah!, sim, em matéria de homofobia, a Universidade está hoje muito melhor do que no nosso tempo...E há casos de ssédio sexual, como em todo o lado...Mas não generalizes...
− Mas voltando às paixões serôdias, não te esqueças que no passado era de bom tom, sobretudo entre as classes altas, os homens casarem com mulheres mais novas ou até muito mais novas...
8. Mas já que estamos a falar de sociedades patriarcais e falocráticas (, embora os papéis entre os homens e as mulheres estejam hoje a mudar, a um ritmo talvez mais assustador para os machos...), ocorreu-me a pergunta que já antes havia formulado a mim mesmo:
− Afinal, quem era o homem de que tanto se falava, no círculo dos amigos e conhecidos da Nucha, o "mau da fita", a "besta quadrada", o "energúmeno", para usar alguns dos epítetos mais suaves do léxico da nossa "Poetisa", sempre politicamente incorreta e com gosto (perverso) para as tiradas panfletárias e provocatórias...
Bom, vim a conhecê-lo mais tarde,não no Porto,mas em Lisboa,por ocasião do lançamento do álbum fotográfico de um amigo comum, fotojornalista, que mo apresentou:
− O eng. Vaz C...
Não vou dizer que ficámos amigos, seria uma fanfarronice da minha parte, afinal não costumo fazer amigos logo ao primeiro aperto de mão... E sobretudo seria uma "traição" ,uma quebra de solidariedade para com a minha amiga Nucha que eu conheço há mais de vinte anos, e que é uma boa e leal amiga do Norte.
Mais tivemos depois, mais tarde, uma conversa franca, "de homem para homem" (como gostam de dizer os machos). Ele fez questão de apresentar a sua versão dos factos, tanto mais que se sentia "injustiçado pelo tribunal, e crucificado na praça pública"... O tribunal condenara-o a uns tantos meses de prisão, com pena suspensa. Teve que pagar ainda uma indemnização, por danos patrimoniais e morais, à Nucha ( que ele sabia, de resto, ser minha amiga de longa data.)
Não sei porquê, devo-lhe ter inspirado confiança. Por outro lado, eu tinha a vantagem de não ser do Porto e de não viver no Porto, e muito menos na Foz.
9. O eng Vaz C... (continuo a omitir o apelido por razões óbvias) é um engenheiro químico. Fez toda a vida no Porto mas tem as suas raízes no Alto Minho.
− Corrijo: fui engenheiro químico, já não sou. É uma parte do meu passado que ainda hoje me é doloroso evocar... Mas não posso riscá-la do meu currículo, seria fazer batota comigo e com os outros que me conhecem... Afinal, sou filho e neto de engenheiros... O meu avô, esse, era engenheiro militar.
Tratavamo-nos por você, como convinha, para manter a "devida distância.... E eu, por minha vez, também evitava interrompê-lo e fazer-lhe perguntas eventualmente embaraçosas...
Poucos o conheciam na vida da Nucha. Ela, de resto, nunca o havia apresentado à Tertúlia dos Caminheiros do Parque da Cidade (**), nem muito menos aos seus colegas professores da escola secundária onde ela dava aulas de biologia (aliás, fez lá toda a sua carreira e desenvolveu projetos na área da promoção da saúde escolar; foi daí, de resto, que nos conhecemos.)
Também eram raros os amigos comuns. O Vaz C... não me explicou como é que a Nucha aparecera na vida dele, há cerca de uma década atrás. Mas é capaz de ter sido numa viagem do Pinto Lopes, a quem já chamam,no Porto, a "agência do amor" ou "agência cor de rosa"...
Nem ele nem ela faziam grande vida social. Eram pessoas discretas, cada um com a sua casa, como convinha. A dele, na Foz, a dela na rua da Alegria. Era um "casal atípico". Viviam juntos há cerca de oito anos, com completa "separação de bens", a começar pelas contas bancárias... Até o IRS faziam em separado. Ela como "solteira" (nunca se tinha casado), e ele como "divorciado", pai de 2 filhos e avô de 3 netos... Filhos e netos que ela nunca quis conhecer.
"Viver juntos" não era, para ambos, uma expressão totalmente correta. A Nucha ficava muitas vezes na casa do Vaz C... Por comodidade, por preguiça, por inércia, por ser mais espaçosa e confortável, enfim, e sobretudo, por estar junto ao mar... Mas ela não gostava do vocábulo "namorados".
− Éramos amigos que às vezes dormíamos na mesma cama − confidenciou-me ela.
Ele, às vezes, apresentava-a como "namorada", nomeadamente aos vizinhos e conhecidos. Todas as despesas de manutenção da casa (e não eram pequenas, a começar pelo condomínio) eram suportadas por ele. A Nucha contribuía "apenas com parte da alimentação". Ns despesas do dia a dia, ela gostava das "contas à moda do Porto". Os pequenos luxos, como restaurantes caros, uma vez por outro, em "dias de festa", era ele que fazia questão de pagar. De resto, ele era também "um razoável cozinheiro, um bom, garfo e um melhor copo", segundo o autoelogia que ele próprio fez, na conversa que teve comigo. A Nucha confirmou-me que "ele bebia bem, e às vezes demais". Tinha uma excelente garrafeira, de fazer inveja aos amigos e vizinhos.
Não era um desses "novos ricos da Foz", nem sequer se considerava "rico", vivia com relativo desafogo, graças ao "pé de meia" que juntara no tempo das vacas gordas, e ao longo de uma vida de trabalho. A casa na Foz ("um casarão"...) já vinha de família. O pai fora um dos pioneiros da construção das barragens no Douro. Era também engenheiro (e empresário).
− Investi na bolsa, ganhei dinheiro, soube aplicá-lo, poupei-o... Fui formiguinha, hoje posso dar-me ao luxo de ser cigarra...A Nucha só conheceu a cigarra, não a formiga...
10. Foi ele próprio que me deu alguns detalhes do seu "currículo". Tinha sido, durante mais de três décadas, um "alto quadro" de um conhecido grupo empresarial do Norte,ligado à indústria transformadora. Tivera uma "fulgurante e brilhante carreira", até à morte do fundador do grupo. (Nas fábricas do grupo, antes do 25 de Abril, o fundador era tratado por toda a gente, desde os operários às chefias, como o "Senhor engenheiro", só mais tarde é que passou a ser o "Velho" ou o "Patrão Velho".)
