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quinta-feira, 13 de maio de 2021

Guiné 61/74 - P22198: Blogues da nossa blogosfera (159): PANHARD - Esquadrão de Bula (Guiné, 1963/1974) (4): Descrição das Operações realizadas na zona de Bula no dia 5 de Maio de 1973 (José Ramos, ex-1.º Cabo Condutor de Panhard AML do EREC 3432)



Do blogue PANHARD - Esquadrão de Bula (Guiné, 1963-1974), que estamos a seguir e que é editado pelo nosso camarada José Ramos, ex-1.º Cabo Condutor de Panhard AML, do EREC 3432, que esteve em Bula, de 1972 a 1974.


DESCRIÇÃO DAS OPERAÇÕES REALIZADAS NA ZONA DE BULA – GUINÉ BISSAU

NO DIA 05 DE MAIO DE 1973


1 - A descrição dos factos ocorridos na Zona de Acção do Batalhão de Cavalaria 8320, sito em BULA (GUINÉ BISSAU) no dia 05 de Maio de 1973 foi em tempos motivo de publicação nas redes sociais e, a sua autoria atribuída ao então Capitão Salgueiro Maia.

Conhecendo bem Salgueiro Maia tendo tido oportunidade de com ele conviver desde 1965 na AM (Academia Militar), EPC (Escola Prática de Cavalaria) e, mais tarde na GUINÉ na qualidade de Comandante da Companhia de Cavalaria 3420 (Intervenção) colocados em BULA afirmei em comentário que mantenho e reitero:-

“ NÃO ACREDITO QUE SALGUEIRO MAIA SEJA O AUTOR DESTE ARTIGO “

“O MAIA pela sua conduta e serviços prestados na sua intensa actividade operacional não necessita de chamar a SI o protagonismo de uma Operação em que não teve intervenção, mas sim colaborou voluntariamente e de forma relevante no auxílio à recolha e evacuação de mortos e feridos”.

2 - Já este ano 2021 foi novamente publicado o mesmo texto acrescentando actividade em GUIDAGE.

Tomei a mesma posição acima descrita com a diferença de não me referir à actuacão de CCav 3420 quando da missão que lhe foi atribuída – ESCOLTAS para GUIDAGE (quando aguardava embarque por ter terminado a comissão) não porque dela não tivesse conhecimento.

Situação idêntica aconteceu ao então, também Capitão Infantaria Manuel Ribeiro de Faria. Se a elas me referisse, ou por aí enveredasse, teria que fazer referência a outros intervenientes que tiveram acções muito relevantes e, não esquecidas como tive oportunidade de o verificar pelo pedido de contacto telefónico de um camarada do meu curso Joaquim Reis (ao tempo Tenente e Comandante da Escolta de Segurança - Viaturas AML/PANHARD) por parte do hoje Coronel Manuel Ribeiro Faria.

3 - Em tempos tive oportunidade de fazer uma descrição dos acontecimentos numa página do Faceebook – AML/PANHARD e foi com alguma admiração que na sua transcrição/publicação é referido que “embora não tivesse o valor do que publicado em livro…………”.

Tal descrição (embora ligeira) teve única e simplesmente a intenção prestar a MINHA HOMENAGEM aos MILITARES da “METRÓPOLE” e naturais da GUINÉ-BISSAU que nessa Operação perderam a VIDA, foram FERIDOS e CAPTURADOS.

4 -Tendo plena consciência de que as interpretações variam com os observadores não envolvidos directamente (alguns sem conhecimento técnico-militar necessário e da situação) entendam fazê-lo “romanceando”; outros conhecedores das circunstâncias que conduzem a Operações desta envergadura, mas também desconhecendo tudo (informações, movimentação, indícios, etc, etc a que ela conduziu) decidam descrever com menos precisão a realidade.

Mesmo nestas condições o maior respeito quanto mais não seja por terem deixado uma referência a situações que NUNCA devem ser ESQUECIDAS.

Importa agora debruça-nos sobre as OPERAÇÕES realizadas no dia 05 de Maio de 1973 em simultâneo.


