terça-feira, 12 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8086: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (40): O Domingos encontrou-me!.. Ele era a mascote da CCAÇ 462, Ingoré (1963/65) (J. Marques Ferreira)

1. O nosso camarada José Marques Ferreira, ex-Sold Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 462, Ingoré (1963/65), autor também do blogue Terras do Marnel e Vouga, enviou-nos em 9 de Abril uma mensagem de felicidade e alegria por voltar a ter notícias de um Amigo de quem não sabia nada acerca de 46 anos.



Camaradas,

Todos aqueles que se habituam a ver o nosso nome por aqui na rotina do blogue e que de repente o vê desaparecer, sem qualquer explicação como é o meu caso, fica admirado. Pelo facto quero pedir as minhas desculpas.

Andava a ruminar alguma coisa para ser postada neste nosso blogue, quando me surgiu um acontecimento que me surpreendeu muito agradavelmente, quando menos eu esperava. Já não sei há quanto tempo - e a emoção leva-me a «despejar» estas palavras -, foi publicada num poste uma estória minha – dos anos 1963/1965 -, sobre uma mascote que foi adoptada na nossa CCAÇ 462, em Ingoré (*). Chamava-se Domingos e tinha na altura uns 4 ou 5 anos de idade, ou talvez um pouco mais.

Pois agora, dia 7 de Abril, fui surpreendido com um e-mail seu, que abaixo anexo e só me ocorreu, rápida e ansiosamente, vir dar aqui dar-vos esta notícia, que considero ao mesmo tempo ser uma óptima publicidade para este nosso blogue, que é: “O Domingos encontrou-me!”

O texto que ele apresenta é verídico, e é mais um caso a juntar a muitos outros que o nosso blogue tem vindo a proporcionar. Reparem na linguagem que o Domingos utiliza. Toda ela é sinceridade, simplicidade e honestidade. Que felicidade, minha e dele claro.

Ainda por cima ele mora em Portugal, embora eu não saiba onde. Já lhe respondi e pedi-lhe a sua morada.

Não me preocupei muito com este texto, pois o objectivo é apenas dar-vos conhecimento deste facto, quase inédito, mas que como se vê não há impossíveis.

O nosso blogue vai a todos os lados e a todas as pessoas que o queiram visitar.

Este acontecimento é mais uma prova do poder e da força deste maravilhoso meio de comunicação. Creio sinceramente que ainda o podemos melhorar em alguns aspectos, Amigos e Camaradas da Guiné. Nunca esqueçamos também os «milagres» que muitos de nós têm vindo a fazer, uns no terreno e outros contribuindo com o que podem, para ajudar aquele pobre povo.

Não tenho mais palavras…

J. M. Ferreira
Sold Apt de Armas Pesadas da CCAÇ 462

2. Em 7 de Abril de 2011, enviou então o Domingos a seguinte mensagem ao nosso surpreendido e alegre Camarada Ferreira:


Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > CCAÇ 462 (1963/65) > Na foto podemos ver o Domingos sentado no chão, entretido a colcocar um capacete na cabeça. [É pena que a imagem não tenha maior resolução pra poder ser ampliada]

Foto: © José Marques Ferreira (2009). Direitos reservados.

O MASCOTE DOMINGOS

Nem sei por onde começar por tamanha ser a minha emoção! 1963/1965... INGORÉ... a criança que ia ao quartel mais a irmã pedir comida, e que por lá ficou e se tornou MASCOTE da Companhia de Caçadores 462 (***)... o DOMINGOS... é vivo e está aqui em Portugal!

Vi a minha foto na Net, não aguentei e chorei! Chamei meus filhos, minha mulher e mostrei-lhes as maravilhas que Deus faz!

Sr. Ferreira, estou-lhe mais que grato por ter sabido preservar e eternizar a minha pessoa.

Eu era criança e do pessoal da companhia 462 só me lembro do capitão Parracho que era o comandante da companhia e do Alferes Geraldo (ou era Geraldes?), que foi pela mão de quem fiquei no quartel.

Lembro-me até que o Alferes Geraldes era da Póvoa de Varzim. É que já lá vão quase 50 anos!!!

Eu vivo aqui em Portugal há mais de 20 anos, meus três filhos todos são cá nascidos e minha vida quase toda aqui feita.

