Guiné > Região do Oio > Bironque > Uma mina anticarro, detectada a tempo... e pronta para ser levantada.
Região do Oio > Bironque > Levantamento da mina... Foto tirada à distância regulamentar...
Guiné > Região do Oio > Bironque > O Carlos Vinhal e o Sousa à sua esquerda... Nos dias que correm - de Campeonato do Mundo de Futebol - muito se tem falado da
angústia do guarda-redes na hora do penalti... Ora, raramente se tem falado aqui da
angústia dos nossos camaradas, Furriéis Milicianos de Minas e Armadilhas, quando se tratava de levantar um engenho explosivo montado pela guerrilha... (LG)
Texto e fotos: © Carlos Vinhal (2006), ex-Furriel Miliciano de Artilharia, com a especialidade de Minas e Armadilhas, CART 2732, Mansabá (1970/72)
Durante uma grande parte da comissão fui encarregue da gerência dos bares do aquartelamento. Por inerência do cargo ia quase todos os meses com o meu camarada Costa, Fur Mil Alimentação, a Bissau para acompanharmos no regresso os reabastecimentos da Cantina e Bares.
As colunas de reabastecimento eram compostas por um número elevado de viaturas de carga civis e militares, carregadas com víveres destinados a Mansoa, Mansabá, K3 e Farim. As viaturas militares de mercadorias eram pertença da Companhia de Transportes Militares e eram comandadas normalmente por um Furriel Miliciano que coordenava também as viaturas civis, alugadas para reforço. A protecção da coluna era assegurada entre Bissau e Mansoa pelas forças de Mansoa. A minha Companhia, por sua vez, esperava ali a coluna de onde fazia protecção até Mansabá e daqui ao K3. As viaturas de carga destinadas a cada aquartelamento iam ficando sucessivamente a descarregar, sendo apanhadas, mais tarde, no regresso da coluna para Bissau.
No dia 3 de Dezembro de 1971, num desses reabastecimentos, chegou, ainda em Bissau, uma informação de que teria sido montada, pelo IN, uma mina anticarro no trajecto entre Mansoa e o K3. Deram-me conhecimento do facto por eu ser o único graduado com o curso Minas e Armadilhas na coluna. Dirigi-me ao comandante das viaturas de reabastecimento, por sinal um Furriel Miliciano recentemente chegado à Guiné, para o avisar de que os condutores das viaturas de carga deveriam conduzir com cuidado, porque a todo o momento poderiam surgir complicações. Julgando que eu estava a amedrontá-lo por ele ser
periquito, não me levou muito a sério.
Percorridos cerca de sessenta quilómetros, chegamos a Mansoa sem problemas onde os camaradas da minha Companhia nos esperavam para continuar a escolta até Mansabá. Pela frente ainda tínhamos cerca de quarenta difíceis quilómetros, porque iríamos atravessar uma zona de passagem do IN para o Morés. Neste percurso circulávamos sempre com cuidados redobrados.
Assim se fez e chegámos a Mansabá sem sobressaltos, faltando agora cerca de quinze quilómetros até ao K3. Para chegar a Farim era só atravessar o rio na jangada.
Como eu ia ficar e a coluna continuar, dirigi-me ao furriel da Companhia de Transportes para lhe desejar a continuação de boa viagem, bom regresso a Bissau e uma boa estadia na Guiné. Aproveitou ele para dizer que eu tinha brincado, porque nada tinha acontecido.
A coluna continuou e eu pensava já num bom banho e roupa lavada.
Passado algum tempo, estava eu no quarto quando fui chamado ao Comandante. Afinal sempre tinha aparecido uma mina anticarro. Exactamente no Bironque, num buraco existente na estrada, feito pelo rebentamento de uma outra mina em 16 de Julho de 1971 (1), a qual tinha danificado irremediavelmente a nossa GMC, causando ainda seis feridos, um dos quais com gravidade. O Comandante deu-me ordem para avançar para o local a fim de neutralizar o engenho. Fui chamar o meu camarada Sousa para que ele me acompanhasse na missão e lá seguimos numa reduzida e improvisada coluna até ao local.
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Mansabá > CART 2732 ( 1970/72) > GMC destruída por mina A/C no Bironque, a 16 de Julho de 1971.
