sexta-feira, 22 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1870: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (51): Cartas de um militar de além-mar em África para aquém em Portugal (5)

Guyiné > Zona Leste > Bafatá > Soldado africano ferido em combate > 1970 > "Estou a comandar a tropa africana de grande valentia, vivemos dentro de um mato muito cerrado perto do principal rio da Guiné, que é o Geba. Dentro em breve, vou fazer o primeiro ano da comissão que, confesso-te, tem sido muito dura mas sinto que vou sair daqui um homem muito diferente daquele que conheceste quando te dei instrução em S. Miguel", escreve o Beja Santos ao seu antigo instruendo açoriano, José Braga Chaves, colocado em Moçambique.

Foto: © João Varanda (2005). Direitos reservados. O João Varanda, de Coimbra, foi Fur Mil na CCAÇ 2636 (Có/Pelundo e Teixeira Pinto; Bafatá, Saré Bacar e Pirada, 1969/71) .


51ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado a 30 de Maio de 2007.


Meu caro Luís, não é por perfeccionismo, o texto que vos enviei ontem tinha bastantes gralhas, os bloguistas merecem respeito. Falo aqui na Ópera Tosca e na 9ª Sinfonia de Beethoven. Quando almoçarmos (espero que em breve), levar-te-ei, gostava muito que estes discos aparecessem no blogue. Não tenho ideia do que possa ser uma boa ilustração para este episódio, para além dos livros que já seguiram ontem. Talvez Bafatá, talvez Missirá, à tua escolha. O próximo episódio refere-se ao Ieró Djaló, de que tu tens uma fotografia cedida pelo Luis Casanova, esse gigantão a brincar com crianças em Missirá. (...). Estou ansioso por ver os bilhetes postais que milagrosamente descobri e te enviei. Nada mais por ora e um abraço para os dos do Mário. Aproveito para te dizer que o tema de fundo que proponho para o nosso almoço é o I Volume da Operação Macaréu à Vista. Mário

Cartas de um militar de além-mar em África para aquém em Portugal (5)

por Beja Santos


Para Filipe da Nazareth Fernandes

Querido Padrinho,

O seu valioso presente chegou a semana passada e não tenho palavras para lhe agradecer. Um pacote de livros da Portugália era mesmo o que eu estava a precisar. Já li Rumor Branco, de Almeida Faria e acabo de ler esta edição dos Contos do Oscar Wilde, primorosamente traduzidos pelo Cabral de Nascimento. O Padrinho já me tinha oferecido De Profundis e O Retrato de Dorian Gray que desapareceram na voragem do incêndio que tivemos aqui em Março passado. Estes contos, que só conhecia um ou dois, são uma verdadeira surpresa pelo jogo que o Wilde empresta ao discurso do adulto que retorna a infância. São contos de fadas, alegóricos a esse século XIX de tanta dureza industrial e, ao contrário de Dickens, Wilde socorre-se da ironia para falar da vilania e da insensibilidade dos ricos. Subtil e extremamente fino nas imagens, introduz moralidade naqueles que se excedem na ânsia de conhecer tudo sobre todos, o reizinho que vai ser coroado é odiado pelos súbditos devido a assumir a simplicidade e, como num milagre, Deus substitui os trajes humildes durante a coroação por vestidos muito belos.

A Portugália está de parabéns pela apresentação estética das suas edições e pela escolha dos tradutores. O Espectro de Canterville devia ser dado nas aulas de tradução Inglês/Português!

Fico muito contente sabendo que a Madrinha está de boa saúde bem como os vossos filhos.

A minha vida prossegue sem alterações: temos que patrulhar e montar vigilância todos os dias num local que fica a 12,5 Km do meu quartel, é um cansaço grande, às vezes percorremos esta caminhada com calor tórrido (a primeira vez vi árvores a bailar no ar julguei que estava a delirar, pensava que este fenómeno só acontecia nos desertos), outras vezes debaixo de tempestade (as chuvas tropicais desabam imprevistamente, parecem amostras do dilúvio universal) e situações há em que vivemos as 4 estações do ano numa só caminhada (por exemplo, saio debaixo de chuva de madrugada, irrompe o calor, secamos, volta a chover, andamos por terrenos pantanosos, aparece outra vez o sol, botas, meias e todo o fardamento parece que encarquilham, é um cheiro nauseabundo, agravado pelo suor que deixa branco o camuflado esverdeado). Às vezes, temos que fazer este percurso duas vezes por dia.

