quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20270: Antropologia (34): Cultura e tradição na Guiné-Bissau, por António Carreira (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Dezembro de 2018:

Queridos amigos,
Ao lermos este texto, com mais de trinta anos de idade, podemos dar conta da solidez cultural deste historiador maior das coisas de Cabo Verde e da Guiné, incontornável quando escreve sobre o sistema esclavagista ou grupos étnicos e até panaria, possuía uma curiosidade que não se apagava, tinha a coragem de corrigir opiniões e a dívida cultural com que lhe ficamos é desmesurada. Basta ler este singelo texto que apresentava na Cooperativa Árvore do Porto uma exposição de artes plásticas que exibe escultura da melhor que há em África.

Um abraço do
Mário


Cultura e tradição na Guiné-Bissau, por António Carreira

Beja Santos

António Carreira
Em junho de 1984, a Cooperativa Árvore promoveu uma exposição sobre cultura e tradição na Guiné-Bissau, António Carreira foi convidado a apresentar o país, os dados culturais e o valor da tradição nas manifestações artísticas.

Depois da localização geográfica e de uma síntese histórica, desvelou a estrutura económica, que resumiu deste modo:
“A base fundamental da sua economia assenta na orizicultura e no cultivo dos milhos, como cereais de sustentação; e da mancarra, como produto de exportação. A cultura desta última teve início entre 1942 e 1945. Ao mesmo tempo há o aproveitamento dos frutos da palmeira-do-azeite, nos quais se extrai o coconote e o chamado azeite vermelho.
A orizicultura e o aproveitamento da palmeira-do-azeite constituem a actividade principal dos povos do litoral desde tempos imemoriais; processa-se através de uma técnica bastante aperfeiçoada pela requintada preparação das lalas (planícies alagadas ou alagáveis) e que prontas para o cultivo do arroz tomam a designação de bolanha. A preparação consiste na feitura de camalhões e diques de defesa que permitem a entrada da água do mar e dos rios em quantidades adequadas e, ao mesmo tempo, a descarga dos excedentes quando atingem determinados níveis. O cultivo do arroz nas terras do Quinara e do Tombali, foi introduzido no segundo quartel do século XIX pelos Balantas emigrados na região de Mansoa. À parte este tipo de culturas de arroz, processa-se um outro chamado Pampã, nas terras de sequeiro, sobretudo como cultura intercalar nos palmeirais. Trata-se de uma variedade de arroz especial, temporão, que permite acudir às necessidades alimentares nos períodos entressafras”.

E apresenta o mosaico étnico e a dinâmica cultural nos seguintes termos:
“No concernente à organização social, as comunidades étnicas e étnico-linguísticas mostram-se no geral bem organizadas, coesas, respeitando as suas tradições, os seus hábitos, comportamentos e costumes, tanto quanto o consentem as transformações sofridas nas últimas cinco décadas.
Em matérias de organização política tradicional, necessariamente em decadência, o factor mais saliente é o impacto produzido pelo contacto com outras culturas mais dinâmicas, podemos (ou poderíamos) compartimentar as etnias em dois grandes grupos, sobretudo às crenças ou cultos professados:

1) – o dos que possuem estruturas políticas fortes e eficientes dominando a área do Centro-Leste – Mandingas, Fulas, Beafadas, etc., uns ainda animistas, a grande maioria islamizados; e, no Litoral, os Papéis-Brames, localizados na área compreendida entre a margem esquerda do rio Cacheu até à ilha de Bissau (todos eles animistas). Em todos estes grupos, as autoridades dispunham de poder efectivo sobre as populações das respectivas áreas de jurisdição. Esse poder foi cedido indolentemente, quer devido à presença europeia quer pela mentalização da juventude.

2) – outro, dos que nunca possuíram o tipo de organização acima referido – Balantas, Felupes, Baiotes, Bijagós e outros – agrupando-se em comunidades de povoados, mais ou menos numerosos e submetendo os seus pleitos e conflitos à decisão do Conselho dos Grandes.
Os islamizados não ultrapassam os 40% da população total. A influência do Islão foi, quanto a nós, decisiva em muitos e amplos aspectos da vida deste mosaico. O Djila (negociante ambulante, em regra do grupo Mandinga) ao percorrer as regiões de animistas aproveitava-se da oportunidade para difundir o credo islâmico, isto começou pelos alvores do século XV-XVI e perdurou.

A título de exemplo, aponta-se a mandiguização do Balanta localizado na margem direita do rio Farim, conhecido por Balanta-Mané (Mané, apelido Mandinga), que de Balanta nada possui já; ao passo que do Mandinga assimilou o tipo de habitação, a técnica agrícola, o vestuário, os sistemas matrimoniais, a sucessão pela linha matrilinear, etc. Mas, para além destes aspectos, apontam-se a influência de grupos de cultura arabizada junto dos Nalus e dos Sossos (das áreas localizadas entre os rios Cacine e Cumbijã) que não só adoptaram o islamismo como religião (islamismo do tipo africano, entenda-se), como as regras de matrimónio (até aos anos 1930, os Sossos e os Nalus só faziam o casamento por troca, por ignorarem o sistema do dote ou compensação). E consoante a progressão do islamismo, assim puseram de lado a escultura em madeira de máscaras rituais em que ambos foram exímios. É ver as fabulosas máscaras Bandá, Ninte-Camatchol, etc., tão procuradas pelos coleccionadores europeus e norte-americanos. Não foram todavia só os Nalus que empobreceram os seus valores culturais. Os Manjacos, bons escultores de postes com figuras zoomórficas e antropomórficas, destinados a certos rituais e a assinalar as campas de indivíduos de alta posição social, decaíram ou desapareceram dos seus costumes.

O Corão proíbe toda esta simbologia esculpida. O islamismo, por muito que tenha oferecido aos animistas, foi o principal responsável pela decadência (e desaparecimento) da arte escultural dos Nalus, dos Sossos, dos Manjacos e dos próprios Bijagós. Isto contudo não impede que as apresentemos sob um outro esquema, embora simplificado. 
Assim, temos:

- Grupos étnicos nitidamente diferenciados, usando línguas aglutinantes do tipo das semi-bantas, definidas pelo uso de prefixos de classe e prefixos de concordância: Balantas e Bijagós, ambos com formas dialetais; Felupes-Baiotes; Banhuns-Cassangas.

