1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Janeiro de 2011:
Queridos amigos,
Já estamos na despedida.
Quero agradecer a todos aqueles que contribuíram para clarificar impressões de viagem que deixaram o Tangomau intrigado. Não há nada como descobrir que a viagem ficou incompleta, havendo necessidade de regressar, um dia. Em nome das amizades inigualáveis, em nome do lugar que se habitou e que se grudou ao coração.
Um abraço do
Mário
Operação Tangomau (17)
Beja Santos
Algumas conversas para melhor perceber o Outro, o PAIGC
Despedidas e promessas
1. É uma reunião muito estimulante com mulheres e homens predominantemente entre os 50 e 70 anos. Já se percebeu que não há nenhuma historiografia oficial, formal ou informal, tanto na posse do PAIGC ou dos seus dirigentes históricos. Há arquivos incompletos, há os trabalhos de Luís Cabral, Aristides Pereira, Mário Pinto de Andrade, as prosas laudatórias da propaganda, de um modo geral inúteis para se obter a panorâmica de como o PAIGC se inseriu junto das populações e delas obteve apoios incondicionais ou as abrigou a colaborar na luta; há muita documentação na Fundação Mário Soares, serve para esclarecer alguns ângulos, mas não todos; desapareceram documentos secretos, correio entre dirigentes, ordens de batalha, até comunicados políticos.
Continua a ser tabu o relacionamento entre os dirigentes cabo-verdianos e os quadros militares guineenses. Ninguém usa como referência o Livro Branco do PAIGC, ninguém tem ilusões que é uma historiografia oficial datada, a história não é feita de declarações incontestáveis. É por todos admitido que foi no Congresso de Cassacá (1964) que o poder político se sobrepôs ao poder militar, orientando-o durante e após a independência, até 1980. Eram os comissários políticos que superintendiam as operações militares, os comandantes prestavam permanentemente contas.
A partir de 1980, com a era de Nino, deu-se uma demarcação, com o agravamento da situação económica e financeira, os militares sentiram-se livres de contestar e de se orientar nos negócios. Quando se sentiram ameaçados, como Ansumane Mané, reagiram. Até hoje. Os altos comandos vivem permanentemente à espreita de serem liquidados, desde a época do conflito político-militar de 1998.
O Tangomau já esgotou praticamente o seu stock de imagens. Nas reuniões por onde anda, nem lhe passa pela cabeça tirar fotografias. Socorre-se de fotografias não publicadas. Neste caso, uma panorâmica do cemitério de Bissau, o talhão dos combatentes da guerra da pacificação, rodeado do talhão dos combatentes da guerra que perdurou até 1974. Estava tudo relativamente bem arranjado, a Liga dos Combatentes determinara uma boa limpeza. Estava um dia luminoso, o Tangomau sentiu-se impelido a estranhas orações, quase conversas, entre o céu e a terra, era uma evocação errática e difusa em nome de todos os mortos.
2. O Tangomau muda de registo e pergunta à assistência como é que os quadros do PAIGC sentiam o crescimento do pensamento nacional, houve comentários variegados, alguns deles mereciam aprofundamento e até registo para um qualquer historiador procurar direcções de análise desse PAIGC aparentemente coeso e militarmente indómito. Um dos comentários lembrou ao perguntador a singularidade do desencadear da guerrilha: primeiro, a formação dos agitadores, quadros que foram lançados na subversão, quer nas barbas das autoridades, quer aproveitando a insignificância da sua presença, como foi o caso do Sul; esses agitadores conduziram à mobilização de populações, mesmo à custa do terror e da separação das famílias, em escassos meses, em 1963, o Sul foi transformado em parcelas atomizadas que reduziram a capacidade de manobra das tropas portuguesas.
Cabral era um ideólogo incontestado, nos primeiros anos; os choques virão mais tarde, se bem que permanecessem discretos, entre cabo-verdianos e guineenses, estes últimos frequentaram escolas de formação e foram confrontados com outras formas de racismo. Uma guerrilha que se expande tão rapidamente entre 1963 e 1964, populações a viver sempre em risco e, de um modo geral, a aceitar esses riscos e os sacrifícios no transporte de munições, armamento, comida e medicamentos, tudo acaba por se saldar numa combatividade de âmbito nacional, basta pensar no hino e na bandeira.