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Missirá > 1968 > Pel Caç Nat 52 > "Tudo aqui é difícil, mando-lhe hoje uma fotografia da nossa padaria onde o soldado Jobo Baldé prepara a farinha dentro de uma caixa de munições de bazuca", escreve o Beja Santos em carta ao seu padrinho Filipe da Nazareth Fernandes.

Foto: © Beja Santos (2007). Direitos reservados.

Não lhe cheguei a dizer mas deixei em Lisboa, ainda sem publicação, as suas recordações acerca da ida do grupo de Pauliteiros de Cércio, pouco antes da Segunda Grande Guerra ter rebentado, que tinham ido exibir-se num espectáculo no Royal Albert Hall. Lembro-me muito bem dos aspectos picarescos do seu depoimento escrito, ficou na minha secretária em Lisboa. Tinham-lhe pedido na Casa de Portugal em Londres para o Padrinho acompanhar este grupo de pauliteiros que depois foi muito elogiado na imprensa britânica. O que eu nunca mais esqueci foi a caminhada dos pauliteiros no metro de Londres, vestidos a preceito, de bigodes farfalhudos e de garrafão na mão, com o acompanhamento da gaita de foles e paulitos, a exigir bacalhau com batatas antes da récita. Outro aspecto que guardei foi eles terem recusado fazer uma vénia para agradecer ao público - "O português não dobra a cerviz ao estrangeiro, agradecemos sempre com a cabeça bem levantada". Prometo-lhe que cuidarei destas impressões e do seu orgulho em ter andado com gente de Miranda do Douro no centro de Londres.

Ainda guardo uma esperança de poder ir de férias a Lisboa, tive dois dias de prisão, recorri do castigo que considero duro e desproporcionado a alguma negligência, que não sei se não existem em todos os quartéis. O Padrinho sabe que fui educado pela minha mãe na arrumação, nos valores do trabalho e nos princípios da disciplina. Este aquartelamento alberga muita população civil, a própria tropa é constituída por naturais, não é fácil, ainda por cima vivendo como vivemos com as maiores dificuldades, manter a ordem quando à volta do quartel, e mesmo dentro, há espaços com culturas de batata doce, tomate, beringela e couves, eles são rurais que entram e saem para ir buscar comida, trazer mangos e papaias, às vezes os meus soldados, que já eram caçadores, deslocam-se para o mato e levam civis e depois trazem porcos de mato ou gazelas.

Tudo aqui é difícil, mando-lhe hoje uma fotografia da nossa padaria onde o soldado Jobo Baldé prepara a farinha dentro de uma caixa de munições de bazuca. Os bidões de água, quando as viaturas estão empanadas, rolam pela estrada dois quilómetros até à fonte. Ao anoitecer, haja bom ou mau tempo, a iluminação do quartel é feita com petromaxes, pode imaginar o sobressalto em que vivemos, temos a promessa de um gerador eléctrico, tudo é arrancado a ferros, desde toalhas de mesa até caçarolas. Mas o pior de tudo é este clima que abala profundamente a saúde, tenho presentemente uma boa parte dos soldados doente, fazemos prodígios mandando os menos doentes para as emboscadas nocturnas à volta do quartel e os outros vão a Mato de Cão, que é o tal local por onde passam barcos militares e civis que trazem as tropas e os abastecimentos para esta região que se chama o Leste.

Não o incomodo mais com estes pormenores. Peço-lhe que diga à Madrinha o muito amor que lhe dedico, e se falar com o Jorge ele seguramente lhe falará da violência desta guerra já que ele foi oficial pára-quedista. Receba a gratidão do seu afilhado que nunca o esquece.