- Grupos étnico-linguísticos nitidamente determinados: Papel-Brame (ou Mancanha)-Manjaco. A par deles a minoria Caboiana ou Cobiana (da região de Caboi) com um linguajar típico misto do Banhum-Cassanga e do Manjaco. Todos eles animistas. Os grupos de fundo linguístico semi-banta, incluindo minorias, abrangem 59,1% da população global (censo de 1950).

- Grupos étnicos falando línguas do tipo sudanês, definidas pelo emprego de sufixos plurativos, todos eles islamizados:

Mandingas e etnias mandinguizadas: Beafadas, Nalus, Sossos, Bambarãs, Saracolés, Landumás, Jalofos, Jacancas, Pajadincas. A par destes, apontam-se também os Balanta-Mané e os Cunantes ou Mansoancas, que usam um linguajar fortemente influenciado pela língua Mandinga; Fulas e os seus diferentes ramos: Fula-Preto, etnia constituída pelos antigos escravos das mais diversas origens, conhecidos também por Fula-djom, Fula cativo, em Mandinga e Fula Matchudô, em Fula; Fula-Forro, o havido por nobre ou filho de pais de longa data alforriados no ato de rapar a cabeça; Futa-Fula ou Fula do Futa – do Futa Djaló ou do Futa Toro, este também conhecido por Toranca e Tôrôdô; Fula do Boé ou Boenca, o oriundo da área do Boé-Kadé.”

No termo do seu trabalho da apresentação da exposição de artes plásticas da Guiné-Bissau no Porto, o historiador refere a importância do crioulo, considerando que todos estes dados somados são definidores de uma extraordinária diversidade, caso ímpar na diminuta dimensão de um território.



Imagens da arte Bijagó, reproduzidas do site Bestnet Leilões, com a devida vénia.
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19840: Antropologia (33): "Regressos quase perfeitos, memórias da guerra em Angola", por Maria José Lobo Antunes, Tinta-da-China, 2015 (3) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20269: Agenda cultural (706): III Encontros Literários de Montemor-o-Novo, a levar a feito na Biblioteca Municipal Almeida Faria, entre os dias 24 e 27 de Outubro (José Brás)

1. Em mensagem do dia 22 de Outubro de 2019, o nosso camarada José Brás (ex-Fur Mil da CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68) enviou-nos, para divulgação, a programação dos III Encontros Literários de Montemor-o-Novo, a levar a feito na Biblioteca Municipal Almeida Faria, entre os dias 24 e 27 de Outubro.



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Nota do editor

Último poste da série de 10 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20225: Agenda cultural (705): Lançamento do livro "Museu Etnográfico Nacional da Guiné-Bissau: Imagens para uma história", de Albano Mendes, Ramon Sarró e Ana Temudo. Lisboa, Centro de História, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Sala B1, 15/10/2019, 18h. (Patrício Ribeiro)

Guiné 61/74 - P20268: (De)Caras (137): Camaradas da Companhia de Terminal (Bissau, 1973/74), que em menos de 2 meses carregou mais de setenta barcos para o Leste (Manuel Oliveira Pereira, ex-fur mil, CCAÇ 3547, Contuboel, 1972/74)


Foto nº 1 > O fur mil Manuel Oliveira Pereira, em Bambadinca, c. 1973/74, ao serviço da Companhia de Terminal


Foto nº 2 > Porto fluvial de Bambadinca > c. 1973/74 >  Companhia de Terminal > O fur mil Manuel Oliveira Pereira acompanha a entrega de abastecimentos, vindos de barco de Bissau


Foto nº 3 > Bissau > Companhia de Terminal > c- 1973/74 > O fur mil Manuel Oliveira Pereira nas instalações da Quinta do Fim do Mundo, assim chamada por estar nas traseiras do cemitério da cidade de Bissau: eram as instalações da antiga fábrica de cana da Casa Gouveia. Ficavam bem por trás do BINT (Batalhão de Intendência).


Foto nº 4 > Bissau > Companhia de Terminal > c- 1973/74 > O fur mil Manuel Oliveira Pereira com o fur mil Melo nas instalações da  Quinta do Fim do Mundo


Foto nº 5 > Bissau > Companhia de Terminal > c- 1973/74 > O fur mil Manuel Oliveira Pereira com o fur mil Mealha  nas instalações da  Quinta do Fim do Mundo





Louvor ao fur mil Manuel Oliveira Pereira, exarado na sua caderneta militar, a pp.11 e 12,  atribuído pelo comandante da CCAÇ 3547, na data de 16 de junho de  1973,  por, sendo o delegado administrativo do Batalhão, o BCaç 3884 (Bafatá, 1972/74), ter ajudado a criar e a desenvolver a "Companhia de Terminal" (Bissau, 1973.

Fotos (e legenda): © Manuel Oliveira Pereira (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


O Manuel Oliveira Pereira, algures, no rio Geba,
ao serviço da Companhia de Terminal
(Bissau, 1973/74)

1. O Manuel Oliveira Pereira,  membro da nossa Tabanca Grande, desde 14 de outubro de 2006,  já nos explicou em tempos o que era a Companhia Terminal [ou de Terminal] (*):


(...) Conjuntamente com mais uns tantos camaradas fui fundador da "Companhia Terminal" que resultou da junção de todos os "Delegados de Batalhão" (---) a que se juntaram uns tantos "piras" - milicianos e malta dos pupilos do exército - vindos directamente de Lisboa (administração militar).

As nossas instalações [eram na] Quinta do Fim do Mundo, assim chamada por estar nas traseiras do cemitério da cidade [de Bissau:]  eram as da antiga fábrica de cana da Casa Gouveia. Ficavam bem por trás da Intendência e ao lado do armazém de medicamentos/produtos farmacêuticos do Batalhão Saúde.

(...) Os "Delegados" tinham total autonomia. A Delegação era formada normalmente pelos seguintes meios humanos e materiais: um Sargento ou Furriel, um Cabo, dois Soldados motoristas, um Unimog 404 e um Jipe. Esta era a minha formação (BCaç 3884, Bafatá), talvez a mais numerosa, contudo as diferenças, se existiam, eram poucas.

Com o avolumar da guerra, tornou-se necessária uma coordenação efectiva dos parcos meios humanos e logísticos - barcos, barcaças, viaturas e aviões. Todo era necessário!

As Delegações requisitavam e, devido à sua autonomia, qualquer um dos meios de transporte referidos quando bem entendesse. Por exemplo: em alturas diferentes ou quase em simultâneo seguia para Bambadinca carregamento para o sector de Bafatá, no dia seguinte para Nova Lamego e porque não para Piche?!...

