sábado, 27 de julho de 2024

Guiné 61/74 - P25781: Lições de artilharia para os infantes (11): A artilharia portuguesa, até à década de 90, nunca teve condições para efectuar a Preparação Teórica do Tiro (Morais Silva, cor e prof art AM, ref; ex-cap art, instrutor 1ª CCmds Africanos, Fá Mandinga, adjunto COP 6, Mansabá, cmdt CCAÇ 2796, Gadamael, 1970/72)



Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971 > A famosa e feliz foto do ex-alf mil médico Amaral Bernardo, membro da nossa Tabanca Grande desde Fevereiro de 2007: a saída do obus 14, de noite.

"Foi tirada com a máquina rente ao chão. Bedanda tinha três. Uma arma demolidora. Um supositório de 50 quilos lançado a 14 km de distância... Era um pavor quando disparavam os três ao mesmo tempo... Era costume pregar sustos aos periquitos... Eu também tive honras de obus, quando lá cheguei... Guileje não tinha nenhum obus, mas sim três peças de artilharia 11.4. A peça era esteticamente mais elegante do que o obus" - disse-me o Amaral Bernardo, no dia em que o conheci pessoalmente, no Porto, no seu gabinete no Hospital Geral de Santo António, que era então a sua segunda casa, e onde era o director do ensino pré-graduado da licenciatura de medicina do ICBAS - Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar/HGSA Ciclo Clínico (ou seja, responsável por mais de meio milhar de alunos, um batalhão; reformou-se, entretanto]...

Foto (e legenda): © Amaral Bernardo (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem de Morais Silva (cor art ref; foi professor de artilharia e investigação operacional durante duas décadas, na Academia Militar; ex-cap art, cmdt  CCAÇ 2796, Gadamael,  instrutor 1ª CCmds Africanos, Fá Mandinga, adjunto COP 6, Mansabá,1970/72; colabora com o nosso blogue desde 31/5/2010; integra formalmente a nossa Tabanca Grande desde 17/3/2019; tem 142 referências no blogue; página na Net:  https://www.moraissilva.pt/):


Data - 26/07/2024, 21:54
Assunto - 

Caro Luís

Afinal resolvi fazer o seguinte comentário “educativo” (*):

A afirmação de Domingos Robalo "No CTIG, devido à rarefação do ar (pressão atmosférica reduzida), este alcance tabular tem um incremento de 10%" sugere-me um muito breve apontamento teórico sobre o tiro de artilharia. (**)

A trajectória de um projéctil é afectada por:

1. Condições balísticas : "Gastamento do tubo" e "Temperatura da carga" que afectam a Velocidade Inicial da granada e, portanto, o alcance do tiro. Para um obus/peça o efeito conjunto deste dois parâmetros só pode ser conhecido, para cada carga, dispondo de um Velocímetro que na nossa Artilharia só apareceu na década de 90...

2. Condições aerológicas: "Rumo donde sopra o vento" para calcular os efeitos longitudinal e transversal respectivamente nas Distância e Direcção do tiro. "Temperatura e Densidade do ar" para obter correcções na distância de tiro. Para calcular o efeito destes parâmetros é necesssário dispor de uma estação meteo (Meteogramas) e só na década de 80 passamos a dispor desta facilidade.

Resumindo, a Artilharia portuguesa, até à década de 90, nunca teve condições para efectuar a Preparação Teórica do Tiro. E porque assim foi, o atrás referido “incremento de 10%” não tem suporte analítico que eu conheça.

Nos 3 TO a artilharia usava a prancheta topográfica que, na Guiné, dispunha do suporte da preciosa carta totográfica 1:50000.

A distância topográfica e diferença de cota determinavam Carga e Elevação do tubo. Os Rumos Posição-Objectivo e de Vigilância permitiam calcular a Direcção topográfica que era corrigida da Derivação tabular associada ao tempo de voo.

Procedimento simples cuja eficácia era afectada pela localização "estimada" das bocas de fogo do IN...

Ainda hoje não entendo porque não foi prioritária a aquisição de radares contra-morteiro que transformassem a nossa artilharia "barata-tonta" em "barata-inteligente e eficaz".

