segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7388: Efemérides (55): Cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné (1) (Magalhães Ribeiro)

1. Em conversa com o nosso Camarada Luís Graça, eu havia-lhe dito que possuo no meu espólio documental da Guiné, de várias fotos e documentos alusivos à cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné, onde como sabeis eu, Eduardo José Magalhães Ribeiro, fui Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74, Cumeré/Mansoa/Brá – 1974. Como só agora acabei de ordenar e identificar as fotografias, inicio hoje a sua publicação.
Camaradas,
Esta matéria sobre a cerimónia simbólica da transição da soberania nacional na Guiné, para o P.A.I.G.C., foi já aqui ligeiramente abordada no blogue e vou agora desenvolvê-la na totalidade.
Devido ao seu peso informático (40 fotografias e 2 documentos históricos) terá que ser dividida em 5 postes, que tentarei colocar durante a semana que vem para que, aquelas pessoas que acompanharem a leitura, não percam a sequência de factos e fotos.
Ao iniciar esta série não posso deixar de registar o meu pensamento sobre as origens da guerra, de modo apolítico pois além de não sentir qualquer simpatia, ou nostalgia, pelo regime que cessou em 25A74, também, infelizmente, não me revejo, minimamente, nas palavras, atitudes e procedimentos dos actuais líderes dos partidos políticos da nossa tão mal servida Pátria.
Assim, resumida e pessoalmente, penso que:
O ULTRAMAR PORTUGUÊS ERA UM LEGADO HISTÓRICO DA EXPANSÃO PORTUGUESA, ANCESTRAL, REGADA COM O SACRIFÍCIO, SUOR E SANGUE DE REIS, DESCOBRIDORES, AVENTUREIROS E GUERREIROS, DESTEMIDOS, OUSADOS E VALENTES, QUE PERCORRERAM O MUNDO, LÉS A LÉS, DESCOBRINDO NOVOS MUNDOS, NOVOS POVOS, NOVOS PRODUTOS, MATERIAIS, ETC. E QUE, AO LONGO DOS SÉCULOS, FOI SENDO POVOADO E DESENVOLVIDO POR MILHARES DE PORTUGUESES, OUSADOS E DESTEMIDOS TAMBÉM ELES, À PROCURA DE UMA TERRA QUE LHES DESSE O QUE NÃO ERA DADO NO CONTINENTE, PARA SI E SEUS FILHOS E, ACIMA DE TUDO, MELHORES CONDIÇÕES DE VIDA.
Revolta-me, irrita-me e desgosta-me profundamente, ler e ouvir tanto dislate e tanta burrice em inúmeras declarações de ex-Combatentes, que, ou são ignorantes, ou são ressabiados e, ou, fantoches apalhaçados de certas filosofias partidário-políticas.
E se os idiotas estão perdoados por motivos óbvios, já o mesmo não se pode dizer dos ressabiados que com as suas serventias lacaias, deturpam factos e acontecimentos que, de algum modo, podem vir a ser fatais à honestidade, lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais que a esta matéria são, e serão, dedicadas na História de Portugal.

O fim do Império português na Guiné
Pertenci à C.C.S. - Companhia de Comandos e Serviços -, do Batalhão de Caçadores 4612/74, que foi o último batalhão que partiu para a Guiné, e também o último que de lá saiu, em Novembro de 1974, no navio Uíge.
Um dos objectivos deste contingente foi substituir o BCAÇ 4612/72, que se encontrava a prestar serviço há 22 meses na região de Mansoa e a sua última missão consistiu em assegurar a evacuação do dispositivo militar, que se encontrava estacionado naquela ex-província ultramarina portuguesa (cerca de 27 mil homens), e testemunhar alguns factos históricos.
Entre eles vou narrar um, enriquecido com 40 fotografias, que aconteceu em 9 de Setembro de 1974 - a entrega do aquartelamento de Mansoa ao P.A.I.G.C., que incluiu uma muito concorrida cerimónia oficial do último arriar da bandeira nacional e o hastear da primeira bandeira da Guiné-Bissau (simbolizando o surgir de uma nova nação), facto este que, ao mesmo tempo, incluiu a oficialização da transferência da soberania neste território.
MANSOA, 9 de Setembro de 1974
Como é do conhecimento geral, principalmente para aqueles que acompanharam as notícias, após a revolução de 25 de Abril de 1974, sobre a evolução da situação dos conflitos em África, foram quase de imediato iniciadas negociações com os movimentos de libertação, que combatiam as tropas portuguesas e que tem vindo a ser designada, ao longo dos anos, por Guerra do Ultramar ou Colonial (nas frentes de Angola, Guiné e Moçambique).
Assim, após várias reuniões para o efeito foi decidido que na Guiné, o poder administrativo, político e económico, seria transferido para os guerrilheiros do P.A.I.G.C., incluindo-se a cerimónia oficial durante a entrega do aquartelamento de Mansoa, como foi referido no dia 9 de Setembro de 1974.
Estiveram presentes nessa cerimónia; os militares da C.C.S. do batalhão 4612/74 comandada pelo major Ramos de Campos, o CMDT do mesmo batalhão – ten cor Américo C. Varino -, um bi-grupo de combate do P.A.I.G.C., um grupo de pioneiros do mesmo partido, Amélia Araújo (Maria Turra), Ana Maria Cabral (viúva de Amílcar Cabral) e seu filho, vários comandantes dos sectores norte, centro e sul do P.A.I.G.C. e suas mulheres, o comissário político do P.A.I.G.C. - Manual Ndinga e - em representação do C.E.M.E. do C.T.I.G. -, o major Fonseca Cabrinha.
À cerimónia compareceram ainda uns largos milhares de nativos locais, de diversas etnias: papéis, balantas, fulas, futa-fulas, mandingas, manjacos, etc., e umas dezenas de jornalistas de todo o mundo.
A bandeira foi arriada por mim e desta cerimónia possuo 40 fotografias, que me foram oferecidas por um dos fotógrafos suecos.
Este acontecimento foi gravado em filme e pode ver-se inserido na série televisiva: Século XX Português, da SICnotícias – Episódio sobre a “Descolonização”, acompanhado de uma entrevista guiada pelo jornalista Mário Augusto, sobre diversos factos por mim vividos nesse tempo.
P.S.: Segundo vim a saber posteriormente, após a saída do BCAÇ 4612/74 ficaram ainda em Bissau, durante mais algum tempo, dois pequenos destacamentos de tropa portuguesa, um na já ex-BA 12 - em Bissalanca e outro nas instalações que eram da Marinha, colaborando na transição e transmissão de técnicas, conhecimentos e experiências de navegação aérea e marítima, com elementos do P.A.I.G.C.


