domingo, 11 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25157: Por onde andam os nossos fotógrafos? (19): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte V: A visita da "Cilinha" a Nhala a um mês e meio do 25 de Abril de 1974


Foto nº 1


Foto nº 2

Foto nº 3

Foto nº 4

Foto nº 5

Foto nº 6

Foto nº 7

Foto nº 8 

Foto nº 9


Foto nº 10

Froto nº 11

Guiné > Região de Tombali > Nhala > 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) >  Domingo, 10 de março de 1974 > A visita da Cecília Supinco Pinto ("Cilinha")

Legendas:

Fotos nº 1 >   Cilinha, à chegada, num momento de descontração. Boas vindas da companhia com os apertivis possíveis.

Foto nº 2 -  A Cilinha a dialogar com o cmdt do BCAÇ 4513 (Buba); em primeiro plano o cap João Brás Dias, comandante da 1.ª CCAÇ/ BCAÇ 4513 (Buba).

Foto nº- 3 >  Messe de oficiais de Nhala. O Comandante do Batalhão diz umas palavras de circunstância.

Foto nº 4 > Deois de ter falado para  um pequeno juntamento de militares e nativos, a Presidente do MNF prepara-se para partir para Aldeia Formosa.

Foto nº 5 > A  "Cilinha",  oten- cor Carlos Ramalheirao  e  cmdt da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Nhala), cap Braga da Cruz. 

Foto nº 6 > A "Cilinha", com a ajuda do ten-cor Ramalheitra, sobe para a Berliet.

Foto nº  7 > A "Cilinha" e o  ten-cor Ramalheitra acomodam-se na  Berliet.,

Foto nº 8 > Beijo de despedida do cap Braga da Cruz.

Fotoo nº 9 > A "Cilinha" despede-se de um alferes náo identificado  
 
Foto nº 10 - Último adeus da "Cilinha" ao pessoal de Nhala. 

Foto nº  11 -  Partida +ara Mampatá, o aquartelamento seguinte. (A mim pareceu-me mal que a Cilinha e o Comandante de Batalhão tivessem seguido à cabeça da coluna numa Berliet rebenta-minas; ao lado direito; a escolta foi feita por  fuzileiros do destacamento de Cacine.)

Fotos (e legendas): © António Murta  (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. A visita da Cilinha  (seu nome de guerra) era sempre motivo para algum alvoroço nos nossos aquartelamentos... Antes de mais, pela curiosidade de  ser uma das raríssimas  mulheres brancas que se podia ver no mato, em plena guerra, em carne e osso... E sempre bem vestida. Secundariamente,  por ser a histórica e carismática líder do MNF - Movimento Nacional Feminino que, para alguns  nossos soldados,  tinha sobretudo a função de "Pai Natal": com sorte, um pedido ao MNF, desde que não fosse exorbitante,  era atendido (livros, instrumentos musicais, equipamentos de futebol, etc.).

Cilinha tinha um carinho especial pela Guiné (a sua "Guinezinha")  e pelos militares que aí "defendiam a Pátria", a avaliar pelas diversas vezes (quatro)  que visitou o território, a última das quais já em março de 1974, a um escasso mês e meio do golpe de Estado do MFA. 

A melhor reportagem, documentada, por texto e fotos, que já aqui apresentada sobre uma visita da Cilinha ao mato, é a do nosso camarada António Murta,  ex-alf mil inf,  MA,   2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74).

De uma lote de cerca de duas dezenas, selecionámos e  reeditámos onze fotos (*), Segue também um excerto do enquadramento feito pelo fotógrafo.


A visita da Cilinha a Nhala em 3 de março de 1974

Texto e fotos: António Murta (**)


(...) Este mês de Março ficou marcado por alguns acontecimentos empolgantes, para variar, como a ligação de Nhala à estrada nova Aldeia Formosa-Buba e a visita da Presidente do Movimento Nacional Feminino, Cecília Supico Pinto.

Sobretudo esta visita, trouxe uma animação inusitada às tropas de Nhala – e do Sector -, mas não se pode dizer que tivesse, também, quebrado a monotonia e a rotina, simplesmente porque naquela época, o que tínhamos menos era monotonia e rotina, tal era a actividade operacional.(...) 

10 de Março de 1974 – (domingo) – A visita da Cilinha 


Cecília Maria de Castro Pereira de Carvalho Supico Pinto [Lisboa. 1921 – Cascais, 2011],  Cilinha, como gostava de ser tratada, (diminutivo que lhe vinha da infância), era descendente de aristocratas e uma Senhora do Regime.

Não precisa de grandes apresentações porque sobre ela quase tudo já foi dito. Muito antes de a ter conhecido em Nhala, já tinha por ela uma elevada consideração e um grande respeito, pela sua coragem, tenacidade e coerência.

Durante treze anos, de 1961 a 1974, foi presidente do MNF que ela fundou, tendo em vista acções de sensibilização da sociedade portuguesa para a defesa das colónias ultramarinas, o seu Ultramar.  

Tudo fez nesse sentido, desdobrando-se em iniciativas na Metrópole e calcorreando as colónias, tentando dar alento a tropas desmotivadas e politicamente amorfas.

Era por ser assim, e não pelos seus objectivos, que a admirava e a minha consideração elevou-se depois de a ter conhecido. Porque, sendo coerente com as suas convicções, saiu do seu confortável cantinho e dos salões solenes e elegantes, e veio para o terreno com o seu camuflado pôr na prática aquilo em que acreditava, correndo riscos e sofrendo privações.

E via-se que gostava do que fazia, exibindo uma alegria contagiante e uma disponibilidade total, atributos que passavam para quem a via e ouvia, por a reconhecerem como “um deles”. Politicamente, eu estava nos antípodas. Para mim, a Cilinha, pelas suas ideias e acções e pela sua proximidade (intimidade) com o Regime, representava o Regime.

Politicamente, portanto, eu era contra a sua filosofia de manutenção das colónias, contra tudo o que dizia e fazia nesse sentido, que era, um pouco do que já fizera na sua juventude em prol da caridadezinha.

Paradoxo, incoerência da minha parte? Não. Repito que, como pessoa, tinha por ela o meu maior respeito e consideração. Aliás, soube já depois da sua morte que, nesse aspecto de respeitar o “outro” mesmo não concordando com “ele”, ela não era muito diferente de mim.

Dois exemplos: foi sempre amiga, desde a infância, da Sofia de Mello Breyner, mesmo estando em campos políticos opostos; uma vez disse, revelando nobreza de carácter: “Admiro Cunhal pela sua coerência”.

Para terminar, lamento que, após o 25 de Abril e até à sua morte, tenha sido desprezada pela esquerda e ostracizada pelos seus correligionários de direita. Tudo apanágios de gente de baixa índole. Sei que nunca foi hostilizada, ainda assim, merecera mais consideração.