Falei dos sectores Leste l e Leste ll como poderia falar da zona Sul ou de Farim/Cacheu.

Surge assim a Companhia Terminal com o objectivo de coordenar e planificar toda acção das diversas Delegações.

A Companhia Terminal não era uma verdadeira Companhia, pelo menos na sua organização e estrutura. É certo que tinha um Capitão SGE – Herman [Mendes] Schultz [ Guimarães], não como Cmdt, mas como Coordenador, coadjuvado por dois oficiais; uns quanto sargentos / furriéis piras e por todas as Delegações de Batalhão/Companhia. A esta grande equipa, foi ainda acrescentado todo o nosso parque auto.

A partir da sua formação, talvez outubro/novembro de 1972  - não tenho de momento a certeza  (...) -   todos os "abastecimentos" passaram a ser feitos em conjunto (na gíria actual "Serviços Partilhados"),  ou seja, abastecimento / carregamento de barcos ou aviões feito em simultâneo (ex. Bambadinca/Galomaro ou Bafatá/Nova Lamego ou Nova Lamego/Piche).

Qualquer combinação é possível. Já não servíamos o "nosso" Batalhão, mas qualquer um que necessitasse do nosso apoio. Se na minha anterior missão de Delegado, apenas requisitava, organizava, transportava e acompanhava as "coisas" para o meu Batalhão por barco até ao Xime ou Bambadinca e de avião para Bafatá, passei com a Companhia Terminal a ir, para além das referidos [destinos], a Aldeia Formosa, Nova Lamego, etc.

(... Aqui vão alguns dos nomes que de momento me vêm à memória: Cap Schultz, Alf Neves, Furriéis Catana, Mealha, Grenho, Botelho, Mestre, Ferreira, Aarão, Pinheiro, Soldados Soares, Melo e Pereira. Mantenho, com alguns deles fortes laços de amizade nomeadamente com o Catana, o Mealha, o Grenho, o Aarão, Soares e o Melo. (...) (*)


2. O Manuel Oliveira Pereira foi louvado pelo seu comandante [, da CCAÇ 3547], em 16 de junho de 1973 pelo elevado empenhado e grande competência com que exerceu funções na "Companhia de Terminal", permitindo que esta efetuasse carregamentos em mais de setenta (70) barcos, no curto espaço de dois meses (o que dava em média mais de um barco por dia). (**)
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Vd. também postes de:

12 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3196: Em busca de...(39): Companhia Terminal (Bissau, 1973/74) (Daniel Vieira)

(...) Telefonou-me o ex-Fur Mil Daniel Vieira, que fez parte da Companhia Terminal, sediada em Bissau, mais exactamente na antiga Fábrica da Cana de Açúcar, por detrás do Cemitério, em instalações que outrora terão pertencido à Casa Gouveia. Lembram-se ?

Eu nunca ouvira falar desta Companhia Terminal, cuja missão era fazer os reabastecimentos das unidades espalhadas pelo TO da Guiné, por ar, terra, rio e mar… Iam a todo lado, de Buba a Bambadinca...

Pois bem, pelo que o Daniel Vieira me contou ao telefone, e que eu aqui reproduzo, ele chegou à Guiné, em rendição individual, em março de 1973 e foi um dos últimos militares a abandonar o território, em outubro de 1974.

Pelo meio, aí por volta de 12 ou 13 de março de 1974, foi ferido no Rio Geba, por ocasião de um ataque do PAIGC, no Geba Estreito, entre o Xime e Bambadinca, a um batelão carregado com 24 toneladas de munições. Morreu um cabo da Companhia Terminal, para além de 13 ou 14 africanos (civis ou militares, não faço ideia). Ele depois poderá contar mais pormenores: não sei se o batelão foi ao fundo, se houve explosões em cadeia, etc. /...)

terça-feira, 22 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20267: Controvérsias (140): é verdade que Contuboel, na zona leste, região de Bafatá, nunca foi atacado ou flagelado ? ( Manuel Oliveira Pereira, ex-fur mil, CCAÇ 3547 / BCAÇ 3884, 1972/74)



Foto nº 1 > A velha ponte de madeira, sobre o rio Geba (Estreito), em Contuboel


Foto nº 2 > No "barco turra", a navegar no rio Geba... O Manuel Oliveira Pereira, à proa, à direita... É bom lembrar que ele foi um dos co-fundadores da famosa Companhia Terminal (Bissau,1973/74) (*) devendo ter feito várias viagens nos "barcos turras", com abastecimentos para o seu batalhão e outros do leste...


Foto nº 3 > No "barco turra", a navegar no rio Geba.. À direita, na margem direita do rio, no sentido Xime / Bamadinca, palmares típicos das margens do rio...


Foto nº 4 > No "barco turra", a navegar no rio Geba... Não parece ser a mesma viagem, o "artista" vai de camuflado... 


Foto nº 5 > No "barco turra", a navegar no rio Geba... O Manuel Oliveira Pereira, para onde iria, em farda nº 3 ?... 


Foto nº 6 > No "Barco turra", a navegar no rio Geba... Comendo a "ração de combate", que a viagem era longa... Adivinham a marca da lata de sumo de fruta...


Foto nº 7 > No "barco turra", a navegar no rio Geba... Noutra viagem, de camuflado e de G3...

Guiné > Região de Bafatá > CCAÇ 3547 / BCAÇ 3884 (Contuboel, 1972//74) > O Manuel Oliveira Pereira, ex-fur mil, membro da nossa Tabanca Grande, da primeira hora. Fotos de álbum do Manuel Oliveira Pereira, cortesia da página do Facebook  da Companhia de Caçadores 3547 - Os Répteis de Contuboel, página criada em 2011.

Fotos (e legenda): © Manuel Oliveira Pereira (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Comentário do Manuel [Oliveira] Pereira,   ex-fur mil, CCAÇ 3547, "Os Répteis de Contuboel", (Contuboel 1972/74), subunidade que pertencia ao BCaç 3884 (Bafatá, 1972/74); hoje advogado, vive em Ponta de Lima (**)


Meu caro Zé Saúde, camarada e amigo. Como me sinto lisonjeado com as tuas palavras. Na verdade, estivemos tão perto (Nova Lamego e Madina Mandinga) e ao mesmo tempo nunca nos encontramos. Depois, já na vida civil, trabalhamos na mesma secção, tivemos cumplicidades múltiplas e viemos também a residir no mesmo prédio.