OPERAÇÃO GRANDE BURACO EM PONTAMATAR E OPERAÇÃO REALEZA NO CHOQUEMONE.

Não elaborando uma Ordem de Operações (que à época existiu) por forma a facilitar uma melhor e mais fácil compreensão (evitando terminologia militar com a qual nem todos estão identificados) não posso deixar de pontualmente a ter que utilizar.

1 - SITUAÇÃO GERAL

a. NT (Nossas Tropas)

Há época durante o período houve uma modificação sensível no dispositivo do Sector:-

Assim com a ida da CCav 3420 para BISSAU por haver terminado a Comissão de Serviço, a 1.ª CCav /BCav 8320 assumiu a posse do Sub-Sector de PETE destacando para os Destacamentos pertencentes a este Sub-Sector (PETE, CAPUNGA, JOÃO LANDIM), continuando os pelotões de Milicias em PONTA CONSOLAÇÃO E AUGUSTO BARROS.

Chegada da Companhia de Cavalaria 8353 (Intervenção) para rendição da Companhia de Cavalaria 3420.

b. IN ( Inimigo)

Neste período o IN mostrou-se particularmente activo aumentando os efectivos habituais nas suas bases/refúgios na Zona do CHOQUEMONE.

2 - SITUAÇÃO PARTICULAR

Em Março de 1973 assume as funções de Oficial de Operações do BCAV 8320 o então Tenente de Cavalaria Rui Santos Silva por designação do Comando do Batalhão.

Em Abril foram recebidas no Batalhão espingardas FN recondicionadas destinadas ao rearmamento dos Pelotões de Milícias.

Foram submetidas a verificação tendo sido detectadas diversas e frequentes avarias que na maioria dos casos não permitiam mais do que um tiro.

Seleccionadas as consideradas em condições foram distribuídas a um pelotão de 30 homens (Mílicias).

Quando da saída de qualquer força para qualquer tipo de acção o Comandante de Batalhão e Oficial de Operações estavam ser presentes podendo estar apenas um dependendo apenas efectivo e importância da missão.

Nesse dia coube ao Oficial de Operações que deparou com a seguinte situação. Pelas 03h00 (hora de saída) dos 30 homens do Pelotão de Milícias compareceram apenas 14 “armados” com paus de vassouras ou semelhantes. Situação resultante da desconfiança que as armas FN recondicionadas tinha provocado.

Decidi mandar abrir uma arrecadação e armar os 14 homens com o melhor armamento disponível acompanhando-os na missão.

Tratou-se da montagem de uma emboscada no CHOQUEMONE sem contacto. Retiramos do local efectuando uma pequena incursão pela zona do PETABE e HORTA DO ANANASES tendo sido recolhidos na estrada BULA – BINAR (junto a um local designado por Placa) por duas viaturas UNIMOG escoltadas por duas AML/PANHARD.

Uns dias depois sou informado pelo Senhor Comandante de Batalhão TENENTE-CORONEL ALFREDO FERREIRA DA CUNHA que nesse dia tínhamos sido observados por um Grupo do PAIGC (com efectivo de cerca de 150 homens) que só não reagiu dada a proximidade do Destacamento de CAPUNGA.

O efectivo normalmente presente no CHOQUEMONE era substancialmente mais baixo.

Tratava-se dum local de refúgio/base muito importante, um local de passagem para OESTE da GUINÉ com destino à CABOIANA e outros refúgios/bases ou para preparação de ataques a aquartelamentos do sector de BCav sito em BULA e, com alguma probabilidade a tentativa de aproximação a BISSAU fazendo a travessia no Rio MANSOA.

Equacionadas estas modalidades/intenções entendeu o COMANDO DO BATALHÃO actuar.

