domingo, 10 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7109: Historiografia da presença portuguesa em África (38): António da Silva Gouveia, fundador da Casa Gouveia, republicano, representante da colónia na Câmara dos Deputados, na 1ª legislatura (1911-1915) (Parte II) (Carlos Cordeiro)




 A Província da Guiné foi criada em 1879, depois de separação administrativa de Cabo Verde. A capital foi instalada em Bolama, até 1941. Em 1903 o Banco Nacional Ultramarino inaugurava a sua agência em Bolama. A cidade começou a ter alguns belos edifícios de traça colonial, mas ainda em 1912 faltava um cais acostável... A falta de infra-estrtuturas portuárias (tanto em Bolama como em Bissau) é aqui evocada pelo deputado republicano António Silva Gouveia, um típico africanista do Séc. XIX que se instalou em Bolama justamente em 1879 e aqui criou a maior empresa daquela colónia africana, a Casa Gouveia (mais tarde, em 1921, adquirida pela CUF - Companhia União Fabril). 

De 1911 a 1915, António Silva Gouveia teve assento na Câmara dos Deputados, como representante da Província. Este homem, de que se desconhecem muitos aspectos da sua vida, e que antes de ser empresário e político, foi  "moço e marinheiro, piloto e capitão de navios", orgulhando-se de conhecer toda a África, ocidental e orienta, mereceria muito provavelmente uma boa história, uma boa biografia, um bom filme... Não sabemos onde nasceu nem onde morreu. Fazia gala de dizer que era "um homem que não tinha o exame de instrução primária" e que acreditava na "iniciativa privada", vociferando contra o estado (lastimável) em que se encontrava a província no início do Séc. XX.


Freixo de Espada à Cinta > 13 de Março de 2010 > Lápide assinalando o local do nascimento de Manuel Maria Sarmento Rodrigues (1899-1979), que foi Governador da Guiné na segunda metade na década de 1940.

Foto: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados.

Ainda a propósito de Bolama, é bom recordar que a ilha era conhecida dos navegadores portugueses, desde 1460, mas só em 1753 foi ali colocada um padrão com as armas portuguesas.  Em Maio de 1792, foi estabelecida na ilha uma colónia inglesa, um comunidade  de menos de 300 pessoas, chefiadas por Philip Beaver (1766-1813),  depois de negociação com os régulos beafadas e bijagós que sempre disputaram o controlo daquele território...   Em 1794 os últimos colonos europeus abandonavam a ilha. A grande maioria tinha sucumbido às doenças e aos ataques dos  beafadas e dos bijagós... 

 Em 1823, os portugueses estabelecem um posto militar em Bolama, mas a posse do território passa a ser objecto de disputa com o Governo Inglês. Há inclusivamente ataques militares às instalações portuguesas por parte dos nossos velhos aliados. Em 1860 os ingleses anexam a ilha ao território da Serra Leoa. Finalmente, Portugal e a Inglaterra concordam em submeter o litígio à arbitragem do Presidente dos Estados Unidos, o Gen Ulysses Grant que, em 21 de Abril de 1870, toma uma decisão favorável à causa portuguesa. 

Em 1879 Bolama volta a ser a capital da Guiné. Bissau já existia desde 1687, como praça fortificada e centro de comércio, mas teve igualmente uma história atribulada (e trágica): basta referir que só em 1913 (!) a ilha de Bissau foi finalmente "pacificada", por Teixeira Pinto, o "capitão-diabo"... Em 1914 foi elevada á categoria de cidade, mas o seu desenvolvimento vai acontevcer sobretudo depois da II Guerra Mundial, graças à acção do Governador Manuel Maria Sarmento Rodrigues (Freixo de Espada à Cinta, 1899- Lisboa,1979). (L.G.).

Imagens: Do blogue BNU - Banco Nacional Ultramarino (2010) (Com a devida vénia...)