Para o José Braga Chaves, no SPM 4374

Meu estimado José Braga Chaves,

É bom receber cartas de um soldado e querido amigo mariense, ainda por cima com fotografia, em Moçambique. Imagina tu que com a tua carta veio a de um grande amigo meu que partiu há dias para a região de Cabo Delgado, onde creio que a guerra está muito acesa. Claro que me lembro muito de ti e do pelotão de marienses, e do Natal de 1967 que passámos juntos com uma grande festa nos Arrifes. Tenho muito orgulho em vocês e fico muito contente com os teus planos de ires viver com a Lúcia de Fátima na ilha de S. Miguel.

Já escrevi ao Dr. Furtado Lima, daqui da Guiné, e não deixei de lhe agradecer a operação que ele fez ao teu dedo indicador da mão direita. A guerra aqui é um pouco diferente da que tu me contas, não podemos fazer essas grandes viagens em colunas militares, 100Km aqui eram minas, emboscadas, o Inferno. Estou a comandar a tropa africana de grande valentia, vivemos dentro de um mato muito cerrado perto do principal rio da Guiné, que é o Geba. Dentro em breve, vou fazer o primeiro ano da comissão que, confesso-te, tem sido muito dura mas sinto que vou sair daqui um homem muito diferente daquele que conheceste quando te dei instrução em S. Miguel. Vamos manter o nosso contacto, diz à Lúcia de Fátima que vos desejo as melhores felicidades finda esta guerra onde estamos. Recebe a grande estima de um amigo que só te quer bem.


Para Angela Carlota Gonçalves Beja

Querida Mãezinha,

Chegaram os livros e não tenho palavras para lhe agradecer a sua atenção. A Manuela parece que consegue o transporte gratuito das toneladas de revista que nos manda através do Movimento Nacional Feminino. Fale, por favor, com ela, os livros e as revistas são sempre muito apreciados. Eu tinha encomendado a História da Novela Policial, de Fereydoun Hoveyda na Livraria Torrens, estava completamente esquecido de o ter feito, eu depois faço contas consigo.

Agora que acabei de ler o livro, lembro-me com saudade de certos livros seus que li com grande prazer desde as aventuras de Sherlock Holmes, de Conan Doyle, passando pelo Arsene Lupin, Comissário Maigret até às novelas de Edgar Allan Poe. Partilho da maior parte das opiniões deste autor, desde classificar de pedante Philo Vance de S. S. Van Dine até às considerações depreciativas sobre Simon Templair de Leslie Charteris.

A propósito, consegui em Bafatá, um verdadeiro achado de sorte, Os Crimes do Bispo, por S. S. Van Dine. Vance, na exibição da sua cultura chega a ser grotesco mas depois a natureza do problema, a originalidade de uma melodia infantil que é utilizada por uma mente doentia para assinalar os seus diferentes crimes, a escrita palpitante, por vezes tumultuosa, as pistas deliberadamente falseadas para lançar o leitor na completa incerteza e o gigantesco último acto onde Vance induz o assassino a uma forma de suicídio involuntário, tudo leva a que se leia esta narrativa poderosa com renovada satisfação, a despeito de se perder, na releitura, a curiosidade pela solução final. Vou levar estes livros para si.

Ainda bem que está melhor e que planeou as suas férias com o meu sobrinho nas termas de S. Pedro do Sul. Por aqui, estamos na época das chuvas, tenho muitos soldados doentes, estão a subtrair-me parte do efectivo, já pedi para me ir embora, é pura loucura termos um patrulhamento diário de 25 Km, emboscadas nocturnas, trabalhamos nas condições mais adversas na melhoria ou na conservação dos dois aquartelamentos, manter a segurança com máximo rigor durante 12 horas, ter sempre um efectivo no quartel na previsão de um ataque inimigo, dizem-me para ter paciência, podia ser muito pior, eu podia estar a ser atacado várias vezes ao dia, até já houve quem me dissesse que eu me devia dar por muito feliz, não tenho casos de suicídio, o número de mortos é reduzido e a loucura não se vê muito de perto...

Dentro de dias parto para Bissau, vou ser testemunha no julgamento de um soldado que adormeceu e deixou fugir um prisioneiro. Já escrevi ao Comandante Teixeira da Mota a informá-lo que eu o vou visitar. Logo que saiba exactamente a data, comunico-lha para marcarmos uma hora e eu telefonar-lhe.