Alguém da assistência pede para fazer um comentário: é verdade que hoje o pensamento nacional é difuso, mas no conflito político-militar a população insurgiu-se contra a presença estrangeira, contingentes senegaleses e de Conacri foram severamente reprimidos por exércitos ad hoc, compostos por gente de todas as etnias. E foi lembrado ao perguntador se era possível não haver uma consubstanciada crença no PAIGC quando, em 27 de Abril de 1974, andavam grupos nas ruas de Bissau a gritar vivas ao MFA e ao PAIGC. O Tangomau a todos agradece, amanhã terá um encontro com Filinto Barros e Chico Bá para falar sobre a evolução da guerra de 1973 para 1974, ouvi-los sobre o que devíamos fazer conjuntamente para se estudar melhor o Outro, antes e depois da guerra que findou em 1974.
É a última fotografia que resta de Ponta Varela. Permite verificar a natureza do Geba estreito, que aqui começa ou aqui finda. Neste exactíssimo ponto, dentro da vegetação, os guerrilheiros do PAIGC flagelavam batelões e até lanchas da Armada. O Tangomau sentiu-se compensado da passeata em companhia de gente moçoila, intrigada com o velhote que caminhava despachado aqueles quilómetros ida e volta, encantado com hortas, cabaceiras, poilões e o marulhar da corrente desse Geba, que é o rio da sua vida.
3. Anoitece, o Tangomau despede-se das pessoas que amavelmente cederam a conversar com ele. Regressa à Pensão Central, vem com muita precisão de tomar um banho de caneco, pôr o corpo na horizontal, sentir o fresco de uma ventoinha trepidante. Encontra Patrício Ribeiro, combinam ir jantar num restaurante de comida portuguesa. Antes, conversa com a Avó Berta, conta-lhe o que andou a fazer pela região de Bambadinca. A Avó Berta aproveita para lhe falar de como, com o marido, num oceano de dificuldades, montaram a Pensão Central, como ela sobreviveu a todas as carestias, ali se recebeu professores, ali se manteve a sede viva da cooperação portuguesa e internacional. O Tangomau embevece-se com o fulgor desta senhora exemplar que se recusa a abandonar a grande obra da sua vida.
Refrescado e com o corpo menos moído, vai prestar contas e dar graças ali ao pé, na catedral. Dar graças por o coronel Jales Moreira ter pedido ao Daniel Nunes para encontrar uma solução de acolhimento na região de Bambadinca, foi ele quem apresentou o Tangomau ao embaixador Inácio Semedo, depois este pôs o irmão em acção; dar graças ao Fodé à família, dar graças a quem o reconheceu e o quis rever, com a alegria estampada no rosto, dar graças pela imensidade destas relações indestrutíveis, até ao último alento da sua vida.
Era assim a Pensão Central em 1997, fora retocada, pintada de branco imaculado, agora está de azul e há muita ferrugem à mostra. Ainda é possível andar num destes táxis azuis, com um ou até quatro passageiros. Importa não esquecer o bem que aqui se fez a quem chegou com fome e à procura de abrigo, de todas as partidas do mundo (foto retirada do site: www.guinee-bissau.net, com os devidos agradecimentos).
4. Vão jantar, o Patrício Ribeiro e o Tangomau, num restaurante decorado à portuguesa, até ali há enchidos, cebolas e alhos decorativos. Para surpresa do empregado, o Tangomau pede dois ovos estrelados, umas batatinhas fritas e uma boa salada, tudo a regar com uma cerveja gelada. A assistência grita frenética, o Barcelona esmaga o Real Madrid, há claques furiosas pró e anti-Cristiano Ronaldo. O Real Madrid sai dali desfeiteado, o Tangomau despede-se de Patrício Ribeiro, cai de sono, já está informado que aí pelas 23 horas se apaga a luz com o corte de energia, quer fazer as últimas leituras, preparar-se para os últimos encontros de amanhã, vai entregar cartas a Tumlo Soncó, que dentro em breve parte para o Cuor.