Anexo à Ordem de Serviço da CCS do BCAÇ 4612/74, do dia 6 de Setembro de 1974, assinado pelo Comandante da Companhia - Capitão António Marques Fontes -, que determinava a distribuição do pessoal de serviço, na entrega do aquartelamento e as respectivas competências de cada um. A mim, um Operações Especiais, tocou-me entregar: a cantina, a arrecadação de géneros e o refeitório, por o vaguemestre ter sido evacuado devido a doença (cirrose).


Eu a dirigir-me para o meu posto e ao fundo pode ver-se a porta-de-armas e a massiva afluência de populares que queria ser os primeiros a testemunhar in locco os factos

O Fur Mil Mec Armamento Fernandes, distribuindo entre os guerrilheiros do PAIGC, várias metralhadoras portuguesas HK-21, para eles montarem a segurança dos seus homens, no quartel, durante a cerimónia

A chegada de uma viatura, proveniente de Bissau, com um grupo de pioneiros do PAIGC


Abertura da cancela da porta-de-armas ao povo


Muitos populares foram contidos à distância e em respeito por alguns guerrrilheiros do PAIGC, podem ver-se à frente os djubis locais


A formação ordenada dos pioneiros (juventude educada e doutrinada) do PAIGC

Dois jovens pioneiros

Duas jovens pioneiras


As mulheres dos comandantes dos sectores operacionais norte, centro e sul do dispositivo militar territorial do PAIGC


Outro aspecto das mulheres dos comandantes dos sectores operacionais norte, centro e sul do dispositivo militar territorial do PAIGC
(continua)
Um abraço,
Magalhães Ribeiro
ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74

Documentos e fotos: © Eduardo José Magalhães Ribeiro (2009). Direitos reservados.
__________
Nota de M.R.:

9 comentários:

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Olá Magalhães!
Há aqui qualquer coisa que não bate certo. Então tomaste parte do BCAÇ 4612/74 e foram substituir o BCAÇ 4612/72? Por outro lado quero também dizer-te que o BCAÇ 4616 foi o que rendeu o meu BART 3873 em FEV/74.
Um abraço,
Sousa de Castro

Jorge Fontinha disse...

Alguém tinha de fechar a porta e com honra e mérito.Ninguém melhor que um Ranger, piriquito que o seja, para o fazer.Um abraço amigo, prometendo desde já, ir comentando o desenrolar da transição.
O Rager não morre, porque o Ranger não gosta de flores e no cemitério há flores!...Nunca te esqueças deste lema que nos ensinaram em Lamego.
Aquele abraço.
Jorge Fontinha

Anónimo disse...

Pertenci ao BCaç 4612/72 mobilizado no RI 16 (72/74)
Manuel Ramires

Joaquim Mexia Alves disse...

Meu caríssimo camarigo Ranger Eduardo

Disto nem falo, espero pelo resto.

Não sei se já tivemos essa conversa?

Quando eu estava em Mansoa na C Caç 15 tu já lá estavas?

Grande e camarigo abraço

Anónimo disse...

Eduardo Magalhães.

São oportunos estes textos com as fotos Históricas da entrega do aquartelamento ao PAIGC pelo simbolismo que representa e ser a fase final da guerra que lá travamos.

Quanto às apreciações que fazes, estou de acordo com elas, espero o restante deste trabalho.

Um grande abraço

Manuel Marinho

Luis Faria disse...

Amigo Magalhães Ribeiro

Estou curioso pelo descrição do desenrolar factual desses acontecimentos.
Um relato deste tipo,sentido e vistos com o olhar da época,alheado de reflexões politicas subjectivas,para mim tem interesse e é bem vindo

Um abraço
Luis Faria

Anónimo disse...

Camarigo Magalhães Ribeiro

Como utente deste aquartelamento durante um ano, anteriormente ao "calmeirão" (pela corpolência, que não pela molenguice) do bravo Mexia Alves, fiquei logo emocionado ao rever algumas fotos dos locais.

Em linguagem de caserna "conhaque é conhaque e serviço é serviço, ou vice versa tanto faz", saíu-te a ti a nomeação para executares esse acto simbólico, gostasses ou não de o fazer. Mas como militar e ainda para mais Ranger, houve que fazê-lo com honra e dignidade.

Abraço

Jorge Picado

Anónimo disse...

Camarigo Magalhães Ribeiro, ficaste para a História como Militar Português protagonista do arriar da Bandeira Nacional, em Mansoa, e como muito bem mencionas foi o princípio do "O fim do Império Português na Guiné."

Assim, na primeira pessoa ficamos devidamente esclarecidos da forma protocolar da efeméride.

Um Abraço
Arménio Estorninho

Anónimo disse...

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