− Fui eu que sugeri (e preparei o dossiê de) a internacionalização do grupo e é por isso que alguns não me perdoam, a começar pelos herdeiros. Deviam-me estar gratos, se o grupo não se abre, os filhos e os netos estariam hoje na miséria, a empresa familiar que eu conhecia não teria sobrevivido aos choques políticos, económicos e tecnológicos dos últimos 30 ou 40 anos... (Hoje a empresa está sólida e tem à frente uma equipa de gestores altamente profissional, segundo apurei.)
− Sabes, tão bem como eu, de casos de professores universitários que perdem a cabeça com alunas, 20 ou 30 anos mais novas, com quem têm "paixões escaldantes", efémeras umas, e outras que até dão em casamento ou uniões de facto... Miúdas novas, da idade dos filhos ou até dos netos... Paixões que os colegas de departamento procuram "abafar" a todo o custo para evitar estardalhaço...
− Quem diz alunas, diz alunos − corrigiu o psiquiatra.
− Ah!, sim, em matéria de homofobia, a Universidade está hoje muito melhor do que no nosso tempo...E há casos de ssédio sexual, como em todo o lado...Mas não generalizes...
− Mas voltando às paixões serôdias, não te esqueças que no passado era de bom tom, sobretudo entre as classes altas, os homens casarem com mulheres mais novas ou até muito mais novas...
8. Mas já que estamos a falar de sociedades patriarcais e falocráticas (, embora os papéis entre os homens e as mulheres estejam hoje a mudar, a um ritmo talvez mais assustador para os machos...), ocorreu-me a pergunta que já antes havia formulado a mim mesmo:
− Afinal, quem era o homem de que tanto se falava, no círculo dos amigos e conhecidos da Nucha, o "mau da fita", a "besta quadrada", o "energúmeno", para usar alguns dos epítetos mais suaves do léxico da nossa "Poetisa", sempre politicamente incorreta e com gosto (perverso) para as tiradas panfletárias e provocatórias...
Bom, vim a conhecê-lo mais tarde,não no Porto,mas em Lisboa,por ocasião do lançamento do álbum fotográfico de um amigo comum, fotojornalista, que mo apresentou:
− O eng. Vaz C...
Não vou dizer que ficámos amigos, seria uma fanfarronice da minha parte, afinal não costumo fazer amigos logo ao primeiro aperto de mão... E sobretudo seria uma "traição" ,uma quebra de solidariedade para com a minha amiga Nucha que eu conheço há mais de vinte anos, e que é uma boa e leal amiga do Norte.
Mais tivemos depois, mais tarde, uma conversa franca, "de homem para homem" (como gostam de dizer os machos). Ele fez questão de apresentar a sua versão dos factos, tanto mais que se sentia "injustiçado pelo tribunal, e crucificado na praça pública"... O tribunal condenara-o a uns tantos meses de prisão, com pena suspensa. Teve que pagar ainda uma indemnização, por danos patrimoniais e morais, à Nucha ( que ele sabia, de resto, ser minha amiga de longa data.)
Não sei porquê, devo-lhe ter inspirado confiança. Por outro lado, eu tinha a vantagem de não ser do Porto e de não viver no Porto, e muito menos na Foz.
9. O eng Vaz C... (continuo a omitir o apelido por razões óbvias) é um engenheiro químico. Fez toda a vida no Porto mas tem as suas raízes no Alto Minho.
− Corrijo: fui engenheiro químico, já não sou. É uma parte do meu passado que ainda hoje me é doloroso evocar... Mas não posso riscá-la do meu currículo, seria fazer batota comigo e com os outros que me conhecem... Afinal, sou filho e neto de engenheiros... O meu avô, esse, era engenheiro militar.
Tratavamo-nos por você, como convinha, para manter a "devida distância.... E eu, por minha vez, também evitava interrompê-lo e fazer-lhe perguntas eventualmente embaraçosas...
Poucos o conheciam na vida da Nucha. Ela, de resto, nunca o havia apresentado à Tertúlia dos Caminheiros do Parque da Cidade (**), nem muito menos aos seus colegas professores da escola secundária onde ela dava aulas de biologia (aliás, fez lá toda a sua carreira e desenvolveu projetos na área da promoção da saúde escolar; foi daí, de resto, que nos conhecemos.)
Também eram raros os amigos comuns. O Vaz C... não me explicou como é que a Nucha aparecera na vida dele, há cerca de uma década atrás. Mas é capaz de ter sido numa viagem do Pinto Lopes, a quem já chamam,no Porto, a "agência do amor" ou "agência cor de rosa"...
Nem ele nem ela faziam grande vida social. Eram pessoas discretas, cada um com a sua casa, como convinha. A dele, na Foz, a dela na rua da Alegria. Era um "casal atípico". Viviam juntos há cerca de oito anos, com completa "separação de bens", a começar pelas contas bancárias... Até o IRS faziam em separado. Ela como "solteira" (nunca se tinha casado), e ele como "divorciado", pai de 2 filhos e avô de 3 netos... Filhos e netos que ela nunca quis conhecer.
"Viver juntos" não era, para ambos, uma expressão totalmente correta. A Nucha ficava muitas vezes na casa do Vaz C... Por comodidade, por preguiça, por inércia, por ser mais espaçosa e confortável, enfim, e sobretudo, por estar junto ao mar... Mas ela não gostava do vocábulo "namorados".
− Éramos amigos que às vezes dormíamos na mesma cama − confidenciou-me ela.
Ele, às vezes, apresentava-a como "namorada", nomeadamente aos vizinhos e conhecidos. Todas as despesas de manutenção da casa (e não eram pequenas, a começar pelo condomínio) eram suportadas por ele. A Nucha contribuía "apenas com parte da alimentação". Ns despesas do dia a dia, ela gostava das "contas à moda do Porto". Os pequenos luxos, como restaurantes caros, uma vez por outro, em "dias de festa", era ele que fazia questão de pagar. De resto, ele era também "um razoável cozinheiro, um bom, garfo e um melhor copo", segundo o autoelogia que ele próprio fez, na conversa que teve comigo. A Nucha confirmou-me que "ele bebia bem, e às vezes demais". Tinha uma excelente garrafeira, de fazer inveja aos amigos e vizinhos.
Não era um desses "novos ricos da Foz", nem sequer se considerava "rico", vivia com relativo desafogo, graças ao "pé de meia" que juntara no tempo das vacas gordas, e ao longo de uma vida de trabalho. A casa na Foz ("um casarão"...) já vinha de família. O pai fora um dos pioneiros da construção das barragens no Douro. Era também engenheiro (e empresário).
− Investi na bolsa, ganhei dinheiro, soube aplicá-lo, poupei-o... Fui formiguinha, hoje posso dar-me ao luxo de ser cigarra...A Nucha só conheceu a cigarra, não a formiga...
