segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

Guiné 61/74 - P20601: Fotos à procura de... uma legenda (116): afinal, o "Manel Djoquim" andava armado,no mato, com uma pistola metralhadora, facto que a família desconhecia... Resta saber a marca e o modelo: é mais provável que fosse a portuguesa FBP m/948 ou até m/963


Foto nº 1 A
Foto nº 1

Foto nº 2 A


Foto nº 2 

Guiné > s/l > s/d > Não há dúvida que se trata de uma "arma de guerra" e não de caça, uma pistola metralhadora, talvez a portuguesa FBP m/948 ou m/963...  Ou a americana M3 (1942), a famosa "grease subgun" ? As opiniões dividem-se... Thompson não parece, pelo punho em madeira...E M3 também não, que os americanos (General Motors) desenvolveram na II Guerra Mundial, mais barata que (e, por isso, substituta de) a Tommy Gun, a Thompson m/927 (, esta, sin, eternida, na Lei Seca, pelo famigerado Al Capone)... Procurámos melhorar a resolução das fotos acima (Fotos nºs 1 e 2) que, por serem a cores, devem ser dos anos 60.


Fotos (e legenda): © Lucinda Aranha (2014) . Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Angola > 1961 >Angola > 1961 > Desfile de tropas > O António Rosinha, furriel miliciano, aparece aqui em primeiro plano, assinalado com um X... O alferes, que vem à frente, e os três furriéis, imediatamente a seguir, empunham pistolas-metralhadoras FBP (Fábrica Braço de Prata) (1)... As praças, brancas e negras, usam a velha Mauser...Mas, diz o Rosinha, "essas FBP estavam inoperacionais em geral, porque as poucas que existiam em Angola eram da instrução, e com tanto 'monta e desmonta' as molas de recuperação já não actuavam. Mas a mim não me fez diferença, pois que, tirando a carreira de tiro, nunca fiz fogo a não ser à caça. Nem fiz nem ouvi. Vivi 200 dias por ano em toda a Angola, durante os 13 anos de guerra, menos a tropa, em barracas de campanha." (*)

Foto (e legenda): © António Rosinha (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Não, não estamos aqui a discutir o "sexo dos anjos"... Se efetivamente for uma FBP m/948 ou até m/963, a pistola-metralhadora que empunha o "Manel Djoquim", a questão agora que se põe é a de saber como é que ele a arranjou (**) ...

Tratava-se de uma arma de guerra, distribuída apenas aos graduados do exército e  às forças militarizadas... O António Rosinha usou-a em Angola, como furriel miliciano, não como civil...

Temos de admitir a hipótese de, na Guiné, ter sido distribuída aos comerciantes e demais empresários (madeireiros, etc.), para defesa pessoal... Possivelmente no início dos anos 60, quando há cada vez mais indícios de "subversão": destruição de linhas telefónicas, sabotagens de pontes, raptos e assassínios de civis, incluindo comerciantes, etc. E,  se sim, quem dá ordem para distribuir armas de guerra aos civis ?

Não era arma para a caça de onças e crocodilos... Para esse efeito, o nosso homem tinha que ter uma ou mais caçadeiras de grosso calibre... Enfim, daqui a uns dias, a Lucinda Aranha poderá esquecer esta questão, da FBP, que é nova, para ela... E ficou de nos mandar cópia das imagens que tem nas pp. 80/81, com melhor resolução...

De qualquer modo, obrigado aos nossos leitores pelas diversas achegas..

PS - Mandei à Lucinda Aranha, hoje, às 12h49 a seguinte mensagem: "

"Lucinda: não há dúvida que o teu pai tinha uma arma de guerra, uma pistola-metralhadora...Há disputa, entre os nossos leitores, sobre se é uma FBP m/948 ou m/963 (portuguesa) ou uma M3 (americana, do tempo da II Guerra Mundial)... Que idade é que teria aqui o teu pai nestas fotos [, que reenvio, editadas] ? Devem ser fotos, a cores, dos anos 60... Portanto, ele já teria 60 e picos"..

2. Comentário de Lucinda Aranha, com data de hoje, às 16h43:

Apesar de a família desconhecer, tenho de me render à evidência. Como disse, o meu pai nunca fez serviço militar mas, eventualmente, quis uma arma que lhe desse mais segurança. Ele nasceu em 1901, portanto rondava 60 e pouco quando a guerra começou. O Pereira [, o genro do Esteves,] foi para a Guiné por volta de 1956, vamos ver o que ele dirá.

