domingo, 15 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20735: Blogpoesia (665): "Não é à vergastada", "De cangalhas" e "Passos em falso", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante a semana, que continuamos a publicar com prazer:


Não é à vergastada

Não é à vergastada que a Natureza resolve os problemas ou dá suas lições.
Sabe trabalhar na sombra como ninguém.
Para que tudo dê certo e esta magna viagem de cruzeiro chegue a bom porto.
Seu método é a discrição.
Para não alarmar.
Como capitão do navio está atenta ao que se passa a bordo.
Sabe como usar sua autoridade.

Desta vez, quando viu que a população se desenfreou com a avareza do poder e do dinheiro.
Escravizando de mil formas, os fracos e os pobres.
Criando guetos como nazis, escorraçando as gentes de suas terras natais para lhes sugar o volfrâmio do petróleo ou da matéria prima para bem do mal.
Soltou um enxame de bichinhos minúsculos por esse mundo infernalizado e paralisou tudo.
Atravancou as fábricas e os escritórios; paralisou comboios, navios e aviões; desertificou as megas-praças da barafunda anónima das cidades cosmopolitas.
Atiçou aos hospitais o fogo da incapacidade para acudir os acossados.

Pôs toda a gente a pensar que, afinal, a vaidade, a ganância que engalanava as nossas vidas, tudo era basófia e vã riqueza…

Mafra, 15 de Março de 2020, 8h21m
Jlmg

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De cangalhas

Bastou uma pequena lufada de bichinhos minúsculos.
Parece um tornado.
A terra tremeu.
Pobres e ricos.
Fortes e fracos,
Defendem a vida,
Com unhas e dentes,
Se agarram ao chão.

Cerraram as escolas.
Hospitais e clínicas,
Num gesto humano,
Dão-se as mãos.
Vêem-se aflitos,
Sem mãos a medir.

O dinheiro nos bancos
Fica gelado,
Não tem quem o trate.

Os figurões do dinheiro,
Com medo da morte,
Gemendo aflitos,
Tudo açambarcam.

Só os que dormem na rua,
Habituados a tudo,
Ao frio e à chuva,
Continuam alheios
Ao vírus da morte,
Como se estivessem em casa.

Mafra, 13 de Março de 2020
16h52m
Jlmg

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Passos em falso

Há passadas na marcha que nos estatelam no chão.
Faz falta um apoio,
Pequeno que seja,
Dum forte ou dum fraco.
Se ganha o equilíbrio e a firmeza também.

Quem só olha para o ar.
Não vê o buraco.
E é tarde, quando dá conta.

Não ver o futuro,
Só olhar o presente,
Põe em causa o caminho
Que nos leva ao fim.

Distrair a mente, fantasiando o presente, dá cabo de tudo.
Só resta o passado
Que foi e não volta.

Bar “Castelão” em Mafra, 13 de Março de 2020
9h27m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 8 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20715: Blogpoesia (664) : No Dia Internacional da Mulher: "Como todos os meus passos levam a ti..." (JUvenal Amado)

2 comentários:

Valdemar Silva disse...

Mendes Gomes
Já lá vai o tempo, ou melhor dizendo ainda não há muito tempo, erigiam-se monumentos religiosos para suavizar as partidas maléficas da natureza. Mas a natureza é terrível a pregar-nos partidas, a pulga do rato que infetou/matou milhões pessoas várias vezes na idade média era coisa do diabo e a natureza lavava daí as mãos e entrava de quarentena durante uns tempos.

Nós, agora com este corona, como se estivesse-mos a sofrer umas grandes morteiradas, temos que ficar resguardados de quarentena, que até pode ser inspirador para os poetas.

Ab. e saúde da boa
Valdemar Queiroz

Joaquim Luís Mendes Gomes disse...


Olá, amigo Valdemar


Para mim, creio que não navegamos à toa neste mar da vida. A Natureza quando vê a humanidade a descarrilar, aparece no caminho a avisar a navegação para corrigir o desvio.
Ela é sábia, competente e justa...

Joaquim