quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3746: História da CCAÇ 2679 (12): O Carregamento e a RVFM (José Manuel Dinis)

1. Continuação da história da CCAÇ 2679.
Episódio enviado por José Manuel Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, em mensagem de 10 de Janeiro de 2009

O Carregamento

A coluna saíu de Piche pela manhã cedo, embora o sol tropical, lá do alto, já emanasse o calor fustigante. A finalidade da deslocação a Nova Lamego era para proceder ao carregamento de munições para obus 14, destinado às peças de Canquelifá. Estrada fora, o Foxtrot escoltava o pelotão do Bart encarregado do carregamento e a cavalaria, com três viaturas, duas white e uma fox, reforçavam a segurança.
Ali chegados, o alferes do Bart constatou o grande volume das caixas para carregar e a dificuldade inerente, pois cada caixa pesava cerca de sessenta quilos. Assim, veio pedir ajuda, quer a nós, quer ao pessoal da cavalaria, e logo anuímos. Decidimos dividir o número de caixas pelos três grupos. Ao Foxtrot calhou carregar em segundo lugar, pelo que dei alguns minutos para quem quisesse ir à cervejinha. Afigurava-se tarefa difícil a transferência daquele material, exigindo vários elementos em cima das viaturas para recepção e acondicionamento, outros a transportar do armazém, dois homens para cada caixa, com esforço evidente.
Quando chegou a vez dos madeirenses, o pessoal já tinha tirado um plano e passaram à execução. Era impressionante a desenvoltura na manobra: dois homens elevavam uma caixa, que colocavam às costas de cada um dos que transportavam até à viatura, onde outros dois a recolhiam e arrumavam, tudo acompanhado com larachas e boa disposição. Comparado com o desempenho anterior, a malta parecia estar na brincadeira. Ao meu lado, alguns militares olhavam com surpresa. Num pequeno grupo, um major perguntou quem eram aqueles gajos.

- É o pessoal do Foxtrot, meu major - respondi com vaidade. Quis saber mais duas ou três coisitas a propósito do pessoal e respondi, causando alguma admiração.

Foi sempre um grupo fantástico, onde se cultivou a solidariedade e a boa disposição

RVFM

Regressava do mato às tantas da noite. No aquartelamento a escuridão casava com o silêncio da noite. Dirigia-me para o meu quarto, quando reparei haver luz no quarto que antecedia. Olhei, e no interior estava um furriel de transmissões do Bart dedicando-se a qualquer trabalho. Entrei, e quando o vi com um ferro de soldar, sobre uma tábua, a alinhar e a fazer ligações com pequenos transistores, que eu não sabia o que eram, perguntei-lhe, na paródia, se estava a fazer o T.P.C.
Sorriu e explicou-me que estava a fazer uma mesa de mistura. Arrebitei as orelhas. Qual era o interesse dele? Nada em particular, mas como tinha a profissão de sonoplasta na Emissora Nacional, deu-lhe para aquilo, sem qualquer objectivo. Perguntei-lhe de quantas entradas dispunha a misturadora, e se poderia ter aplicação prática. Concluímos que sim, poderia ter aproveitamento. Falámos sobre a E.N., já que eu era ouvinte da Rádio Universidade, transmitida por aquela estação.

- Então, e se fizéssemos uma emissora em Piche? - Perguntei-lhe.

Podia ser, utilizando um rádio militar como emissor, mas seria necessária uma licença, em conformidade com o que lei exigia.

- Licença? Interroguei-me. Se isso fosse imprescindivel, era melhor esquecer a ideia.
- Calma - disse ele - Se abafarmos a emissão, ninguém fora de Piche vai ter conhecimento da rádio.
- Porreiro, e como é que se abafa a emissão? - Voltei a perguntar.
- É simples - serenou-me - Recorremos a uma antena horizontal, com cerca de vinte metros, o comprimento do ediíficio, colocada a pouca distância do telhado, porque o zinco encarrega-se do abafanso.
- Porra, pá, sabes do assunto, referi admirado.
- Sim, mas não temos discos, nem prato, torna-se necessário comprar disso.

Pus-lhe à consideração, se o meu gravador e as minhas cassetes, não serviriam para fornecer a música, expliquei-lhe a minha ideia, de seleccionar a gravação e entrar com a voz durante a mudança de cassete ou emitir música, simplesmente.
Servia, claro, e podíamos tentar.

Ok, estava decidido, ele acabava de construir a mesa de mistura, a partir de uns transistores gamados dos rádios portáteis que lhe levavam a reparar. Rapidamente esboçámos uma programação simples, para emissões de uma ou duas horas, talvez a partir das vinte da noite, para entreter, especialmente o pessoal dos abrigos.

Assim nasceu a RVFM - a Rádio Voz do Furriel Miliciano, em homenagem ao construtor do equipamento, que funcionou com emissões irregulares e onde tive pouca participação, pois dormia metade das noites no mato e, pouco depois, saí de Piche por dois períodos, estive de férias em seguida e, no regresso, fui para Bajocunda, definitivamente.

O França

Alguns elementos do 2.º Pelotão - Foxtrot, de pé, da esquerda para a direita: Dinis, Abreu, Teresa e França. Em baixo: Lamarão (condutor), Rodrigues, Martins e Virgílio Sousa

João Baptista França de seu nome, foi um brioso militar. Oriundo do meio rural, onde exercera actividade no campo até à incorporação no BII-19. Foi um elemento de grande valia, sempre pronto para qualquer actividade, amigo dos amigos, com bastantes provas de solidariedade, destemido quanto baste, porque o arrojo deve ser controlado pelo bom senso.
Bem disposto e jovial, foi dos elementos que mais contribuíu para a coesão do Foxtrot, o Segundo Grupo de Combate, manifestando-se com orgulho relativamente ao colectivo.
Educado, disciplinado e voluntarioso, foi um camarada que grangeou a estima de todos os que o conheceram e com ele privaram.

JMMD
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Vd. último poste da série de 30 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3685: História da CCAÇ 2679 (11): Encontro imediato e estórias contemporâneas (José Manuel Dinis)

5 comentários:

Anónimo disse...

José M Dinis

Gostei da desenvoltura dos escritos,especialmente daquele da Rádio.Essa de montar uma rádio privada,mostra bem a arte e o engenho Lusitano do desenrascanço com utilidade colectiva.

Abraço
Luis Faria

Anónimo disse...

Luis Faria
Obrigado pela apreciação estimulante.
Todavia, no que à criação da RVFM respeita, o meu papel foi secundaríssimo, pois sem o camarada, de que, infelizmente, não recordo o nome, com capacidades técnicas na matéria, nenhuma emissoara teria acontecido.
Depois foi fácil.
Um abraço

Anónimo disse...

Caro Amigo josé M Dinis eu estive em Piche dame a inpressao que contas un pouco mais que a verdade NAO? josé

Anónimo disse...

Caro José
Suponho que te referes às emissões da RVFM. Aconteceu num período que estimo em fins de Abril, princípio de Maio. Eu dormia na suite très, onde também estavam o Branco da Silva e o Àguas. Talvez eles se lembrem. Mas que fique claro, não ando alucinado.
José Dinis

Anónimo disse...

josé de oliveira e Rocha Op; de trans; ccs Bart 2857 Piche nov.68 a Agt 70 Caro Dinis se Quiseres explicaçoes o meu mail é jose.e.rocha@orange.fr porque comentàrios nao serve de nada tudo o que jà li neste Bloog é demasiado triste para nao diser mais. Até breve josé