Mostrar mensagens com a etiqueta Adriano Moreira. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Adriano Moreira. Mostrar todas as mensagens

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11045: Os Nossos Enfermeiros (8): Diagnóstico salomónico (Adriano Moreira)

1. Estória do nosso camarada Adriano Moreira (ex-Fur Mil Enf da CART 2412, BigeneGuidaje e Barro, 1968/70), chegada até nós em mensagem do seu camarada (e nosso tertuliano) Jorge Teixeira com data de 30 de Janeiro de 2013:


Diagnóstico Salomónico

Quando cheguei a Guidage tinha dois meses de Guiné. Depois de já ter passado mês e meio no Posto de Socorros e Enfermaria de Bigene e de ter visto com pouco pormenor a Enfermaria de Binta naqueles três dias que lá passei, quando deparei com o que me disseram ser o Posto de Socorros de Guidage, quase caí pr´o lado. Era praticamente pegado à Cantina onde toda a gente ia comprar as bebidas. Tinha porta da frente, mas sem fechadura o que equivale a dizer que não precisava de chave. Portanto ficava aberto dia e noite, porque na parte de trás nem porta tinha.

Coloquei o Atrelado Sanitário (que me tinham impingido em Bissau) de forma estratégica para dificultar um pouco mais a entrada naqueles aposentos maravilhosos com um chão tão irregular como a estrada que lhe passava à porta e nos levava até à pista. As paredes não podiam sentir nenhum desprezo pelo chão, pois estavam esburacadas e estragadas o suficiente para não serem consideradas nenhuma Obra d´Arte. Assim, aqueles aposentos dignos das Mil e Uma Noites passaram a ser o meu local de trabalho.

Com estas maravilhosas instalações, a única coisa boa que eu recebi foi o meu ajudante "TUMBULO". Era esse o nome do rapaz a quem eu muito pomposamente designava "Pelo meu Tradutor Oficial de Línguas".

Como estávamos em cima do Senegal ou o Senegal em cima de nós, tínhamos uma considerável clientela do lado de lá, que nós tratávamos gratuitamente o melhor que sabíamos e podíamos, e eles também conforme podiam lá iam trazendo uns ovitos e outras vezes as bichezas que os punham, ou seja umas galinhitas.

Dentro deste panorama geral, certo dia aparece por lá um indivíduo a quem o Tumbulo no seu afã habitual de perguntar o que as pessoas tinham para me comunicar em seguida, diz-lhe com toda a rapidez e num tom de cortar à faca: "PENCÓ".

Eu naquela altura já sabia algumas palavras de mandinga e de fula e, entre elas, que pencó ou pingo significavam injecção, portanto fiquei logo elucidado ele queria levar uma injecção e "mais nada".

O Tumbulo vira-se para mim muito atrapalhado:
- "Furié ele só fala injecção!"

Digo-lhe:
- Eu já percebi, mas volta-lhe a perguntar o que é que lhe dói ou o que ele sente para eu lhe poder dar o remédio adequado.

Então o Tumbulo cheio de boa vontade lá recomeçou com a lengalenga toda outra vez, ao que o indivíduo impávido e sereno lhe atira com outro "PENCÓ", não negociável.

O Tumbulo ainda mais atrapalhado volta-me a dizer:
- "Furié ele só fala injecção".

Nessa altura eu já estava a dar voltas à cabeça a pensar no que havia de fazer para dar a volta àquele mânfio. Então viro-me para o Tumbulo com o ar mais dramático do mundo e com uma voz muitíssimo calma para quem estava prestes a explodir e digo-lhe assim:
- Olha diz ao homem que estão aqui as injecções todas que nós temos. Umas são muito boas, fazem muito bem, outras matam. Ele escolhe a que quiser, põe mesmo a mão dele na caixa e eu dou-lha, se ele estiver com sorte a injecção faz-lhe bem ou não lhe faz nada, se ele estiver com azar leva a injecção e morre. É tudo tão simples como isto.