Foste ao meu casamento, os meus filhos tiveram, durante algum tempo, por "ama" uma tia tua e nesse tempo NUNCA abordámos,  e até julgo desconhecermos, a nossa situação de combatentes e percurso nas "fileiras". Foram precisos anos, muitos anos, para nos "reencontrarmo-nos"!...


Lido o teu texto, aqui vão algumas achegas: A minha Unidade Operacional pertencia ao BCaç 3884 sediado em Bafatá, e tinha por perímetro de acção o sector de Contuboel. Era a CCaç 3547,  conhecida por "Os Répteis de Contuboel" que, devido à sua localização e, não havendo "guerra", funcionava como Centro de Formação de Milícias. 

Assim os seus Grupos de Combate (Pelotões) [, da CCAÇ 3547,] andavam sempre destacados em reforço de outras unidades. Foi deste modo que a CCaç 3547 fez, nos seus quase 28 meses de Guiné,  um "périplo turístico" por Bafatá, Bambadinca Tabanca, Sonaco, Sare Bacar, Nova Lamego, Madina Mandinga, Galomaro e Dulombi. 

Outra curiosidade que também desconheces, talvez, o teu ex-cmdt de Batalhão,  ten-coronel Castelo e Silva, veio a ser meu cmdt, e de quem eu fui  (e continuo a ser) amigo. Vive actualmente em Valpaços. 

Como vez, muitas coincidências! Esqueci de referir que a partir do 3º mês de Guiné e, enquanto operacional, fui sempre Cmdt de Pelotão e em funções administrativas Delegado de Batalhão.

Um abraço. Manuel Oliveira Pereira, Fur Mil,  BCAÇ 3884/CCAÇ 3547.


2. Comentário de Valdemar Queiroz [, ex-fur mil, CART 11,
(Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) 
(**):

Contuboel, um caso interessante na guerra da Guiné.

De Fevereiro a Maio de 1969 estive em Contuboel e não houve o mínimo indício de guerra a não ser ruídos noturnos de outras tabancas a 'embrulhar' e também não tive conhecimento de anteriormente ter havido.

Depois, no resto do ano de 1969 e até Dezembro de 1970, quer em Nova Lamego ou em Paunca, nunca tivemos conhecimento de nenhum ataque a Contuboel.

Agora venho a saber que até 1974, ou seja, até ao final da guerra, Contuboel nunca foi atacada.

3. Comentário do editor LG:
Eu e o Renato Monteiro,
o "homem da piroga", no rio Geba,
com a ponte de madeira ao fundo...,
e que lhe ia seno fatal!

Foto (e legenda): Luís Grça (2005)

É verdade. Zé Saúde e Manel Pereira ? Trabalharam juntos, e nunca tinham falado da Guiné e da guerra , até se encontrarem em Monte Real, num Encontro Nacional da Tabanca Grande ? 

Manuel, Contuboel (, o quartel e a tabanca,)  nunca foi mesmo atacado ou flagelado pelo PAIGC em todos estes anos de guerra ?  Ou, pelo menos, no teu tempo ?

O Valdemar e eu estivemos lá, no 1º trimestre de 1969, na altura Contuboel era um CIM (Centro de Instrução Militar) e e eu descrevia como um "oásis de paz" a ponto de termos feito a IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional) nas suas imediações, em farda nº 3, com as nossas praças, do recrutamento local (, refiro-me à CCAÇ 2590 / CCAÇ 12) apenas com balas de salva nas cartucheiras da G3... Só os graduados levavam bala real (***).

Contuboel era local de passagem para quem ia comprar vacas a Sonaco... Quem, da malta do leste, não foi pel menos uma vez a Sonaco ? De facto, também nunca me constou que o quartel tenha sido atacado ou flagelado pela guerrilha do PAIGC, tanto o de Contuboel como o de  Sonaco. É verdade ? (****)

Contuboel tem mais de noventa referências no nosso blogue.

Um abraço especial para o Manel, nosso grã-tabanqueiro da primeira hora. Conhecemo-.nos no I Encontro Nacional da Tabanca Grande, na Ameira, Montemor-o-Novo, em 14 de outubro de 2006, já vão 13 anos!...
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Notas do editor:

(*)  Vd. poste de 2 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3264: A Companhia Terminal , Bissau, 1973/74 (Manuel Oliveira Pereira)

(**) Vd. poste de 21 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 – P20265: Memórias de Gabú (José Saúde) (88): Manel Pereira, um amigo. (José Saúde)

(***)  Vd. poste de 28 de junho de  2005 > Guiné 63/74 - P86: No oásis de paz de Contuboel (Junho de 1969) (Luís Graça)

(****) Último poste da série > 21 de setembro de  2019 >  Guiné 61/74 - P20165: Controvérsias (139): louvor, em ordem de serviço, do comando do BART 733 (Farim, 1964/66), aos seus militares, pelo pronto, abnegado e eficiente socorro prestado às vítimas do atentado terrorista de 1 de novembro de 1965 (João Parreira, ex-fur mil op esp, CART 730 / BART 733, Bissorã, 1964/65; ex-fur mil cmd, CTIG, Brá, 1965/66)

Guiné 61/74 - P20266: O nosso blogue em números (61): Mais um número redondo, os 11, 4 milhões de visualizações de páginas, registados no sábado, dia 19, às 20h28 (Jorge Araújo)




1. Mensagem do Jorge Araújo, nosso coeditor: 

Data: sábado, 19/10, 21:18



Assunto: contador de visualizações

Luís,

Boa noite.

Espero que estejas a recuperar (bem) dos teus joelhos.

De acordo com o teu alerta, depois das 20 horas, estive 'emboscado' na expectativa de apanhar mais um número redondo.

Consegui, com uma rajada, apanhá-lo. Eram 20h28. 

Entretanto, para a tua colecção, anexo o n.º 9 300 000, apanhado à mão em 08.06.19, às 12h21.

Bom fim de semana. Um abraço.
Jorge Araújo 



2. Comentário do editor LG:

Jorge:

Tu  és um verdadeiro caçador dos "contadores do tempo"..."Just in time", apanhaste o momento em que o nosso contador  (, do Blogger,) registava os 9,6 milhões de visualizações de página (, desde maio de 2010, altura em que mudámos de contafdor),  o que no total (, desde abril de 2004,  início do blogue e das nossas contagens) perfaz os 11,4 milhões...