À chegada a Nhala, a Cilinha foi alvo de calorosa recepção por parte da tropa e de alguma população, sobretudo crianças. Mais pelo inédito da situação e pela curiosidade por esta mulher branca que se aventurava no mato para chegar perto deles, com estímulos e uma palavra amiga.

Almoçou na messe de oficiais após uns descontraídos aperitivos, mais para pôr a conversa em dia. Vinha acompanhada pelo Comandante do Batalhão, Ten Cor Carlos Alberto Ramalheira e por um séquito de outros oficiais que foi arrastando por onde passou.

Após o almoço (ou antes?) houve tempo para falar aos soldados, cantar o fado e, até, dançar com alguns. Depois partiu rumo a Mampatá, após demoradas e sentidas despedidas. 

Admito que foi o acontecimento do mês, mas não poderia adivinhar que o mês seguinte traria acontecimentos muito mais importantes e marcantes do que este, efémero e superficial. (...)

[Seleção e reedição de fotos, revisão / fixação de texto para efeitos de edição neste blogue, itálicos e negritos: LG]

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 25 de janeiroo de 2024 > Guiné 61/74 - P25109: Por onde andam os nossos fotógrafos? (18): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte IV: Bem-vindos a Nhala!


Vd. tanbém poste de 15 de setembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21361: (De)Caras (160): Cecília Supico Pinto (1921-2011)... "Cilinha, uma mulher que aprendi a admirar e a respeitar, mesmo discordando dos seus objetivos políticos" (António Murta, autor de uma belíssima reportagem fotográfica da visita da histórica líder do MNF a Nhala, em 10/3/1974, e que ela nunca viu em vida)

sábado, 10 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25156: Os nossos seres, saberes e lazeres (613): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (141): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Quando comecei a preparar este passeio a Évora, soltou-se-me uma recordação e estou a ver a minha adorada avó materna na cama, derrubada por um AVC, a ouvir na sua telefonia marca PYE canções alentejanas nas vozes de Francisco José e Luís Piçarra; havia um programa de discos pedidos pelos ouvintes e eu tinha a recomendação de pedir com regularidade O Meu Alentejo, por Francisco José, foram pedidos até à exaustão, mas era um consolo da minha ditosa avó, e falava-se de Évora com uma regularidade inusitada. Consolo também senti com este fim de semana inteiro a calcorrear Évora, sopesando as palavras de José Saramago, a cidade é muito mais do que está consagrado no Património da Humanidade, há uma intemporalidade que acaba por se revelar na dinâmica entre o antigo, o que é restaurado, o inovado e a permanência da cultura contemporânea, tudo se articula em bom concerto, é isto que dita a especificidade eborense.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (141):
Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (1)


Mário Beja Santos

Desta vez preparei-me a sério, procurei munição do melhor calibre, desde um roteiro turístico do Património Mundial, obras de Túlio Espanca, folhetos vários dedicados a museus, casas apalaçadas, belezas perenes desde o chamado Templo de Diana ao Centro Cultural da Fundação Eugénio de Almeida. Mas não resisti, à guisa de introito a este passeio pegar no belo álbum que a idealidade de Évora preparou para a candidatura da cidade a Património da Humanidade, é um luxo, texto de José Saramago e fotografias de Eduardo Gageiro. De mestre Gageiro não me atrevo a falar, seria insulto concorrer a minha câmara com a genialidade das suas imagens. Peço é licença a Saramago para uma citação que extraí deste álbum:
“A singularidade de Évora não deve ser procurada nas suas igrejas nem nos seus palácios. Palácios e igrejas é o que não falta pelo mundo fora, muitos deles, sem dúvida, de maior beleza e sumptuosidade do que estes que a invenção criadora e o engenho edificador de gerações portuguesas souberam erguer aqui. Évora podia ter a Sé, e apesar disto não ser Évora. Podia apresentar à admiração universal a relação completa dos seus elementos, e Évora continuar a não ser. Podia enumerar e descrever com amorosa minúcia os méritos arquitetónicos e artísticos de S. Francisco e de S. Brás, dos Paços de D. Manuel e da igreja da Graça, dos Loios e do Templo Romano, do Aqueduto da Água da Prata e do Seminário Maior, e ainda assim não chegaria a ser Évora. Há cidades que são sobretudo famosas pelos esplendores materiais que o tempo nelas foi depositando, ao passo que esta Évora seria sempre a Évora que profundamente sabemos ser, mesmo que um maligno passe de prestidigitação fizesse desaparecer da noite para o dia os seus atrativos mais evidentes, deixando-a apenas com a nudez das suas ruas e dos seus pátios, dos seus largos e calçadas, dos seus becos e travessas, das suas arcadas, dos seus terreiros. Com a nudez das suas frontarias, com a claridade das suas fontes, com o segredo das suas portas.
Porque Évora é principalmente um estado de espírito, aquele estado de espírito que, ao longo da sua história, a fez defender quase sempre o lugar do passado sem negar ao presente o espaço que lhe é próprio, como se, com o mesmo olhar intenso que os seus horizontes requerem a si mesma se tivesse contemplado e portanto compreendido que só existe um modo de perenidade capaz de sobreviver à precariedade das existências humanas e das suas obras: segurar o fio da história e com ele bem agarrado avançar para o futuro. Évora está viva porque estão vivas as suas raízes.”

Posto isto, saio para a rua e faço menção do primeiro passeio, com um belo sol de outono.