10. Foi ele próprio que me deu alguns detalhes do seu "currículo". Tinha sido, durante mais de três décadas, um "alto quadro" de um conhecido grupo empresarial do Norte,ligado à indústria transformadora. Tivera uma "fulgurante e brilhante carreira", até à morte do fundador do grupo. (Nas fábricas do grupo, antes do 25 de Abril, o fundador era tratado por toda a gente, desde os operários às chefias, como o "Senhor engenheiro", só mais tarde é que passou a ser o "Velho" ou o "Patrão Velho".)
− Fui eu que sugeri (e preparei o dossiê de) a internacionalização do grupo e é por isso que alguns não me perdoam, a começar pelos herdeiros. Deviam-me estar gratos, se o grupo não se abre, os filhos e os netos estariam hoje na miséria, a empresa familiar que eu conhecia não teria sobrevivido aos choques políticos, económicos e tecnológicos dos últimos 30 ou 40 anos... (Hoje a empresa está sólida e tem à frente uma equipa de gestores altamente profissional, segundo apurei.)
E prosseguiu o meu interlocutor:
− Tudo corria aparentemente bem até ao dia em que lhe foi diagnosticado (ao fundador e líder do grupo,) um cancro, fatal, no cérebro. Ainda foi operado nos EUA, mas em vão. Com um prognóstico tão reservado, entrámos todos em parafuso. Ele era muito centralizador e gostava sempre de ter a última palavra, à boa maneira antiga do "eu quero, posso e mando". Este período poderia ter sido fatal para o futuro do grupo mas eu fui-lhe sempre leal e dedicado até à sua morte. De resto, não tinha funções executivas.
Convém acrescentar que o Vaz C... já antes se tinha começado a incompatibilizar com o filho mais velho do patrão, quando regressou à fábrica, vindo da América ou da Inglaterra, com um "Master", um "MBA", debaixo do braço, preparando-se para assumir, com toda a naturalidade deste mundo, o lugar que um dia, pela ordem natural das coisas, o pai lhe deveria deixar... Na realidade, não seria assim tão pacífica a sucessão...
E confessou-me, o Vaz C..., o que sentiu com a morte do "Velho":
− No dia seguinte, senti que aquela casa também já não era a minha...
− Tudo corria aparentemente bem até ao dia em que lhe foi diagnosticado (ao fundador e líder do grupo,) um cancro, fatal, no cérebro. Ainda foi operado nos EUA, mas em vão. Com um prognóstico tão reservado, entrámos todos em parafuso. Ele era muito centralizador e gostava sempre de ter a última palavra, à boa maneira antiga do "eu quero, posso e mando". Este período poderia ter sido fatal para o futuro do grupo mas eu fui-lhe sempre leal e dedicado até à sua morte. De resto, não tinha funções executivas.
Convém acrescentar que o Vaz C... já antes se tinha começado a incompatibilizar com o filho mais velho do patrão, quando regressou à fábrica, vindo da América ou da Inglaterra, com um "Master", um "MBA", debaixo do braço, preparando-se para assumir, com toda a naturalidade deste mundo, o lugar que um dia, pela ordem natural das coisas, o pai lhe deveria deixar... Na realidade, não seria assim tão pacífica a sucessão...
E confessou-me, o Vaz C..., o que sentiu com a morte do "Velho":
− No dia seguinte, senti que aquela casa também já não era a minha...
A correlação de forças mudou com a modificação da estrutura acionista: entraram para o Conselho de Administração os representantes dos herdeiros e dos novos acionistas, nacionais e estrangeiros.
O eng Vaz C..., assessor para a área do desenvolvimento estratégico, braço direito e protegido do "Patrão Velho", deixou de ser convocado para as reuniões do Conselho de Administração onde tinha lugar "praticamente vitalício", com funções consultivas.
O eng Vaz C..., assessor para a área do desenvolvimento estratégico, braço direito e protegido do "Patrão Velho", deixou de ser convocado para as reuniões do Conselho de Administração onde tinha lugar "praticamente vitalício", com funções consultivas.
Sobretudo os herdeiros não gostavam dele, chamavam-lhe o "Rasputine", acusando-o de ter uma influência demasiado grande (e sobretudo nem sempre benéfica) sobre o "Velho".
− Substituiram o timoneiro (que morreu) e afastaram o seu "leal conselheiro"... A história repete-se...
Os novos patrões não o despediram logo, até por razões legais e por respeito a uma cláusula testamentária do "Velho"... Por "piedade" (sic), deixaram-no só, num gabinete vazio, com uma secretária, uma cadeira e um PC... Alguém lhe sugeriu que escrevesse a "história" da empresa e as suas memórias de trinta anos de colaboração com o "Patrão Velho"...
− Recusei-me, disse-lhes que não era historiador, era engenheiro...
O seu conhecimento e relacionamento com o fundador do grupo já vinha de longa data, ainda antes do 25 de Abril, quando, jovem engenheiro químico (e um dos melhores alunos do curso) fizera um estágio prolongado numa das fábricas da empresa, na Maia.
O "Velho" também vinha da "química" (ou da "alquimia", como ele costumava de dizer, para brincar com os colegas), mas era de outra geração... Apreciava, no jovem Vaz C..., além da "competência técnica", a "visão estratégica" em relação ao futuro do setor e dos negócios, a par da "arte de negociar e de resolver problemas".
− Sem falsa modéstia, eu fui um dos obreiros da "via real" do sucesso daquela empresa (e, por tabela, do grupo que veio depois a criar-se). Sobrevivemos aos desvairados anos 70, à crise do petróleo de 1973, ao 25 de Abril, às greves, saneamentos e ocupações selvagens, às nacionalizações, ao PREC, à intervenção do FMI,etc. Mas, depois, vieram os "trinta gloriosos", de princípios de 80 até à primeira década do séc. XXI"...
Não foram trinta, emendou ele:
− Se não foram trinta, foram vinte e tal anos a trabalhar bem, sem horários, às vezes sem férias, a criar riqueza, postos de trabalho, a distribuir dividendos, a abrir novas fábricas...
Por outro lado, conhecia o pai e o avô do Vaz C..., também eles engenheiros. Católico, com "sensibilidade social", o "Velho" não perdeu a oportunidade de o contratar para a sua equipa de gestores, numa época em que, nas empresas, ainda se valorizava mais a "tarimba" do que os "canudos". Por outro o conhecimento pessoal e as famosas "cartas de recomendação" também eram como o código postal, invenção muito mais recente: eram meio caminho andado para se arranjar um bom emprego numa boa empresa...
