segunda-feira, 30 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4106: No 25 de Abril eu estava em... (8): Pirada, a ferro e fogo (Joaquim Vicente Silva, 3ª CCAV / BCAV 8323)

Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Pirada > 3ª CCAV / BCAV 8323 (1973/74) > O 1º Cabo Joaquim Vicente Silva, em 26 de Abril de 1974, com os restos das lembranças do ataque do dia anterior. (Neste caso, parte de um foguetão 122 mm).

Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Pirada > 3ª CCAV / BCAV 8323 (1973/74) > Bateria anti-aérea montada pelas NT, em Pirada, já depois do 25 de Abril.

Fotos: © Joaquim Vicente Silva (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do nosso camarada e amigo António Graça de Abreu:


Assunto - Joaquim Vicente da Silva: Ataque a Pirada em 25 de Abril


Meus caros Luís e Carlos Vinhal

Envio-vos este texto escrito pelo meu amigo do talho de S. Miguel de Alcainça. O texto é dele, eu não tenho nada a ver com isto, excepto ter limado algumas frases. O Joaquim não sabe usar computador.

Este texto é uma boa resposta ao general Almeida Bruno quando fala do 'Bando' que não participava em operações, nem saía dos aquartelamentos. O homem, general, tem de se penitenciar porque disse uma inverdade muito grande que mexe com todos nós, que obrigados (não foi o caso dele!) passámos pela Guiné.

Um abraço,

António Graça de Abreu



2. O dia 25 de Abril de 1974, em Pirada, a ferro e fogo (*)por Joaquim Vicente da Silva


O dia 25 de Abril de 1974, em Pirada, a ferro e fogo Apresenta-se o 1º cabo atirador 045385/73, Joaquim Vicente da Silva (na foto, à esquerda), da 3ª companhia do BCav 8323, comandado pelo coronel Jorge Matias, estacionada em Pirada, Guiné, 1973/1974.

Vivo em S. Miguel de Alcainça, a terra onde nasci, perto de Mafra e da Malveira, e sou o dono do talho de Alcainça. No blogue, o António Graça de Abreu, que tem casa aqui na terra, já falou em mim e entusiasmou-me a escrever para o blogue do Luís Graça e dos camaradas da Guiné.

Junto três fotografias minhas, a primeira em Pirada a 26 de Abril de 1974, com os restos das lembranças do ataque do dia anterior, outra de como sou hoje e a última de uma bateria anti-aérea que foi montada por nós, em Pirada, já depois do 25 de Abril.

Vou contar a história do violento ataque que sofremos em Pirada,  exactamente no dia 25 de Abril de 1974.

No dia 25 de Abril de madrugada, saímos dois pelotões, mais os sapadores. Fomos levantar algumas minas que estavam na picada em direcção a Gabu (Nova Lamego). Regressámos a Pirada por volta das dez da manhã. Participei nesta saída, tínhamos de fazer a protecção aos sapadores.

Eram mais ou menos dez e meia, eu já tinha tomado banho e estava no meu quarto, abrigo nº. 1, deitado em cima da minha cama e ouvi um pequeno estalido. Um colega que estava cá fora sentado num banco, gritou logo:

-Saiam para a vala que isto é o início de um ataque!...

Naquele dia o PAIGG bombardeou Pirada com muitos mísseis e morteiros, alguns caíram bem perto do local onde eu me encontrava, eu não morri por sorte. A meu lado, morreram três africanos nossos colegas, um míssil caiu-lhes aos pés e cortou-os em pedaços. Nunca tinha visto nada daquilo. Fiquei horrorizado, ainda hoje mexe comigo.

Nós, soldados brancos, não morremos nenhum, porque estávamos bem agachados nas valas ou trincheiras. Vieram juntar-se a nós vários oficiais, incluindo o alferes médico que nos disse para nos espalharmos mais pelas valas porque aquilo estava a ficar feio.