O que é que há de especial nesta arcada e no enfiamento das ruas, pode-se dizer? É a presença contumaz do branco e do amarelo, a singularidade é a de, em nenhuma circunstância, provocar monotonia, há também para ali uns lambrins em cinzento, dão realce ao que o olhar contempla. Saí à rua e vou daqui até à Praça do Giraldo bem embalado por estas duas cores prevalentes.
Há nomes bem curiosos para as ruas de Évora, pergunto-me se se tratava de um lagar de azeite e havia dízimos para a aristocracia da cidade ou para o senhor arcebispo. Gosto sempre do respeito pela memória. Nunca me esqueço daqueles anos em que fui representante na Confederação Europeia dos Sindicatos, esta sediava-se na Rua da Montanha de Hortaliça…, isto no centro histórico de Bruxelas.
Impossível não apreciar o tratamento num edifício intervencionado deixando à mostra algo que vem do passado. Porque património é mesmo dever de memória, não se aterram os vestígios de outras eras.
Impressiona este branco imaculado que vai do fontanário à fachada da igreja de Santo Antão, estamos no coração da Praça do Giraldo.
Não escondo a estupefação, consagrar o nome de uma rua aos estroinas ou outras pessoas pouco abonatórias, a que titulo se homenageiam os valdevinos, alguém me pode explicar?
Neste caminhar em rua pedonal em direção à Sé Catedral depara-se com esta loja dedicada a objetos da cortiça, da minha infância há a lembrança de mobiliário pintado e um punhado de objetos, o corcho e o tarro, por exemplo, regozijo com a amplidão de aplicações e folgo imenso com tal desenvolvimento comercial, é também uma maneira de revelar no mundo que somos a primeira potência corticeira.
Retiro o que vem na inscrição alusiva, trata-se da maior de Portugal de estilo românico-gótico, séculos XIII e XIV, menciona-se o belíssimo claustro gótico com o túmulo do fundador, o bispo D. Pedro, e recomenda-se ao visitante que não deixe de contemplar o órgão ibérico único em Portugal (séc. XVI), a imagem da Senhora do Ó (séc. XV) e o Arcanjo S. Gabriel (séc. XV), capela do Esporão (séc. XVI), Capela-mor (séc. XVIII), e Capela das Relíquias (talha do séc. XVIII).
Surpreende na escadaria da Sé o túmulo que se mostra, e dá satisfação ver que há cuidados de manutenção dada a exposição às inclemências do tempo.
Pormenor do pórtico, registo também satisfação com os cuidados de manutenção da preciosidade nestes lavores da pedra.
Impressionante escultura de um evangelista numa esquina de corredores do claustro da Sé de Évora
Transcrevo o que diz a inscrição sobre o claustro, é construção de meados do século XIV, prima a arte gótica com os seus arcos ogivais nas abóbodas e nas janelas e ainda desenhos geométricos nos óculos, de influência árabe. É aqui que se encontra a capela do fundador com o seu belo mausoléu da arte gótica e as imagens de S. Pedro, Virgem com o Menino, Senhora do Ó e o Arcanjo S. Gabriel; em casa ângulo do claustro, imagem dos quatro evangelistas.
Um pormenor do claustro
Claustro ajardinado, torre com pináculos, merlões da fachada lateral, há aqui qualquer coisa de catedral-fortaleza, mas não passa de uma suposição.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 3 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25131: Os nossos seres, saberes e lazeres (612): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (140): Férias em região duriense, uma rota de aldeias vinhateiras (9) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25155: O(s) segredo(s) que o Amadu Djaló (Bissau, 1940 - Lisboa, 2015) não quis ou não pôde contar no seu livro (1): A revolta da CCAÇ 21, em 16 de agosto de 1974, em Bambadinca, e as suas exigências "milionárias": 300 contos por cabeça (50 mil euros, a preços de hoje), antes de entregar a arma e passar à "história" (isto é, à "peluda")

Guiné > s/l [Bambadinca?] > s/d [c. 1971/73] > A Força Africana... O major inf Carlos Fabião, na altura (1971/73),  comandante do Comando Geral de Milícias, e o gen António Spínola, passando revista a uma formatura de novos milícias.

In: Afonso, A., e Matos Gomes, C. - Guerra colonial: Angola,  Guiné, Moçambique. Lisboa: Diário de Notícias, s/d. , pp. 332 e 335. Autor da foto: desconhecidos. (Reproduzidas com a devida vénia)

1. Há segredos que não se partilham, por uma razão ou outra. Este, que envolve o Amadu Djaló, pode ter sido por uma de quatro razões (especulativas, acrescente-se): 

(i) o Amadu Djaló não estava lá nesse dia, em Bambadinca  (ele vivia em Bafatá, com as suas duas mulheres e restante família, incluindoa a amada mãe): 

(ii) o Amadu Djaló terá achado indigno o comportamento dos seus camaradas e subordinados, e escamoteou, esqueceu ou  branqueou este episódio, grave, que foi a insubordinação da CCAÇ 21 (no seu todo ou em parte)

(iii) o Amadu Djaló já se desligara, disciplinar e afetivamente, dos seus antigos camaradas e subordinados da CCAÇ 21, que era comandado pelo ten graduado 'cmd' Abdulai Jamanca (a companhia seria dissolvida e extinta dois dias deppois, em 18 de agosto de 1974);

(iv) "last but not the least" (isto é: não menos importante...), a ser verdade que cada militar da CCAÇ  21 só aceitava entregar a arma e passar à disponibilidade por 300 contos "per capita", estávamos perante uma exigência "milionária":  na época,  300 contos (da Guiné, 1 escudo a valer 0,90 de 1 escudo da metrópole) seriam qualquer coisa como cerca de 50 mil euros (a precos  atuais); multiplicando por 150 homens (=1 companhia,  só de guineenes) daria qualquer coisa como 7,5 milhões de euros (que não poderiam caber na mala de nenhum governador-geral, ainda para mais na véspera do reconhecimento do independência e da saída do território por parte de Portrugal; o Amadu Djaló não podia deixar de estar a par destas reivindicações, para mais sendo um alferes graduado da companhia; mas será que ele tinha a noção exata ou aproximada dos valores que estavam em jogo ? 

2. Vamos reconstituir o que se passou nesse "dia de todas as emoções" (como escreveu, no seu diário, o senhor cor cav CEM Henrique Manuel Gonçalves Vaz, 1922-2001).

Repete-se aqui a mensagem do nosso leitor (e camarada) Fernando Gaspar, ex-Fur Mil Mec Arm, CCS/BCAÇ 4518/73 (1973/74):


Data: 11 de Maio de 2012 22:30

Assunto: Bambadinca 1974

Boa noite, Luís

Fui furriel miliciano com a especialidade de mecânico de armamento e fui incorporado no Batalhão [de Caçadores] 4518/73 para a Guiné...  

Após o 25 de abril de 1974, fui destacado para Bambadinca para receber material militar, viaturas, armas, etc.


Em agosto de 1974 (não consigo memorizar o dia), os militares presentes no destacamento de Bambadinca (eu incluído), foram surpreendidos com a presença de dezenas de militares do denominados Comandos Africanos (tropas nossas aliadas).

Todos nós (talvez duas dezenas),  ficámos perplexos... Primeiro pensámos que vinham entregar as armas (o que nos facilitava o regresso a Portugal), mas não!... Fomos encostados à parede e deram um prazo de 48 horas para serem pagos da indemnização a que tinham direito, ou então, seríamos fuzilados... 

Cerca de 40 horas após o sequestro, o brigadeiro Carlos Fabião chegou num helicóptero com duas malas carregadas de dinheiro... Terminou o sequestro!

Se através do teu blogue for possível reencontrar esses camaradas de armas, ficarei muito agradecido.

Até sempre, um abraço | 
Fernando Gaspar


2. Comentário de L.G.:

Na altura manifestámos a nossa gratidão e apreço ao Fernand0 Gaspar pela  coragem de vir, a público, num blogue de antigos combatentes, revelar esse segredo, que possivelmente guardava, enterrado  há muito na sua memória... 

De qualquer modo, o  que ele  contava - ao fim de quase 4 anos todos - e que deve ter isso um pesadelo para ti e para os demais camaradas que foram feitos reféns, já não era segredo para mim... Já aqui transcrevi, ao de leve,  uma conversa que tive, em Monte Real, por ocasião do nosso VII Encontro Nacional, com o último comandante do Pel Caç Nat 52, o alf mil Luís Mourato Oliveira [foto à direita].

