1. Mais uma nota solta enviada pelo nosso camarada Rogério Cardoso* (ex-Fur Mil, CART 643/BART 645, Bissorã, 1964/66), em mensagem de 23 de Abril de 2010.
NOTAS SOLTAS DA CART 643 (19)
ALGUNS MOMENTOS AGRADÁVEIS
O dia a dia nos anos 64/65 no interior da Guiné, era de facto muito difícil, muito mais complicado que em Bissau, onde os dias corriam mais ou menos bem. Na chamada "Guerra do ar condicionado", havia restaurantes para quando havia vontade, e claro haver o velho patacão, cinema, cafés com as sua esplanadas, actividades desportivas, etc. Estando os felizardos da capital, "muito bem", o incómodo não passava além do ataque ao mosquiteiro, mais precisamente do anofelis e o calor intenso.
No nosso pequeno burgo, "cá tem" restaurantes, cinema, cafés e jornadas desportivas, então como passava o pessoal os raros momentos de lazer?
Lembro-me, que às vezes aparecia um elemento da Especialidade de Foto-Cine, com uma pelicula para ser exibida à noite, claro ao ar livre, para que o fumo em recintos fechados não atacasse as nossas vias respiratórias. Depois do acostumado e suculento jantar, era passado o filme com o ecran colocado numa viatura, sendo a plateia e balcão de pé, para todos somarem mais uns centimetros de altura. O filme era exibido sem interrupção, no entanto os nossos amigos do PAIGC, invejosos por não poderem assistir, obrigavam-nos por vezes a fazer um intervalo.
Certa vez o Foto-Cine apresentou o filme mexicano CURRITO DE LA CRUZ, a historia de um puto que queria ser toureiro, passou-o 3 vezes em dias seguidos. Quando se preparava para seguir para outro aquartelamento, eis que o IN minou algumas pontes em redor de Bissorã, ficando a Cart 643 isolada por terra durante uma série de dias, o que implicou a permanência do homem da máquina, que se instalou nos nossos alojamentos temporariamente.
Como não havia outro filme, aplicou-se o chamado vira o disco e toca o mesmo, enquanto ele esteve em nossa casa, todos os dias era visionado e até chegou ao ponto, conforme ideia de um camarada, passá-lo de trás para a frente, já que todos nós já sabíamos de cor todos os diálogos
do Currito de la Cruz e los companheros.
Outro grande momento de lazer, era ouvir de um gravador de fita, que o ex-Fur Mil Fernando Sousa possuia, as músicas do Festival de San Remo 1964, para nós o melhor festival de sempre.
Quem venceu foi a Gigliola Cinquetti com a peça Non Ho L'Età, canção que foi à Eurovisão onde também venceu .
Também cantava o Bobby Solo - Una Lagrima Sul Viso, o Domenico Modugno - Che Me Ne Importa a Me, entre outras de bom nível.
Posso afirmar que ultimamente a fita já tinha fraca qualidade, foi ouvida centenas de vezes, eramos 6 no quarto, acabando por adormecer ao som daquelas melodias, era um tónico que nos fazia lembrar a longínqua metrópole, no fim pouco nos contentava.
Hoje interrogamo-nos, que mal fizemos à sociedade para merecer tal castigo. Na altura os que fizeram mal, eram colocados nos presídios, vivendo melhor, refeições a horas, visitas familiares e divertimentos diversos, e sem perigo de vida. Estavam encerrados, também nós, só que o nosso presídio era muito maior, sem visitas e claro muito mais longe, a nossa vantagem era o Registo Criminal limpo, os que conseguiram regressar.
Rogério Cardoso
CART 643 - Águias Negras
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 28 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6269: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (18): Recordando o nosso Comandante de Companhia Capitão Ricaro Silveira
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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2 comentários:
Caro Rogério Cardoso
Com os teus” Momentos Agradáveis” transportaste-me para o passado, quando eu tinha 17 ou 18 anos. Guardo eu gratas recordações do Festival de San Remo de 1964, na altura a música Italiana e Francesa, estavam muito em voga. Nos largos milhares de discos de vinil que possuo, continuam destacados e estimados os intérpretes dessa época. Acrescidos ainda aos que tu mencionas: - Gianni Morandi (Non Son Degno Di Te); Rita Pavone (Cuore); Antonio Prieto (Cuando Calienta el Sol); Adamo (Tombe la Neige); Gilbert Becaud; Charles Aznavour; Beatles; Shadows e o Cliff Richard; Rolling Stones (Angie) e muitos, muitos outros…
Mas também recuei no tempo, quando tu falas de projecção de filmes. É que fez ontem precisamente quarenta anos, era Sábado, fui eu como operador de transmissões, na viatura, com um grupo da CCAÇ. 5, recolher um outro grupo que estava no mato, algures entre Canjadude e Nova Lamego. Dada a proximidade a que ficamos de Nova Lamego, aproveitámos e deslocámo-nos lá, para levar o correio e outras coisas. Eu comprei, na Casa Caeiro, um projector de diapositivos da marca Agfa. No regresso a Canjadude, acompanhou-nos um Operador de Foto-Cine, que levava na sua bagagem também um só filme e uma reportagem, foram três ou quatro dias sempre a mesma projecção, ao ar livre, cuja tela estava fixada na parede da caserna. Eu aproveitei e projectei diapositivos.
O Título do filme, já não lembro, mas recordo perfeitamente que o interprete principal, era o Gianni Morandi e cantava a Canção – Non Son Degno Di Te – e creio que também cantava - La Fisarmonica.
Boa Tarde Rogério
UM abraço para todos
Perdão, esqueci-me de assinar o comentário anterior.
José Corceiro
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