Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > Mapa de Fulacunda (1956) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Gampará e da Ponta do Inglês na Foz do Rio Corubal
Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013)
1. Mais um pequena história do Carlos Barros, um de "Os Mais de Nova Sintra", 2ª C/BART 6520/72 (Bolama, Bissau, Tite, Nova Sintra, Gampará, 1972/74) (*):
As ratazanas ao ataque…
por Carlos Barros
O 3º Grupo de Combate da 2ª CART / BART 6520/72 foi destacado para Gampará, um pequeno inferno de guerra, zona conquistada “recentemente” ao PAIGC e que este movimento guerrilheiro nunca deixou de atacar, de uma forma insistente: eram constantes flagelações ao aquartelamento, inúmeras emboscadas no mato, em suma, era a guerra em toda a plenitude…
A maioria dos militares dormia ao ar livre, no período mais quente e outros recolhiam-se nas casernas, feitas de adobes com cobertura de chapas de zinco, onde o frio e a chuva, tinham entrada livre…
O furriel Barros dormia numa caserna, sobre um colchão de espuma, sem lençol, e dormir nestas condições era terrível já que a ansiedade estava constantemente presente, devido aos ataques dos guerrilheiros inimigos para além dos mosquitos, inimigo número um dos militares “metropolitanos”…
Os ratos eram às centenas, atacavam os militares, subiam pelas paredes dos adobes e “guinchavam” numa melodia de sons agudos e incomodativos.
Um dia, para fazer face a esta praga, o Barros pediu aos mecânicos da companhia para fazerem uma ratoeira e, passados dois dias, apareceu, ao furriel, uma ratoeira cheia de molas, parafusos e outras “tecnologias”. Ratoeira montada durante uns dias, e os ratos entravam e saiam da ratoeira num gozo irritante…O Barros sentia-se ultrajado e agiu…
Fez uma ratoeira simples, com tábuas dos caixotes das batatas, uma caixa forrada com folheta, das latas de conservas, uma porta “levadiça”, um arame em caracol, com isco, a segurar a entrada da ratoeira improvisada e, no final, de uma semana, o Barros tinha apanhado 47 ratazanas, sim, foram quarenta e sete, nada mais , nada menos que essa quantidade de ratos…
E o que fazia o Barros, todas as manhãs? Imagine-se!...
Colocava as ratazanas num bidon, regava-as com gasolina e soltava-as numa curta corrida contra a morte…
Hoje, não faria isto, mas a guerra transtorna as nossas mentes e a realidade foge-nos…
O Barros não ficou com a patente da armadilha, pelo contrário, deu a conhecer aos “artistas inventores” dos condutores a estrutura e o funcionamento do mesma e, a partir daí, o furriel Barros, era o grande inventor e o inimigo das ratazanas… O Barros apanhava, e a população nativa, levava a “mercadoria” para as suas tabancas, para comerem como “pitéu”…
Em Gampará havia alguma população e eram maioritariamente Balantas e Mandingas e as ratazanas assadas eram comidas por esta população e vi, muitas vezes, eles nas bolanhas secas, com uma catana, esburacarem as tocas para apanharem esses roedores para sustento da família….
Como curiosidade, e um pouco aparte desta história, segundo censo de 1960, a população total da Guiné era de 521 336 habitantes, dos quais 519 229, constituíam a população residente.
A densidade populacional média, para toda a “Província” aproximava-se dos 15 habitantes por Km2.
No grupo mandinga contam-se os Mandingas, os Saracolés, os Bombarás, os Jacandas, os Sossos e os Jaloncas. A Guiné tinha uma diversidade étnica muito grande: Balantas, Manjacos, Mandingas, Papel, Brame, Fulas, Beafadas,Bijagós, Felupes, Torancas…Estas etnias e muitas outras, eram constituídas por vários subgrupos, numa complexidade tal, que a convivência entre eles não era fácil, como se pode depreender.