Ele também estava em Bambadinca, sentado tranquilamente no bar de oficiais, a beber o seu copo, quando ocorreram os graves incidentes aqui  referidos, sem grandes detalhes..  Foi igualmente sequestrado como o Fernando Gaspar  e mantido como refém até à chegada do brigadeiro Carlos Fabião, que, vindo de Bissau,  resolveu o problema (havia um vazio legal, com a CCAç 21 e a CCAÇ 20, que estaria ainda por resolver,  mais de um ano deppois da sua criação).

Isto ter-se-á passado não com os "Comandos Africanos" (que pertenciam ao Batalhão de Comandos da Guiné, com sede em Brá, Bissau)  mas com o pessoal da CCAÇ 21, que era comandada pelo tenente 'cmd' graduado Abdulai Queta Jamanca, e onde havia antigos militares da formação inicial da CCAÇ 12 do nosso tempo (Contuboel e Bambadinca, 1969/71)...  

Disse-nos o Mourato Oliveira que, depois da negociação com o Carlos Fabião, houve grande ronco...

Semelhantes incidentes (graves) deram-se em Paúnca, pela mesma altura, com a malta da CCAÇ 11 (antiga CART 11), já relatados pelo nosso camarada J. Casimiro Carvalho. (*)

De qualquer modo, esperávamos que tanto o Fernando Gaspar como o Luís Mourato Oliveira nos pudessem, na altura,  fornecer mais pormenores destes tristes acontecimentos que poderiam ter originado um tragédia imensa,  se as ameaças de fuzilamento dos reféns fossem levadas a série pelos militares revoltosos da CCAÇ 21, em caso de falharem as "negociações"!. 

3. O alferes 'cmd' graduado Amadu Bailo Djaló [foto à direita] também pertenceu a essa companhia, que era inteiramente constituída por pessoal do recrutamento local (incluindo os graduados e os especialistas). No entanto, nas suas memórias (Amadu Bailo Djaló - Guineense, comando, português: 1º volume: comandos africanos, 1964-1974. Lisboa: Associação de Comandos, 2010, 299 pp., il), não são narrados, referidos ou sequer evocados os "incidentes" de Bambadinca (vd. pp. 276 e ss.). 

Talvez o nosso camarada Virgínio Briote [foto à esquerda,] que o ajudou a escrever o livro (como "copy desk") e privou muito com ele, nos seus últimos anos de vida, possa ainda esclarecer o que se passou exatamente nesses dia 16 de agosto de 1974 em que a CCAÇ 21 (ou parte do seu pessoal, possivelmente até à revelia do seu comandante, Abdulai Jamanca) tomou como reféns cerca de duas dezenas de militares metropolitanos que ainda restavam em Bambadinca, a aguardar o fim da comissão.

4. Estes factos já eram conhecidos do nosso blogue, ainda antes do final de 2011. Terminamos este poste,  já longo, com um dos  excertos dos registos pessoais, manuscritos, do cor cav CEM, Henrique Manuel Gonçalves Vaz (1922-2001), no ano de 1974, no TO da Guiné (foto a seguir, à direita).

A recolha e a transcrição são  da responsabilidade do seu filho Luís Gonçalves Vaz que estava, nessa época (1973/74), com a sua família, em Bissau (é hoje  professor de matemática e ciências da natureza numa escola da zona de Braga; é membro da nossa Tabanca Grande). 

Recorde-se que a CCAÇ 21, de vida efémera (e que não tem história da unidade) foi dissolvida e extinta dois dias depois, em 18 de agosto de 1974.

(...) 16 de Agosto de 1974

... Este foi um dia tremendo de trabalho e emocionante com as notícias de Bambadinca, em que a Companhia  de Caçadores nº 21 a tomar conta do aquartelamento e a exigirem 300 contos por homem, para entregarem a arma e passarem à disponibilidade!

Foi para lá o Governador Brigadeiro Fabião e ao fim da tarde foi recebida a notícia de que tudo estava resolvido. ..."

Coronel Henrique Gonçalves Vaz (Chefe do Estado-Maior do CTIG) (...)

Este valor (300 contos, 300 mil escudos ultramarinos) era uma exorbitância! Tem de ser confirmado. (Nesta altura, em meados de 1974, já depois do 25 de Abril, um Fiat 127, que era o carro mais vendido em Portugal, custava 95 contos, o litro da gasolina andava nos 7$50, e o salário mínimo nacional acabava de ser fixado em 3300$00 mensais)...

Nunca o pobre do Amadu Djaló ganhou 300 contos  em toda a guerra. Nem sequer um oficial general ganhava isso numa comissão de dois anos!...Pode ter havido um erro de audição e/ou transcrição, se calhar há um zero a mais: vamos ter de pedir ao Luís Gonçalves Vaz que  releia com atenção o "manuscrito" do seu querido pai. 

No nosso tempo, um soldado da CCAÇ 12, do recrutamento local, uma praça de 2ª classe (!) ganhava 600 escudos por mês, mais o "per diem" de 24$50 por ser desarranchado: comia na tabanca e no mato, em operações, não tinha direito a ração de combate (levava um lenço atado com um mão  cheia de arroz cozido) ... Em suma, recebia em média 1300 escudos ("pesos") mensais (em 1969/71).

Os militares da CCAÇ 21 devem ter recebido em 16/8/1974, aliás como o disse o Amadu Djaló (não no livro mas noutra fonte), o dinheiro a que tinham direito até fim do ano de 1974.  O Amadu Djaló foi oficial do Exército Português até essa data. Depois teve que optar por uma das nacionalidados... Recuperaria mais tarde a nacionalidade portuguesa,  mais tarde,; quando vem para Portugal em 1986, juntamente com outros antigos comandos...

Infelizmente estas "pequenas grandes histórias " não vêm nos livros da CECA nem  na historiografia militar oficiosa,  oficial ou académica.   São "anedotas"...
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(**) Vd. poste 13 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9190: O último Chefe do Estado-Maior do CTIG, Cor Cav Henrique Gonçalves Vaz (Jan 1973/ Out 74) (Parte II): Agosto de 1974: rebelião da CCAÇ 21 (Bambadinca) e do BCAV 8320/72 (Bula)

Guiné 61/74 - P25154: Parabéns a você (2245): José Brás, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 1622 (Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68)

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Nota do editor

Último post da série de 6 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25139: Parabéns a você (2244): José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381 (Os Maiorais), (Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70)

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25153: Notas de leitura (1665): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (11) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Fevereiro de 2024:

Queridos amigos,
Resume-se neste texto a atividade desenvolvida pela Força Aérea praticamente durante o primeiro semestre de 1968, correspondente ao término da governação de Schulz. Deixa-se esclarecido como houve uma escalada de poder de fogo e de operações especiais na transição de 1967 para 1968. A estratégia do PAIGC, delineada por Amílcar Cabral, visando contraria este vendaval de fogo teve duas dimensões: por um lado assistiu-se à reorganização do Exército Popular, que veio a ganhar mobilidade devido à decisão tomada em substituir os lugares das bases e acampamentos, tornando-os mais flexíveis, haveria menos danos face aos bombardeamentos aéreos; por outro lado, chegaram novas armas, entre elas o morteiro 120, como observam os autores o armamento do PAIGC era de longe superior ao das forças portuguesas, em termos de forças terrestres, e deu-se neste período uma intensificação de flagelações por toda a Guiné. Com a chegada do governador Spínola, bastantes coisas irão mudar, à busca por uma supremacia e com base numa estratégia de reorganização dos aldeamentos.