A detecção da mina deveu-se à informação recolhida em Bissau e ao bom hábito de picar a zona da cratera sempre que ali passávamos.
A coluna tinha interrompido a sua marcha e o furriel da Companhia de Transportes veio logo ter comigo, pediu-me desculpa por não ter acreditado em mim e desejou-me felicidades para a operação de neutralização da mina.
Analisada a situação, afastámos toda a gente para uma distância de segurança e metemos mãos à obra. Por sorte a mina, uma TM42, que possui uma asa própria para transporte, tinha-a acessível sem necessidade de lhe mexer muito. Foi só afastar um pouco de terra com cuidado não fosse estar armadilhada. Atámos-lhe uma corda estendendo esta de modo a, por de trás de uma árvore, puxar a mina até ela se soltar. À conta de alguma força, lá a conseguimos soltar. Para a tornar inofensiva, removi-lhe a espoleta e ei-la em condições de ser tocada e fotografada para a posteridade.
O pessoal reapareceu todo, recebemos as felicitações da ordem e voltou tudo à normalidade.
A coluna continuou o seu caminho até ao K3 e nós voltámos ao aquartelamento para finalmente eu tomar o meu banho e vestir roupa lavada. A rotina no aquartelamento esperava-me (2).
Carlos Vinhal
Ex-Fur Mil Art MA
CART 2732,
Mansabá (1970/72)
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Notas de L.G.
(1) Vd. post de 21 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P890: Uma mina no Bironque (Carlos Vinhal)
(2) Outros posts, inseridos no nosso blogue, relacionados com minas e armadilhas:
26 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P911: Uma mina para o 'tigre de Missirá'
24 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P904: SPM 3778 ou estórias de Missirá (3): carta a Alcino Barbosa, com muita intranquilidade (Beja Santos)
21 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P889: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (11): Férias em Portugal
(...) "Terminado o serviço, regressámos e Nossa Senhora nos valeu novamente. Saímos do aquartelamento de madrugada e passados uns 200 metros, ao começarmos a descer um relevo da estrada, no cimo da subida à nossa frente, dá-se um grande rebentamento e surge um grande tiroteio.
"Eu ia logo à frente, atrás dos picadores (picadores eram os rapazes que iam à frente com umas varas, com um ferro na ponta para picar o chão à procura de minas), e deito-me imediatamente para o chão. A árvore atrás de mim fica toda picada com tiros do inimigo. De repente noto que algo se passa de estranho, que havia outro tiroteio cruzado.
"Então o que se passara? Vinha na estrada, em sentido inverso ao nosso, uma secção de milícias nativas. O inimigo tinha na estrada uma mina comandada e montara uma emboscada. Como eles chegaram primeiro à mina foram eles a apanhar com a metralha.
"Resultado: 3 mortos e três feridos graves evacuados de heli Se tivéssemos sido nós a lá chegar primeiro, tinha apanhado eu e os picadores com aquela mina. Durante toda a tarde andei com o caixão daqueles rapazes noUnimog para os entregar às famílias. Ao fim do dia, por causa do calor, o sangue ainda não tinha coagulado" (...).
30 de Março de 2006 >
Guiné 63/74 - DCLXII: As minas do nosso descontentamento
26 de Março de 2006 >
Guiné 63/74 - DCLIII: Uma mina na estrada de São Domingos para Susana (Manuela Gonçalves)
(...) "Foi naquela mesmo estrada - de São Domingos para Susana - numa operação de reconhecimento da via, que o Unimog em que o maridão seguia, pisou uma mina anti-carro. No Unimog, uma outra mina anti-carro, levantada cerca de 300 metros antes, era transportada atrás e, por mero acaso, não rebentou, o que teria sido catastrófico para todo o pelotão!
"A mina tinha sido accionada pelo pneu do lado direito, pelo que o maridão foi
atirado para fora, em estado crítico, não tendo o condutor sofrido senão pequenos ferimentos, apesar da força do embate!
"Um helicópetro transportou-o para Bissau, tendo acordado uns dias mais tarde numa cama no Hospital Militar, sem uma perna e tendo por companheiro de quarto o capitão Peralta, cubano, cuja captura tão noticiada era nos
media de então" (...).
