1. Mensagem de Manuel José Ribeiro Agostinho, ex-Soldado Radiotelefonista, Condutor Auto e Escriturário, (QG/Bissau, 1968/70), com data de 25 de Março de 2009:
Meus caros amigos Luís Graça, Virgínio Briote e Carlos Vinhal:
Começo por os saudar e dar os parabéns pelo vosso trabalho que é merecedor dum grande aplauso. Saúdo também toda a enorme tabanca que faz parte deste BLOGUE, a que aderi como visitante quase diário, desde que tomei conhecimento dele num Convívio de Ex-combatentes da Guiné em Esmoriz, já lá vão cerca de 3 anos. Não tenho participado por ter uma vida muito activa, mas como o tema (*) era convidativo, aqui estou... mas vou começar pelo princípio.
Agora há que fazer as apresentações da praxe, então aí vai:
MANUEL JOSÉ RIBEIRO AGOSTINHO, ex-Soldado de Infantaria com a Especialidade de Radiotelefonista/Condutor Auto, (Escriturário).
No CTI da GUINÉ estive sempre em BISSAU, mas lá iremos mais tarde.
Sou natural de LEÇA DA PALMEIRA, terra onde resido. Sou casado com a ELISABETE, temos duas filhas e duas netinhas.
Junto as minhas fotos como ditam as regras.
Sobre a minha mobilização para a GUINÉ, começo por fazer uma introdução, o início da incorporação que me levou a tirar a recruta em Espinho (GACA-3), sendo de seguida recambiado para Lisboa (BC-5) para tirar a especialidade de Radiotelefonista, para vir depois novamente para o Porto (CICA-1) tirar a carta de condução de Ligeiros, para depois ainda no Porto seguir para o (RC-6) tirar a carta de Pesados. Depois destas especialidades todas, voltei a Lisboa ao BC-5.
Voltei a ser colocado no Porto no (RI-6), onde começou a etapa da minha vida militar que teve reflexos futuros. Passo a explicar.
Chegámos num sábado de OUTUBRO de 1967 a Lisboa, um grupo de 7 militares do meu pelotao para sermos distribuídos por diversas unidades, sabendo eu nesse dia que viria novamente para o Porto. Passei um bom domingo com os amigos de Matosinhos que tinham tirado as mesmas especialidades, o José António e o Humberto Vieira Pereira que iam para outros destinos no Alentejo, mas para diferentes unidades. Divertimo-nos imenso, fomos ver um Benfica-Leixões e a seguir um jogo de hóquei em patins no Benfica de LIVRAMENTO. Muitos copos até dormir no cinema e dormir no quartel, até que chega a segunda de manhã e acordam-me para as despedidas. Lá me despedi deles e infelizmente do Humberto, pessoalmente para sempre, pois viria a falecer em fins de 1968 em Bambadinca.
Abro um parentesis para contar esta pequena história.
Estando eu em Bissau e ele no mato, trocávamos correspondência com frequência. Certa ocasião, uns dias depois de ter estado comigo, tendo-lhe escrito um aerograma como era habitual, o mesmo veio devolvido sem explicações. Mais tarde vim a saber por um colega de Bambadinca que tinha levado com uma roquetada dum cubano, quando ia buscar água à fonte fora do quartel. Gostaria, se alguém tiver dados mais concretos, que me dessem mais notícias sobre este caso.
Mas, então a seguir a essa segunda-feira, depois de acordar, alguém me vem dizer que afinal já não ia para o Porto, mas para Bragança. Protesto daqui, protesto dali e consigo dar a volta ao assunto e desfazer a panelinha que tinham cozinhado. Como eu tinha a melhor nota dos sete colocados acima de mim, impus a minha razão, com a ajuda de um alferes que me levou ao Capitão e que mandou sacrificar outro, ao sargento da secretaria.
Naquele momento tudo ficou para mim em ordem, mas mais tarde teve os seus reflexos quando me quiseram mobilizar.
Regressei então ao Porto e passei a trabalhar na secretaria do RI-6 até que, já em Abril de 1968 e tendo já quase todos os da minha especialidade avançado para o Ultramar, pensando eu que ja não iria, apareceu uma carta da Repartição de Mobilizados, com conhecimento ao RI-6, a dizer que eu não estava nem em Bragança nem em Abrantes, onde devia estar. Passaram mais uns dias e lá estava eu a avançar para Abrantes com destino a embarcar para a Guiné.
Quando soube da notícia fiquei pior que estragado, pois tinha namorada e ter que avançar assim, sem mais nem menos, tornava-se pesado. Dar a notícia em casa aos meus pais foi duro, só eu sei como a minha mãe sofreu. No dia seguinte, quando acordo, mais uma bomba em casa. Na Guiné tinha desaparecido o meu vizinho Rui Rafael da CCS/BCAV 1986 em BUBA. Algum tempo mais tarde, outra notícia negativa, desapareceu o Sargento da Marinha, Lamarão, na Guiné, amigo do meu Pai.
Rui Rafael Moreira, à esquerda, que esteve preso em Conakry e foi libertado dutante a Operação Mar Verde, apesar de emigrado em Espanha, esteve presente no I Encontro dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos. À direita José Oliveira (Mestre Zé Cartaxo), ele também um dos organizadores destes Encontros.