Na cama, folheia os elementos que compilou sobre o MFA da Guiné, o golpe militar que ele desencadeou em Bissau logo a seguir ao 25 de Abril, até o plano de ali fazer uma sublevação caso falhasse o 25 de Abril em Lisboa. Nunca entendeu porque é que os protagonistas não documentaram claramente estes factos, os movimentos, as tensões ideológicas e depois o entabulamento de relações, mais ou menos informais, com o PAIGC e como, logo em 1 de Julho de 1974 centenas de militares exigiram ao Governo de Lisboa o reconhecimento da República da Guiné-Bissau, no fundo se a Guiné o berço do MFA e este conspirou e descolonizou por conta própria no território, que diálogo se estabeleceu com os quadros do PAIGC. E assim adormeceu, mesmo sentindo a pressão do calor e depois de olhar, assombrado, o volteio dos carros na Avenida Amílcar Cabral, a fugir dos buracões do alcatrão, na noite escura.
Este é o Zé Pereira que viajou de Bissorã para me abraçar. Era o 1.º cabo mais culto e desempenado do Pel Caç Nat 52. Foi um exemplo de coragem quando, com Missirá em chamas, foi salvar uma criança esquecida numa morança. O que o Tangomau lhe deve não cabe num possível título de dívida e quando lhe disse: “Zé, deixa-me tirar-te uma fotografia, quer que todos saibam quanto te admiro!” ele logo respondeu: “Sim, mas com o teu livro na mão, este é meu e vou levá-lo para Portugal, quando for visitar o meu filho”. Um pai orgulhoso por ter conseguido dar estudos médios a todos os seus filhos, o Aillton é avançado no Atlético Clube Oriental e está a acabar a licenciatura.
5. De manhã, não há tempo para o devaneio de leituras, é importante escrever ao régulo Carambá, ao Príncipe Samba e ao Fodé. O ambiente escolhido é o do Centro Cultural Francês, é fresco e silencioso, o Tangomau escolhe uma mesa na zona da banda desenhada, bem fornecida e tentadora, sem perda de tempo escrevem-se saudações e promessas.
Que o régulo Carambá veja o Cuor desenvolver-se, do Geba estreito até Madina de Gambiel. Que o régulo esteja descansado, o Tangomau sente impulso para voltar, a velha estrada abandonada de Gambaná atrai-o, percorreu-a vezes sem conta, corta-lhe o coração vê-la reduzida a um caminho alcantilado de pouco préstimo, quer voltar à Aldeia do Cuor que ele encara como uma civilização perdida, nunca decifrou aqueles muros tão altos, houve quem lhe dissesse que ali se pensou criar a povoação mais importante, desistiu-se, sabe Deus porquê, foi assim que nasceu Bambadinca, era por Aldeia do Cuor que se pensava escoar as madeiras exóticas e os produtos agrícolas do Gambiel.
Ao Príncipe Samba desejou-se as maiores felicidades, agradeceu-se o encontro comovente, aquela tradução para crioulo, cheia de intenção e sentimento, aqueles pedidos de ajuda a que ele gostaria de corresponder e lamentavelmente não pode, o Tangomau recorda e acentua a gratidão pela dedicação recebida. Ao Fodé, o muito obrigado por ter convocado tanta gente, ele foi o anjo de S. Gabriel que anunciou a vinda do Tangomau.
Aproveita-se o agradecimento para fazer tábua rasa das diferentes tensões entre ambos, aguarda-se agora reencontro em Lisboa. Escritas as missivas, faz-se a sua entrega no Bairro Missirá, Tumlo lembra ao Tangomau que tem um filho com muito jeito para a bola, pede-lhe encarecidamente ajuda, o Tangomau volta a chorar, de impotência, não pode corresponder a tanto pedido.
Tumlo Soncó sentado, parece que está à espera calmamente que o futuro seja pródigo, lhe traga algumas benesses. É nestas coisas que o Tangomau revela a incipiência própria dos fotógrafos amadores, deixa sombra da Maria Fausta, a mulher de Abudu Soncó, e do Sr. Sabino, o motorista da Embaixada de Portugal.