20 de Fevereiro de 2006 >
Guiné 63/74 - DLXVII: O meu diário (José Teixeira, enfermeiro, CCAÇ 2381) (15): um dia negro para a 15ª Companhia de Comandos (Setembro de 1969)
(...) "Na estrada de Fulacunda, mais 8 Comandos e 3 soldados ficaram sem vida. Houve ainda sete feridos graves, entre os quais o meu amigo Zé João, enfermeiro comando. Uma mina anti-carro de grande potência atirou com a viatura cheia de militares, que estiveram comigo em Buba (15ª Companhia de Comandos) contra um tronco de árvore que se debruçava sobre a estrada, matando uma série deles instantaneamente. No buraco feito pela bomba pode-se esconder uma viatura, tal era a sua potência" (...).
11 de Fevereiro de 2006 >
Guiné 63/74 - DXX: O meu diário (José Teixeira, enfermeiro, CCAÇ 2381) (14): De que lado estaria Deus ? (Agosto de 1969)
(...) "As colunas de abastecimento a Aldeia Formosa e povoações limítrofes continuam a dar que falar. Ontem, seguiu mais uma e ao chegar ao Pontão de Uane, uma mina anticarro rebentou debaixo da 14ª viatura, projectando os seus ocupantes a grande altura, pois a viatura seguia sem carga. Três mortes instantâneas, todas de africanos e nove feridos graves, entre os quais dois colegas meus. Foi este o resultado" (...).
26 de Janeiro de 2006 >
Guiné 63/74 - CDLXXV: Estórias do Xitole ao Saltinho: duas pontes, um fornilho e uma trovoada tropical (David Guimarães)
24 de Janeiro de 2006 >
Guiné 63/74 - CDLXXVI: Um mês a feijão frade... e desenfiado (Mondajane, Dulombi, Galomaro, 1969) (Carlos Marques Santos)
(...) "No cruzamento para Dulombi rebenta uma mina na GMC que segue à minha frente (nós íamos apeados, fazendo a segurança à coluna que integrava uma nova Companhia em treino operacional e que era de madeiraenses) a cerca de 15/20 metros, destruindo a sua frente. Resultado: um morto (desintegrado) e um ferido (condutor) que faleceu ainda nesse dia.
"Impossibilitados de prosseguir fomos para Dulombi com os reabastecimentos. Aí fomos informados que deveríamos seguir a pé para Mondajane, que atingimos e onde nos instalámos" (...).
22 de Janeiro de 2006 >
Guiné 63/74 - CDLXXI: Quando até os picadores tinham medo (Mansambo, 1968)
... Às 14.00h a coluna iniciou a retirada, tendo a cerca de 2 Kms da Ponte dos Fulas (XIME 7C-2) sido emboscada do lado Oeste por grupo IN estimado em 40/50 elementos. Esta emboscada foi iniciada pelo accionamemto de uma mina A/C comandada e simultaneamente pelo lançamento de granadas de Mort e LGFog, tendo dois destes últimos atingido duas viaturas GMC, uma das quais ficando imobilizada.
A emboscada foi feita no princípio do regresso da coluna tendo a ela ficado sujeitos o Pel Caç Nat 53 e 2 Gr Comb da CART 2339, durante cerca da 30 minutos, tendo as NT reagido pelo fogo e manobra.
Tratados os feridos, apagado um foco de incêndio manifestado numa das viaturas atingidas, atrelada a que ficara imobilizada, [foi depois] procurado na ausência do PCV contacto com qualquer um dos postos fixos de Bambadinca, Mansambo e Xitole, [tendo-se] conseguido a ligação com este último, por onde foi feito o pedido de apoio de fogo da aviação de Bambadinca – Agrupamento.
"Iniciada a marcha com todo o pessoal apeado, pouco tempo depois nova emboscada IN do mesmo lado da estrada e com os mesmos efectivos e armamento (Mort 60, Met Lig e Armas Aut)(...)
19 de Janeiro de 2006 >
Guiné 63/74 - CDLIX: Cancioneiro de Mansoa (6): O pesadelo das minas
(...) "Na Guerra do Ultramar, em África,
De todos os temores, o mais terrível
Era a mina dissimulada no chão,
Traiçoeira... funesta... invisível" (...)