Para tua informação, e dos nossos leitores, registámos nesses últimos 30 dias (até sábado passado) cerca de 120 mil visualizações de página, uma média de 4 mil por dia. (Não confundir com "visitantes", cada visitante pode visualizar mais do que um página.)

Portugal, Estados Unidos, Brasil, França e Alemanha continuam a ser, ao fim destes anos todos, os cinco principais países, donde são originários os nossos leitores. Há depois um "segundo pelotão", a  uma distância mais considerável, que inclui, por ordem de números de visualizações, o Reino Unido,  a Rússia, a Polónia, a Espanha e a China. Quanto aos outros países lusófonos,para além de Portugal (1º) e do Brasil (3º), vêm no "resto do mundo", não sendo possível diferenciá-los... Cabo Verde e a Guiné-Bissau já têm aparecido, pontualmente, nos registos diários e semanais. De qualquer modo, são países onde o grau de penetração da Internet ainda é baixo, ou relativamente baixo, por comparação connosco.
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segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Guiné 61/74 – P20265: Memórias de Gabú (José Saúde) (88): Manel Pereira, um amigo. (José Saúde)

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem.

 
Memórias de Gabu 


Manel Pereira, um amigo



Numa destas tardes de outono onde o sol copiosamente brilhava, sendo que através dos vidros da janela admirava a sua enorme luminosidade, predispôs-me a reviver álbuns de fotos que a minha singela biblioteca justamente contém e lá fui dar com uma imagem que assinala um reencontro com um amigo de longa data: o Manel Pereira.

Os anos que o novel Cartão de Cidadão menciona, envia-nos irremediavelmente para as 69 risonhas primaveras, sendo, por isso, absolutamente normal admitir que o metro, outrora comprido, está agora cada vez mais curto.

Não importa chorar agora sobre leite derramado, o importante é entoar com enfâse o inabalável hino da nossa existência ao cimo deste imenso cosmos que dá pelo nome de terra. Ontem, fomos jovens dinâmicos que palmilhámos os mesmos terrenos de uma Guiné a contas com uma guerra que não dava tréguas, hoje, porém, somos rapazes crescidos, já aposentados, que vão paulatinamente erguendo bem alto a voz de comando que declara firmemente a integral condição de antigos combatentes.

O Manel é um rapaz que vive intensamente a sua condição afável como limiano de pura gema. Nasceu em Ponte de Lima e disso faz uma justíssima menção. Moço de uma benéfica cortesia, sempre disponível para dois dedos de conversa, reafirma convincentemente que foi furriel miliciano na CCAÇ 3547 e pertenceu ao grupo de combate designado como “Os Répteis de Contuboel”, uma subunidade que pertencia ao BCAÇ 3884 (1972/1974) na região de Bafatá.

O nosso camarada minhoto, nessa manhã em Monte Real, e em que o sol intenso dava as boas-vindas aos antigos combatentes de guerra de uma Guiné onde a luta quotidiana de então das NT encetava amiúde confrontos contra um IN que não dava folgas, lá me foi dissecando pormenores da sua presença no conflito.

Claro que o meu conhecimento pessoal com o Manel deveu-se a que ambos tivéssemos entrado para a Caixa de Previdência e Abono de Família dos Serviços Médico Sociais do Distrito de Lisboa no mesmo dia (25 de junho de 1975) e que partilhássemos de seguida a mesma secção. Depois separámo-nos e não mais soubemos um do outro.

Mas desse companheirismo próximo nasceu uma profunda amizade. Desses tempos do primeiro “ganha-pão”, ficou a certeza que jamais trocámos impressões sobre o nosso recém passado militar. Nunca abordámos o tema. Na altura a nossa afirmação passava por outros objetivos. Curtíamos a noite de Lisboa, de entre outras entretengas que nos preenchiam a vida.

Mas, a vida, sempre impulsionadora de uma ziguezagueada estrada onde se multiplicam fustigadas “minas antipessoais”, eis que em Monte Real reencontrei o Manel Pereira como membro da nossa Tabanca Grande e desde logo a temática foi puxada para lugares guineenses que ambos conhecemos. O almoço foi então digerido lado a lado e a temática da guerra na Guiné devidamente escalpelizada.

Lembro-me quando o Manel me falou da sua espontânea passagem por Madina Mandinga com o seu grupo de combate. Logo, o informei que essa companhia pertencia ao meu BART 6523, sendo que a conversa resvalou, desde logo, para o reavivar de nomes de camaradas que ambos conhecíamos.

Falámos, licitamente, sobre o capitão miliciano Zé Luís, comandante da Companhia de Madina. Ambos concordámos que era um homem de fino trato. Aliás, não havia muito tempo que me tinha encontrado com o Zé Luís num almoço em Fátima de "rangers", onde esteve também o alferes "ranger" António Barbosa, da 2ª Companhia,  instalada em Cabuca, mas que esteve deslocado em Madina Mandinga a render o capitão Zé Luís num período de férias.

Presentemente a nossa conversa sobre o capitão Zé Luís esbarra para o campo da saudade. O Zé Luís já não está entre nós. Morreu! Finou-se no dia 30 de maio de 2019. O seu nome completo era José Luís Borges Rodrigues e fora capitão miliciano de Infantaria.

Tive oportunidade de com ele conviver. Primeiro em Nova Lamego, depois numa ida a Madina em finais da nossa estadia em Gabu. O 25 de Abril trouxe liberdade de movimento às NT e, obviamente, ao PAIGC. A guerra, e o seu ímpeto guerreiro, chegou ao fim. Os movimentos quer no mato quer na picada não traziam problemas de maior.

Neste contexto, num belo um sábado do mês de julho, creio, lá partiu um grupo da CCS a caminho de Madina Mandinga em dois Unimog sendo o objetivo único um jogo de futebol onde se entrelaçava a amizade de camaradas atirados para sítios diferentes.

O jogo realizou-se, a malta conviveu e o pessoal foi recebido pelos camaradas de Madina com pompa e circunstância. O capitão Zé Luís desfez-se em cortesias e o apito final ditou algumas bebedeiras de jovens que se entregavam então ao simples prazer da vida.

Manel, tempos que já lá vão. Vamos, pois, agradecer o facto de nós ainda por cá permanecermos neste globo terrestre, finalizando o texto com um descansa em paz ao capitão Zé Luís.





Capitão Zé Luís. 