− Substituiram o timoneiro (que morreu) e afastaram o seu "leal conselheiro"... A história repete-se...
Os novos patrões não o despediram logo, até por razões legais e por respeito a uma cláusula testamentária do "Velho"... Por "piedade" (sic), deixaram-no só, num gabinete vazio, com uma secretária, uma cadeira e um PC... Alguém lhe sugeriu que escrevesse a "história" da empresa e as suas memórias de trinta anos de colaboração com o "Patrão Velho"...
− Recusei-me, disse-lhes que não era historiador, era engenheiro...
O seu conhecimento e relacionamento com o fundador do grupo já vinha de longa data, ainda antes do 25 de Abril, quando, jovem engenheiro químico (e um dos melhores alunos do curso) fizera um estágio prolongado numa das fábricas da empresa, na Maia.
O "Velho" também vinha da "química" (ou da "alquimia", como ele costumava de dizer, para brincar com os colegas), mas era de outra geração... Apreciava, no jovem Vaz C..., além da "competência técnica", a "visão estratégica" em relação ao futuro do setor e dos negócios, a par da "arte de negociar e de resolver problemas".
− Sem falsa modéstia, eu fui um dos obreiros da "via real" do sucesso daquela empresa (e, por tabela, do grupo que veio depois a criar-se). Sobrevivemos aos desvairados anos 70, à crise do petróleo de 1973, ao 25 de Abril, às greves, saneamentos e ocupações selvagens, às nacionalizações, ao PREC, à intervenção do FMI,etc. Mas, depois, vieram os "trinta gloriosos", de princípios de 80 até à primeira década do séc. XXI"...
Não foram trinta, emendou ele:
− Se não foram trinta, foram vinte e tal anos a trabalhar bem, sem horários, às vezes sem férias, a criar riqueza, postos de trabalho, a distribuir dividendos, a abrir novas fábricas...
Por outro lado, conhecia o pai e o avô do Vaz C..., também eles engenheiros. Católico, com "sensibilidade social", o "Velho" não perdeu a oportunidade de o contratar para a sua equipa de gestores, numa época em que, nas empresas, ainda se valorizava mais a "tarimba" do que os "canudos". Por outro o conhecimento pessoal e as famosas "cartas de recomendação" também eram como o código postal, invenção muito mais recente: eram meio caminho andado para se arranjar um bom emprego numa boa empresa...
Mais do que simples colaborador, o eng Vaz C... tornou-se um amigo e até um confidente do "Velho".
Resumindo:
− Eu era um "colarinho dourado" bem pago, comecei a ser vítima de "bullying", como se diz agora. Arrumaram-me para um canto, como um trapo velho... A maior humilhação da minha vida... Devia ter lutado mais, mas faltaram-me as forças... O braço de ferro acabou por quebrar pelo elo mais fraco da cadeia. Estive de baixa psiquiátrica durante três anos, e depois a Segurança Social mandou-me para o esquema da invalidez... Hoje estou reformado, isto é, arrumado. A única coisa que me aconteceu nestes últimos dez anos foi ter conhecido a Nucha. Infelizmente acabo de a perder, há um ano atrás, pela coisa mais estúpida que fiz na minha vida, que foi bater numa mulher.
Fez-se um silêncio prolongado, embaraçoso, o meu interlocutor ia sendo traído pela emoção, recompõs-se, puxou de um lenço, assoou-se e prosseguiu:
− Há coisas que fazemos que não têm volta: a rajada de G3 que se dispara à queima-roupa contra um pobre diabo que tenta iludir a vigilância dos seus captores, mesmo de mãos algemadas; a pedra que se lança no pátio da escola, e que vai partir a cabeça de um inocente; a gadanha da morte que varre a autoestrada e que ceifa a vida daqueles que te deram o ser; enfim, uma mão, pesada, que se abate sobre a cara da mãe dos teus filhos...
Depreendi, ou deduzi eu, que eram fantasmas do seu passado: a guerra colonial, o acidente mortal com os seus pais, o divórcio litigioso do seu primeiro (e único) casamento...
11. Estava à espera que ele me contasse o que se passara exatamente "naquela malfadada noite" em que a Nucha regressara de Lisboa, de um congresso internacional... Mas ele, de repente, entrou num mutismo extremamente embaraçoso para mim... Respeitei o seu silêncio, levantei-me, despedi-me e nunca mais o voltei a encontrar.
Só mais tarde é que consegui saber pormenores, através da Nucha, sobre o que se havia passado nessa noite fatídica, para ambos, que marcou o fim de uma relação.
(Continua)
___________
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 21 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19426: A Galeria dos Meus Heróis (18): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte I) (Luís Graça)
(**) Vd. postes de:
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19352: A Galeria dos Meus Heróis (16): Os caminheiros do parque da cidade - Parte I (Luís Graça)
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19353: A Galeria dos Meus Heróis (17): Os caminheiros do parque da cidade - II (e última) parte (Luís Graça): com os meus votos para o novo ano que aí vem, o 2019. Porque a saúde, afinal, não serve para mais nada... a não para sermos livres e felizes! (Luís Graça)
− Eu era um "colarinho dourado" bem pago, comecei a ser vítima de "bullying", como se diz agora. Arrumaram-me para um canto, como um trapo velho... A maior humilhação da minha vida... Devia ter lutado mais, mas faltaram-me as forças... O braço de ferro acabou por quebrar pelo elo mais fraco da cadeia. Estive de baixa psiquiátrica durante três anos, e depois a Segurança Social mandou-me para o esquema da invalidez... Hoje estou reformado, isto é, arrumado. A única coisa que me aconteceu nestes últimos dez anos foi ter conhecido a Nucha. Infelizmente acabo de a perder, há um ano atrás, pela coisa mais estúpida que fiz na minha vida, que foi bater numa mulher.
Fez-se um silêncio prolongado, embaraçoso, o meu interlocutor ia sendo traído pela emoção, recompõs-se, puxou de um lenço, assoou-se e prosseguiu:
− Há coisas que fazemos que não têm volta: a rajada de G3 que se dispara à queima-roupa contra um pobre diabo que tenta iludir a vigilância dos seus captores, mesmo de mãos algemadas; a pedra que se lança no pátio da escola, e que vai partir a cabeça de um inocente; a gadanha da morte que varre a autoestrada e que ceifa a vida daqueles que te deram o ser; enfim, uma mão, pesada, que se abate sobre a cara da mãe dos teus filhos...