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (11)


Mário Beja Santos

Deste segundo volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados na sua aquisição: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/.

Capítulo 3: “Eram eles ou nós”


Dando continuidade ao relato das atividades da Força Aérea em 1968, ainda correspondentes à governação de Schulz, recorda-se que os Fiat da Esquadra 121 continuavam em operações contra os sistemas de defesa antiaéreo do PAIGC e os Alouette III da Esquadra 122 intensificavam as operações de assalto aéreo. Os registos da Zona Aérea revelam mais 27 operações de assalto helitransportado de janeiro a junho de 1968, maioritariamente na zona Sul. Duas delas, a Operação Ciclone I (Quitafine, 10 de janeiro) e a Operação Tufão (centro de Como, 20 de março) foram as maiores operações de assalto helitransportadas na Guiné até então, cada uma delas envolvendo cerca de 200 paraquedistas em oito ondas de cinco Alouette III, com o habitual apoio de Fiat, T-6, helicanhão e DO-27 PCV. Os DO-27 sofreram danos causados por fogo antiaéreo durante as duas operações, bem como um Alouette III armado com canhão apoiava a Operação Tufão, o que evidenciava a ameaça do sistema de defesa antiaéreo no Sul da Guiné. Schulz e os seus comandantes da Força Aérea mostravam-se dispostos em enfrentar aqueles riscos, hipotecando mais aeronaves e pessoal nestas operações. Em comparação com as operações de 1967, o assalto médio de helicóptero que se realizou durante a primeira metade de 1968 foi cerca de um terço mais em termo de missões realizadas e tropas transportadas.

Em janeiro de 1968, a Zona Aérea também lançou uma série de ataques pré-programados contra infraestruturas a redes de apoio do PAIGC. A Operação Fogachol atingiu a aldeia de Quitafine no dia 8 de janeiro, e no dia seguinte foi atingida a área de Tafor-Canefaque. Em cada um destes ataques sete Fiat lançaram napalm (embalagens de 350 litros) e as estruturas visadas em ambas as operações ficaram praticamente destruídas. Na região central da Guiné, os T-6 levaram a cabo a Operação Dá-lhe Agora, uma série de ataques de três dias contra supostos centros rebeldes localizados em Dambol, Banir e Cauali. De 21 a 23 de janeiro, os T-6 realizaram 12 missões, estreitamente coordenadas com a atividade dos Fiat, nas regiões do Oio e Bafatá.

As aeronaves regressaram ao Como em 4 de fevereiro de 1968 para a Operação Crepúsculo, um ataque contra três acampamentos do PAIGC na zona do Caiar. Quatro Fiat e três T-6 lançaram cerca de três toneladas de bombas sobre os seus alvos, de que resultaram grandes explosões, produzindo rolos de fumo preto e fogo interesso sobre o arvoredo. Observaram-se detonações secundárias, o que levou a admitir a possibilidade de que o ataque tinha destruído com sucesso um depósito de armazenamento de munições. A Operação Crepúsculo seria a última operação independente do Grupo Operacional 1201, uma operação de ataque pré-programada no ciclo de operações até novembro de 1968, pontuando um período de intensa atividade da Zona Aérea, durante uma fase dinâmica e incerta da guerra. A adição do Fiat e do helicanhão, juntamente com quase duplicação das horas de voo do T-6, estimulou o crescimento explosivo no número de ataques aéreos, que aumentaram nove vezes entre 1965 e 1966, e cresceram mais de 60% no ano seguinte. Segundo fontes do PAIGC, só na península do Quitafine registaram-se cerca de 2 mil ataques aéreos durante 1967, que quase paralisaram o PAIGC na região. Notícias publicadas na imprensa estrangeira davam conta que a ofensiva aérea levava os habitantes de aldeias dominadas pelos insurgentes a fugirem tanto para o Senegal como para a República da Guiné, aldeões que abandoavam as suas colheitas, o que forçava os militantes a caçar e procuras plantas comestíveis para não terem fome. Facto ainda mais preocupante, alguns membros do PAIGC começaram a questionar abertamente a estratégia seguida pelo partido, enquanto quadros mais empenhados tinham de persuadir os aldeões mais aterrorizados a permanecerem nas chamadas zonas libertadas, apesar do risco do continuo bombardeamento aéreo.

A ofensiva aérea exigiu grandes mudanças na organização e nas operações do PAIGC. Como as suas áreas de base semipermanentes, acampamentos e instalações de apoio na Guiné figuravam com destaque a lista de alvos da Zona Aérea, desde o início da guerra, Amílcar Cabral e os seus comandantes, entre 1967 e 1968, mandaram proceder ao seu desmantelamento, reduzindo as bases, dividindo-as e, nalguns casos, ordenando a sua eliminação, como lembrou Cabral mais tarde. O líder do PAIGC também sentia que a vida sedentária neste tipo de bases era suscetível de reduzir a capacidade ofensiva dos combatentes, pelo que delineou uma abordagem que produzisse a uma vida mais nómada. Esta abordagem de maior movimentação acabou por tornar mais rápida a concentração de forças rebeldes, a articulação do PAIGC ia-se aperfeiçoando e o seu armamento melhorava. Em termos de manobra, a norma de formações era o bi-grupo complementada por forças especiais ou então reforçadas por bi-grupos que operavam em cada uma das Frentes ou Inter-Regiões do PAIGC; os bi-grupos mais robustos operavam como “forças de intervenção” em operações maiores. Quanto à melhoria do armamento, entrou em ação o RPG-7, a espingarda sem recuo T-21 Tarasnice de 82 mm, que houve pela primeira vez em junho de 1968; e chegaram também os morteiros de 120 mm, ficaram operacionais na segunda metade de 1968.

O PAIGC dirigiu estas novas aquisições para equipas especiais de artilharia e meios antiaéreos, que podiam ser utilizados em missões para apoiar operações maiores. Com a chegada deste armamento, o Exército Popular passou a funcionar como um exército semimóvel altamente flexível dentro da Guiné, apoiado por cerca de 30 campos ou bases localizados no Senegal e na República da Guiné. Estes santuários seguros e a “mobilidade permanente” do Exército Popular levou a 120 ataques em toda a Guiné durante os primeiros cinco meses de 1968, incluindo uma sucessão de flagelações durante as quais as unidades de guerrilha revelaram como tinha melhorado a iniciativa, o poder de fogo e a tática, um ataque do PAIGC contra Bissássema de Cima, a apenas 20 km de Bissau, envolveu cerca de 200 militantes armados com morteiros, granadas lançadas por foguetes e canhões sem recuo, rivalizando com intensidade de fogo e com o maior helicóptero português usados nas operações de assalto.