Eu, Manel Pereira e um outro camarada, no Encontro anual do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné em Monte Real

Um abraço, camaradas 
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

7 DE OUTUBRO DE 2019 > Guiné 61/74 – P20212: Guiné, da escravatura à carne para canhão - Os escravos e os combatentes, (José Saúde)

Guiné 61/74 - P20264: Em busca de... (299): Camaradas do ex-alf mil António Vieira Abreu, recentemente falecido em Lisboa, e que pode ter pertencido ao BART 1904 (Bissau e Bambadinca, jan 67 / out 69) (João Crisóstomo, Nova Iorque; Manuel Carvalho Gondomar; José Martins, Odivelas)


Foto nº 5


Foto nº 6


Guiné > s/l > s/d > c. 1967/68 > O Alf António Veira Abreu com o seu grupo de combate, militares que poderão ter pertencido ao BART 1904 (Bissau e Bambadinca, 1967/69),à CCS, ou às companhias de quadrícula, CART 1646, 1647 e 1648


Fotos: © João Crisóstomo (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.]


1. Mensagem do João Crisóstomo, com data de ontem:

Luís Graca,
O Vieira Abreu a bordo de um "sintex"
Vou tentar mais alguma info sobre o Vieira Abreu. Pensei que querias “uma foto" dele ( pedi duas fotos à São, uma à paisana e outra da tropa, mas enviou umas poucas , todas da Guiné.  Enviei-te estas quatro para escolheres (*) , mas, sendo assim há/ tenho mais algumas que a São me mandou; junto mais duas pois nelas aparecem outros “camaradas". Nos meus “canhenhos" o nome que tenho dele é António Vieira Abreu.

Vou confirmar logo que puder. E se conseguir mais alguma info envio-te de imediato.

Vou fazer o que puder pela "Tabanca da Diáspora", mas não te quero alimentar esperanças demasiadas, pois os resultados, por razões várias (, a maioria fora do meu controlo, ) até ao momento têm sido aquém dos meus esforços. (...)
Abraço, João

João Francisco Crisóstomo
Queens, New York


2. Comentário de Manuel Carvalho (Gondomar), ex- (ex-fur mil armas pesadas inf, CCAÇ 2366 / BCAÇ 2845, Jolmete, 1968/70) (*):

Caro amigo Luis Graça

Acerca do nosso camarada Vieira Abreu,  se ele embarcou em Janeiro de 67 só pode ter pertencido ao Bart 1904 que esteve em Bissau e em Fevereiro/68 foi para Bambadinca. 

As companhias operacionais foram as CArt 1646, 1647 e 1648 que também estiveram em Bissau até meados de 67 e é natural que tenham ido fazer alguma operação para a zona onde estava o camarada João Crisóstomo e se tenham encontrado. 

Com os dados que temos, o camarada Vieira Abreu pode ter pertencido a qualquer uma destas companhias inclusive a CCS do BART 1904. 

As outras companhias que foram em Janeiro de 67 para a Guiné foram a CArt 1659 que foi para Gadamael, a 5ª de Comandos e os Pelotões de Reconhecimento 1143 e 1165: o  1143 esteve em Bafatá e em Teixeira Pinto onde ainda convivi com alguns em junho e julho de 68 no Pelundo com quem aprendi algumas coisas, eles estavam no fim e eu estava a começar. Boa gente nunca mais vi nenhum mas gostava.

Um abraço
Manuel Carvalho


Guião do BART 1904 (Bissau e Bambadinca, janeiro de 1967 / outubro de 1969). Cortesia de © Carlos Coutinho (2004)

3. O nosso colaborador permanente, José Marcelino Martins, mandou-nos a seguinte lista dos locais (e datas) por onde passou o BART 1904 e as suas companhias de quadrícula.

Unidade |  Inicio |  Local  | Zona | Saida | Destino

B. Art. 1904 - CCS | janeiro 67 | Bissau | Bissau | fevereiro 68 | Bambadinca
B. Art. 1904 - CCS | janeiro 68| Bambadinca |  Leste | outubro 69 | Fim comissão
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 |  janeiro 67 | Bissau | Bissau | agosto 67 | Fá Mandinga
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | abril 67 | Bula | Oeste | abril 67 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 |  maio 67 | Bipo | Oeste |  agosto 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | maio 67 | Choquemone |  Oeste | agosto 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | maio 67 | Ponta Matar | Oeste | agosto 67 |  Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | maio 67 | Pelundo | Oeste | agosto 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | agosto 67 | Bambadinca | Leste | novembro 67 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | agosto 67 | Fá Mandinga | Leste |  janeiro 68 | Xitole
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | setembro 67 | Fá Mandinga | Leste | outubro 69 | Fim comissão
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | novembro 67 | Mansambo | Oeste | maio 68 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | novembro 67 | Saltinho | Leste | maio 68 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1646 | janeiro 68 | Xitole | Leste | setembro 67 | Fá Mandinga
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | janeiro 67 | Bissau | Bissau | abril 67 | Quinhamel
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | janeiro 67 ! Ilondé | Oeste | agosto 67 ! Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | janeiro 67 | Ome | Sul | agosto 67 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | janeiro 67 | Ondame | Bissau | agosto 67 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | janeiro 67 | Ponta Vicente da Mata | Bissau | agosto 67 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | março 67 | Quinhamel | Bissau | agosto 67 | Bissau
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | agosto 67 | Bissau | Bissau |  setembro 67 | Binar
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | agosto 67 | Bula | Oeste | agosto 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1647 | setembro 67 | Binar | Oeste | outubro 69 | Fim comissão
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | janeiro 67 | Bissau | Bissau | agosto 67 | Nhacra
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | fevereiro 67 | Pelundo | Oeste | julho 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | fevereiro 67 | Queré | Oeste | julho 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | fevereiro 67 | Churobrique | Oeste | julho 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | fevereiro 67 | Tiligi | Oeste | julho 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | fevereiro 67 | Bula | Oeste | julho 67 | Intervenção
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | julho 67 | Dugal | Oeste |  janeiro 68 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | julho 67 | Joáo Landim | Oeste | janeiro 68 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | julho 67 | Nhacra | Oeste | janeiro 68 | Binta
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | julho 67 | Ponte Ensalma | Oeste | janeiro 68 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | julho 67 | Safim | Bissau | janeiro 68 | Destacada
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | janeiro 68 | Binta | Oeste | outubro 69 | Fim comissão
B. Art. 1904 - C. Art. 1648 | janeiro 68 | Guidage | Oeste outubro 69 | Destacada


Guiné 61/74 - P20263: Notas de leitura (1228): "O Alferes Eduardo", por Fernando Fradinho Lopes; Círculo-Leitores, 2000 (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Agosto de 2019:

Queridos amigos,

A narrativa de Fernando Fradinho Lopes não se pode confundir com as reportagens que proliferaram no teatro de guerra angolano, logo a partir de 1961. O discurso é inicialmente balizado por um rigor formal, sucedem-se as etapas convencionadas para este tipo de diário, memorial, descrevem-se os antecedentes familiares, a recruta e a especialidade, tudo numa atmosfera de amenidade.
E é nessa mesma amenidade que se parte para Quipedro, ali vive-se uma atmosfera de guerra com florestas cerradas. E dá-se a reviravolta, a CCAÇ 1638 parte para o Leste, ali pratica-se a carnificina, mutila-se e executa-se. São descrições terríficas, como se o horror fosse aceite ao nível da banalidade. É nesta dimensão que o relato de Fradinho Lopes é uma corrente de alta tensão, o ódio anda por ali à solta, entre pretos e brancos.

