quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16563: Os nossos seres, saberes e lazeres (178): Uma viagem em diagonal pelos países dos eslavos do Sul (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Maio de 2016:

Queridos amigos,
Antes de me lançar nesta deambulação montenegrina não tinha a menor ideia do que significava Kotor, nada conhecia das maravilhas arquitetónicas de uma fortificação medieval com sucessivas alterações até ao século XIX, muralhas que envolvem um velho núcleo urbano que conheceu o esplendor marítimo, várias ocupações, com particular relevo para a Sereníssima República de Veneza e o império austro-húngaro. Para os aficionados da arquitetura militar, não há pitéu maior: 4,5 km de muralha com uma largura que varia entre os 2 e os 16 metros, Kotor tem belas portas, torres, palácios e templos religiosos. E a beleza da baía não é insuperável porque continua pelos sítios espetaculares com Perast. Chovia que Deus dava mas guardei recordações indeléveis. Já passei por várias fronteiras já saí do comboio para o autocarro e do autocarro para o comboio, agora tomo novamente o autocarro e vou par outro Património da Humanidade, Dubrovnik.

Um abraço do
Mário


Uma viagem em diagonal pelos países dos eslavos do Sul (3)

Beja Santos


De vez em quando apanho livros no lixo, melhor dito recolho livros abandonados. Tenho um vizinho que larga no vidrão resmas de publicações relacionadas com teatro, algumas delas com indiscutível valor histórico, levo-as para casa, limpo-as e depois entrego-as na Biblioteca do Teatro Nacional D. Maria II. Este livro da Jugoslávia foi recolhido na Feira da Ladra entre cacos de vidros e molduras podres. Data de 1978, fala de um país que já não existe, o tal país dos eslavos do Sul, constituídos por sérvios, croatas, eslovenos, albaneses, macedónios, montenegrinos e minorias onde constam húngaros, eslovacos, gregos e muito mais. De Belgrado já se falou, era a capital dessa república federativa que exalou o último suspiro com a partida do Montenegro, em 2006. A viagem que fui fazer de comboio até Sutomore, no extremo do Montenegro, tem amplos sinais essa república federativa inexistente: não quero exagerar, terão sido pelo menos cinco quilómetros desde que partimos de Belgrado a ver comboios em decomposição, abandonados em carris onde cresce a vegetação. Uma viagem cheia de peripécias, com trânsito para autocarros devido a obras, passámos de autocarro por Podgorica, voltámos ao comboio até Bar e daqui Sutomore, debaixo de uma chuva diluviana, deu para ouvir o marulhar do Adriático e de manhã cedo apanhar transporte para Kotor, sempre com chuva inclemente.




Segundo o guia da Jugoslávia que recolhi do lixo, datado de 1978, Kotor tinha 5 mil habitantes, 4 km de muralhas e em grande parte devia a sua imponência à época veneziana, mas encontram-se vestígios da colonização grega, por aqui andaram romanos, godos e bizantinos. Kotor caiu nas mãos dos austríacos e pertenceu ao império austro-húngaro até 1918. Em 15 de Abril de 1979 um tremendo abalo de terra arruinou a povoação e a maior parte dos habitantes desertou. Tudo mudou quanto Kotor foi reconhecido pela UNESCO como Património da Humanidade. Há sobejas razões para tal, é um ponto de encruzilhada que marca o esplendor marítimo montenegrino, a arquitetura assinala a presença veneziana e austríaca. Ruas estreitas marcadas pela antiguidade, panorâmicas sem rival de uma muralha que sobe em direção às cumeadas, belos templos religiosos. Felizmente que passei dois dias em Kotor, mesmo sob as ameaças da chuva.




Património da Humanidade pelo encontro de civilizações pelas igrejas medievais, pelos palácios sumptuosos, pelas marcas indefetíveis da República de Veneza, pela esplendorosa catedral alvo de restauros sucessivos desde o século XVII, pelos relevos da baía, ruas e ruelas contratando com as escadarias que os levam até ao forte de S. João, a 260 metros de altura.




Os países separaram-se mas a história comum é indelével. Passeando pelo porto de Kotor, o viajante encontra um monumento aos heróis da resistência aos ocupantes alemães. A vários títulos, foi um período dramático, já com a envolvente da guerra civil, basta recordar o ditador croata e os seus crimes ferozes. A escassos quilómetros de Kotor encontra-se Perast que no guia jugoslavo de 1978 tinha 500 habitantes, hoje a população é largos milhares, mais beleza inexcedível, mais tradição marítima, pois aqui houve um estaleiro naval imponente, o Czar Pedro O Grande enviou aqui gente para se preparar para fazer grandes armadas. Na baía encontramos duas ilhas, qualquer delas de tirar o fôlego. O dia estava nublado, o viajante acha que o leitor tem direito à comparação entre uma imagem de cariz romântico e a luminosidade que se pode desfrutar num dia claro e ameno, o que este bilhete-postal assegura, a tal ponto que dá vontade de viajar já para o Montenegro. A visita está feita, vamos mudar de país, segue-se para a Croácia, que tem no seu extremo mais Património da Humanidade, Dubrovnik.

(Continua)
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Notas do editor:

[1] - Poste anterior de 28 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16531: Os nossos seres, saberes e lazeres (176): Uma viagem em diagonal pelos países dos eslavos do Sul (2) (Mário Beja Santos

Último poste da série de 30 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16539: Os nossos seres, saberes e lazeres (177): 28 segundos de fama, adrenalina e felicidade de avô... Cernache, Coimbra, o meu primeiro vídeo de um salto em paraquedas... (Paulo Santiago, ex-alf mil, cmdt do Pel Caç Nat 53, Saltinho e Bambadinca, 1970/72)

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