Depreendi, ou deduzi eu, que eram fantasmas do seu passado: a guerra colonial, o acidente mortal com os seus pais, o divórcio litigioso do seu primeiro (e único) casamento...
11. Estava à espera que ele me contasse o que se passara exatamente "naquela malfadada noite" em que a Nucha regressara de Lisboa, de um congresso internacional... Mas ele, de repente, entrou num mutismo extremamente embaraçoso para mim... Respeitei o seu silêncio, levantei-me, despedi-me e nunca mais o voltei a encontrar.
Só mais tarde é que consegui saber pormenores, através da Nucha, sobre o que se havia passado nessa noite fatídica, para ambos, que marcou o fim de uma relação.
(Continua)
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Notas do editor:
(*) Último poste da série > 21 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19426: A Galeria dos Meus Heróis (18): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte I) (Luís Graça)
(**) Vd. postes de:
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19352: A Galeria dos Meus Heróis (16): Os caminheiros do parque da cidade - Parte I (Luís Graça)
1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19353: A Galeria dos Meus Heróis (17): Os caminheiros do parque da cidade - II (e última) parte (Luís Graça): com os meus votos para o novo ano que aí vem, o 2019. Porque a saúde, afinal, não serve para mais nada... a não para sermos livres e felizes! (Luís Graça)
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Guiné 61/74 - P19427: Parabéns a você (1564): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67) e Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando, CMDT do Grupo Os Diabólicos (Guiné, 1965/67)
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Nota do editor
Último poste da série de 21 de Janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19423: Parabéns a você (1563): Dr. João Graça, Amigo Grã-Tabanqueiro de Lisboa
segunda-feira, 21 de janeiro de 2019
Guiné 61/74 - P19426: A Galeria dos Meus Heróis (18): A Nucha ou a difícil arte do envelhecimento (Parte I) (Luís Graça)
Luís Graça, Contuboel, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, julho de 1969 |
por Luís Graça
1. A Nucha ainda estava muito combalida quando eu, na semana seguinte, lhe telefonei. Por mero acaso, numa daquelas minhas saudáveis rotinas de fazer a ronda, “on line”, dos amigos que estão longe. Uma ou duas vezes por ano, lembro-me de pegar no telefone para o fazer o teste da “prova de vida e da amizade”.
Em geral, sou preguiçoso demais para telefonar. Fobias, critica-me um amigo. No fundo, tenho tenho boas notícias. Mas afinal malta ainda vai estando cá está para as curvas, está bem de saúde e recomenda-se. Mas neste caso foi o contrário. A Nucha estava viva, graças a Deus, mas tinha tido um “acidente de percurso” (sic), nesse princípio de verão de 2016.
− Num ataque de ciúme patológico, o meu ex tentou estrangular-me!
− O quê, estrangular-te ?! Quem, o teu ex ?!... Não acredito...
− Desculpa, nunca te cheguei a falar dele, nestes anos todos!
2.Pedi-lhe para desligar e voltei a contactá-la por videochamada. Senti que ela precisava de desabafar e nada como ter um velho amigo, a 300 km de distância, longe mas sempre ao alcance de um clique.
Enfim, pelas imagens, deu para perceber a gravidade da agressão de que fora vítima… Trazia ainda um colar cervical. Segundo as suas queixas, sofrera diversas contusões no pescoço, mas também na cabeça e no peito. Felizmente não havia vértebras cervicais partidas.
Logo que pude, em meados de julho desse ano, arranjei um pretexto para ir visitá-la. Tinha uma viagem no Alfa, paga. Até Braga, por razões profissionais. Aproveitei para ir na véspera e ficar no Porto nesse fim de semana.
3. Não deu, desta vez, para estar com a simpática malta da Tertúlia dos Caminheiros do Parque da Cidade (*), que se junta às 5ªs feiras. Havida entrado neste grupo, justamente através da Nucha e do seu projeto de promoção do envelhecimento ativo e saudável.
A Nucha é uma das “mães-fundadoras” do grupo e um elemento-chave. ”É certinha, não falha, comparece sempre, quer faça sol quer faça chuva”, dizem-me. Naturalmente, nas semanas seguintes à agressão, não teve condições para lá voltar. Sobretudo, anímicas. Creio que só regressou à tertúlia em outubro de 2016, até porque entretanto meteram-se as “férias de verão”dos caminheiros.
“Deixou-se ir abaixo com esta história toda, creio que anda deprimida”, confidenciou-me uma das pessoas do grupo que lhe estava mais próximas, a “Poetisa”. Mas, não faltaram logo, à boa maneira nortenha, as manifestações de afeto e de solidariedade, por parte dos caminheiros e demais amigos, até porque o “caso” se tornara público, contra a sua vontade.
− A nossa Nucha foi vítima de violência doméstica – anunciou o “Mister”, logo na 5ª feira seguinte aos “acontecimentos”. O “Mister”, professor de educação física reformado, exerce as funções de líder informal da Tertúlia, por acordo tácito da maioria (*).
Algumas pessoas do grupo estavam mais chocadas do que outras, segundo me contou a “Poetisa” com quem apenas falei ao telefone nesse fim de semana em que fui ao Porto e aproveitei para estar com a minha amiga Nucha.
− Uma “brincadeira”, ao que parece, que poderia ter acabado em tragédia – terá comentado um dos caminheiros.
A “Poetisa” não achou “graça nenhuma” à subtil insinuação desse caminheiro, para mais vindo de quem era, de alguém que, no passado, também fora vítima de violência doméstica, mas neste caso por parte da companheira, que sofria de graves problemas de saúde mental. O termo “brincadeira” não estava isento de uma conotação algo machista.
− O gajo, no fundo, está a insinuar que a Nucha também tivera culpas no cartório, “ao andar a brincar com o fogo”... Estás a ver a mente pornográfica destes sacanas!
4.Quanto ao ex-companheiro da Nucha (que vivia com ela há cerca de oito anos, e que eu só vim a conhecer pessoalmente mais tarde,) contaram-me que fora ouvido, no dia seguinte, na polícia e depois no tribunal, na presença do seu advogado.
A Nucha apresentava claros sinais de ter sido vítima de uma grave agressão, com danos corporais ao nível do pescoço, peito e cabeça. Teria havido uma tentativa de estrangulamento, num acesso de fúria provocada, ao que parece, por uma crise de “ciúme patológico” (sic).
− Patológico ?... Todo o ciúme é patológico! – ironizou a “Poetisa”.
A Nucha ficou muito afetada, física e psicologicamente. “In extremis” conseguira libertar-se das mãos do agressor, e chamar o 112. O INEM veio com a polícia.