Quando acabei de falar deu-me mesmo a sensação que ia ficar sem tradutor oficial de línguas pois ele devia de estar com pensamentos do género: "E andei eu a dar injecções destas às bajudas sem saber podia mandar alguma pró galheiro". Logo a seguir já refeito lá passou a minha mensagem ao homem que preferiu não arriscar e acabou por dizer o que sentia e eu acabei por lhe dar a injecção adequada às suas maleitas, que espero lhe tenha feito bem, para acabar com esta treta em beleza.

O meu muito obrigado para todos os que contribuíram para que este texto e as fotografias possam sair à luz um dia qualquer num post e no blogue de todos nós, principalmente aos camarigos Teixeira e Vinhal.

Manga d´abraços para todos.
Adriano Moreira

Adriano Moreira com miúdos 

Adriano Moreira com Mulher Grande
____________

Nota do editor:

Vd. último poste da série de 20 DE SETEMBRO DE 2009 > Guiné 63/74 - P4978: Os Nossos Enfermeiros (7): Excerto do Diário de um Enfermeiro (José Teixeira)

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Guiné 63/74 - P10451: (Ex)citações (196): Um funeral balanta, em Barro, no tempo da CART 2412 (1968/70) (Adriano Moreira)

1. Comentário do Adriano Moreira (Admor) ao poste P10442:

[O Moreira foi Fur Mil Enf da CART 2412, Bigene, GuidajeBarro, 1968/70, e está inscrito na Tabanca Grande desde 30 de maio de 2012; foto atual à direita]


O único enterro em que fui chamado a participar ou convidado aconteceu em Barro.

Um homem grande,  de etnia balanta,  que se chamava Fonseca, meu cliente certo da enfermaria,  fez questão ou a sua família que eu assistisse ao seu funeral.

Assim, quando cheguei à tabanca,  na casa onde ele morava estava o Fonseca sentado numa poltrona de veludo vermelho, bastante coçado,  e com duas ou três notas enroladas e metidas nos lábios.

Quando foi a enterrar ao lado da sua casa,  foi precisamente num buraco aberto na vertical e na mesma posição de sentado em que estava na poltrona, que devia de servir para estas situações.

Não sei se a sua posição respeitava alguma orientação, mas como os balantas eram animistas acho que não devia ter qualquer sentido obrigatório, como Meca para os muçulmanos.

Fiquei bastante surpreendido com estas situações, mas não fiz quaisquer perguntas, nem na altura nem depois, o que realmente foi pena, pois poderia agora estar mais elucidado sobre o assunto.

Um grande abraço para todos.
Adriano Moreira



Guiné > Região do Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968 > Espaldão do morteiro 81, guarnecido por dois Jagudis, de etnia balanta.

Foto: © A. Marques Lopes (2007). Todos os direitos reservados.

_____________

Nota do editor:

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9964: Tabanca Grande (341): Adriano Moreira (Admor), ex-Fur Mil Enf, CART 2412 (Bigene, Guidaje e Barro, 1968/70), grã-tabanqueiro n.º 560

1. Há muito que o nosso camarada Adriano Moreira (Admor) (ex-Fur Mil Enf.º da CART 2412, Bigene, Guidaje e Barro, 1968/70) intervém no nosso Blogue, do qual é leitor diário.
Sabendo disso resolvi endereçar-lhe um convite para ele se instalar com armas e bagagens na nossa Tabanca Grande, sabendo que o seu coração pende para aquele grupo de bandalhos pertencentes ao Bando do Café Progresso - Das Caldas até à Guiné, capitaneado pelo nosso outro camarada e tertuliano Jorge Teixeira, também este da 2412.