Este bombardeamento durou cerca de duas horas. Nós respondemos com os morteiros 81, os nossos obuses 10.5 e o nosso obus 14 que estava junto ao aeroporto de Pirada.  Bajocunda também nos deu apoio de fogo com o obus 14 deles. Foi um inferno. Só se ouviam bombas a voar, outras a assobiar e a rebentar por cima ou perto de nós.

Assim que terminou o ataque, mandaram-nos equipar para sair. Fomos patrulhar em volta de Pirada e encontrámos, para o lado do Senegal,  o mato todo a arder, mas felizmente não vimos ninguém do PAIGC. Caiu um míssil na casa de um comerciante branco, de nome António Palhas, que escapou ileso, mas morreram seis africanos que estavam noutro compartimento da casa.

Nesse dia,  nós, cabos e soldados,  não sabíamos nada do que estava a acontecer cá na Metrópole. Só à noite, através da BBC é que tivemos conhecimento do golpe de Estado. Foi uma grande alegria para todos nós porque pensámos logo que a guerra acabava naquele dia. Festejámos com muitas cervejas.

No dia seguinte na telefonia, começámos a ouvir a Grândola, Vila Morena e outras músicas do Zeca Afonso. A guerra ia acabar, que alegria!

____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 4 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3561: No 25 de Abril eu estava em... (5) Bissau, ouvindo vivas a Spínola, pai do nosso povo (J. Casimiro
Carvalho)


Postes anteriores:

22 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3498: No 25 de Abril eu estava em... (4) Agrupamento de Transmissões, Bissau (Belarmino Sardinha)

1 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3262: No 25 de Abril eu estava em... (3): Gadamael e depois Cufar (José Gonçalves, ex-Alf Mil Op Esp, CCAÇ 4152)

19 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2963: No 25 de Abril eu estava em... (2): Gadamael e a vontade de lutar do PAIGC também era pouca (Anónimo, Alf Mil Op Esp)

14 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2939: No 25 de Abril eu estava em... (1): Guidage (João Dias da Silva, CCAÇ 4150, 1973/74

4 comentários:

Anónimo disse...

Caro Vicente Silva

E´o que se chama pode chamar "data marcada em dobro" ,para a vida.
Depois da tempestade...vem a bonança,é verdade

Aquele "brinquedo" da foto(122)é tambem meu conhecido,de Bula,só que não cairam dentro(6)e não fizeram estragos,felizmente

Gostei
Um abraço extensivo ao AGAbreu pela tabelinha

Luis Faria

Amilcar Ventura - Furr. Mecâ. 1ª comp. 8323 disse...

Amigo Vicente também me lembro desse dia e acho que foram mais de 20 foguetões que mandaram para Pirada e nós em Bajocunda tivemos que bater a vossa zona com os nossos obuses 14 que eram três e que levamos muito tempo a mandar ameixas para ver se Calava-mos o ataque do PAIGC.

fernando belo disse...

fernando belo disse...
Amigo Vicente,então, quando é que
largas esse amigo, que tens nas
maus, parece que te enamoras-te de-
le.Amigo estou apenas, a brincar
contigo,então como vais camarada?
Espero,que vás contactando com al-
guns companheiros nossos,não sei,
se tens computadôr,se tiveres vai
á NET.e no GOOGLE, escreve.
B.CAV.8323 GUINE 1973/74,e lá apa-
rece,algumas novidades minhas.
Vicente,um abração do F. BELO.

LUIS PALHA disse...

Caro Vicente Silva

Li a sua crónica sobre o ataque a PIRADA em 25ABR74. Gostaria de rectificar o nome de António Palhas. Era o meu Pai e o seu verdadeiro nome Silvério Palha.
Por milgare escapou ileso, porque se tinha retirado naquele preciso momento para ir buscar algo que nunca cheguei a saber.Nunca mais foi o mesmo homem...