Última nota para alguns Oficiais artilheiros-infantes que recorreram à observação aéra/terrestre, para obter correcções empíricas para a distância topográfica e assim melhorar as condições balísticas para o "Apoio próximo". Era poucochinho (100, 200 metros) mas melhor do que nada.
Abraço

Morais Silva

(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)
__________

Notas do editor:


Vd. também poste de 26 de julho de 2024 > Guiné 61/74 - P25777: Casos: a verdade sobre... (47) "Fogo amigo", Xime, 1/12/1973: o obus 14 cm m/43 usava a granada HE (45 kg) com alcance máximo de 14,8 km... (Morais Silva, cor e prof art AM, ref; ex-cap art, instrutor 1ª CCmds Africanos, Fá Mandinga, adjunto COP 6, Mansabá, cmdt CCAÇ 2796, Gadamael, 1970/72)

4 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O nosso camarada artilheiro Morais Silva ("comandante operacional" é camarada...) já aqui, por diversas vezes, tem usado esta sugestiva imagem da "barata tonta" (aplicada à nossa artilharia bem como à do Zé Turra)... E agora percebe-se melhor porquê...


(...) "Na Guiné, as artilharias das NT e do IN eram baratas tontas que actuavam por 'intuição' a partir do som e do conhecimento do terreno (quem o conhecia a palmo).

Muitas vezes pedi ao meu Cmdt-Chefe que me arranjasse um radar contra-morteiro e o problema da artilharia IN era assunto arrumado. Infelizmente nunca recebi o 'presente'." (...)



28 DE AGOSTO DE 2019 > Guiné 61/74 - P20103: Dossiê Guileje / Gadamael (33): "Basófia muita, ciência pouca e assistência benévola ou ignorante" (diz o cor art ref Morais da Silva, antigo professor de tiro de artilharia da EPA e da Academia Militar), a propósito da comunicação de Osvaldo Lopes da Silva, apresentada em Coimbra, em 23/5/2013

Fernando Ribeiro disse...

Fiquei embatucado quando li que no CTIG a pressão atmosférica era reduzida. Como assim? Como é possível que se diga que a Guiné tem uma pressão atmosférica reduzida, se ela está quase ao nível do mar? Fui confirmar, acedendo ao Accuweather.com, e verifiquei que, neste exato momento em que escrevo, a pressão atmosférica em Bissau é exatamente igual à de Lisboa: 1012 milibares, o que é equivalente a 0,9987663462 atmosferas. Esta é uma pressão atmosférica normalíssima para um local situado ao nível do mar, nem outra coisa seria de esperar. Muitas vezes repetimos afirmações que outros já fizeram, sem confirmarmos se elas estão certas ou erradas. Também acontece comigo.

Valdemar Silva disse...

Caro Fernando Ribeiro.
Julgo que em locais de temperaturas mais quentes, a pressão atmosférica tende a ser menor.
Provavelmente, hoje na Costa da Caparica está a mesma temperatura de Bissau, assim sendo terão a mesma pressão atmosférica.
Por lá deve haver sempre a mesma pressão atmosférica, que me lembre nunca havia vento apenas se formando uns minúsculos tornados que levantavam poeira, com o aproximar da época das chuvas, o quer dizer que não havia diferenças de pressão atmosférica assinalável.

Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz

Fernando Ribeiro disse...

Caro Valdemar,
É verdade que quanto mais quente o ar estiver, mais ele sobe. Falta saber até que ponto este efeito se reflete nos valores da pressão atmosférica. Lembro-me de que antigamente havia em muitas casas um barómetro com um ponteiro, que indicava o estado do tempo conforme a pressão atmosférica: "Bom Tempo", "Variável", "Chuva", "Temporal", etc. Esses barómetros não faziam qualquer distinção entre o tempo quente e o tempo frio. Eu mesmo visito quase todos os dias o site do Serviço Meteorológico (agora chamado IPMA) desde o ano 1995, mais ou menos. Já são muitos anos! Nunca me apercebi de qualquer variação da pressão atmosférica consoante está frio ou está calor.

O Accuweather é um site muito traiçoeiro, que parece querer esconder as pressões atmosféricas, mas acabei por conseguir saber qual é a pressão numa localidade do litoral da Patagónia, no extremo sul da Argentina, onde agora é inverno. A localidade chama-se Río Gallegos e o Accuweather informa-me que neste momento está lá uma pressão de 1015 milibares, para uma temperatura do ar de 1 grau e céu pouco nublado.

Por outro lado, na localidade de Longyearbyen, que fica no arquipélago norueguês de Svalbard, no meio do Ártico, e onde agora é verão, está uma pressão atmosférica de 1012 milibares e uma temperatura de 12 graus. 12 graus no Ártico deve ser um calor de rachar para os habitantes de Svalbard! A propósito deste arquipélago situado entre a Europa e o Polo Norte, e onde o "lapão" José Belo deveria sentir-se em casa, indico a seguir dois endereços, um para ver e o outro para ouvir:

https://bjornfree.com/travel/2024/01/longyearbyen-by-the-sea-for-free/

https://www.aor.am