Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > BART 2917 (1970/72) > CCAÇ 12 > Crianças de tabanca fula em autodefesa, no sul do Regulado de Badora, talvez Sansacuta.
Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Subsetor de Bambadinca > Detalhe > Tabancas fulas em autodefesa, Samba Juli, Sinchã Mamajã e Sansacuta, situadas entre os rio Querol e Timinco, a leste da estrada Bambadinca-Mansambo > Carta do Xime (1955) (Escala 1/50 mil)... Lugares que continuam no nosso imaginário...
Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2012)
Caro amigo António [Carvalho]:
É verdade que os camponeses fulas não gostavam de vender o seu gado e a razão é muito simples, era e continua a ser a única riqueza que têm e com a qual podem contar para se socorrer em casos de necessidade da família e da comunidade ou ainda em casos de calamidades naturais ligadas as suas actividades de sobrevivência.
Para nós, que estávamos habituados a escassez e a miséria do dia a sua, parecia-nos um exagero quanto as "queixinhas" dos metropolitanos sobre a comida. No caso concreto de Fajonquito, todas as semanas (segundas feiras?) abatia-se uma vaca que compravam (?) com a ajuda das autoridades locais, quando não eram vacas trazidas do mato, e habitualmente, preparava-se um guisado de carne com batatas ou então com massas (esparguete) e ainda assim acontecia, esporadicamente, na aldeia o desaparecimento de cabritos e galinhas que iam parar no forno do padeiro.
Para a tropa a comida nunca estava boa, mas ainda assim nós os djubis do quartel debatiamos sempre com insuficiência de sobras, aliás não raras vezes as segundas feiras (dia do abate) eram o dia em que não queriam ninguém no quartel, corriam com todos, isto falando dos outros, porque os faxinas estes ficavam na caserna à espera que um dos amigos lembrasse de trazer um pouco da sua comida ou da segunda dose quando restava alguma coisa na mesa.
É verdade que os camponeses fulas não gostavam de vender o seu gado e a razão é muito simples, era e continua a ser a única riqueza que têm e com a qual podem contar para se socorrer em casos de necessidade da família e da comunidade ou ainda em casos de calamidades naturais ligadas as suas actividades de sobrevivência.
Só quem (sobre)vive da terra, da agricultura, percebe as dificuldades e incertezas com que se deparam e num pais onde não existem nem subsídios, nem financiamentos ao agricultor.
Para nós, na tabanca, tirar uma galinha já representa um grande sacrifício. E de mais a mais, as manadas representam uma propriedade colectiva onde crianças, mulheres e homens adultos, cada um tem a sua vaquinha para seu sustento (ordenha do leite) e a sua poupança para o futuro a titulo individual e colectivo.
Vocês, vivendo no meio dos guineenses, nunca estranharam o facto de nunca terem encontrado instituições de fomento e/ou de apoio aquelas famílias, muitas vezes escorraçadas das suas terras e condicionadas pela situação da guerra onde eram mais vítimas do que propriamente actores ?
Para nós, que estávamos habituados a escassez e a miséria do dia a sua, parecia-nos um exagero quanto as "queixinhas" dos metropolitanos sobre a comida. No caso concreto de Fajonquito, todas as semanas (segundas feiras?) abatia-se uma vaca que compravam (?) com a ajuda das autoridades locais, quando não eram vacas trazidas do mato, e habitualmente, preparava-se um guisado de carne com batatas ou então com massas (esparguete) e ainda assim acontecia, esporadicamente, na aldeia o desaparecimento de cabritos e galinhas que iam parar no forno do padeiro.
Para a tropa a comida nunca estava boa, mas ainda assim nós os djubis do quartel debatiamos sempre com insuficiência de sobras, aliás não raras vezes as segundas feiras (dia do abate) eram o dia em que não queriam ninguém no quartel, corriam com todos, isto falando dos outros, porque os faxinas estes ficavam na caserna à espera que um dos amigos lembrasse de trazer um pouco da sua comida ou da segunda dose quando restava alguma coisa na mesa.
O que me valia a mim era ter o amigo Teixeira (Cabo Mecânico), hoje um empresário de sucesso em Lisboa, que nunca se esquecia do seu amigo Chiquinho. Alguns eram bons comilões e por cima mandões, porque traziam a marmita vazia para eu lavar e guardar.
Continua que estamos a gostar, embora me pareça mais do género politicamente correcto, como se costuma dizer e um pouco à esquerda. Não sei se vais ter muitos leitores nos tempos que vivemos.
Um grande abraço,
Continua que estamos a gostar, embora me pareça mais do género politicamente correcto, como se costuma dizer e um pouco à esquerda. Não sei se vais ter muitos leitores nos tempos que vivemos.
Um grande abraço,
Cherno Baldé
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 15 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21905: Projecto de livro autobiográfico, de António Carvalho, ex-Fur Mil Enfermeiro da CART 6250/72 (Mampatá, 1972/74) (4): A vaca
(**) Último poste da série > 20 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21924: (Ex)citações (382): O 1º Cabo RD "Estraga a Tábua" que eu conheci em 1962, no então BC 10, mais tarde, RI 19, Chaves (E. Esteves Oliveira)
2 comentários:
Meu caro Cherno Baldé, como as tuas palavras me fazem recuar no tempo! Como sabes, não fazia parte dessa Companhia, mas como a amizade ficou, e independentemente da Companhia a que pertencíamos, vamos-nos (uns tantos) encontrando de tempos a tempos, em particular nos "convívios anuais". E é desses " convívios", que me recordo de ouvir o Teixeira (hoje empresário ligado ao comércio de motas), abordar essa questão, não propriamente, pela "comida", mas pelo carinho que sentia (nem sempre expresso) por essas crianças, entre elas tu, que circundavam o aquartelamento de Fajonquito. Recordo que um dos grandes intermediários na venda de vacas à "tropa", era o conhecido comerciante em Sonaco, o Sr. Orlando.
Fica o abraço, e vai continuando a contar-nos histórias do "teu" povo, que tanto me (nos) encanta.
Manuel OLIVEIRA PEREIRA
C.Caç.3547 - Os Répteis de Contuboel
Manuel Pereira, tens que nos falar desse sr. Orlando. Sonaco era, no meu tempo (1969/71) o maior mercado abastecedor de gado vacum da nossa tropa. Ia-se de Bambadinca ate la buscar vacas. Quem era esse Orlando ? Quem eram os seus fornecedores ?
E já agora conheces o Teixeira, tra-lo até nos...Era também uma alegria para o nosso irmão zinho Cherno. Ab. Luis
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