quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15556: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (50): Na minha língua materna, o fula, não existe a expressão "Feliz Natal"... Mas felizmente que a Guiné-Bissau é um país de tolerância religiosa, em que as duas religiões monoteístas, Islamismo e Cristianismo, coexistem bem com o animismo


Guiné-Bissau > Bissau >  2004 > Festa do Tabaski (ou do carneiro) (em árabe, Aïd el- Kebir ou Aïd el-Adha) > O nosso grã-tabanqueiro Cherno Baldé com os seus 4 filhos...  A festa do Tabaski (designação corrente nos países de forte tradição muçulmana da África ocidental)  é, a seguir à festa do fim do Ramadão, a mais importante do Islamismo, equivalente ao Natal cristão. A data é variável, em 2015, foi a 24 de setembro.

"Segundo o Islamismo, o filho herdeiro de Abraão foi Ismael e não Isaac. Esta festa é a comemoração do Livramento, do filho de Abraão que foi substituído por um cordeiro no momento exato em que seu pai iria sacrificá-lo, em obediência ao Senhor. Esta providência divina livrando (segundo o Islão) a Ismael, pai da nação árabe e antepassado do profeta, é lembrada anualmente por todo o povo muçulmano, como a Festa do Sacrifício ou a Festa do Cordeiro." (Fonte: Ordidja)

Foto: © Cherno Baldé (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legenda: LG]



Guiné-Bissau > Região de Bissau > Tabatô > 28 de Novembro de 2009 > A cerimónia do Tabaski... em que pela primeira vez participaram três europeus, não-muçulmanos, duas portuguesas e um espanhol... Uma das portuguesas foi a Catarina Meireles, médica, antiga aluna do nosso editor Luís Graça e amiga do nosso grã-tabanqueiro João Graça... Nesta foto temos uma vista geral da assembleia, durante a cerimónia do Tabaski, na aldeia mandinga de Tabatô, a escassos 10 km de Bafatá, na estrada Bafatá-Gabu. É a terra do nosso grã-tabanqueiro Mamadu Baio, ator e músico. (*)

Foto: © Catarina Meireles (2010). Todos os direitos reservados[Edição e legenda: LG]


1. Mensagem, de 29 do corrente, do nosso amigo  Cherno Baldé em resposta a um pedido do nosso editor ("Eh!, Cherno Baldé, aí em Bissau, bom dia!... Como se diz 'Feliz Natal'  na tua língua, em fula ?") (**)

Bom dia, amigo Luis! Que a paz esteja contigo e que tenhas um feliz Natal junto a familia.

Na minha lingua materna (Pullar), não existe a expressão "feliz Natal" porque o Natal é uma invenção recente, histórica e religiosamente falando, pois fosse mais antigo seria aceite e incorporado nas festividades religiosas muçulmanas porque o Profeta Mohamed sempre se via como o Profeta da continuidade das duas grandes religiões monoteistas anteriores e não enveredou pela ruptura, mesmo se os 'Surats' chamados de Medina são muito críticos em relação aos Cristãos e sobretudo aos Judeus que a habitavam e que estavam relutantes em o reconhecer como verdadeiro profeta e acima de tudo unificador.

Mas, ser Guineense significa, de uma certa forma, situar-se um pouco no meio das duas religiões e sobretudo solidarizar-se com os irmãos das outras confissões o que, penso eu,  representa uma particularidade específica da Guiné-Bissau, país onde a maioria muçulmana nunca esteve em confronto com a minoria cristã e onde os adeptos das religioes monoteístas nunca estiveram muito afastados das práticas e cultos animistas.

Esta convivência pacífica, em parte, é uma herançaa e resultou da prática colonial que ao mesmo tempo que promovia a religião cristã no seio dos povos do litoral animista e anti-colonial, era obrigada a colaborar com os muçulmanos por força da sua moderação e aliança no seio do "pacto colonial".

Já deixei os meus contactos para um possível encontro com o João Martel e a Ana Maria Gala [, voluntários na Missão da Cumura].

Para si e a todos os editores, assim como todos os restantes Régulos, Almamis, Conselheiros e Djargas da Tabanca Grande os meus votos de um bom e excelente novo ano, cheio de prosperidade, saúde e longa vida.

Um abraço amigo de muita saudade desde Bissau (Guiné-Bissau).
Cherno A. Baldé, Chico de Fajonquito

PS - Sobre o que disse antes, queria acrescentar o facto amplamente conhecido de que o venerando Cherno Rachid de Quebo (Aldeia Formosa) era um dos mais bem escutados Conselheiros do gen Spínola durante todo o período que esteve na Guiné como Governador e Com-Chefe da Provincia e, certamente os dois se terão influenciado mutuamente, facto que vem reforcar a tese da convivência pacífica.
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 8 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6695: Memória dos lugares (89): Bafatá, Tabatô, Tabaski 2009: Não há preto nem branco, somos todos irmãos, disse a Fátima de Portugal numa cadeia de união... (Catarina Meireles)

 (**) Último poste da série > 1 de agosto de 2015 >  Guiné 63/74 - P14956: Relativamente ao desaparecimento do Alferes Leite, trata-se de um caso do qual ouvi falar desde a minha infância (Cherno Baldé)

6 comentários:

Juvenal Amado disse...

Amigo Cherno


Um grande abraço e desejo de um 2016 prospero e feliz

Antº Rosinha disse...

Os povos da Guiné-Bissau deviam ser exemplo como se pode viver sem guerra entre irmãos e vizinhos.

Exemplo para a Europa de hoje e África de sempre.

Existe uma harmonia religiosa e étnica na Guiné, que só mesmo o PAIGC é que está, sempre esteve, a mais como um corpo estranho.

Tudo parece tão natural naquela diversidade de gente, que não merecia aquela alcunha de «Estado falhado».

Bom ano para todas as etnias do Minho a Timor

Gil disse...

Bom Ano, Caro Cherno.

Abraço do V.Briote

Luís Graça disse...

Deus, Alá e os bons irãs protejam a Guiné-Bissau e o seu povo em 2016... E sobretudo abram uma grande picada de esperança, do Cacheu a Cacine, de Buba a Buruntuma, do Gabu a Bubaque, de Bissau a Bafatá...

Que seja igualmente um ano benfazejo para os nossos amigos e irmãos, a começar pelo nosso querido Cherno Baldé e sua família. LG

Anónimo disse...

Meu caro Cherno,
No PelCaçNat #56 coexistiam pacíficamente crentes dos grupos que mencionastes. Era impressionante e uma lição de vida.
Um dos professores da escola era o 1°Cabo Joãoazinho, Manjaco, católico praticante. Os alunos, jovens e militares, eram na sua maioria animistas e muçulmanos. Nos treze meses que passei em São João nunca me apercebi de qualqer falta de respeito por divergências religiosas.
Para ti, para os teus familiares, para as gentes da Guiné votos de um Ano de Paz e de Prosperidades.
Abraço,
José Câmara

Hélder Valério disse...

Para o Amigo Cherno, aqui vão as saudações e o desejo de um Bom Ano Novo (mesmo que pelo calendário ocidental...) e com sucesso profissional e pessoal, para ele e família.

Quanto às observações sobre a tolerância religiosa pois também acho que ali, na Guiné, seja a 'portuguesa' como também na actual 'guiné-bissau', essa possível divergência não era visível, nem sequer motivo de controvérsia no tempo da nossa permanência lá.
Claro que questões de estratégia política podem ter contribuído fortemente para isso, mas não me recordo de um único problema motivado por diferenças de religião.

Abraço e Bom Ano
Hélder Sousa