Um abraço do
Mário


Uma das mais explosivas obras da literatura da guerra colonial:
“O Alferes Eduardo”, por Fernando Fradinho Lopes (2)

Beja Santos

O título escolhido para esta recensão não enferma nada de bombástico. “O Alferes Eduardo”, de Fernando Fradinho Lopes, Círculo de Leitores, 2000, é uma obra arrasadora, no início, a máquina literária parece conduzir-nos para descrições semelhantes a muitas outras, desde a preparação militar e do contexto familiar, até do maravilhamento perante a fauna e a flora, as tensões com a hierarquia, e o muito mais que serve de pano de fundo a uma grande parte da literatura da guerra colonial, por essência.

O autor, que diz suportar-se por notas de diário, parte de Luanda com o seu batalhão, o BCAÇ 1901, a sua companhia fica sediada em Quipedro, onde ele não se sente bem, há patrulhamentos, acidentes, dificílimas colunas de reabastecimento. É destacado para Quixico e regressa a Quipedro. Estamos agora em finais de abril de 1967, o seu pelotão foi destacado para o Lué, leva por missão garantir a integridade da ponte sobre o rio com o mesmo nome e dar proteção aos trabalhadores da fazenda. Constata que os rebeldes se passeiam com grande à-vontade na fazenda.

Então escreve:

“Viviam no Lué centenas de negros trazidos, enganados, do distante Centro de Angola. Haviam-lhes dito que trabalhariam numa zona pacífica. Afinal estavam no meio da guerra, numa das zonas de intervenção militar mais perigosas.

"Era um trabalho escravo, a troco de alguns escudos por dia. Habitavam em miseráveis cubatas e alimentavam-se de fuba e peixe seco, comprados na cantina do patrão. Aí deixavam grande parte do que ganhavam. E regressavam às suas terras tão miseráveis como eram dantes.

"Dizia-se que os fazendeiros do Norte recrutavam os trabalhadores no Centro de Angola através das autoridades administrativas, a troco de dinheiro. Estas, por sua vez, encomendavam os ‘escravos’ aos sobas que estavam sob a sua jurisdição, recebendo os últimos uma insignificante quantia por cabeça”.

Do Lué o seu pelotão regressa a Quipedro e o Alferes Eduardo vai passar férias a Luanda, findas estas embarca para Quipedro, as coisas começam mal pois o comandante de companhia reúne os seus subalternos e lê a nota de repreensão agravada que fora aplicada a Eduardo, pressente-se que há um contexto de rivalidades e de mexerico entre os diferentes alferes. E parte com uma coluna que acompanha a máquina de Engenharia, perto de Nambuangongo rebenta uma emboscada, os feridos graves serão evacuados por avião.

Eduardo é informado que a CCAÇ 1638 irá em breve ser transferida, no início de agosto estão em Luanda de onde vão partir para o Leste, Munhango.

Escreve nas suas notas:  

“Estava perante um meio paisagístico e humano muito diferente daquele que encontrara no Norte de Angola. As florestas tinham uma arborização pouco densa e o terreno era constituído de areia fina. Existiam longas planícies, com chanas ao longo das linhas de água. Munhango, uma pequena povoação sem asfalto nas suas poucas ruas, não tinha semelhança alguma com a região desabitada de Quipedro. Parte da população da vila trabalhava nos Caminhos de Ferro, que eram o motor económico de Munhango”.

Eduardo contraiu malária, doente vai fazer uma descida aos infernos. Numa serração próxima aparece uma senhora retalhada em postas e a casa saqueada. Um negro de Munhango foi apontado como suspeito. Pouco depois será abatido em “patrulhamento”. Começa a melhorar, tem tempo para refletir sobre as contradições da presença portuguesa e o quadro de injustiça que presenceia diariamente.

Outra serração será atacada, mais gente assassinada. “Os terroristas, ao serviço da UNITA, deixaram na serração dois papéis escritos, com o carimbo da organização. Procuravam justificar o massacre invocando o nome de Deus. Alguém com formação religiosa, provavelmente protestante, dirigira a matança”.

Chegam os feridos, todos negros, empregados dos brancos assassinados, feridas horríveis. Sai de Munhango um pelotão com intenção punitiva. Com a saúde recomposta, Eduardo partiu a 28 de agosto para a região de Cangonga.

Os ódios andam à solta:

“Descobri na floresta, a ocidente de Cangonga, uma sanzala ainda habitada. Ao aproximar-se de surpresa, apercebeu-se de que alguns indivíduos se haviam posto em fuga. Teria de investigar aqueles movimentos estranhos.

"Cercou o quimbo e andou de cubata em cubata a observar e a interrogar as pessoas delicadamente. As contradições que ele viu convenceram-no de que a UNITA tinha de facto aquela sanzala sob o seu controlo.

"Com alguns habitantes da sanzala a servirem-lhe de guias involuntários, fez um patrulhamento pela mata, nas proximidades do quimbo. Não encontrou ninguém.

"Ao deixar o local, levou consigo os homens adultos da sanzala. Depois de serem cuidadosamente interrogados no Munhango, regressariam às suas casas onde poderiam continuar a viver em paz, garantiu-lhes o alferes.

"Pelo caminho, alguns militares propuseram insistentemente a Eduardo o fuzilamento dos negros detidos. Mas ele, enojado com aquela sede de sangue, repeliu a proposta”.

