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EMOÇÃO E BOM SENSO
Nas nossas memórias, a intenção normalmente passa por transparecer emoções, racionalidade, por vezes agressividade, porque não vivemos numa redoma de vidro e somos afectatos pelo que se passa à nossa volta, tonando-nos alvos fáceis das chuvas ácidas e do Sol inclemente.
Há dias que tudo nos agride e qual espoleta sensível, facilmente deixamos rolar as lágrimas, assim como respondemos violentamente a qualquer situação que em dias normais deixaríamos passar com sorriso nos lábios, ou com um encolher de ombros, denotando assim a pouca importância da questão.
Temos uma geração inteira que teve pouco tempo para ser criança e muito menos para ser jovem, passou pela ditadura e pela guerra, teve medos anseios e viu o que nenhum ser humano está preparado para ver. Há quem tenha visto demais e aí chegados, uns reagem de uma maneira tornando-os insensíveis enquanto os outros o horror, permanece para além do imaginável e desejável.
De uma forma de outra, uns e outros ficaram condicionados ao reflexo daquele tempo. Muitos de nós começámos a usar a G3 antes mesmo de termos feito sexo pela primeira vez. Digo sexo, porque fazer amor, só mais tarde descobrimos o que era isso. Depois alguns choraram a sua desdita e outros mataram antes de amar.
Assim como quem usa uma bengala muito tempo, há momentos que sente necessidade de a voltar a usar, também ao longo da vida, quem tivesse uma G3 teria impulso de a usar numa briga da vizinhança, num desaguisado na estrada ou lavagem da sua honra, sim porque a ocasião fez o ladrão e os resultados não seriam diferentes do que se passa nos países onde as armas são de livre acesso, onde por exemplo os veteranos têm a opção de adquirir a arma com que prestaram serviço, com resultados funestos que todos ouvimos falar.
Há tempos li que os crimes, acidentes, etc com armas de fogo, já custaram três vezes mais vidas do que as que os americanos perderam em todas as guerras em que foram intervenientes, inclusive na guerra civil. Mas é assim, a G3 é um símbolo dos tempos de guerra mas também da paz, da mudança, da liberdade, da alegria e da esperança, não discuto se concretizada ou não, pois cada um é livre de estar contente ou não e de o dizer livremente.
Quem não se lembra da emoção com que lhe pegou a primeira vez e mais tarde a usou quase como adereço? Nessa altura não sabíamos que a passaríamos a usar como um turista usa a máquina fotográfica, para captar coisas boas e coisas más. A G3 empunhada pelo povo fardado, também tem que ser símbolo da Justiça e da equidade entre cidadãos, que têm o direito de ser defendidos acima da própria vida, e mal vai um país que não tem orgulho nas suas forças armadas.
Num arremedo de poema escrevi uma alegoria intitulada “se eu tivesse uma G3”.(*)
Essa G3 representa um símbolo daqueles anos de juventude, de algum desencanto, assim como um grito de revolta, pois todos têm o dever de perseguir a felicidade e não se contentar com o que nos querem dar.
Sejam ousados e exijam nada menos que o impossível, porque o não, esse está sempre garantido! Mas eu estou de acordo que por estas e outras razões, ainda bem que nós por cá não podemos ter uma G3. Razão tinham os hippies que gritavam no auge do movimento, façam amor e não a guerra.
Um abraço para todos e boas amêndoas.
Juvenal Amado
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Notas do editor
(*) Vd. poste de 20 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14392: Blogpoesia (405): Paranóia ou lamentos de veterano - Ah! se eu tivesse uma G3! (Juvenal Amado)
Último poste da série de 18 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14383: (Ex)citações (267): Será que nós estamos escrevendo milhares de postes à procura da juventudo "perdida" na guerra? (José Manuel Matos Dinis)