6. Entregues as cartas, o Tangomau parte para um café onde se vai encontrar com Filinto Barros e Chico Bá, ou Francisco Silva, que foi comissário geral das frentes Norte e Sul. Ambos autorizam que o Tangomau tome notas. A primeira pergunta incidiu sobre o modo como se radicalizou a luta, exigindo, logo após o 25 de Abril uma independência total e irrestrita. Os interlocutores responderam que se temia também com o futuro de Angola e Moçambique: se a independência da Guiné empanasse, haveria consequências para as outras colónias. Era preciso que tudo começasse claramente na Guiné.
Ao contrário do que se tem dito, os negociadores guineenses pediram às autoridades portuguesas para ficarem transitoriamente na Guiné, cedo se aperceberam que não havia condições nem militares nem políticas. Os quadros do PAIGC sabiam não dispor de uma estrutura administrativa capaz para as novas realidades da independência. Os gestores que se prepararam vieram de escolas muito rígidas, como a RDA, uma outra realidade. Filinto Barros lembrou que a confraternização em Bissau teve muito poucas arestas, logo a seguir à chegada do PAIGC, por pura coincidência, encontrou do lado português um oficial da Armada que estudara com ele no Colégio Nuno Álvares. O erro não esteve em exigir a independência, esteve em não partilhar por mais alguns anos com os portugueses a aprendizagem da administração.
Falando dos acontecimentos de 1973 e 1974, estes dois importantes quadros políticos foram consensuais: não havia pressa quanto ao fim da guerra, sentia-se e sabia-se da erosão que a guerra estava a provocar e que a perda de supremacia aérea trouxera uma profunda desmotivação. Mesmo que, por absurdo, os aleados da NATO dessem provisoriamente um equilíbrio militar, a capacidade do PAIGC estava imparável, agora não era só o facto das tropas mal saírem do arame farpado, já se combatia com carros de combate e escolhiam-se alvos como Canquelifá que, tudo previa, iria ser cercada em Maio, em termos semelhantes ao de Guidage, como no ano anterior.
Os informadores do PAIGC em Bissau também sabiam que ia haver abandono de vários quartéis junto da fronteira e com graves consequências para o moral das tropas, essas populações ao abandonarem as suas tabancas iriam concentrar-se à volta de Bissau, agravando todos os problemas. Outra informação digna de nota: quando se proclamou o Estado em 24 de Setembro, a partir dessa data deu-se uma sangria de estudantes já adolescentes que se foram oferecer para a guerrilha. Era uma quantidade impressionante. A direcção do PAIGC ao comentar o facto concluiu que a juventude guineense irreversivelmente se pusera do lado do PAIGC. A relação de forças entrara em desequilíbrio, estes jovens marcavam a diferença. Discutiram-se ainda projectos sobre as relações com o Outro, de ambos os lados. Todos prometeram manter-se em contacto.
O Tangomau voltou à Madina do Gambiel à procura do paraíso, das palmeiras de Samatra. Tudo mudou, mantém-se luxuriante mas aquela beleza esmagadora desapareceu. Foi um dos momentos de decepção. Felizmente que o Tangomau fora reconhecido por Ieró Baldé, não há paisagem que substitua um momento de tanta beleza nos corações.
7. Amanhã haverá despedidas, algumas delas comoventes. E depois terminará este diário composto a trouxe-mouxe. O Tangomau vai às compras, para si e à procura de lembranças para os outros. Será a circunstância para mostrar as últimas fotos e convidar todos os confrades a voltar à Guiné.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 26 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7676: Ninte Kamatchol: a história da capa de um livro (Mário Beja Santos)
Vd. último poste da série de 21 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7650: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (16): Até Bissau num toca-toca e conversas sobre a história do PAIGC
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
Guiné 63/74 - P7682: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (17): Algumas conversas para melhor perceber o PAIGC
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4 comentários:
Mário Beja Santos, com toda a dedicação às memórias da guerra nossa e da Guiné, não consegue matar a curiosidade dele e nossa sobre o que se passa na "alma" do PAIGC.
