domingo, 29 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12519: Tabanca Grande (417): Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974) (2): Informações complementares

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974), com data de 14 de Dezembro de 2013:

Caros camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal
Cordiais saudações,

Começo por enaltecer e louvar a vossa competente e generosa dedicação à vida deste Blogue Colectivo de mais de 630 homens e mulheres que têm a Guiné como traço de união e que se manifestam como uma (quase) Comunidade. – Tabanca Grande.

Foi uma boa e feliz inspiração a sua criação, mas só o muito trabalho, dedicação e amor à causa tem levado a bom termo os seus objectivos ao longo dos quase 10 anos. O mínimo que posso dizer ao Luís é muito obrigado e parabéns, que torno extensivos a todos os co-editores, camaradas e amigos que o têm engrandecido com as suas participações.

Começa a ser penoso para mim continuar a adiar o envio de mais informações, que melhor me descrevam como ex-combatente na Guerra Colonial da Guiné, partilhando um pouco da minha vida aí passada nos anos de 1973 e 1974 e também dando-vos conta da minha vida presente, isto é, dando-me a conhecer um pouco mais. A minha responsabilidade ética e o respeito que sinto pelos camaradas e amigos de tertúlia assim o exigem.

As circunstâncias da minha vida presente, ainda muito ocupado com o trabalho profissional com que me esforço para “sobreviver à crise” não me concede o tempo disponível de que necessitava para escrever as minhas memórias da Guiné. Por outro lado, a minha ainda recente descoberta do blogue e a admissão como Tabanqueiro, aliada à falta de hábitos, destreza e até alguma relutância atávica no uso desta via (internet), de relações virtuais nas redes sociais, tem-me condicionado e impedido de cumprir o que era expectável. Mesmo assim, apresento as minhas sinceras desculpas.

Tinha a intenção, manifestada no acto de admissão, de iniciar de imediato uma participação efectiva enviando para publicação textos e fotos da Guiné que testemunhassem a minha vida nesses 2 anos. Cheguei a elaborar mentalmente o tipo de posts que iria propor e que intitulei de (Re)flexões onde abordaria, em episódios, vários aspectos pela minha vida militar e pela Guiné. Reflexões críticas, politico-militares, com que partilharia a minha posição e entendimento sobre as instituições políticas e militares que nos empurraram para a guerra e para o seu desfecho desastroso de que ainda hoje sofremos as consequências, mas procurando reflectir e considerar outras posições não concordantes. Escreveria como vi e senti a vida militar, cá e lá, mas também a vida das populações e territórios da Guiné, do pouco que conheci. Os meus preconceitos originais para com a instituição militar, ou antes com o militarismo classista, pernicioso, balofo e estéril, mas também da minha evolução descobrindo que entre os militares e na instituição militar também há homens bons. Partilharia alguns dos meus sofrimentos e perigos vividos em ambiente hostil, mas também algumas aventuras, camaradagem, amizades, esperanças e alegrias; uma história de 2 anos de vida que não considero perdidos e onde também fui feliz.

A necessidade de “conhecer o terreno” onde iria caminhar levou-me a percorrer um pouco a vida de mais de 9 anos do blogue e de muitos milhares de posts. Nesta busca vim a encontrar relatos impressionantes de muito sofrimento e morte que a guerra gerou, apenas uma parcela mas que eu não conhecia na sua frieza e rudeza. Compreendi melhor os efeitos da guerra em tantos camaradas que hoje sofrem no seu espírito as suas consequências; do pouco que sabia da Guiné e dos seus casos, tomei contacto com alguns relatos de grande heroísmo, coragem e valor, grandes gestos e atitudes de abnegação, de camaradagem e amor. Isto para além do manancial de informações e de relações de amizade que emana do blogue que me tem cativado, tornando-me um permanente leitor, dentro do possível, ávido de mais informações e de conhecimentos. Isto para dizer que perante o que conheço agora do blogue o que iria escrever segundo o meu projecto inicial, se me afigura irrelevante e em alguns aspectos a evitar, podendo vir a melindrar algumas sensibilidades e a última coisa que quero é que o meu contributo e participação fosse causa de sofrimento para qualquer daqueles camaradas que participaram naquela guerra, porventura entraram em combate, mataram e viram morrer quaisquer que fossem as suas motivações, convicções e razões. Para seu sofrimento já bastou o que tiveram e têm; para todos, o meu respeito, compreensão e solidariedade no seu pesar.

A seu tempo e dentro das minhas possibilidades procurarei propor alguns posts que sinta como úteis para os objectivos do blogue, dando assim o meu contributo na tertúlia. Até lá, procurarei comentar alguns dos posts que mais me interpelam, dentro da escassez dos recursos de que disponho; algumas vezes já o tenho feito e mais teria feito se tivesse mais tempo livre ou se os posts permanecessem na página durante mais algum tempo.

Desde já darei alguma informação com que estou em falta desde o meu acto de admissão (peço desculpa ao Carlos Vinhal).

Estive na CCaç 3461, do BCaç 3863, de Janeiro a Dezembro de 1973. Depois de uma passagem pelo Cumeré, onde o Batalhão aguardou embarque para a metrópole, fiquei colocado no Depósito de Adidos, em Brá, onde fiquei a exercer as funções de Oficial de Justiça. Aí, vivi bons e maus momentos e conheci pessoas interessantes com alguns momentos de algum relevo, sendo bem-sucedido até ao meu regresso, em 9 de Outubro de 1974.

Tinha casado em 30 de Setembro de 1973 aquando das férias que vim passar à metrópole. Em Fevereiro de 1974 a minha esposa foi viver comigo em Bissau, onde apesar das circunstâncias, fomos muito felizes. Ela regressou em Julho, grávida da nossa filha Margarida.