Uma forma de resolverem as vossas dúvidas era contactarem as relações públicas do exército. Eu contactei por  mail as relações públicas da marinha a propósito da fotografia do jogo de futebol na Praia [, pág. 44: uma equipa de futebol da marinha alemã em visita a Santiago] e o sr Costa Canas foi excelente, não só identificou a nacionalidade dos oficiais como mandou fotografias com os fardamentos dos oficiais alemães. Penso que deviam tentar.

Lucinda

3. Pistola-Metralhadora FBP (m/948, m/963 e m/976) (**)

 A FBP é uma pistola-metralhadora de 9 mm,  desenvolvida a partir de um desenho concebido pela primeira vez, em 1940, pelo maj art Gonçalves Cardoso. Coma a 2ª Guerra Mundial, o desenvolvimento da arma ficou em "stand by". É preciso esperar pelo pós.guerra para que o 948 o projecto de uma pistola-metralhadora portuguesa,  entretanto modificado e melhorado, entre em fase de produção.

Como a sigla sugere, a arma foi produzida na Fábrica do Braço de Prata, em Lisboa, em 1948. Foi adoptada para o serviço como m/948. Nessa altura, o  Exército Português apenas dispunha da Steyr m/938, uma pistola-metralhadora moderna mas em pequena quantidade. 

As primeiras FBP foram entregues,  numa primeira fase às unidades da metrópole, seguindo para as colónias as armas consideradas obsoletas.   Em finais dos anos 1950, a principal pistola-metralhadora usada nas colónias era a Steyer 9mm m/942.  A FBP vinha apenas em  segundo lugar. 

Fachada da antiga Fábrica de Braço de Prata
hoje um "centro cultural privado"
Foto: Cortesia da CM de Lisboa.


"Foi buscar a mola telescópica à alemã MP40 e a culatra amovível em aço, à americana M3 (Grease Gun). Inovador e único em pistolas-metralhadoras, foi a inclusão na m/948, de um grampo fixo debaixo do cano para suporte de uma baioneta Mauser".

A arma era distribuída apenas a  oficiais e sargentos das Forças Armadas e a Forças de Segurança. No início da guerra colonial, era a principal pistola-metralhadora nos primeiros tempoos da Guerra de África. Era manobrada sobretudo  pelo comandantes dos pelotões (alferes) e das secções de atiradores de infantaria (furríéis e sargentos). 

Também era  usada pelas unidades de defesa das instalações militares. Acaba por ser susbtituída pela    G3, que passa a equipar toda a secção de atiradores-

 "Nessa altura, a FBP foi relegada para as forças de segurança de instalações ou para unidades de recrutamento local e acabou por ser gradualmente substituída pela Uzi calibre 9 mm e pelas versões de coronha retráctil ou encurtada da G3 m/961".

Funcionamento:

(i) Arma automática, de tiro semiautomático e automático, de funcionamento por inércia.

(ii) A pistola-metralhadora FBP apresenta uma culatra cilíndrica. A abertura da câmara, retardada pela acção conjunta da massa da culatra e da mola recuperadora, dá-se no instante seguinte à saída do projéctil à boca. 

(iii) O percutor encontra-se fixo na culatra. Após a recuperação, esta só inicia o seu movimento de avanço quando o gatilho é pressionado. 

(iv) A alimentação efectua-se por acção da mola do depósito. Um extractor de garra com mola efectua a extracção do invólucro no movimento de abertura da culatra. A ejecção verifica-se quando a base do invólucro encontra, ao nível da caixa da culatra e sobre a base, um ejector fixo. 

(v) Um problema recorrente nos modelos iniciais tinha a ver com o sistema de segurança, o que originava alguns acidentes com as armas que, por exemplo, começavam a disparar ao receberem uma pancada forte (devida, por exemplo, a uma queda acidental) e só paravam quando o carregador estava vazio. 

