quinta-feira, 8 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6695: Memória dos lugares (89): Bafatá, Tabatô, Tabaski 2009: Não há preto nem branco, somos todos irmãos, disse a Fátima de Portugal numa cadeia de união... (Catarina Meireles)







Guiné-Bissau > Região de Bissau > Tabatô > 28 de Novembro de 2009 > A cerimónia do Tabaski... em que pela 1ª vez participaram três europeus, não-muçulmanos, duas portuguesas e um espanhol... Uma das portuguesas foi a Catarina Meireles, médica, aqui na foto (a 3ª, a contar de cima), com uma criança mandinga ao colo;  e na 2ª, partilhando a refeição)... Na 1ª foto a contar de cima, temos uma vista geral da assembleia, durante a cerimónia do Tabaski, na aldeia mandinga de Tabatô, a escassos 10 km de Bafatá, na estrada  Bafatá-Gabu. Ainda há dias o Fernando Gouveia andava desesperado para encontrar a localização exacta de Tabatô, que não vem na nossas cartas da época colonial (Será uma povoção de recente implantação ? Ou deslocalizada por causa da guerra colonial ? O João Graça, que passou lá uma noite memorável a tocar com os músicos locais, não me soube esclarecer a data da origem da tabanca; o Fernando, por sua vez, não conseguiu lá ir, quando revisitou Bafatá,  em Abril passado ).

Fotos: © Catarina Meireles (2010). Direitos reservados





Guiné-Bissau > Bissau > Dezembro de 2009 > Na conhecida e conceituada Residencial Coimbra, sita na Av Amílcar Cabral, em pleno centro: da esquerda para a direita, o João, o Mamadu (músico da tabanca mandinga de Tabatô de onde é natural o Kimi Djabaté), o Vitor (cooperante espanhol), a Catarina Meireles (médica, portuguesa, minha antiga aluna na Escola Nacional de Saúde Pública)... Os restantes cinco elementos não sei, de momento, identificá-los. O João Graça, músico e médico, interno de psiquiatria, esteve na Guiné duas semanas, em Dezembro de 2009,  tendo estado mais tempo em Iemberém (onde prestou cuidados de saúde à população local, durante cinco dias), além de Bissau, e visitado ainda a zona leste (Bafatá, Tabatô, Gabu, Contuboel...) e a região do Cacheu (S. Domingos). Em Bissau conheceu a colega Catarina Meireles.


Foto: © João Graça (2009). Direitos reservados


1. A minha amiga e antiga aluna do Curso de Especialização em Saúde Pública, Dra. Catarina Meireles, natural de Vila Verde (a terra dos lenços dos namorados ou, melhor, e segundo as  palavras da Catarina, a terra onde são as raparigas a escolherem os namorados com quem querem casar ou não ...), passou cerca de 3 meses em missão de cooperação na Guiné-Bissau, no último trimestre de  2009. Mais exactamente na Associação Saúde em Português, que está a actuar em Bafatá (Projecto  "Mais Saúde, Melhor Saúde por Bafatá").

Nesse período fomos trocando mails e eu convidei-a inclusive para colaborar no blogue, com alguns apontamentos sobre a sua estadia em Bafatá. Disse-me que estava a escrever o seu diário e que depois decidiria onde e quando publicar...

Em Outubro de 2009, escrevi-lhe o seguinte, em resposta às suas primeiras impressões da Guiné-Bissau (tinha chegado a 5):

 (...) Catarina, você representa uma geração, a do pós-guerra colonial, que está a redescobri África, nas suas misérias e grandezas… Sendo uma mulher de grande sensibilidade sócio-cultural e para mais médica de saúde pública, além de uma grande minhota, gostaria de poder publicar, no nosso blogue colectivo, Luís Graça & Camaradas da Guiné, alguns crónicas suas sobre esta sua 'viagem de imersão' na Guiné-Bissau" (...).

A Catarina respondeu-me, a 8, nestes termos:

(...) Sim, com efeito sou dessa geração. Mais interessante é o que a minha mãe constata: o meu pai escapou do Ultramar mas os 2 filhos estão em África. O meu irmão há dois anos que anda pelos PALOP e não só, como engenheiro civil de obras públicas. Confesso que ele me abriu portas por me alargar o planisférios mental. Sem medo, com confiança... a nossa geração tem se ser feita de cidadãos do mundo. (...)

