Hoje estando eu sentado diante do meu ordenador lembrei-me de contar-te uma história bonita que se passou com dois loucos ex-combatentes da Guiné que se conheceram através do blogue e por haverem estado os dois em Catió.
Por certo no mesmo batalhão mas em datas diferentes, esses dois loucos são o Manuel Dias Pinheiro ex-1.º Cabo Radiotelegrafista e o António Melo ex-1.º Cabo Rec Inf, como te deves recordar, foste tu quem nos puseste em contacto depois do pedido do Manuel, do meu email e eu com muito gosto lhe respondi.
Daí em diante temos trocado varia correspondência, eu ao ler o que me contava convidei-o a fazer parte do nosso blogue, ele se me escapou, te garanto que é bom rapaz mas se me escapa com muita habilidade, mas te asseguro que este terá que fazer parte do nosso blogue. Depois de vária correspondência trocada já acertamos que iremos a um almoço do blogue para nos conhecermos pessoalmente visto que neste momento estamos bem longe um do outro, eu em França e ele em Espanha e não nos é muito fácil encontrarmos porque nos separa mil e duzentos quilómetros mas como te digo este vai cair.
Carlos à parte te mandarei um extracto de um email que ele me mandou para que tu com a tua paciência e amabilidade componhas este email porque te digo não tenho impressora para poder compor.
Carlos agora também quero através deste blogue pôr em apertos o Manuel e convidá-lo a juntar-se a esta família que é o blogue e como agora o convite é publico quero ver se esse louco da colina dá o nega ao meu convite.
Gracias
Manuel
2. Primeira mensagem do nosso camarada Manuel Dias Pinheiro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, enviada ao nosso tertuliano António Melo:
Um amigo que nunca mentiu
Se me recordo da viagem para Catió!!!
Te conto uma história muito grande e assim não estás aborrecido tu e eu.
Assentei praça no RI8 em Braga no dia 28 de Julho de 1969. Aí fiz a instrução e no dia 28 de Setembro do mesmo ano fui para o Porto para o Regimento de Transmissões na Arca d'Água, aí estive fazendo a especialidade de radiotelegrafista até ao dia 22/2/1970. Passei ao Regimento de Transmissões, fui promovido a 1.º Cabo e aí fiz um estágio muito bom, onde fazia de Cabo Dia e algum Cabo de Reforço. Como já tinha muito tempo pensava que já não ia à guerra, mas a notícia chegou no dia 25/6/1970, o 1.º Cabo Radiotelegrafista NM 114485/69 vai para a Guiné. Embarquei no Uíge no dia 18/07/1970 e chegou o periquito à Guiné no dia 24/07/1970. Como ia em rendição individual fui no porão da mercadoria, bom depões de dois dias de viagem chegou o pior o enjoo mas tudo passou.
Chegando a Bissau lá fomos para o Quartel General a que o Agrupamento de Transmissões estava adido, só mais tarde já no ano 1973 tinha as suas instalações próprias. Chegando a Bissau me dão uma folha para preencher na qual havia uma pergunta, se tinha algum familiar na Guiné, como tinha um primo, diz o Manuel: tenho um primo! Então havia um colega que estava esperando transporte para Catió, esse já não foi para Catió e foi o Manuel, tendo o outro ido para Piche. Quando chegou o dia de ir para Catió lá fui por mar, deram-me então uma ração de combate mas não água. Ia com os marinheiros e mais embarcações de civis, esses senhores marinheiros bebendo as suas cervejas e comendo a sua boa comida e o pobre do Manuel olhando para eles que nem sequer perguntaram se queria água ou comida.
Lá fomos, a água entrava por um lado e saía pelo outro e eu dizendo: estou "feito", aonde vim parar. Seguindo com a viagem, chegámos já à tardinha. Pararam os motores quando entrámos nas bolanhas, agarraram as metralhadoras e eu como parvo olhando para eles e pensando: isto é guerra! Mas lá chegámos na paz de Cristo. O transporte esperando e lá cheguei a Catió. Perguntei pelo meu culpado primo que de imediato me deu um grande abraço, chorando. Fomos beber umas bazucas, depois de ter passado tanta sede até já tinha vontade de beber. Deu-se a casualidade que a minha tia tinha mandado uma caixa com umas garrafinhas de vinho, uns salpicões e outras coisas. Dizia a minha Tia que tinha uma alma muito grande, e assim foi, o destino é grande e nunca fujas a ele.
À minha Maria só menti uma vez, foi quando lhe disse que casava com ela, e até essa mentira foi mentira porque casei com ela quando vim de ferias em julho de 1971. Casámos e volvi a cumprir o meu dever para com a pátria. Por coincidência hoje faço 41 anos de casado e cinco de noivos, uma vida. Como se aguenta?
Quanto às fotos não te preocupes que destas tenho muitas e mais fortes, assim prepara-te mas na condição de não fazeres coisas mal feitas.
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3. Segunda mensagem de Manuel Pinheiro a António Melo:
Baseando-me na tua publicação no blog de Luís Graça decidi juntar a parte dois que é a mais triste.