Estou muito contente, mas muito contente mesmo!!!!!!!!!!!!

Domingos “O MASCOTE” (**)
_________

Nota de MR:

Vd. poste anterior desta série em:


(...) O DOMINGOS – UMA CRIANÇA SOLDADO

O Domingos era uma criança, em 1964, de estatura normal para os seus cinco, seis anos (talvez nem tantos na altura), os olhitos pareciam estar em permanente melancolia (como os de muitos putos guineenses), mas já o seu porte e presença eram um tanto diferentes.
O Domingos, fazendo fé nas recordações um tanto esfumadas, porque o tempo não perdoa e não é eterna a sua permanência nas minhas memórias cerebrais, começou a aparecer com a mãe, que lavava a roupa de alguns camaradas nossos, o que, como sabemos, constituía mais alguma fonte de sobrevivência para a família.
Tantas vezes lá foi que começou a ter contacto mais directo com os militares que, pelo seu feitio e postura simpáticas, eram afáveis para aquela criança de tenra idade. Ficou lá connosco um dia, depois outro e outro...
Todos o acarinhavam e brincavam com ele, e o Domingos ia demonstrando alguma sociabilidade, retribuindo simpaticamente com as peripécias próprias das crianças, o trato que lhe ia sendo dispensado.
Até que, para não alongar mais esta “lengalenga”, o Domingos foi adoptado, oficialmente, como mascote da CCAÇ 462. Passou a ter uma farda verde igual à nossa, com excepção do camuflado e do vestuário de trabalho.
Comia connosco, e durante muito tempo, chegou a dormir na nossa caserna, tal como todos nós. Os pais sabiam desta situação, o comandante da Companhia também. Já fazia parte da nossa "família".
(...)
Ao fim de dezasseis meses, a minha companhia foi “embalada” e enviada para Bula, pelo que perdemos o rasto do Domingos.
Continuamos sem o ver quando fomos ocupar, pela primeira vez, o território de Có, Ponate, Jolmete e Pelundo.
E perdemos-lhe completamente o rasto, quando destas localidades seguimos para Mansoa. Nunca mais soube nada do Domingos, aquele puto simpático e meigo, de olhar melancólico, que viveu connosco durante vários e saudosos meses. Um dia, a Guiné tal como a conhecemos então, acabou para a nossa companhia, pois regressamos a casa no paquete Niassa…
Do Domingos ficou-me as naturais saudades do seu sorriso e traquinices, e a única foto que tenho dele (...). (**) CCAÇ 462: Compannhia independente, foi mobilizada pelo BCAÇ 10, partiu para o TO da Guiné em 14/7/1963 e regressou à Metrópole em 7/8/1965.
Esteve em Ingoré, Bula, Có e Mansoa. Comandantes: Cap Mil Inf Jorge Saraiva Parracho; Cap Inf Joaquim Jesus das Neves.
(***) A mascote e não "o"... Não corrigimos intencionalmente o português: o substantivo "mascote" é feminino, vem do francês (c. 1870), mascotte > pessoa ou animal de estimação, fétiche, talismã, algo que dá boa sorte...

5 comentários:

Luís Graça disse...

Parabéns ao Zé Marques Ferreira por ter proporcionado, ao nosso amigo Domingos e à sua família, tamanha alegria!...

Fui ao teu blogue ver se conseguia "recuperar" a fotografia em que aparace o Domingos "vestido à tropa"... Mas tem a mesma resolução da que foi publicada, em Julho de 2009, no nosso...

Vou-te pedir, Zé Ferreira, que nos mandes uma com "maior resolução", de modo a poder ser publicada em formato "extra-largo" (a toda a largura da página...). Deve ter dez vexzes mais resolução... Esta tem cerca de 30 Kb...

Para um africano que não tem fotos do tempo de criança, é de facto uma "dádiva de Deus" vir encontrar uma, aqui no nosso blogue... O Domingos que apareça aqui, que será bem vindo!

José Marques Ferreira disse...

Meu caro Luís;
Obrigado pela simpatia manifestada nas palavras acima. Não fiz mais que o meu dever de cidadão e de membro deste grande poilão.
O Domingos ainda não me respondeu.