Vou a Bafatá tratar dos documentos para o meu casamento. Agradeço-lhe do coração que compreenda que as minhas decisões estão tomadas e que já me basta o sofrimento que tenho na guerra. Rezo pelas suas melhoras, não me canso de louvar ao Senhor a benção de ser seu filho. Receba muitos beijinhos e a saudade de quem lhe deve a vida e tudo o mais.



Guiné > Rio Geba > A caminho de Bissau > 1968 ou 1969 > O Fur Mil Carlos Marques dos Santos, da CART 2339, Mansambo, 1968/69, num dos típicos barcos civis de transporte de pessoal e de mercadoria, que fazia a ligação Bissau-Bambadinca, passando poela temível Ponta Varela, na na confluêncioa do Rios Geva e Corubal e o assustador Mato Cão, no Geba Estreito, entre o Xime e Bambadinca. Estes barcos (alguns ligados a empresas comerciais, como a Casa Gouveia) tinham, como principal cliente a Manutenção Militar. Pelo Xime e por Bambadinca passava o "ventre da guerra" de toda a Zona Leste.
Foto: © Carlos Marques dos Santos (2006). Direitos reservados.


Guiné > Bissau > 19 de Abril de 1970 > Cristina Allen, com quem Beja Santos irá casar, no dia seguinte, em Bissau, sendo o David Payne e a esposa padrinhos de casamento. O Mário escrevia-lhe praticamente todos os dias detalhadíssimos aerogramas, contando-lhe o seu dia a dia de Missirá. A Cristina era estudante universitária finalista. Tirou férias para casar. Voltou para Lisboa, ao fimd e 20 dias. O Mário irá findar a sua comissão em Agosto de 12970. embarcando no Carvalho Araújo que levou 15 dias a chegar a Lisboa, "distribuinndo pelo caminho tropas e cadáveres"...

Legenda do Beja Santos: "A Cristina chegou a 18 de Abril e praticamente nunca saiu de Bissau a não ser umas curtas visitas a Safim, Nhacra e Quinhamel. Não podíamos, evidentemente, ir passear a quaisquer teatros de operações. Durante os praticamente 20 dias que ela aqui viveu, visitámos as amizades feitas em Bambadinca e Bissau e fomos recebidos regularmente pelo David Payne, Emílio Rosa e mulheres. Não resistíamos à curiosidade de andar pelos mercados, ver artesanato e pequenas festas locais. Muitas vezes, o Cherno acompanhou-nos, insistia que não havia pausas no seu papel de guarda-costas".

Foto e legenda: © Beja Santos (2007). Direitos reservados.

Para Cristina Allen

Meu adorado amor,

Dentro em breve, já está confirmado, parto para Bissau para me apresentar no Tribunal Militar. Vou ser testemunha de defesa de um soldado da milícia de Missirá, Ieró Djaló, que adormeceu e deixou escapar o prisioneiro de Quebá Jilã.

Espero aproveitar esta viagem meteórica para tratar dos assuntos dos materiais de construção civil e do gerador, pois chegou uma informação a dizer que tinha sido deferido o pedido do gerador para Missirá. Tu não podes imaginar o que este gerador irá alterar para melhor a nossa segurança. Logo que anoitece , espalhamos por 6 pontos correspondentes à vigilância dos sentinelas petromaxes que são muito sensíveis às correntes de ar, apagam-se frequentemente, é um risco tremendo para quem lhes muda as camisas e os reacende, imagina que há rebeldes a ver, não pode haver melhor alvo humano! Espero igualmente encontrar-me com a Maria Luísa e o Pedro Abranches e o Comandante Teixeira da Mota, é tudo uma questão de ter tempo e eles estarem disponíveis. Logo que saiba a data, comunico-te para nos ouvirmos ao telefone nos correios de Bissau.

Estive em Bafatá (não sei se já te disse, mas se já disse repito) a tratar dos documentos. Houve momentos hilariantes, o secretário do administrador perguntava-me se eras da Província ou da Metrópole, queria saber se o casamento era com ou sem separação de bens e falou mesmo em convenção antenupcial. Depois disse-me quer era preciso uma certidão completa narrativa, uma certidão de baptismo (no caso de querermos casar religiosamente) e para irmos pensando se queremos o casamento com separação de bens.