Devem estar a ver a minha mobilização com tantos festejos e desde fins de Abril até 10 de Agosto, tempo que demorou até que embarquei em rendição individual no n/m ALFREDO DA SILVA em Lisboa, passando por casa (Porto de Leixões), Cabo Verde (Mindelo e Praia) até que cheguei a Bissau, no dia 20 de Agosto de 1968, com destino a uma companhia que gostaria de saber qual (?) , que tinha vindo embora a 18/08/68, dois dias antes no UIGE.
N/M Alfredo da Silva pertencente à Sociedade Geral
Foto retirada do site Navios no Sapo, com a devida vénia.
Vista aérea do Porto de Leixões, reconhecendo-se as povoações de Leça da Palmeira e Matosinhos, respectivamente a Norte e a Sul da zona portuária
Por agora ficamos por aqui, prometo voltar mais tarde.
Um abraço para todos
Ribeiro Agostinho
2. Comentário de CV
É com particular alegria que recebo na nossa Tabanca, muito mais que um camarada, um amigo de longa data.
Tivemos caminhos paralelos, ele no Liceu, eu na Escola Industrial, ele com empregos no Privado e eu na Função Pública. Ele a vir embora da Guiné e eu a ir para lá.
Ribeiro Agostinho é hoje um respeitado comerciante de máquinas ferramentas, sempre disponível para ajudar os amigos, que lhe custam por vezes as suas horas de descanso.
É o principal incentivador dos Encontros anuais dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos, a ele se devendo a organização dos mesmos (**).
Sabendo-o um leitor diário do nosso blogue, sempre o incentivei a entrar para a nossa Tabanca Grande, ao que ele respondia estar a pensar, mas que o tempo livre lhe é escasso e achava que tendo cumprido a sua comissão só em Bissau, se sentia mal entre os operacionais.
Fiz-lhe ver que na guerra tinha de haver gente em todo o lado. Os mais sortudos ficavam em Bissau ou iam para o mato, não lhes acontecendo nada e os menos afortunados, mesmo em Bissau, morriam de acidente ou doença. Quem ia para o mato, além da doença e dos acidentes, tinha a morte por perto quando em situação de combate.
Não podemos monesprezar o trabalho de quem em Bissau tratava dos nossos vencimentos, da nossa alimentação, dos sobressalentes para as nossas viaturas, do nosso correio e, muito, mas muito importante, de quem nos recebia, quando feridos com mais ou menos gravidade, chegávamos ao Hospital.
Sei que o Ribeiro Agostinho organizou uma tertúlia de Matosinhos em Bissau, onde eram recebidos todos os matosinhenses, sendo-lhes minimizado o efeito da chegada a um sítio desconhecido. Quem não se lembra da alegria que era encontrar um conterrâneo por aquelas bandas?
Não vou pedir ao Agostinho que conte as suas aventuras enquanto combatente, mas que nos conte como reagiam os nossos conterrâneos quando o viam. Não podemos esquecer que ele estava na Secretaria do QG e que pelas suas mãos passava toda a correspondência não secreta, logo sabia quem chegava e quem partia, principalmente os de rendição individual, os mais traumatizados.
Caro Agostinho estás apresentado à Tertúlia. És um membro de pleno direito, quanto mais não seja, por fazeres o que ainda hoje fazes pelos ex-combatentes da Guiné.
Deixo-te o habitual abraço (virtual) de boas-vindas dos atabancados.
Será que me vais acompanhar no próximo encontro da Tertúlia? Deves-me esta.
Ribeiro Agostinho falando às tropas, no III Encontro dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos, realizado no passado dia 7 de Março de 2009
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 24 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4075: O trauma da notícia da mobilização (2): No dia da minha inspecção, ali estava eu, em pelota... (Joaquim Mexia Alves)
(**) Vd. poste de 14 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4030: Convívios (100): III Encontro dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos, dia 7 de Março de 2008 (Carlos Vinhal)
Vd. último poste da série de 29 de Março de 209 > Guiné 63/74 - P4096: Tabanca Grande (128): Orlando Pinela, militar da CART 1614 (Guiné, 1966/68)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
Ribeiro Agostinho:
É um esclarecimento e, simultaneamente, um agradecimento por recordares um Camarada que combateu na minha Companhia, fora do arame farpado e não pertenceu, como eu e os da 2339, a "tropa fandanga ou macaca". Nem sabemos o que isso é.
Escrevo rápido, a lutar contra o tempo. Tenho um escrito sobre a emboscada na fonte de Mansambo. Quando passar á tecla envio-te ou o Carlos Vinhal, como mando sempre ou directa ou com Cc ao Blog, se não for publicado, mesmo que seja, vai ter contigo.O Carlos...
O Soldado Humberto Pereira Vieira, soldado Trms nº07459167, faleceu em COMBATE, vitima de ferimentos recebidos numa emboscada, comandada por internacionalistas ou mercenários cubanos, na zona da fonte de Mansambo em 19 de Setembro de 1968.
Foi o maior desaire da Minha Companhia.
Nunca se esquecem os Amigos.
Bem vindo á Tertúlia.
Um abraço do Torcato de Mansambo
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