E quanto a fotografias, dele, só tenho a quem tem andado quer no meu blogue, quer aqui.
Vou enviar outra, «arranjada» à minha maneira e como sei, a ver o que dá. Penso que esta está, pelo menos, com outro formato.

E foi pena o nosso amigo MR não ter aproveitado a foto que ele enviou, actualizada, com aspecto de um físico um pouco mais «redondo» próprio da idade. Estava no mail que serviu de base àquele post.

Um abraço,

JM Ferreira

Anónimo disse...

Camarigos
Seria interessante o Domingos contar a sua história após a retirada da Compª. da qual ele era a "Mascote".
Mantenhas
Luís Borrega

Luís Graça disse...

José: Temos mais histórias parecidas... Por exemplo, a do Cherno Baldé, de Fajonquito.

Convida o Domingos a ligar-se à nossa Tabanca Grande. Ele tem pelo menos e-mail...

Um abraço. Luís

PS - E parabéns pelo teu blogue e pelo amor à tua terra e à tua gente!..

Terras do Marnel e Vouga

http://terrasdomarnel.blogspot.com/
___________

Não sabia...

Marnel: "Significa terreno alagadiço que só em pequenos barcos se pode vadear.
Vadear = passar a vau; vencer uma dificuldade"...

José Marques Ferreira disse...

Meu caro Luis Borrega
Meu caro Luis Graça

Já por duas vezes que tento responder, e esta geringonça da Blogger me dá uma mensagem a dizer que não é possível satisfazer o meu pedido, quando procuro publicar. Vamos a ver desta vez:

Ao Luis Borrega:
Já me tinha passado pela «mona» (aqui quer dizer cabeça) fazer esse convite ao Domingos. A té eu tenho curiosidade e todos nós, certamente.
Obrigado pelas «mantenhas» (ou não serão «matanhas»?)

Ao Luis Graça:
Seguiu para o MR outra foto.
A história do Cherno, que tenho acompanhado, sensibiliza-me bastante. É um grande exemplo de vida.
Mas já vi mais casos idênticos. Ainda hoje recebi um mail de um camarada - Amílcar Ventura - a contar-me uma história idêntica por si vivida. E o que veio «à flor da pele» quando o encontro se realizou. Como se compreende, é indiscritível...
Temos uma vantagem. É que ele -Domingos-não se lembra de mim, mas isso não invalida aquilo que se sente e vive...
Ainda não respondeu. Mas vou insistir se, entretanto, não obtiver resposta.

Quanto ao blogue:
Não admito a ninguém que diga que a freguesia - Valongo do Vouga - não e maior do concelho (Águeda) em área e em densidade populacional, com excepção da freguesia sede de concelho. E estas definições e expressões são da minha autoria, quando levei para os jornais cá do sítio este slogan, que até a certa altura ninguém tinha utilizado.
Esta freguesia é maior, em área e até em população que alguns concelhos do interior.
Utilizei o então IP5, durante quatro anos, a caminhar para a Covilhã - UBI - onde tinha o meu herdeiro, de um pobre já universal, onde se licenciou na mesma especialidade da que tens. Esmifrei-me, mas ele correspondeu, como de seguida, também correspondeu no mestrado (que não sei como se chama a especialidade) no ISEG, aí por baixo.
Agora, já de sua conta, está a escassos meses de «discutir» uma tese doutoramento em Espanha. E nas duas fases anteriores «limpou» monetáriamente os prémios atribuídos por algumas Entidades, entre elas a do ISEG, cujo prémio era da ANA.
Ele ficou com o cheque e eu com a fotocópia...

O Marnel eram uns hectares de arroz, agora é um deserto de selva, mais coisa menos coisa. O monte que fica entre este e o rio Vouga, a escassas centenas de metros entre si e de minha casa, o célebre «Cabeço do Vouga», estrategicamente um local de vigilância e defesa de alguns povos, mesmo antes dos romanos, os quais deixaram por cá bastantes vestígios, postos a descoberto por escavações realizadas por arqueólogos da Univ Coimbra e já antes por particulares, nos anos 40/50 do séc. anterior.

Como disse, perdi-me. Peço desculpa pela extensão.

Para ambos e para todos os camaradas que deste blogue imaginam a sombra de um grande poilão, vai um grande abraço,

JM Ferreira