Depois de chegar a Catió e encontrar-me com o meu primo António Rodrigues do Bat 2865 e tomarmos umas bazucas, dirigi-me à minha residência temporária que era o Posto de Rádio dos Telegrafistas do Agrupamento de Transmissões. Depois da apresentação feita, com os meus camaradas que eram: o Soldado Tino de Tomar, o 1.º Cabo Pinto Costa que era do Porto e eu o ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, nesse dia não fiz serviço mas no seguinte comecei alinhar com os meus turnos correspondentes. Todos tiveram a sorte de regressar, assim começou o primeiro, o Tino depois o Costa, e como sempre uns regressam e outros vão e assim foi chegou o ex-Furriel Nelson Batalha, o Soldado João e o Soldado Miranda que era casado e tinha uma filha e, passado pouco tempo chegou o Soldado Neto que era de Almada.
Vão passando os dias e de pronto chegam as más noticias, em Dezembro chega um telegrama para o Soldado Miranda, com a triste noticia que havia falecido a filha, me recordo perfeitamente era o seu turno e quando abriu o telegrama começou chorando e eu também, mas como era guerra o que fiz foi agarrar a chave de Morse e como um valente transmitindo. Os dias foram passando e vais olvidando mais!
Com o tempo as coisas vão a pior porque em Janeiro chega um telegrama para mim, quando o abri partiu-se-me o coração, dizia que havia morto a minha Mãe. Já éramos dois mas como se diz não há dois sem três. O que virá depois? E assim foi, chegou o dia 14/04/1971 em que sofremos um grande ataque, no qual ficou ferido o ex-Furriel Batalha, o Neto e o João foram evacuados para Bissau nessa mesma noite. Ficamos os dois pobres, o Miranda e eu, foram tempos de muita amargura e tristeza, como éramos só os dois tocou-me chefiar o Posto de Rádio. Fazíamos turnos de 4 em 4 horas até que uns meses mais tarde chegaram dois soldados Alentejanos sem nenhuma ideia.
Como o tempo foi passando chegou também um Furriel e já estávamos todos. Entretanto em Junho fui a Bissau por motivo da morte da minha falecida Mãe e marquei as minhas queridas e desejadas férias porque tinha a minha bajuda em Portugal, desejosa da minha chegada. Assim foram os tristes dias da Guiné. Quando regressei de férias já fiquei em Bissau, era outra vida, quando comíamos as travessas de ostras e as bazucas dava gosto, tirando os maus momentos, deixam saudades esses tempos e esses aninhos que tínhamos.
Vou enviar uma foto do Posto de Rádio de Catió.
Catió - Posto de Rádio, 20 de Maio de 1971
Um grande abraço até breve
O amigo
Manuel Gomes
4. Notas do editor:
- Tentei manter a redacção o mais próximo possível com o original, emendando apenas alguns erros de português, próprios de quem há tantos anos faz vida fora de Portugal. As nossas homenagens a estes bravos camaradas que lutaram a vida inteira, primeiro na guerra e depois na paz.
- Como ambos estão ligados à nossa vizinha Espanha, como emigrantes, aplicam alguns termos que tentei manter desde que se compreenda o sentido das frases. Alguns tive que substituir.
- Removi algumas expressões mais "violentas" em vernáculo e adjectivos dirigidos a pessoas e instituições porque o autor não escreveu este texto para ser tornado público e podia não os ter escrito nesta condição.
- Caro Manuel Pinheiro, seguindo a sugestão do camarada António Melo, fica feito publicamente o convite para te juntares a nós, integrando esta Tabanca Grande. Manda uma foto do teu tempo de militar e outra actual, tipo passe de preferência, e serás apresentado como membro desta caserna virtual.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 30 de Junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10095: Os nossos seres, saberes e lazeres (46): Não trocaria por nada aquele tempo de comissão na Guiné (António Melo)
Vd. último poste da série de 25 de Junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10072: O Mundo é pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (58): O reencontro, 38 anos depois, de dois camaradas da Ponte Caium, o Cristina e o Pinto, 3º Gr Comb, CCAÇ 3546, Piche, 1972/74 (Cristina Silva, Funchal)
2 comentários:
Olá Manuel Pinheiro. Sê bem vindo ao Blogue. Cumprimenta-te o Álvaro Vasconcelos. Estive na Guiné de 70 a 72. Lê,se te fôr possivel, a minha estória, no meu nome ou em Transmissões. Estive em Alçdeia Formosa e de certeza que nos comunicamos em erviço, pois era a mesma rede.Também estive no Centro Recetor, em Bissau, de Julho de 71 até Ago de 72.
Um abraço também remêto ao António Melo e a tods os tertulianos.
Camarigo Alvaro Simões Vasconcelos
Obrigado por o teu recebimento,como te deves recordar já nos comunicamos por umas mensagens fui eu quem te falou do nosso camarada Carneiro da equipo de futabol nessa foto que enviastes para o blogue.
estou em contacto com o nosso camarada Arlindo silva,conhecido por <barba azul e conheçeu na vida civil o Marques de Braga, que neste momento não tem o numero de telefono prometeu enviar assim que seja possivel.
Um abraço e bom verano para todos os tertulianos
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