Do PAIGC de hoje e de ontem.
Mas, sabemos muito bem que após a independência, foi o que temos visto, infelizmente para os guineenses, tudo muito negativo.
Mas sobre o que se passou desde os anos de formação do PAIGC até 1974, Mário Beja Santos tinha que ir Conacry, Moscovo , Havana e Dakar, porque em Bambadinca e ao longo do Geba, não encontra mais esclarecimentos do que aqueles que já tem há muito.
Mesmo em Bissau e cidade da Praia, apenas se ouvirá os silêncios habituais, mesmo nas explicações para os assassinatos e julgamentos de que oralmente se conhece entre o povo.
Faço votos que Beja Santos, com a mesma disposição.
Antº Rosinha
Leio na revista Visão, de hoje, pag. 47 em texto do nosso já conhecido historiador Luís Almeida Martins, a sua "seriedade e rigor" com que se aborda a nossa História:
"Acresce o facto de os guerrilheiros terem podido dispor no início dos anos 70 de mísseis terra-ar Streela, de fabrico soviético que derrubaram alguns aviões Fiat e deixaram a Força Aérea Portuguesa praticamente colada ao solo. O abate de um helicóptero em que viajavam quatro deputados da Assembleia Nacional consternou o regime."
A Força Aérea colada ao solo quando nunca voou tanto, nem bombardeou tanto como em 1973/74,
um helicóptero com quatro deputados abatido pelo PAIGC, em 1970, quando o héli caiu, no meio de um mini-tornado, no rio Mansoa, entre Teixeira Pinto e Bissau num lugar onde, em toda a guerra da Guiné, nunca foi visto um único guerrilheiro.
O que me faz um pouco de espécie é que, com todo o respeito, em 2011 o Mário Beja Santos ainda acredite na propaganda do PAIGC.
Abraço do
António Graça de Abreu
Reconheço que não é fácil "pôr a falar" os antigos combatentes (de um lado e do outro). E menos ainda "saber ouvi-los" (e "filtar" as suas respostas)...
Atenção: em viagem, mesmo de "turismo de saudade" (como me parece ser esta, a da Operação Tangomau), não se vai com o estatuto de jornalista, nem muito menos de investigador científico...
Costumo lembrar aos meus alunos, nas aulas de formação metodológica em investigação social e em saúde, o seguinte (que é o ABC):
O jovem investigador, ao desenhar o seu primeiro questionário (ou o seu primeiro guião de entrevista) (e nomeadamente se quiser fazer algumas perguntas de opinião), deverá ter sempre presente que:
(i)Há pessoas com tendência para mentir, efabular, fantasiar, etc;
(ii) Outras, pelo contrário, estão sempre de pé atrás;
(iii) Umas são exibicionistas e gostam de crescer uns centímetros em prestígio social (e não só…), na presença de terceiros;
(iv) Outras são demasiado tímidas , reservadas ou púdicas para escrever (ou para falar) sobre a sua vida íntimas ou pessoal;
(v) Há também quem tenha um obsessivo sentido de coerência, dando sempre respostas racionais, enquanto outros são sistematicamente críticos ou radicais;
(vi) Existem igualmente pessoas que fazem tudo para agradar aos outros (neste caso, ao entrevistador, que é um 'estrangeiro', alguém que vem de fora);
(viii) Há fenómenos grupais que podem enviesar as respostas às perguntas (groupthinking, ascendente social e intelectual de certos membros do grupo, pressão para a conformidade social, etc.) mas também ambientais e culturais (território, espaço, habitat, língua, etc.).
Para se evitar os problemas de enviesamento das respostas às nossas perguntas, temos no mínimo que fazer a "triangulação" das nossas fontes de informação...
É evidente que no nosso blogue nenhum de nós, que aqui escreve, está com o "estatuto" do historiador, do sociólogo, do antropólogo, do politólogo... Atenção, nenhum de nós ainda despiu definitivamente a "farda" (nem nós nem os nossos "inimigos" de ontem...).
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