
Queridos amigos,
No início, o projeto tinha muito ambição: calcorreava-se de Aix-en-Provence até Marselha, na fase seguinte o passeio seria pela terra dos Cátaros e Albigenses, de Toulouse até Montpellier, juntavam-se as pontas da Gália ao tempo dos Romanos.
Houve que ser mais modesto, na 2.ª fase aterrou-se em Toulouse (entre nós Tolosa) à procura de joias preciosas da arte românica, seguiu-se para Albi, Carcassone, Pirenéus franceses, Pau, de novo Toulouse.
Não foi empreendimento arrojado, mas deu para ver e sentir belezas incomparáveis, se a Provença é magnífica a Occitânia não lhe fica atrás.
Um abraço do
Mário
Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (1)
Beja Santos
O viandante faz-se acompanhar de um Guia Michelin datada de 1989, certo e seguro com desatualizações, à cautela procurar-se-á invocar o que o valor patrimonial é insuscetível de estar alterado. A viagem aqui começa, antigamente falava-se em Languedoc Roussillon Midi Pyrénées, hoje o termo da região administrativa é Occitanie (Occitânia, em português). Toulouse é uma aglomeração de grandes proporções, aqui teve origem a indústria aeronáutica francesa, e recordam-se dois nomes que a literatura do século XX acolhe no seu panteão: Saint-Exupéry, o autor do Principezinho e Jean Mermoz, o pioneiro da aviação que estabeleceu a primeira ligação com a América do Sul. Toulouse é uma cidade com muito tijolo. O viandante vem com o propósito de ver alguns monumentos de renome mundial, antes de partir para Albi, e no final da viagem reservou tempo para uma deambulação mais cuidada.
A primeira impressão é o colorido do tijolo, o viandante começa o passeio à volta do Canal du Midi, um empreendimento gigantesco que permite a ligação do rio Garona ao Mediterrâneo, projetado no século XVII, entra pelos boulevards e procura o centro histórico.
A primeira escultura tem a ver com o resistente que morreu num campo de concentração na Alemanha, a segunda fala por si, glória aos heróis de vários bairros da velha Tolosa do Império Romano, quem foi martirizado pelas suas ideias e pelo seu patriotismo, quem caiu de arma na mão na trincheira ou no campo de batalha não pode ser esquecido.
O monumento emblemático de Toulouse é a Basílica Saint-Sernin (poderemos traduzir por São Saturnino), primeiro bispo de Toulouse. Houve uma modesta basílica no século V, mas a excecional popularidade do mártir tolosano falou mais alto, a afluência dos peregrinos era enorme. E foi assim que apareceu entre os séculos XI e XII o mais espetacular templo românico que há na Europa. A sua nave central é impressionante, ao fundo há um magnífico claustro. Felizmente que em meados do século XIX andou por aqui o famoso arquiteto Viollet-le-Duc, que procedeu a uma série de restauros que garantiram a formosura primitiva do templo.
As obras de Saint-Sernin duraram de 1070 até ao século XVI, mas as torres ocidentais jamais foram acabadas. Vê-se que é um edifício perfeitamente coerente, é um caso raro em que se respeitou integralmente o projeto inicial. Pela sua estrutura, Saint-Sernin pertence à família das igrejas chamadas “de relíquias e de peregrinação”, e por isso tem esta ampla nave flanqueada por naves laterais, um amplo cruzeiro, um couro majestoso e profundo rodeado de um deambulatório de onde irradiam capelas. Tem 115 metros de comprimento e 64 de altura, medida pelo cruzeiro. É por isso que é a maior igreja românica do mundo.
O acesso à basílica é feito sobretudo por três portas, veja-se a beleza deste tímpano, dentro das estritas linhas românicas. Os capitéis, tanto no interior como no exterior, são de uma enorme beleza, são livros em pedra, falam dos suplícios infernais, da Ascensão de Cristo no meio dos anjos, mostram Apóstolos, leões, Adão e Eva expulsos do Paraíso, a Anunciação e a Visitação, são necessários vários dias de visita para absorver tanto esplendor românico nesta construção de fé onde os peregrinos vinham pedir consolação e salvação das suas almas.
Pode-se fazer a visita no deambulatório, andar no exterior à volta, visitar capelas ou a sacristia, pode-se andar demoradamente no cruzeiro ou a estudar os capitéis. Aqui se vê uma porta do Renascimento, a chamada fachada principal, em seu derredor decorrem obras de beneficiação, e veja-se a belíssima torre.
Voltaremos a esta igreja de peregrinação, pela sua invulgar simplicidade e porte majestoso.
(Continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 25 DE AGOSTO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18952: Os nossos seres, saberes e lazeres (281): De Aix-en-Provence até Marselha (13) (Mário Beja Santos)