Entretanto, a 1 de Dezembro manda-me um outro mail em que afirma ter necessidade de partilhar as suas emoções por ter tido o privilégio de assistir à cerimónia do carneiro, com os habitantes de Tabatô... Adorei o texto e disso-lho, na volta do correio, a 2:

Catarina:  Belíssimo texto. Você é uma mulher de grande sensibilidade, sócio-cultural. Esse fim semana foi mesmo ecuménico… Dou-he os parabéns por ter conseguido vencer as barreiras culturais, mentais e religiosas que, muitas vezes, nos impedem de comunicar com o outro… Essa tabanca é do meu tempo, mas nunca convivi com a respectiva população… Fulas ? Mandingas ? …Eu passei por Contuboel (2 meses), e o resto em Bambadinca (20 meses)… Ia com regularidade a Bafatá…


O meu filho João Graça, 25 anos, médico (acaba de entrar para a especialidade de psiquiatria, no Amadora -Sintra) vai estar aí quinze dias…Em princípio, vai trabalhar uma semana e depois vai dar um giro, revisitando alguns sítios por onde eu andei (Contuboel, Bafatá, Bambadinca…). Parte na 6ª feira, à noite… Seria interessante poderem estar juntos (em Bafatá) (...).

 Mais recentemente, e já com novos projectos de cooperação, a 18 de Junho último, a Catarina deu-me o seu OK para publicar, no blogue, o texto sobre o Tabaski, com a seguinte nota:

Este texto foi um impulso de partilha existêncial... de entre vários... Este, por acaso, tive que - por necessidade terapêutica!! - partilhá-lo... é que há coisas grandes demais para caber num só coração, numa só mente.  Deus, obrigado. (Como dizem os guineenses... eheheh)


Talvez a versão rectificada do texto, junto com fotografia, fique melhor... que acha?


Ao dispôr!!


Catarina


PS - Julga que não continuo a colaborar? Nunca parei. Constituí-me co-fundadora duma ONG e hoje mesmo recebi "material" para arrancar com projecto. E do "meu povo", continuo a receber notícias... Por exemplo, o grupo de música de Tabatô foi ao Mali gravar o primeiro CD. Se soubesse como isto representa uma vitória? Emociono-me, só de lembrar!


2. O Tabaski em Tabatô
por Catarina Meireles


No passado fim de semana fui ao Tabaski - cerimónia de imolação do carneiro (por analogia: Páscoa dos Muçulmanos).

Depois de muitas resistências, dúvidas, declinações... lá consegui que me deixassem assistir ao ritual ("eucaristia") numa tabanca perto de Bafatá, de seu nome Tabatô - muito especial, particularmente pela sua forma de vida comunitária, que assenta na música e dança étnicas. São fabulosos!

Fui com mais uma amiga (portuguesa) e um amigo (espanhol). Vestimos roupas típicas, ocupamos as posições indicadas (segundo a ordem social vigente) e imitamos tudo o que nos diziam para fazer...  E não me senti diferente... ao contrário, até me senti mais especial!

No fim do ritual, chamaram-nos (aos 3 brancos) para junto dos Homens Grandes e ajoelhámos em círculo.

Para quê? Para dar graças a Alá por esta dávida - pela primeira vez 3 brancos visitaram aquela tabanca no dia do Tabaski. Era um sinal divino de prosperidade e de vida longa (incluindo para nós!)

As explicações foram reforçadas várias vezes para que percebessemos o quão importante e bem-vinda era a visita dos 3 brancos.

Eu disse...
- Sim, 3 é número sagrado!

Eles rejubilaram com o entendimento do misticismo!

Foi-me pedido que falasse... e falei.  Pedi uma cadeia de união - corrente de mãos dadas. Expliquei como fazer e disse:
- Não há preto, não há branco, somos todos irmãos... daí esta cadeia de união.

E do meu lado esquerdo soou uma voz meiga, dum dos homens que me acolheu nas 3 vezes que fui a essa tabanca:
- Obrigado, Fátima de Portugal!

Catarina Meireles

Bafatá, 1 de Dezembro de 2009

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Nota de L.G.:

Último poste desta série > 6 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6683: Memória dos lugares (81): Binta, no Rio Cacheu... Quando o meu anfitrião foi o JERO, da CCAÇ 675 (Manuel Joaquim, ex-Fur Mil, CCAÇ 1419, Bissorã e Mansabá, 1965/67)

3 comentários:

Anónimo disse...

Será necessário mais?

SOMOS TODOS IGUAIS!

Fátima de Portugal.

Para mim basta!

O Abraço longo, fraterno e amigo do tamanho do Cumbijã

Anónimo disse...

Desculpem não assinei, mas penso que estou identificado

Mário Fitas

Luís Graça disse...

Devo dizer, com toda a sinceridade, que nunca ouvi falar da Tabatô, durante a guerra colonial. Nem nunca fui para os lados do Gabu.

Foi o meu filho que me contou a sua experiência ímpar. Passou lá uma noite a curtir a música mandinga e a tocar também "world music" para os seus novos amigos...

Tabatô, a aldeia de Kimi Djabaté, é agora a tabanca mais famosa da Guiné-Bissau. É já um lugar mítico, nomeadamente para a malta nova, que não vai em "turismo de saudade", à procura de lugares e restos do passado, vai à descoberta do futuro, desse continente do futuro, que é a África... E quer ajudar a construir também esse futuro...

Não sei se Tabatô existia no tempo da guerra colonial... Já pedi ao meu amigo Pepito para saber da história da aldeia...