Porque os amigos são para as ocasiões, para poupar trabalho, fomos ao Blogue do Bando do Café Progresso e, com a anuência do Presidente Jorge Teixeira, copiamos, com a devida vénia, a apresentação do Admor, como segue:


Apresenta-se o Soldado Recruta do CSM,  em 12 de Setembro de 1966,  na EPC, Santarém, Adriano Moreira.
 
Quem é que lhe perguntou o nome? Você aqui é um número! 

Em 3 de Janeiro de 1967 fui para Lisboa para o BSCF, em Campo de Ourique, como pensionista (dormir e comer) para tirar o Curso de Enfermagem na ESSM onde estive até Maio para fazer também o pré Estágio no Hospital Militar Principal.

Depois regressei ao velho burgo do Porto,  ingressando no HMR1 onde estive até junho de 1968, altura em que fui para o RAP2  integrar a CART 2412 com destino à Guiné.

Embarquei em 11 de Agosto no Uíge e lá desaguei na Foz do Geba,  com as trouxas às costas para um batelão que me pôs em terra firme de Bissau.

Após tudo isto e as praxes militares, seguimos para Brá onde ficamos instalados no Depósito de Adidos até 31 de Agosto. No dia seguinte fomos de LDG até Ganturé, onde saímos e dirigímo-nos para Bigene onde ficamos até 14 de Outubro a fazer treino operacional sob o comando do COP3 do Major Correia de Campos e com a CART 1745.

No dia 15 chegamos a Binta para render a CART 1648, tendo seguido quase de imediato o 2.º Pelotão da nossa Companhia para Guidaje a fim de substituir o Pelotão da 1648 que estava lá.

No dia 17 seguiu o 1.º Pelotão mais o Comando da Companhia para Guidaje por este destacamento ter sido considerado mais importante do que Binta em termos operacionais. Assim, a partir desta altura um pequeno destacamento que vivia com a população dentro do arame farpado ficou a rebentar pelas costuras com 3 Pelotões de brancos e um de naturais da CCAÇ 3 que nos apoiou sempre enquanto lá estivemos.

Em 9 de Março de 1969 fomos outra vez Cacheu abaixo em direcção a Ganturé para trocarmos com a CCAÇ 3 de Barro onde ficamos até finais de Abril de 1970.

Regressamos a Bissau onde embarcamos no Carvalho Araújo em 5 de Maio. Ainda passamos pela Ilha de S. Vicente em Cabo Verde, tendo aportado em Lisboa a 14 do mesmo mês. Já nessa altura o barco fez o percurso a cambar para a esquerda. Não sei se era defeito ou premonição.

Um grande abraço para todos
ADMOR - Adriano Moreira


2. Comentário de CV:

Caro camarada Adriano Moreira, estás oficialmente apresentado à tertúlia. Já por cá andas há muito, mas só agora resolveste, a meu convite, fazer parte desta imensa família de ex-combatentes da Guiné.

Foste um dos poucos a fazer o percurso inverso, ou seja vir de uma Tabanca dita mais pequena para a nossa, já que a esmagadora maioria dos camaradas começou a frequentar as que foram surgindo de norte a sul de Portugal, inspiradas pela do Luís Graça & Camaradas da Guiné. É um sinal de vitalidade e capacidade de associação que os ex-combatentes da Guiné demonstram, discutindo e registando as suas memórias em Blogues, livros e redes sociais.

Queremos continuar a contar contigo e com a tua colaboração activa dando, por que não notícias das vossas andanças enquanto bandalhos do Café Progresso.

Não te dou as boas vindas porque já és da casa, mas deixo-te um abraço em nome da tertúlia onde ficas com o número 560. Nem aqui escapaste a um número. Não leves a sério,  é apenas uma referência que amanhã estará esquecida.

O teu camarada e amigo
Carlos Vinhal
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série:

20 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9928: Tabanca Grande (340): Lázaro Ferreira, ex-fur mil art, GA 7 (Bissau, Gadamael e Ingoré, 1974), hoje advogado em Braga