2 de Dezembro de 2005 >
Guiné 63/74 - CCCXXIX: E de súbito uma explosão (Luís Graça)
(...) "E de súbito uma explosão. O sol dos trópicos desintegra-se. O céu torna-se bronze incandescente. O mamute de três toneladas dá um urro de morte ao ser projectado sob a lava do vulcão. E depois, silêncio... Era uma hora e meia da tarde quando o meu relógio parou, na estrada de Nhabijões-Bambadinca" (...).
23 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 -
CCV: 1 morto e 6 feridos graves aos 20 meses (CCAÇ 12, Janeiro de 1971) (Luís Graça)
(...) "Às 11.25h, na estrada de Nhabijões-Bambadinca, uma viatura tipo Unimog 411, conduzida pelo Sold Soares (CCAÇ 12) que ia buscar [a Bambadinca] a 2ª refeição para o pessoal daquele destacamento, accionou uma mina A/C.
"0 condutor teve morte instantânea. Ficaram gravemente feridos 1 Oficial (CCS / BART 2917)[Alf. Mil. Moreira] (a), 1 Sargento (Fur Mil Fernandes/CCAÇ 12) e 1 Praça (CCS / BART 2917)(...).
(...) "Regressado ao local das viaturas, o Gr Comb pelas 13.30h recebeu ordens para recolher, tendo o pessoal tomado lugar no Unimog e na GMC em que tinha vindo. Esta última [onde vinham as secções, comandadas pelos Fur. Mil. Marques e Henriques] (d) , entretanto, ao fazer inversão de marcha, e tendo saído fora da estrada com o rodado trazeiro, accionaria uma outra mina A/C colocada na berma, a 10 metros da anterior, e que não havia sido detectada pelos picadores.
"Em resultado de terem sido projectados, ficaram gravemente feridos o Fur Mil Marques e os Sold Quecuta, Sherifo, Tenen e Ussumane. Sofreram escoriações e traumatismos de menor grau o Alf. Mil. Rodrigues, o Sold TRMS Pereira e os Sold Cherno e Samba"(...).
11 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 -
CLXX: As heróicas GMC e os malucos dos seus condutores (CCAÇ 12, Septembro de 1969) (Luís Graça)
(...) "Porquê falar em sorte ? É que eu ia justamente à frente da viatura que accionou a mina, justamente do lado do pendura, com uma perna de fora… À turista, como quem vai num alegre e matinal safari algures num parque no Quénia… A pouco e pouco, o periquito ia ganhando confiança… Com três meses e meio de Guiné, e baptismo de fogo ainda muito recente (...) considerava-me já quase um veterano…
"Recordo-me da viatura: um Unimog 404… Apesar da relativa tranquilidade que nos davam a experiente equipa de 12 picadores que iam à nossa frente com dois grupos de combate apeados, eu tinha recomendado ao condutor do Unimog que seguisse milimetricamente o rodado da viatura da frente… Um desvio de um milímetro podia ser fatal para o artista… O Dalot, que ia a atrás de mim, levava um bicho que tinha dez rodas, dois rodados duplos atrás, várias toneladas de ferro, mais três de arroz… Daquela vez vez foi ele e a sua GMC que voaram… Eu fiquei para a próxima, já lá mais para o fim da comissão" (...).
10 de Julho de 2005 >
Guiné 69/71 - XCIX: Estórias do Xitole: 'Com minas e armadilhas, só te enganas um vez' (David Guimarães)
(...) "E lá foi naquele dia o Quaresma, sempre ele, que já tratava por tu essa maldita granada. E como gostava dela, o furriel miliciano Quaresma!
"Mais um dia, e novamente o armadilhamento da entrada. Dessa vez ele até foi contrariado, estava a preparar uma galinha para churrasco, lerpou, não comeu…
"O quadro é simples: ouve-se um rebentamento, só um. O Quaresma é decapitado, o Leones fica cego e sem dedos… Ficámos todos em estado de choque:
-Não podia ser!!! - Mas foi: um parte para a eternidade, o outro é evacuado... O Quaresma desta vez tinha falhado, nunca mais armadilharia na vida" (...)
23 de Junho de 2005 >
Guiné 69/71 - LXXV: Minas e armadilhas (David J. Guimarães)
20 de Maio de 2005 >
Guiné 69/71 - XXII: O inferno das colunas logísticas na estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole-Saltinho (Luís Graça)