Lisboa > Diário da Câmara dos Deputados >  Intervenção,  antes da ordem do dia, do representante da Guiné, António Silva Gouveia,  fundador da  Casa Gouveia, com sede em Bolama >  Sessão nº 70, de 11 de Março de 1912.



1. Continuação da publicação de excertos de intervenções do deputado António Silva Gouveia, representante da Guiné na Câmara dos Deputados, na legislatura de 1911-1915. Pesquisa de  Carlos Cordeiro, membro da nossa Tabanca Grande, Professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores, São Miguel, RAA (foto à esquerda). 
[Continua]

[ Revisão / fixação de texto / título / edição de imagens: L.G.]
____________

Nota de L.G.:

4 comentários:

Torcato Mendonca disse...

...Continua...e deve continuar.

O que era a Guiné e não só, cem anos antes de por lá termos passado...???

Parece-me já ter ouvido conversas ou debates assim...mas, eu não estava lá?! Ou eu regredi ou os discursos e os debates avançaram aí uns cem anos. Será possível? A história não se repete ou será que mudam os actores e toca-se o mesmo...

O que interessa é a continuação da Historiografia...a bem da Guiné,do nosso conhecimento sobre a Colónia, o Colonialismo e, principalmente, deste nosso País que é nosso.

AB a todos e um obrigado do T M

Antº Rosinha disse...

Foram os Silvas e os Gouveias da vida que foram os pioneiros da colonização que conhecemos.

Depois deles vinham os missionários, depois os chefes de posto administradores e governadores.

Só que estes todos iam em comissões de uns poucos anitos com passagens pagas e todas as mordomias, e regressavam à metrópole.

Os Silvas analfabetos, aprendiam as línguas indígenas, comerciavam pelo processo de permuta, e tornavam-se a única ligação credível perante os indígenas, face às autoridades coloniais que iam aparecendo.

Uma das grandes desinformações transmitida aqui na "metrópole" às tropas que iam para a guerra, é que iam para o ultramar porque os "pretos revoltaram-se porque os brancos os roubavam".

Aparecia a imagem do comerciante "cafrealizado" sem escrúpulos, tosco e à bofetada aos pretos.

Ainda no 25 de Abril, havia em Angola, regiões onde a única presença colonial era um único comerciante isolado.

Existe o caso histórico do comerciante Silva Porto em Angola no tempo de Paiva Couceiro. (wikipedia)

As autoridades coloniais como qualquer presidente de câmara, ou admonistrador de uma EP, tinham o comportamento a que hoje assistimos.

Anónimo disse...

Estou de acordo com o comentário do camarada Torcato e acrescento:

A acta apresentada data de Março de 1912.
Ora, tinham decorrido apenas 60 anos sobre a mesma quando nós passámos pela Guiné.
(no meu caso 24/12/1971 a 21/01/74).

E pergunto: O que era a Guiné quando nós por lá passámos?

As coisas tinham mudado assim tanto?
Quanto a mim, não.

E isto, considerando que estávamos lá há cerca de 500 anos e tomando também em linha de conta o incremento comercial, naturalmente potenciado pelos muitos milhares de militares que por lá passaram após o início da guerra em 1963.

Só mais um aspecto e este respeitante aos "cafrealizados" e não só, comerciantes, chefes de posto, administradores,etc.:

António da Silva Gouveia era a regra ou ele era a excepção?

Em meu entender, o texto revela uma pequena mas real amostra do colonialismo exemplar.

Um abraço para todos

José Vermelho
Ex-Fur. Milº
CCAÇ 3520 - Cacine
CCAÇ 6 - Bedanda
CIM - Bolama

Anónimo disse...

Interessantes todos estes documentos e mais ou tão interessantes os temas que eles focam. Estou de acordo com o torcato e com os restantes comentários, nós avançamos mas a história, com h, é sempre igual, dizem que se repete, mas nem com tantos doutores e engenheiros fica melhor que no tempo dos ileterados.
Não percebo.
Obrigado a todos os que contribuem para ajudar a melhor perceber tudo isto.
Um abraço para todos,
BSardinha