Chegados a Munhango, recebem a notícia de que houvera um ataque a uma viatura blindada que seguia à frente do comboio. Eduardo constata que a atividade da UNITA alastrava desmesuradamente, os quatro grupos de combate não tinham descanso. Estamos já em setembro, a CCAÇ 1638 parte para uma operação, vão patrulhar na zona onde a UNITA executava habitualmente os ataques ao caminho-de-ferro, entre Cangonga e Cangumbe.

“Impressionara-o os cento e catorze abrigos que encontrara a dois ou três metros da picada. Provavelmente foram escavados por indivíduos mal treinados e mal armados, talvez vacinados contra as balas dos brancos e convencidos de que morreriam num sítio e nasceriam noutro lugar a seguir”.

A tensão avoluma-se, muita gente foge de Munhango, há execuções, e há também momentos de heroísmo, como ele escreve:

“A serração de Nhonga, situada junto da picada para o Alto Cuíto, a cerca de oitenta quilómetros de Munhango, foi atacada por um grupo de dezenas de homens da UNITA. Era defendida por três rapazes do pelotão de Eduardo: o 1.º Cabo Costa e os Soldados Branco e Rodrigues. Durante toda a noite, resistiram com unhas e dentes. Os atacantes desistiram quando se aproximou o dia, levando consigo as baixas sofridas. Os militares, bem protegidos pelos sacos de areia previamente colocados em redor da serração, escaparam ilesos. Parte para o Alto Cuíto, onde muitas centenas de infelizes, cobertos parcialmente de farrapos, viviam na mais absoluta miséria”.

(continua)
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Notas do editor

Poste anterior de 14 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20238: Notas de leitura (1226): "O Alferes Eduardo", por Fernando Fradinho Lopes; Círculo-Leitores, 2000 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 18 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20254: Notas de leitura (1227): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (28) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20262: Tabanca da Diáspora Lusófona (3): Em busca de camaradas da unidade / subunidade a que pertecenceu o ex-alf mil António Vieira Abreu, recentemente falecido (João Crisóstomo,Nova Iorque)


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3



Foto nº 4

Fotos do alf mil António Veira Abreu, que terá chegado ao TO da Guiné em janeiro de 1967...e de quem não sabemos mais nada: a que unidade/subunidade pertenceu, por onde andou, quem era o seu comandante, a data do regresso,  etc.  Nas fotos nº 1 e 2, vemo-lo num "sintex", possivelmente no rio Geba... As fotos nºs 3 e 4 parecem ter sido tiradas num destacamento por onde terá passado com o seu grupo de combate...

Fotos: © João Crisóstomo (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.]



1. Mensagem do nosso amigo luso-americano João Crisóstomo, e nosso camarada da diáspora, a viver desde 1975 em Nova Iorque,  ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67),  régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona (*)

Data - 20 de outubro de 2019, 11h28

Assunto - Fotos do Vieira Abreu

Caro Luis Graça,

A São, esposa do saudoso [António] Vieira Abreu  (`*), enviou-me estas fotos.

Como eu já sabia ele não falava muito da Guiné:


"Bom dia amigo Crisóstomo, o Abreu nunca quis falar do tempo que viveu na Guiné, só queria esquecer, mas julgo que se devia escrever a história dum país que parece que se quer apagar, é assunto que não se fala nas escolas. Tenho poucas fotos vou mandar algumas."

Quanto à unidade (companhia) dele não sei, mas creio não será difícil saber isso. Eu estou confuso *) tinha sido em 1966, mas ele um dia mandou-me uma informação que não corresponde. Devo ser eu que estou enganado a não ser que ele tenha sem querer escrito a data errada. Ele disse:

"Amigo Crisóstomo,  agradeço o teu mail e retribuo os teus votos.Vou reservar a minha participação no vosso encontro. Eu embarquei para a Guiné em janeiro de 1967. Um abraço do amigo Abreu."

É o que pude arranjar. Creio que não será difícil encontrar a info certa.



2. Comentário do editor LG.:

Em relação aos nossos queridos mortos, os nossos camaradas que passaram pelo TO da Guiné que lá morreram (em combate, acidente ou doença), ou que faleceram depois do regresso a casa, já como "paisanas", temos a obrigação (moral) de os não esquecer...

Nesse sentido, agradeço-te muito a ti e à viúva, a tua amiga Purificação (São), a gentileza do envio de algumas fotos do António Vieira Abreu, ex-alf mil, que terá chegado à Guiné em janeiro de 1967, mas de quem não sabemos mais nada: a que unidade/subunidade pertenceu, por onde andou, quem era o seu comandante, que era os outros alferes e restantes camaradas, as operações que fizeram, as baixas que tiveram, a data do seu regresso a casa,  etc. 

Com a publicação destas fotos do álbum da família, pode ser que algum camarada do seu tempo o reconheça e nos dè mais pistas. Vamos também consultar a nossa "base de dados"... Vamos ver quais as unidades/subunidades que chegaram ao CTIG em janeiro de 1967... 

Obrigado pelo teu cuidado. Um abraço fraterno para a tua amiga Patrícia (São),viúva do Vieira Abreu. Já agora, vê se nos mandas o nome completo do teu amigo, condiscípulo e camarada.

________________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 19 de outubro de  2019 > Guiné 61/74 - P20258: Tabanca da Diáspora Lusófona (2): In Memoriam: o meu condiscípulo, amigo e camarada de armas Vieira Abreu: os nossos insólitos encontros e desencontros ao longo da vida, do seminário à guerra, de Saint Germain des Prés (Paris) a Fátima, de Queens à Portela (Lisboa)... até que a sua morte, inesperada, nos vem agora separar de vez (João Crisóstomo, Nova Iorque


[...] A história com o  [António Vieira[ Abreu foi bem diferente, mas muito invulgar: estava eu um dia na Guiné, "no meio duma operação" e, cansado, estava sentado no chão de costas contra o tronco de uma árvore a comer não sei o quê, quando vejo ao meu lado uma cara conhecida que não via há muito tempo e que não esperava ali : era o Abreu, também alferes miliciano numa outra companhia que nesse dia se juntou à nossa, nessa "operação no mato" de que não me recordo mais detalhes.

Como eu, ele tinha saído do Seminário e,  feito o curso em Mafra, ... ali estava... Mas recordo-me bem dos assuntos que o tempo e circunstâncias nos levaram a falar, pois que me surpreendeu com uma mente e visão já mais liberal e mais "arrojada" do que eu, que nessa altura ainda me regia pelo pensar conservador que me tinham encaixado no Seminário.

Depois dissemos "até à próxima" e seguimos cada um para seu lado. [...]