A escalada da guerrilha não impediu que o presidente Américo Thomaz tivesse passado seis dias na Guiné, a visita decorreu sem incidentes, foi recebido com entusiasmo em locais cuidadosamente selecionados, em Lisboa fez-se propagando pelo facto. Para o PAIGC, o evento foi apresentado como um dos maiores fracassos registados na história colonial portuguesa, denunciando que Thomaz e a sua considerável comitiva de segurança apenas tinham visitado alguns lugares na pequena parte do território ainda ocupado provisoriamente pelas tropas colonialistas. O repúdio da visita presidencial do PAIGC refletia perceções mais amplas, Schulz tinha pedido a demissão de Governador e Comandante-chefe, e o PAIGC dava como seguro que as forças portuguesas tinham perdido a capacidade de intervir, a iniciativa estava do lado da guerrilha.
Armamento e reorganização dos bi-grupos do PAIGC entre 1967 e 1968
Visita do presidente Américo Thomaz à Guiné em 1968 (Coleção Virgílio Teixeira)
Guerrilheiros do PAIGC com uma arma antiaérea ZPU-4 de 14,5 mm, de origem soviética (Arquivo Amílcar Cabral/Fundação Mário Soares)
Entrada da Base Aérea nº 12, em Bissalanca

(continua)

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Notas do editor:

Vd. posts anteriores de:

2 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25129: Notas de leitura (1663): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (10) (Mário Beja Santos)

26 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25112: Notas de leitura (1661): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (9) (Mário Beja Santos)

19 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25088: Notas de leitura (1659): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (8) (Mário Beja Santos)

12 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25061: Notas de leitura (1657): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (7) (Mário Beja Santos)

5 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25038: Notas de leitura (1655): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (6) (Mário Beja Santos)

29 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P25012: Notas de leitura (1653): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (5) (Mário Beja Santos)

22 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24987: Notas de leitura (1651): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (4) (Mário Beja Santos)

15 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24960: Notas de leitura (1649): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (3) (Mário Beja Santos)

8 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24931: Notas de leitura (1647): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (2) (Mário Beja Santos)

1 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24905: Notas de leitura (1640): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 5 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25138: Notas de leitura (1664): "Dicionário de História da I República e do Republicanismo", coordenação geral de Maria Fernanda Rollo, do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, edição do Centenário da República, Assembleia da República, 2014 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25152: O Nosso Blogue como fonte de informação e conhecimento (105): Na Morte do Coronel Nuno Rubim (Alfredo Pinheiro Marques / Centro de Estudos do Mar)

Cor Nuno Rubim (1938-2023). Foto de Luís Graça (2006)

1. Ainda a propósito do falecimento do Coronel Nuno Rubim, recebemos a seguinte mensagem com data de 31 de Janeiro de 2024, enviada pelo Director do CEMAR, Doutor Alfredo Pinheiro Marques:
De: CEMAR
Date: quarta, 31/01/2024 à(s) 11:17
Subject: Na Morte do Coronel Nuno Varela Rubim

Prezado Doutor Luís Graça, e demais responsáveis do Blog "Luís Graça & Camaradas da Guiné":
Nesta mensagem e na seguinte remetemos um reencaminhamento das mensagens que enviámos para a lista de "mailing" do CEMAR acerca do falecimento do nosso Ex.º Amigo Coronel Nuno Varela Rubim, e em que nos socorremos de, e citámos, muita da informação que, pela V. parte, disponibilizam no vosso Blog (uma vossa iniciativa meritória, e merecedora dos maiores elogios, e pela qual felicitamos, e desejamos os melhores votos de continuidade do bom trabalho)


Com as melhores e mais cordiais saudações, e votos de tudo de bom neste novo ano 2024
Alfredo Pinheiro Marques
Director do Centro de Estudos do Mar e das Navegações Luís de Albuquerque - CEMAR
(Figueira da Foz do Mondego - Praia de Mira)


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2. Início da mensagem reencaminhada:

De: INFORMAR
Assunto: Na Morte do Coronel Nuno Varela Rubim
Data: 30 de janeiro de 2024, 01:01:12 WET
Para: mail@cemar.pt

NA MORTE DO CORONEL NUNO VARELA RUBIM

Só agora tomámos conhecimento, através de notícias publicadas no Blog "Luís Graça & Camaradas da Guiné" (o principal fórum de informação e discussão sobre a história da Guerra portuguesa no teatro de operações da Guiné-Bissau), na "Revista de Artilharia", e em outras fontes, da triste notícia do falecimento do nosso Ex.º Amigo, Coronel de Artilharia, Comando, na situação de reforma, Nuno José Varela Rubim (1938-2023), historiador militar que tivemos a honra de contar no número dos membros do Conselho Consultivo e Científico do CEMAR - Centro de Estudos do Mar, e pelo qual sentimos, e manifestámos, sempre, uma extraordinária admiração e um profundo respeito, em termos científicos e em termos humanos.

Nuno José Varela Rubim - a que as populações africanas chamaram o "Capitão Fula" (e cuja morte ocorreu, agora, no passado dia de Natal… em 25.12.2023) - foi um homem extraordinário, e com uma vida invulgar, e extraordinária, de heroísmo, de coragem, de lucidez e de inteireza.
Uma vida apontada, ao mesmo tempo, quer para o serviço militar quer para a compreensão do mundo e do seu país: para a História e para a investigação histórica. Provindo de uma tradição familiar apontada para o serviço do Exército Português, e mais concretamente para a Artilharia, ele veio a ser um militar de grande coragem, detentor de uma folha de serviços invulgar, e um historiador de grande lucidez e criticismo, o mais competente nas matérias específicas de História Militar a que se dedicou. De grande coragem científica, para além da coragem pessoal e humana.

Em nove anos em África, com quatro comissões de serviço, foi um dos militares mais condecorados do Exército Português no terrível teatro de operações da Guiné-Bissau, o mais duro e difícil para os Portugueses, na segunda metade do século XX. Comandou, lá, em comissões de serviço sucessivas, como Capitão, duas Companhias de Caçadores (CCaç 726, e CCaç 1424), e uma Companhia de Artilharia (CArt 644), e foi o criador, formador, e comandante, lá, dos "Comandos da Guiné" do Exército Português, entre 1964 e 1966.