Especificações técnicas:

Peso: 3,77kg (descarregada); 4,50kg (carregada) 
Comprimentos: Total - 807 mm (coronha esticada); 64 mm (coronha rebatida), Cano - 251mm - Calibre: 9 mm Parabellum
Tipo de Acção: Blowback (sistema de acção que dispensa o sistema de travamento da culatra. Devido à expansão dos gases da “explosão” do cartucho que se encontra no cano da arma, o ferrolho é impulsionado para trás, a mola recuperadora absorve a energia passada ao ferrolho, provocando a seguir o retorno do ferrolho para frente, colocando um novo cartucho na câmara)
Cadência de tiro: 500 tpm
Velocidade de saída: 390m/s 
Alcance: Útil – 50m; Efectivo - 100m; Máximo - 300m
Sistema de suprimento: Carregador de 32 munições
Mecanismo de segurança: Imobilização da culatra
Arrefecimento do cano: Pelo ar.

Variantes:

Limitações da FBP: a  versão original só fazia fogo em tiro automático. Com a versão melhorada, a FBP m/963, introduzida em 1961, passou também a fazer tiro semiautomático. 

Já depois de finda a guerra colonial, é desenvolvido, em 1976,  um modelo melhorado do m/948: a FBP  m/976  dispões de uma manga de refrigeração no cano, o que torna a arma mais precisa e fácil de controlar.

Temos, pois, 3 modelos:

(i) FBP m/948: versão original, com capacidade limitada a tiro totalmente automático;
(ii) FBP m/963: versão introduzida em 1963, com capacidade acrescida de tiro semiautomático;
(iii) FBP m/976: versão desenvolvida em 1976, com uma manga de refrigeração envolvendo o cano que, acidentalmente, também melhorou a precisão da arma. 


(***) Vd. 23 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5690: Armamento (2): Pistolas, Pistolas-Metralhadoras, Espingardas, Espingardas Automáticas e Metralhadoras Ligeiras (Luís Dias)

5 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Já não me lembro, ao certo, se os cabos milicianos usavam a FBP m/948 ou até a m/923, em serviço, nos quartéis da metrópole (sargento de dia, rondas, defiles, instrução, etc.). Mas tenho uma vaga ideia de ter feito fogo,na carreira de tiro do CISMI; em Tavira, com a nossa "portuguesíssima" FBP...

Também tenho uma vaga ideia de que não era uma arma fiável e segura... Tal como a Uzi, deve ter estado na origem de alguns acidentes graves... Em Tete, em Moçambique, um cunhado meu, que era da Intendência, esteve às portas da morte com um tiro de Uzi que, "acidentalmente",se disparou... A bala, de 9 mm, um "balázio, atingiu-lhe "sete órgãos"... Tem hoje um "fecho éclair" (cicatriz) que vai do baixo ventre até ao ombro...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Aparentemente não há registo do mais pequeno "incidente", na estrada ou nas tabancas, com a velho Ford do Manel Djoquim nem com a sua pessoa...Será que este "tuga" conseguiu passar incólume pela guerra ? S minas e as emboscadas não tinham "código postal"...

Há, naturalmente, lendas e mitos criados à sua volta... A verdade é que ele só baixou às "boxes" em 1971... Deve ter percebido que o seu tempo estava a chegar ao fim... Mas é um caso absolutamente notável de coragem física, de determinação, de resiliência, de amor à Guiné... Por isso lhe chamo o "último africanista". LG

PS - A exibição da FBP podia ter várias leituras... Para a PIDE e a tropa e para o PAIGC...

Valdemar Silva disse...

Pois, tanto a FBP, a Uzi e a Vigneron com o percutor fixo na cabeça da culatra facilmente disparavam 'sozinhas'.
Acontecia várias vezes, com um simples bater com a coronha numa mesa, haver rajadas descontroladas.
Na guerra da Guiné, julgo que não eram utilizadas em operações e apenas seriam utilizadas em desfiles militares.
Parece que estas armas, de pequeno porte e munições derrubantes de 9 mm eram mais utilizadas por forças da polícia.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

César Dias

27/1/2020

Nas Caldas os Cabos Milicianos usaram a UZI na guarda de honra ao Presidente da Republica, em Janeiro de 69, mas não me lembro do modelo.

Saci disse...

Da análise das fotografias do "Manel Djoquim", é definitivamente uma FBP, pois é mais esguia e comprida que a M3.
Por outro lado, será uma m/948 pois é possível ver no cano o suporte para a baioneta (que não existe na M3) que, salvo erro, já não era montado nas m/963.