O agressor acabou por cair em si (até porque era um homem inteligente) e deu-se por “culpado”. A Nucha foi levada, à meia noite, para o Hospital, donde só regressou no dia seguinte, tendo estado em observação e depois em tratamento.
5. Compreensivelmente, ela nunca mais voltou à casa da Foz, nem sequer para ir buscar uma muda de roupa e alguns objetos pessoais mais urgentes. Para essa tarefa, incumbiu uma amiga de ambos, que morava para os lados da av da Boavista. A Nucha voltou, de vez, para o seu apartamento na Rua da Alegria, os “50 metros quadrados da sua ilha preferida”, que ela costumava dividir com o casarão da Foz, nomeadamente no outono e inverno.
− Na primavera e no verão, preciso de sentir nas narinas a maresia, preciso de estar junto ao mar, como a Sophia [de Mello Breyner], faz-me bem aos quatro humores… Nunca poderia viver por detrás de uma serra! Detesto o rosmaninho e a urze, cheiros de uma infância em que não foi feliz!
6. O juiz impôs ao alegado agressor uma medida de coação de termo de identidade e residência.
− Se fora um trolha da construção civil, ia logo dentro! – desabafou a “Poetia”, ao telefone. E justificou a sua afirmação nestes termos:
− Como vês, é a merda da nossa justiça, no seu melhor, uma justiça ainda com muitos tiques de classe e, pior ainda, misógina, sexista, homofóbica e racista.
− Porque é que dizes isso ? – interpelei-a eu – Não serão chavões a mais ?
− Os nossos juízes, e nomeadamente os machos, mas também algumas juízas que vestem calças, parecem, às vezes, ter dois pesos e duas medidas, em matéria de crimes sexuais e de violência de género, incluindo a violência doméstica. Tudo depende do sexo da vítima e do agressor.
− Mas, também, se calhar, do estatuto socioprofissional − insinuei eu. – Mas não creio: os nossos juízes e juízas têm hoje uma outra formação.
7. Comentei este caso (que não é assim tão raro quanto se pensa, no nosso círculo de relações) com um psiquiatra, meu amigo, de Lisboa, que naturalmente não conhecia as pessoas em causa, a Nucha e o seu ex-companheiro.
− Tu, que és sociólogo da saúde, sabes tão bem ou melhor do que eu. Da minha prática clínica, assim a "olhómetro", eu diria que os casais 'grisalhos' (idosos, mas também de meia-idade), em Lisboa, no Porto, em todo o lado, estão a ter dificuldade em envelhecer. Quando as pessoas se reformam, têm ainda a esperança, legítima (ou legitimada pelas estatísticas demográficas...), de viver mais uns 10, 15, 20 ou até 25 anos (!) com saúde e qualidade de vida.
− Há gente a reformar-se muito cedo, por uma razão ou outra. É verdade que alguns começaram a trabalhar ainda crianças. Outros têm profissões ditas de desgaste rápido, ou que pertencem a certas corporações da função pública com privilégios que a maioria da população trabalhadora portuguesa não tem,não pode ter nem nunca terá.
− Mas, repara, a reforma significa para muita dessa gente, sobretudo entre as profissões científicas e técnicas, a "morte social". Saem de cena, saem do palco, saem das universidades, das empresas, das administrações, deixam de ser úteis e sobretudo... desejáveis!... O reformado é sobretudo um indesejável, até por que constitui um "fardo" para a população ativa, os mais novos e os que estão na fila para a reforma, mas que continuam a fazer descontos para a Segurança Social...
E o meu amigo psiquiatra acrescentou:
− As coisas já se vinham agravando com a crise de 2008/2009. As relações conjugais, amorosas, afetivas, enfim, o amor, o namoro, a amizade, a família, tudo isso se degrada com as crises económicas, o desemprego, a perda de rendimentos, os filhos que voltam para casa, etc.
− Ah!, a famosa anomia de Durkheim!
− Depois, há avós que não fazem mais nada do que cuidar dos netos, mesmo quando andam já na escola, adiando ou protelando os seus sonhos, de viajar, conhecer mundo, reviver, etc. Depois tens o inexorável relógio biológico, a idade que não perdoa, a velhice, os cabelos brancos...
− E, como diz, o povo, "teme a velhice porque ela nunca vem só"... − acrescentei eu.
− Tem um fundo de verdade, como muitos provérbios populares... De facto, com a velhice, vêm as doenças crónicas degenerativas, por exemplo, que em muitos casos até são geríveis, se tiveres uma rede de suporte social ou um sistema de saúde como aquele que hoje temos, e que não tinham os nossos pais e avós...
E explicitou melhor o seu pensamento:
− As pessoas querem viver mais, mas não estão preparadas para viver melhor, não sabem lidar com a reforma... É um fenómeno estranho. Há vários casais, meus conhecidos, alguns até meus doentes, que não aguentaram a "solidão a dois", depois da reforma...
(Continua)
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Nota do editor:
Último poste da série > 1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19353: A Galeria dos Meus Heróis (17): Os caminheiros do parque da cidade - II (e última) parte (Luís Graça): com os meus votos para o novo ano que aí vem, o 2019. Porque a saúde, afinal, não serve para mais nada... a não para sermos livres e felizes! (Luís Graça)
(*) Vd. também poste de 1 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19352: A Galeria dos Meus Heróis (16): Os caminheiros do parque da cidade - Parte I (Luís Graça)
Guiné 61/74 - P19425: Notas de leitura (1143): Viagens de Luís de Cadamosto e de Pedro de Sintra (1) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Outubro de 2016:
Queridos amigos,
Com a publicação do meu livro História(s) da Guiné-Bissau lancei-me noutro empreendimento, algo que se aparente a uma seleção das páginas de ouro de literatura em torno da Guiné, dos descobrimentos aos nossos dias.
Lido Zurara, e antes de rever o extraordinário André Álvares de Almada e contemporâneos, vim até às páginas de Cadamosto, interessantíssimas, como podereis ler. Tal como Zurara vai descrevendo a aproximação à Terra dos Negros, Cadamosto dá-nos igualmente a transposição dos homens pardos, os Azenegues, e assim chegamos à Senegâmbia, aqui se fundou um comércio que ficou conhecido por Costa dos Escravos.