Tenho quatro filhos, três raparigas e um rapaz, e quatro netas.

Tenho exercido a minha actividade profissional desde o regresso, no ramo da industria de moldes para plásticos, como técnico de desenho e projecto, desde 1981 por conta própria com um gabinete de Engenharia e Projecto ( CEPMOLDE LDA).

Sou natural de Maceira, concelho de Leiria, nascido a 30 de Julho de 1951.

Filiação: Joaquim Fernandes e Matilde Luísa (já falecidos).

Sou cristão católico e tenho para com a Guiné sentimentos de saudade e solidariedade, alimentando sonhos e projectos de desenvolvimento, e o desejo de um dia lá voltar. Tenho uma enorme pena pelo rumo que a Guiné tem tido no pós-independência, dos crimes perpetrados, da violência que tem grassado, da falta de entendimento político e de liderança.

E por hoje não me vou alongar mais. Agradeço toda a vossa atenção e dedicação à causa. Expresso os meus votos de um Feliz Natal e Bom Ano Novo, que gostaria de tornar extensivos a toda a equipa editorial e às vossas famílias.

Um abraço fraterno.
Joaquim Luís Fernandes

PS: Envio 2 fotos que documentam a minha vida em Teixeira Pinto.

1- Como operacional em patrulhamento de carácter ofensivo, em áreas de contacto eminente, nas matas da Península do Balanguerez até Ponta Costa, bem junto à Caboiana.

2- Visita de Acção Social e Psicológica em Caió, com o camarada tabanqueiro, Alf. Méd. Mário Bravo e outros camarada da CCaç 3461, Alf Mil Moreira que estava “atabancado” em Carenque e o Alf Mil Teixeira da CCS, aquando da visita às ilhas de Jeta ou Peciche.




2. Nota de CV:

Caro camarada  Joaquim Fernandes, em primeiro lugar quero pedir-te desculpa por ter retido a tua mensagem por aqui sem a resposta atempada. A determinada altura do mês de Dezembro a correspondência é de tal modo volumosa, que se não se está atento, alguma fica para trás, ou pior ainda, sem resposta.

Agradecemos as palavras que diriges ao editores e aos camaradas em geral, afinal todos somos operários nesta missão de registo de factos escritos e por imagem daquela guerra que não quisemos, mas que fizemos na convicção de que estávamos ao serviço de Portugal.

Muito obrigado pelo complemento à tua apresentação no Poste 11742(*). Ficamos a conhecer-te melhor.

Compreendemos a tua indisponibilidade para colaborares, no blogue, com as tuas memórias, tanto mais que ainda exerces actividade profissional, como empresário, logo com responsabilidades acrescidas.

Se e quando quiseres escrever algo, não precisas de fazer auto-censura. Escrevemos de acordo com a nossa formação cívica e moral, não tendo que escrever para agradar a este ou àquele. As reacções subsequentes até são saudáveis desde que dentro da cordialidade e do respeito mútuo. Cada um de nós teve a sua guerra e até viu a sua Guiné. Não tem de haver unanimidade.

Tenho aí na zona (Pataias) um amigo, o Ismael Santos, desenhador, também ligado à indústria dos moldes. Ainda há bem pouco tempo trabalhava. Foi meu camarada no RI 5 (Caldas da Rainha), EPA (Vendas Novas), GACA 2 (Torres Novas), BAG 2 (Funchal) e CART 2732 (Guiné). Curiosamente só nos separamos enquanto fui fazer o curso de Minas e Armadilhas a Tancos (EPE).

Termino desejando-te um bom 2014, tanto no plano pessoal como profissional.
Abraço
Carlos Vinhal
____________

Notas do editor

(*) Vd. poste de 21 DE JUNHO DE 2013> Guiné 63/74 - P11742: Tabanca Grande (402): Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973/74), residente em Maceira / Leiria, tabanqueiro nº 621

Último poste da série de 28 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12516: Tabanca Grande (416): Armando Teixeira da Silva, ex-Soldado Atirador da CCAÇ 1498/BCAÇ 1876 (Có, Jolmete, Bula, Binar e Ponate, 1966/67), Grã-Tabanqueiro nº 636

1 comentário:

Hélder Valério disse...

Caro camarada Joaquim L. Fernandes

Li com atenção e interesse este teu texto.
É já um bom relato, em jeito de intróito, do que foi o percurso militar, incluindo a vivência na Guiné.

O comentário colocado pelo Carlos V (caro Joaquim, comecei a tratar assim o Vinhal e agora já reage favoravelmente a esse tratamento de realeza...) é absolutamente justo e contém, em termos de 'aconselhamento' tudo o que eu poderia fazer.

Não te preocupes com 'qualidade literária'. Isto aqui não é, não pode ser, nenhuma 'feira de vaidades', embora alguns, de vez em quando, teimarem em dizer isso, injustamente, e provocarem (inadvertida ou intencionalmente) alguns 'afastamentos' de colaborações mais activas.

Faz como fizeste. Relembra-te das situações, dos episódios, dos acontecimentos, dos dramáticos, dos divertidos, dos que te provocam ainda um arrepio na espinha, um sorriso ou um sentimento de nostalgia e vai contando.
Não tenhas a preocupação, muito comum a todos nós, de 'contar tudo' de uma vez. Assim parecer-te-à que desabafas tudo mas acabas por esgotar o reportório e ficas a pensar que já não tens mais nada para contar, embora depois sejas capaz de reconhecer que este ou aquele episódio podiam ter sido mais e melhor desenvolvidos.

Vai com calma.
O trabalho, a actividade profissional é importante mas sempre se pode 'roubar' um bocadinho de tempo para 'reviver o passado' e principalmente 'avivar a memória'.

Abraço
Hélder S.