Estes dados é apenas , para dar a conhecer um pouco da população guineense mas, muito mais poderia descrever…
Uma coisa é certa, o Barros continuou na sua luta contra os ratos, uma longa guerra que continuou no tempo e, no final da Comissão, já em Esposende, contei esta história à minha família e amigos meus que a acharam engraçada e curiosa…
Carlos Barros
Esposende, 19 de junho de 2020
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Nota do editor:
Último poste da série > 3 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21319: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (2): A fuga da 'beijuda'
Último poste da série > 3 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21319: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (2): A fuga da 'beijuda'
5 comentários:
Carlos, temos uma repulsa instintiva em relação a ratos e ratazanas, a que,m atribuímos a origem da "peste negra" (1348-1352), a maior pandemia conhecida na nossa história, que terá dizimafo um terço a metade da população europeia (calculada então em 100 milhões)...
Mas há quem pense que os roedores foram apenas o "bode expiatório"... Pior que os ratos eram os nosso piolhos e as nossas pulgas...numa época em que ainda não havia hábitos de higiene pessoal e muito menos saneamento urbano (esgosto,s água potável, recolha de lixo)... E depois, "um cristão depois de batizado não precisava de tomar banho" (. dizia um dos padres da Igreja, São Jerómimo, se´c. IV).
https://www.natgeo.pt/animais/2018/01/talvez-os-ratos-nao-sejam-os-responsaveis-pela-peste-negra
Carlos, não tenho dúvidas que comeríamos ratos e ratazanas, como os nossos antepassados, em situações de fome extrema... Houve populações europeias que recorreram à sua carne (, para não falar de necrofagia...) durante a II Guerra Mundial...
Quem come "túbaros" ou tomares de carneiro, cobra, crodilo, moreia, lampreia, enguias, baratas, ..., porque é que não há de comer também ratos e ratazanas, que são um petisco para muitos carnívoras, da água à raposa ?
Os tabus alimentares são culturais... Os muçulmanos não comem porco, os judeus não comem marisco, e os cristão também não podem comer.. a mulher do próximo.
Temos falado menos de Gampará (31 referências), correspondente à margem esquerda do Rio Corubal e durante muito tempo um "santuário" do PAIGC. Era "chão beafada"...
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/Gampar%C3%A1
Já a Ponta do Inglês, com 38 referências, em frente a Gampará, na Foz do Corubal, mas na margem direita do rio, tem tido mais "tempo de antena", uma vez que fazia parte do subsetor do Xime (Setor L1, Bambadinca)...
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/Ponta%20do%20Ingl%C3%AAs
Vale a pena rever este poste:
4 DE NOVEMBRO DE 2013
Guiné 63/74 - P12247: Memória dos lugares (248): Em Gampará, sítio desolador, o dia mais feliz era quando chegava a LDG com as 'meninas' de Bissau... (Amílcar Mendes, ex-1º cabo comando, 38ª CCmds, 1972/74)
O Amílcar Mendes teve a gentileza de me mandar o livro com a história dos bravos da 38* CCmds... Está na altura de fazer a respetiva recensão bibliográfica!... Meteu-se a pandemia, mas não é desculpa!...
Não dei por haver ratazanas no Xime, mas lembro-me de certa vez quando estava de passagem para fazer tratamentos em Bissau, o furriel Pina da CCAC 12 dizer-me: Nascimento vai ali à cozinha. E lá vou eu e quando ao entrar vejo uns nativos a retirar das brasas que a seguir esfolam, metem na boca, mastigam e dos cantos das suas bocas começa a escorrer o sangue do "petisco". Quase a vomitar corro cozinha fora e o Pina morto de rir a observar a cena.
Um abraço.
José Nascimento
Caro Carlos Barros:
A minha companhia (independente)- C.ART. 6250 fez, com o teu batalhão, o IAO, em Bolama. Nós fomos para Mampatá (sector de Aldeia Formosa). No IAO, no dia 10 de Julho morreram o Mata da minha companhia e o Figueiredo do teu batalhão. Momento dramático que vivi a poucos metros de distância. O Figueiredo era da tua companhia ?
Um abraço
Carvalho de Mampatá (Fur.Enfº)
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