As Companhias que comandou estiveram localizadas no aquartelamento de Guileje (Guiledje), na parte desse território que foi a mais problemática para os Portugueses, nas regiões do "Corredor da Morte" de Guileje, Gadamael e Guidaje, e das Matas do Cantanhez, e de Madina do Boé (onde, por fim, em 1973, o PAIGC acabou por proclamar unilateralmente a sua independência). Nessas regiões tiveram lugar alguns dos momentos mais penosos para o Exército Português. Nomeadamente quando, em Maio de 1973 (alguns anos depois de Rubim já lá não ser comandante), esse aquartelamento de Guileje chegou a ser abandonado pelas tropas portuguesas, e ocupado temporariamente pelas tropas do PAIGC (o único caso desse tipo, nas guerras africanas portuguesas da segunda metade do século XX).

Depois disso, entre 1972 e 1974, Nuno Varela Rubim ainda desempenhou também funções no Quartel-General português em Bissau, em serviços secretos de informações, transmissões e criptografia (CHERET), e já então promovido ao posto de Major (e, nessas funções, os serviços portugueses conseguiram decifrar os códigos das comunicações militares dos países vizinhos).
Esteve presente, desde o primeiro momento, lá, na Guiné, na conspiração do "Movimento dos Capitães" que levou ao 25 de Abril de 1974.

Depois, em Portugal, nas convulsões políticas do pós-25 de Abril, esteve envolvido nas difíceis situações que confluíram no 25 de Novembro (1975), no seguimento do qual viu a sua carreira militar ser bloqueada, e esteve preso em Custóias e em Caxias. Alguns anos depois, reconstituída essa carreira, e concedida a mais do que merecida promoção a Coronel (sem ter tido que ser, como então disse, "a título póstumo"…), foi passado à reserva e veio a dedicar-se sobretudo à sua paixão pela História e pela investigação de temas militares, sobretudo de História da Artilharia.

Foi Director de Investigação no Museu Militar de Lisboa, exerceu funções de docência na Academia Militar, na Universidade de Lisboa, etc. (de facto, exerceu-as em toda a espécie de escolas, desde escolas universitárias até humildes escolas primárias e profissionais). Publicou na "Revista de Artilharia" e em outras revistas militares. Organizou exposições e instalações museológicas de grande significado e qualidade (Museu da Escola Prática de Artilharia em Vendas Novas, Artilharia da Fragata Dom Fernando II e Glória, Artilharia do Forte de Oitavos em Cascais, etc.). Deu-nos a honra de, na Figueira da Foz, ter sido um dos membros do Conselho Consultivo e Científico do nosso Centro de Estudos do Mar e das Navegações Luís de Albuquerque (CEMAR), desde Novembro de 2012.

Teve, sobretudo, um interesse muito especial, e competente dedicação, à história do "Príncipe Perfeito", o Príncipe e Rei Dom João II "próprio e verdadeiro coração da República" (nomeadamente à sua invenção do tiro naval rasante), à arquitectura naval, e às fortificações marítimas costeiras (Torre de Belém, etc.).

Na primeira década do século XX (em 2006-2008) — em parceria com a organização de cooperação AD-Acção para o Desenvolvimento, com o supracitado Blog "Luís Graça & Camaradas da Guiné" dedicado aos combatentes portugueses e guineenses da guerra da Guiné-Bissau, e com entidades oficiais desse país independente de Língua Oficial Portuguesa —, Nuno Rubim esteve presente na celebração no Projecto Guiledje, de reencontro entre Portugueses e Guineeenses, nas suas várias vertentes ("triunfo da vida sobre a morte, da paz sobre a guerra, da memória colectiva sobre o esquecimento e o branqueamento da historia"...).
Esteve presente, nomeadamente, no Simpósio Internacional de Guiledje, em Março de 2008, em Bissau (onde foi um dos oradores), e na criação de um Núcleo Museológico de Guiledje (Guileje), para o qual construiu carinhosamente, pelas suas próprias mãos, e levou consigo, para oferecer, um precioso diorama constituído por um modelo à escala 1/72, de grandes dimensões, do aquartelamento português de Guileje tal como ele era na década de 60 do século XX (1966), quando ele próprio, e muitos dos combatentes de ambos os lados dessa guerra, lá haviam estado, e lá haviam combatido.

O Coronel Nuno José Varela Rubim teve um carinho muito especial pela Guiné, e pelas suas gentes, onde havia vivido durante uma década. E teve como esposa uma Ex.ª Senhora africana, de lá originária, que agora deixou viúva, e à qual devemos apresentar as mais sentidas condolências.

Quando, em 2008, voltou à Guiné, e regressou a Guileje e Mejo, foi reconhecido e acarinhado por muita gente que ainda se lembrava dele de há 41 anos atrás (!), e se lembrava da sua sensibilidade e proximidade com as populações locais, que logo então haviam dado origem ao seu cognome de então, de "Capitão Fula".

E, em Bissau, visitou o cemitério, onde estão sepultados centenas de militares do Exército Português, e alguns desconhecidos, e alguns pertencentes a Companhias que por ele haviam sido comandadas.

Muita informação sobre este notável militar e historiador português, e homem de grande carácter, pode ser encontrada em muitas das páginas do tão meritório Blog na Internet, criado por Luís Graça, que já aqui citámos "Luís Graça & Camaradas da Guiné" (em https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com).


Filmes com parte da sessão do Simpósio Internacional de Guilege, em Março de 2008, em Bissau, com Nuno Varela Rubim e Carlos Matos Gomes, ambos Coronéis, Comandos, do Exército Português, em que o primeiro explica o isolamento em que foi deixado cair o quartel português de Guileje e o aparecimento no teatro de operações da Guiné dos mísseis terra-ar Strela que iriam mudar o curso da guerra, e o segundo explica o agravamento da situação militar no ano de 1973 para as tropas portuguesas, nas vésperas do 25 de Abril de 1974:

https://www.youtube.com/watch?v=rd8O523REL4
https://www.youtube.com/watch?v=CceUuqHQCc4


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"HISTÓRIA, MEMÓRIA E EXEMPLO DO PASSADO, PARA LIBERTAÇÃO DO FUTURO"

"(…) Ser ignorante do Passado é como ser uma criança para sempre (…)”… [ Marco Túlio Cícero, 106 a.C - 43 a.C]

"(…) Que os homens não aprendem muito com as lições da História é a mais importante de todas as lições que a História tem para ensinar (…)”… [ Aldous Huxley, 1959 ]

https://www.youtube.com/user/CentroEstudosDoMar


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Centro de Estudos do Mar - CEMAR
Rua Mestre Augusto Fragata, 8 - Buarcos
3080-900 - FIGUEIRA DA FOZ - PORTUGAL
e-mail: cemar@cemar.pt
tel.: (351) 969070009
(telemóvel)
tel.: (351) 233434450
(chamada para a rede fixa nacional)

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Nota do editor

Vd. post anterior de 8 de Fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25149: O Nosso Blogue como fonte de informação e conhecimento (104): O Coronel Nuno Varela Rubim e o CEMAR (Centro de Estudos do Mar)

Guiné 61/74 - P25151: (In)citações (264): Adjarama, Amadu Bailo Djaló, por essa lição de vida (Cherno Baldé).