Um abraço do
Mário
Viagens de Luís de Cadamosto e de Pedro de Sintra (1)
Beja Santos
No âmbito das comemorações do V Centenário da Descoberta da Guiné, a Academia Portuguesa de História editou em 1948 o trabalho “Viagens de Luís de Cadamosto e Pedro de Sintra”, com notas históricas por Damião Peres. Este insigne historiador justifica a iniciativa: “Como a crónica henriquina de Azurara não abrange feitos da Guiné posteriores a 1447,as páginas de Cadamosto constituem uma fonte narrativa, embora de utilização cautelosa, pois nelas se encontram dados cronológicos errados, e até, segundo se pode crer, alguma jactância atentatória da verdade”. Esta edição da Academia Portuguesa de História reproduz o texto de 1812 com as traduções a partir do italiano os dois viajantes, da Academia Real das Ciências, veja-se o site: http://livrosevelharias.blogspot.pt/2012/10/viagens-de-luis-de-cadamosto-e-pedro-de.html#!/2012/10/viagens-de-luis-de-cadamosto-e-pedro-de.html.
Vamos começar pela primeira viagem de Luís de Cadamosto. Ele vem fazer comércio à Costa dos Escravos ou Terra dos Negros, é um veneziano que espelha os conhecimentos da época, homem curioso, o seu relato começa no que é hoje o Senegal. Diz assim: O país destes primeiros negros do reino de Senega (Senegal) é o primeiro reino dos negros da Baixa Etiópia. Os povos próximos deste rio chamam-se Gilofos (os Jalofos).
É atento e minucioso: o Cabo Verde é a terra mais alta que há em toda esta costa, para além do dito Cabo Verde toda a costa é praia rasa. Vem a terra e comenta: Não há no país nenhuma cidade nem lugar murado, se não aldeias e casas de palha (que eles não sabem fazer casas de paredes porque não têm cale e têm grande falta de pedras). O modo de vida deste rei é o seguinte: não tem rendimento certo, além daquele que lhes dão os senhores desse país todos os anos para estarem de bem com ele, os quais presentes são de cavalos que lá são muito apreciados, por deles haver falta. Este rei vive também com roubos que faz, e tem sempre muitos escravos negros que mada pilhar não só no país como nos outros países vizinhos. Quanto ao vestir desta gente, quase todos andam nus continuamente salvo que trazem um coiro de cabra posto em forma de calça com que cobrem as vergonhas; mas os senhores e aqueles que podem comprar alguma coisa vestem camisas de pano de algodão. Quanto à forma, as suas camisas são compridas até meia coxa e largas. As mulheres desta região são muito asseadas de corpo, pois se lavam completamente, quatro e cinco vezes por dia; e assim também os homens, mas no comer são porcalhões e sem nenhuma educação. São homens de muitas palavras e nunca acabam de falar; e são todos, sempre, mentirosos e enganadores, em extremo; por outro lado, são caritativos, porque dão de comer e beber a qualquer estrangeiro que, de passagem, chegue a sua casa por uma refeição ou por uma noite, sem qualquer remuneração.
Cadamosto tem olhar de antropólogo na descrição das cerimónias, nas receções, na admiração ao destemor dos nadadores, descreve a vida de Budomel, o rei da região.
E procura dar um quadro da economia da terra: “Neste reino de Senega dos negros, nem daí por diante, em nenhuma Terra do País dos Negros se produz trigo, nem centeio, nem cevada, nem aveia, nem vinho. E visto que o país é bastante quente e não chove em nove meses do ano. A sua comida é de milho de diversas espécies, fava e feijões que nascem naquelas partes, os mais grados e mais belos que há no mundo". E procede a uma descrição da comida, bebida e substâncias oleaginosas. Fala então da fauna: nesta terra de Senega dos negros não se encontram outros animais úteis a não ser bois, vacas e cabras; ovelhas não se criam aí, nem poderiam viver por causa do grane calor. As vacas e bois daquele país são mais pequenos que os nossos. Animais bravo de presa há-os: leões, onças e leopardos, lobos e cabritos monteses; há í também elefantes selvagens. Estes elefantes andam aos bandos. Os seus dentes grandes nunca lhes caem, a não ser por morte. E aí animal que não ataca o homem se o homem não o atacar.
Cadamosto, com a curiosidade comerciante, vai ver como os outros mercadejam. E observa: Porque me acontece estar em terra muitos dias, determinei ir ver um seu mercado ou feira que se fazia numa pradaria, não muito longe do lugar onde eu estava hospedado; o qual se fazia à segunda e sexta-feira: fui lá duas ou três vezes. A este mercado vinham homens e mulheres das terras que estavam em volta até quatro ou cinco milhas, pois que os que estavam mais longe iam a outros mercados, porque também noutros lugares se costumam fazer. Nestes mercados compreendi muito bem que estes são gente muito pobre, pelas coisas que traziam ao mercado para vender. Primeiramente era o algodão (mas não fiado) em pouca quantidade; não muitos panos de algodão; legumes, milho, óleo; gamelas de pau, esteiras de palma e todas as outras coisas de que se servem para a sua vida. Nada se vende por dinheiro porque não há moeda nenhuma nem usam se não trocar coisa por coisa ou duas coisas por uma coisa, e todo o seu mercado se faz por troca. Estes negros, tanto machos como fêmeas, vinham ver-me como uma maravilha, e parecia-lhes coisa extraordinária ver um cristão em tal lugar, nunca dantes visto: e não menos se espantavam do meu traje e da minha brancura; o qual traje era à espanhola, com um jibão de damasco preto, e com uma capinha de gris; reparavam para o pano de lã, que eles não têm, e reparavam para o jibão, e muitos pasmavam, alguns tocavam nas mãos e nos braços e com cuspo esfregavam-me para ver se a minha brancura era tinta ou carne; e vendo que era carne branca, ficavam-se em admiração. Vendo-se um cavalo arreado com os seus arreios por nove até catorze escravos, conforme a qualidade e beleza do cavalo. Admiravam-se, grandemente, de ver arder uma vela, de noite, num castiçal e isto porque na sua terra não sabem produzir nenhuma outra luz que não seja a da fogueira.
Prepara-se para partir do Senegal para a Gâmbia, e ainda mais abaixo. E explica: Tive ocasião de estar neste país do senhor Budomel alguns dias, para vender e comprar, e saber de muitas coisas: pelo que estando do dito senhor despachado, e tenho obtido uma certa quantidade de escravos, determinei ir para diante, e passar o Cabo Verde e ir descobrir países novos para experimentar a minha sorte. Não muito longe deste primeiro reino de Senega dos Negros, indo mais para diante, havia um outro reino ou país chamado Gambra (Gâmia) no qual se encontrava grande quantidade de ouro.
(continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de18 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19414: Notas de leitura (1142): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (69) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P19424: Guerra colonial - cronologia(s) - Parte III: Angola, 1962: o ano em que o Exército tem mais baixas mortais em combate (121) depois do ano de 1961 (126), naquele teatro de operações. Utilização das primeiras minas A/P e A/C.
Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Estrada Finete-Missirá > 1969 > O Fur Mil Reis (à esquerda) e o Alf Mil Carlão (à direita), do 2º Gr Comb da CCAÇ 12 vistoriando os restos da viatura (Unimog 404) em que seguia o Alf Mil Beja Santos, comandante do Pel Caç Nat 52, quando accionou uma mina anticarro, no dia 16 de Outubro de 1969, por volta das 18h00, na zona de Canturé (entre Finete e Missirá: vd. carta de Bambadinca, de 1/50.000).
A primeira mina A/C, na guerra colonial, foi utilizada em Angola, em 12 de junho de 1962.
Foto do arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
Foto (e legenda): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
A primeira mina A/C, na guerra colonial, foi utilizada em Angola, em 12 de junho de 1962.
Foto do arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
Foto (e legenda): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1962-01-15
Portugal abandona a Assembleia-Geral da ONU, em virtude do debate sobre Angola.
1962 -01 -30
Assembleia Geral da ONU: resolução reprovando a repressão e a ação armada de Portugal contra povo angolano; reafirmação do direito à autodeterminação e independência dos angolanos.
1962-03-03
A UPA reivindica, em Leopoldville, a prisão e a execução de um destacamento do MPLA, comandado por Ferreira (cerca de 20 hiomens), que se infiltrara em dezembro de 1962 na região de Nambuangongo. Presidente: Holden Roberto.
1962-03-23
O Governo Português recusa a visita do Comité dos Sete da ONU aos territórios sob administração portuguesa.
1962-03-27
Formação da FNLA - Frente Nacional de Libertação de Angola, a partir da UPA e do PDA - Partido Democrático de Angola.
1962-04-05
Formação do GRAE - Governo Revolucionário de Angola no Exílio, por iniciativa da FNLA.
1962-04-07
Criação da 1ª Companhia de Fuzileiros.
1962-04-27
Aprovação do Código do Trabalho Rural para o Ultramar, ou seja, a primeira lei de trabalho livre. Tentativa de resposta às acusões de colonialismo por parte da ONU. Criados também os primeiros tribunais do trabalho no Ultramar.
1962-06-01
Inauguração oficial da Base Aérea 9, em Luanda.
1962-06-06
Primeira mina A/P [antipessoal], utilizada na guerra colonial, na estrada Zala-Vila Pimpa, norte de Angola.
1962-06-12
Primeira mina A/C[anticarro], utilizada na guerra colonial, na pista da povoação do Bembe, em Angola.
1962-06-23
Despenha-se , no Vale do Loge, Angola, um caça bombardeiro F-84, Thunderjet, da FAP.
1962-06-25
Criação do Centro de Instrução 21 (CI 21), em Zemba, para formar as primeiras unidades de comandos.
1962-06-30
Agostinho Neto foge de Portugal, juntamente com a mulher e dois filhos, e ainda com Vasco Cabral, dirigente do PAIGC, com a ajuda do PCP - Partido Comunista Português. No final do ano, em Leopoldville, será eleito presidente do MPLA.
1962-07-01
Condenação, em Luanda, dos escritores António Jacinto, António Cardoso e José Graça (Luandino Vieira) a 14 anos de prisão por 'actividades contra a segurança exterior do Estado'.
Condenação, em Luanda, dos escritores António Jacinto, António Cardoso e José Graça (Luandino Vieira) a 14 anos de prisão por 'actividades contra a segurança exterior do Estado'.
1962-08-10
Fuga para Paris dos dirigentes da FUA - Frente de Unidade Angola, que estavam com residência fixa em Lisboa.
1962-08-13
Início da construção do mito de Spínola, com o sucesso da Op Nun'Alvares, realizada pelo BCAV 345, de que ele era o comandante.
1962-08-15
Criação dos Estudos Gerais [Universidade] de Angola e Moçambique, levando a um conflito de competências do Ministro do Ultramar, Adriano Moreira, e o general Venâncio Deslandes, governador e comandante-chefe de Angola. Em choque, duas conceções diferentes sobre o futuro do território.
1962-09-24
Demissão de Venâncio Deslandes, substituído por Silvino Silvério Marques (como governador-geral) e Holbeche Fio (como comandante-chefe).
1962-10.18
Primeiro heliassalto na guerra colonial (16 paraquedistas em 4 helis Alouette II): Op Três Mosqueteiros, na região de Caluca, a sul de São Salvador do Congo.
1962-10-23
Primeiras notícias, não confirmadas, sobre a possível abertura da Frente Leste, por parte da UPA, podendo afetar a atividade da Diamang e o caminho de ferro de Benguela.
1962-1-15
Carta de Viriato Cruz aos militantes do MPLA, manifestando-se contra Agostinho Neto.
1962-12-01
Início do I Congresso do MPLA em Leopoldville. Neto substitui Viriato. Mário de Andrade na vice-presidência.
1962-12-04
Adriano Moreira perde a confiança pessoal e política de Salazar, que o substitui na pasta do Ultramar. Remodelação do Governo.
1962-12-17
Início da Op Roda Viva a região de Quicabo. Morre o furriel Szabo, filho de uma antiga glória do futebol húngaro e português. A notícia teve grande impacto emcoional em Angola e na Metrópole.
1962-12-31
Total dos efetivos do Exército nos 3 teatros de operações: 61 847, sendo 44 925 em Angola (dos quais 33 760, de origem metropolitana.
No ano de 1962, morreram em combate, em Angola, 121 militares, o segundo ano com mais baixas em Angola durante toda a guerra (depois de 1961).
Fonte: Adapt de Carlos Matos Gomes e Aniceto Afonso - Os Anos da Guerra Colonial, vol. 3 - 1962: optar pela guerra. Lisboa: Quidnovi, 2009.
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Nota do editor:
Último poste da série > 14 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19402: Guerra colonial - cronologia(s) - Parte II: A nova "união sagrada": "A Pátria deve estar, em todas as circunstâncias, acima do regime"... mas "o regime [também] deve estar, em todas as circunstâncias, à altura da Pátria" (Diário de Lisboa, 18 de março de 1961)
Último poste da série > 14 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19402: Guerra colonial - cronologia(s) - Parte II: A nova "união sagrada": "A Pátria deve estar, em todas as circunstâncias, acima do regime"... mas "o regime [também] deve estar, em todas as circunstâncias, à altura da Pátria" (Diário de Lisboa, 18 de março de 1961)
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