Finda estas formalidades, fui comprar a 9ª Sinfonia de Beethoven interpretada pela Suisse Romande e dirigida por Ernest Ansermet e com 4 solistas de luxo: Joan Sutherland, Norma Proctor, Anton Dermotta e Arnold Van Mill. Mas acabei por perder a cabeça e comprei por 400 escudos uma versão fabulosa da Tosca, com a Callas, Tito Gobbi e Carlo Bergonzi. É impressionante a qualidade desta gravação, a intensidade dramática da Callas, o poder representativo de Gobbi que nos chega aos ouvidos, a coloratura de Bergonzi, que eu considero um dos maiores tenores verdianos de todos os tempos.

À saída do estabelecimento o Campino apresentou-me a mulher que ele comprou recentemente (sei que isto te faz muita confusão, mas uma rapariga aqui custa cerca de 2 vacas e alguns milhares de escudos, o que é muito curioso é a facilidade com que se podem divorciar as mulheres, tendo mesmo a liberdade de pedir o divórcio).

Sei que estás muito ocupada com as últimas frequências e parece que a Filosofia Contemporânea ficará para exame. Se em Bissau eu receber boas notícias quanto ao meu recurso, juro-te que nos casaremos em Lisboa. Mas continuo a hesitar quanto à possibilidade de dares aqui aulas e ficares torturada e sozinha em Bissau. Não tenho escondido no correio mais recente a dor que me provoca as cartas que vou recebendo da minha mãe e as tuas próprias queixas. É evidente que quem está na guerra sou eu, mas nunca supus este volume de tensões e como eles me desalentam.

Não te querendo trazer mais ansiedade, todos os patrulhamentos que fazemos diariamente a Mato de Cão são verdadeiros exercícios de ouvido à escuta, olhos à procura de minas e de emboscadas, haja calor, friagem, chuvas torrenciais, orvalho no capim, picadas inundadas ou enlameadas. Habituei-me a gostar do mundo que me rodeia, os cajueiros em flor, o porte gigantesco dos bissilões, as árvores do pau de sangue e pau preto. Habituei-me a achar natural as couves, as beringelas, o tomate, os mangais e as papaias, dentro e fora do quartel, como se esta fosse a ordem natural do mundo. Habituei-me ao capim alto de onde podem sair emboscadas, habituei-me a suspirar por Canturé com os seus laranjais de fruta ácida e limoeiros donde se avistam morros vistosos de baga-baga. Tiro partido da mata luxuriante a caminho do planalto de Mato de Cão, um dos locais mais lindos do mundo. Então, agradeço a Deus esta possibilidade de amar o que me foi oferecido, a devoção dos meus soldados, o estarmos vivos. Sim, estarmos vivos, embora enterrados neste sofrimento. E fico por aqui, exprimindo-te esta dor de te escrever para tão longe, sempre saudoso e sabendo que sou tão estimado por ti. Que todos os meus beijos atravessem rapidamente este oceano e cheguem hoje a Lisboa. Até amanhã.

__________

Nota de L.G.

(1) Vd. post de 15 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1851: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (50): Do tiroteiro em Bambadinca na noite de 14 de Junho de 1969 à emboscada da bruxa

Posts da série Operação Macaréu à Vista, de 39 a 27:


23 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1623: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (39): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (1)

16 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1600: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (38): Missirá, a Fénix renascida

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1578: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (37): O horror do Hospital Militar 241 e o grande incêndio de Missirá

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1577: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (36): Bissau, um grande teatro de luz e sombras

4 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1561: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (35): O Fado Hilário, em Mansambo, antes do internamento no Hospital Militar de Bissau

23 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1542: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (34): Uma desastrada e desastrosa operação a Madina/Belel

16 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1531: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (33): O Sintex: A Marinha Mercante chega até Missirá

8 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1504: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (32): Aruma Sambu, o prisioneiro de Quebá Jilã

2 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1486: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (31): Abelhas africanas assassinas

25 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1461: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (30): Spínola, o Homem Grande de Bissau, em Missirá

18 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1442: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (29): Finete contra Missirá mais as vacas e o bombolom dos balantas

10 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1418: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (28): Sol e sangue em Gambiel

3 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1399: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (27): Sinopse: os meus primeiros 150 dias

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