Lisboa > 2009 > O Amadu Djaló no Cais do Sodré... A solidão de Lisboa, onde apesar de tudo teve camaradas que o ajudaram, a começar pela Associação de Comandos e o Virgínio Briote... No final do seu livro de memórias, publicado em 2010, escreveu: "Deixámos o passado para trás. Por quê o ódio? E a vingança? Qual é o destino da vingança? É a guerra! Qual o destino final da guerra? Estropiados, sangue, lágrimas, pobreza, suor, trabalho. Vai demorar muitos anos para acabar com a pobreza." (In: Amadu Bailo Djaló -  "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, il.,  pág., 286) .

Foto (e legenda): © Virgínio Briote  (2015). Todos os direitos reservados.
[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários ao poste P25147 (*)

(i) Tabanca Grande Luís Graça:

O Amílcar Cabral e o seu partido e os seus comandantes, a começar pelo 'Nino', teriam ficado na História, se tivessem deposto as armas tal como os tugas o fizeram, feito as pazes com todos e lançado as bases da reconciliação e do futuro...

Tinham preparado o seu país para um sociedade democrática, pluralista, pluriétnica, pluripartidária, pacifista, e formado os quadros que não tinham, com apoio da antiga potência colonial (agora um país reconciliado com a sua tradição de sociedade democrática, aberta e plural) e dos novos amigos (a Suécia, etc.), durante um periodo transitório de dez anos...

Ao fim desses dez anos, fariam eleições livres... Mas não, não era essa infelizmente a sua matriz ideológica, baseada no pensamento único de um único homem... (que não conseguiu pòr os outros a pensar pela sua própria cabeça).

Era o modelo do partido único, o que estava "a dar" nos anos 60/70 em África e no resto do chamado Terceiro Mundo... E ainda o é, tragicamente, o que predomina, na maior parte do planeta,  em quse toda a Africa, na Chin, na  Rússia, no Irão, na Arãbia Saudita, e por aí fora...

O poder estava na ponta das espingardas, à esquerda e à direita., e o mundo bipolarizado.. E viu-se: os Cabrais, os 'Ninos', etc., foram um desastre a governar... e acabaram por se trucidar uns aos outros.

De que é que o PAIGC tinha medo ? Se calhar de si próprio... Não era dos fulas nem dos comandos (que podiam perfeitamente ser  integrados num futuro exército nacional)... Claro que era preciso dinheiro ("divisas") para alimentar o povo... O arroz não cai do céu...

(ii) Cherno Baldé:

(...) O PAIGC tinha medo,  sim, tinha medo dos fulas, mas não de todos,  e foi essa particularidade que salvou o nosso Amadu Bailo Djalo que, na verdade, arriscou muito ficando em Bafatá, mas também a desgraça e a morte estavam em todos os lados, muitos que tinham fugido, depois foram recambiados.

A meu ver, o PAIGC tinha medo dos régulos fulas que tinham recusado, na sua totalidade e sistematicamente, aderir às  ideias e à ideologia da luta da libertação nacional, dirigida por uma elite urbana de Cabo-verdianos e de Grumetes de Bissau com os quais não se identificavam e não tinham nenhuma confiança quanto ao futuro do território. 

Não sei e não posso dizer quem teria razão, mas a verdade é que os seus interesses e perspectivas eram divergentes e, logo após a independência, a primeira medida de segurança que tomaram foi decapitar os poderes tradicionais das comunidades (fulas e manjacos) que tinham tido um comportamento recalcitrante em relação a (senão mesmo contra)  a luta do partido libertador.

Sobre a foto da casa Gouveia, sou de opinião contrária (*).Esta foto deve ser dos finais da década de 1970 ou início de 80. Os sinais: não se vê nenhum veículo militar, não se vê nenhum branco, civil ou militar, a circular no largo do mercado, o que não seria normal no período anterior à independência. 

Os edifícios estão um pouco degradados e as paredes parecem sujas com falta de pintura, o parque ao lado tem sinais de degradaçãoo e não se vêm sinais de embelezamento e parece reinar uma certa apatia, abandono e tristeza ao redor. 

Além disso, o camião da marca "Bedford" não é da casa Gouveia,  cujas portas parecem fechadas e há uma aglomeração anormal à frente das portas, o que denota desordem e abandono. 

Não, Luís Graça, esta imagem é dos tempos novos e tristes que se abateram sobre Bafatá e a Guiné no período posterior que eu bem conheci porque acompanhei, entre 1975/79, como estudante do Liceu local.

O camião deve estar à espera de poder ser alugado para cargas ou passageiros assim como o Toyota Hylux noutra berma, adaptada para transporte de pessoas e de cargas porque já não havia colunas militares nem para as localidades próximas e/ou longínquas. Muitos dos antigos soldados condutores na situação de reformados tinham adquiridos meios de transporte como forma de continuar a trabahar e sustentar a família.

O Amadu Djalo diz, no seu texto, que 3 anos depois ofereceu ao Ansumane Injai, o homem que o tinha feito prisioneiro,  20 Escudos, mas na realidade deviam ser Pesos Guineenses (PG), porque em meados de 1978 já não circulavam os escudos do período colonial.

A morte por sufoco dos presos do Senegal em Farim (caso que também já denunciei aqui no Blogue) resultou de um acordo que o regime do Luís Cabral tinha assinado com o Presidente LS Senghor em contrapartida da pesca nas nossas águas territoriais.

 Aquela nota redigida por Luís Cabral a lamentar as mortes de pessoas recambiadas de forma indiscriminada pelas autoridades do Senegal,  não passava de lágrimas de crocodilo, pois dentro do PAIGC ninguém era inocente dos atropelos e crimes que eram cometidos, todos sabiam o que estava a acontecer e todos podem ser considerados cúmplices, porque existia uma espécie de consenso interno desde os tempos de A. Cabral, sobre o destino reservado aos traidores da pátria a que, apesar da ferocidade aparente, no entanto, alguns puderam fazer tábua rasa,  ajudando os seus conhecidos e/ou entes queridos. O Aladje Mané,  deputado da ANP na época colonial,  foi depois membro influente e dirigente do PAIGC, o Cadogo Junior e muitos outros não foram incomodados, estando a viver em grande e em Bissau.

Após a leitura, ontem, de um extrato muito interessante do livro de memórias do comandante Pedro Pires (antigo Presidente de Cabo Verde), descrevendo o seu período de travessia de deserto, quando foi obrigado a sair nas eleições que seguiram à abertura política de 1991,  e, ao ler, hoje, o desabafo do Amadu Djaló, antigo combatente 'comando', sobre o ser humano ("O  povo era falso, não podíamos ter confiança em ninguém. O povo não tem cor, nem medida, nem peso, é tudo falso.”)...

Hoje vou dormir muito tranquilo e sem nenhumas ilusões sobre o ser humano.
Adjarama, Amadu Bailo Djalo por essa lição de vida. (**)