3 - MISSÃO

Executar acções tendo como objectivos as bases do IN no CHOQUEMONE e PONTAMATAR

À CCav 8353 atribuir a zona de PONTAMATAR. Designada por “OPERAÇÃO GRANDE BURACO”

Na zona do CHOQUEMONE actuação de tropas conhecedoras do terreno e com elevada experiência operacional. Designada por “ OPERAÇÃO REALEZA”

4  - EXECUÇÃO

OPERAÇÃO GRANDE BURACO

A CCav 8353 (a 2 pelotões) reforçada com um pelotão da 1ª CCav/BCav 8320 ( 1 ano de actividade operacional ) deslocou-se para a zona de PONTAMATAR cerca das 03h00 do dia 05 de Maio iniciando a actividade cerca das 07h00 que foi dada por terminada pelas 10h30. Não houve contacto com o IN.

OPERAÇÃO REALEZA

As informações do possível aumento dos efectivos presentes no CHOQUEMONE obrigaram ao planeamento de uma Operação de Grande Envergadura com Unidades que conhecessem muito bem a zona e tivessem grande experiência de Combate recorrendo aos Pelotões de Milícias sob a dependência do Batalhão, bem como à Companhia Africana sediada em BINAR.

A CCav 3420 comandada pelo Capitão Salgueiro Maia (ainda em quadrícula) estava a aguardar a ida para BISSAU por ter terminado a sua Comissão. A não ser em última instância é que o Comando do Batalhão a aplicaria na Operação.

Assim a missão foi atribuída aos Pelotões de Milícias 291, 293, 341 (a 35 homens cada) e à Companhia de Caçadores 17 (Africana) sita em BINAR com 2 pelotões posicionadas de forma a evitar uma possível incursão/acção sobre o Aquartelamento em Binar.

DESENROLAR DA OPERAÇÃO

Montado o dispositivo, cerca das 07h00 foram ouvidos alguns disparos e conjuntamente com o Comandante de Batalhão ( com quem me preparava para tomar o pequeno almoço) fomos de imediato para a Sala de Operações e do Posto Rádio – anexo à Sala – entrei em contacto rádio procurando saber o que se estava a passar.

O radiotelegrafista responde-me solicitando um instante porque se preparava para disparar sobre um elemento IN (elemento participante de patrulha de segurança ao Grupo IN acampado na zona).

De imediato ouviu-se um tiroteio de alguma intensidade fruto do contacto com o Pelotão de Milícias 341 (coord. Bula 5 B4.51) sem consequências para as NT. IN resultados desconhecidos. Pelas 07h30 novo contacto com IN desta vez com enorme intensidade em consequência da fuga para Norte do Grupo IN (em acampamento provisório com um efectivo calculado em cerca de +/- 100 elementos ) que deparou com o Pelotão de Milícias 293 ( coord. Bula 5 A4.64 ).

NT 03 mortos e 01 desaparecido e desmembramento do pelotão.

IN mortos prováveis e feridos confirmados.

Conseguiu-se novo contacto rádio e fui informado pelo radiotelegrafista que estava sozinho, mas avistando ainda alguns camaradas.

Informei-o de que se deviam dirigir ao SOL (Sul) e aguardassem recolha na Estrada para BINAR.

Com a concordância do Comandante do Batalhão foi solicitado o apoio ao ESQUADRÃO AML/ PANHARD para que se dirigisse à Estrada BULA-BINAR que de imediato se deslocou para o local.

Dado o distanciamento do Posto de Comando em BULA sugeri que fosse criado um Posto de Comando Avançado (PC 2), sito em CAPUNGA – aquartelamento de um dos pelotões da CCav 3420 a uma distância da área de acção de cerca de 3 km e, por decisão e delegação do Comando do Batalhão desloquei-me para o local onde permaneci até ao final da Operação.

Em coordenação com o PC 1 e, como conhecedor do posicionamento das NT (coube-me o planeamento da Operação com a aprovação do Comando) iniciei as acções necessárias por forma a ter uma noção o mais exacta possível das NT tendo como intenção o pedido de utilização da Artilharia o que se tornou impossível após os contactos já referidos e ao desmembramento do Pelotão de Milícias 293.

Pelo Pelotão 341 foi localizado o acampamento da Força IN ( entre as coordenadas Bula 5 B4.51 e Bula 5 A4.64 ).

Informando o PC 1 foi solicitado o apoio da Força Aérea (Fiat’s), mas como à época já era utilizado o míssil Terra-Ar STRELA a nossa Força Aérea dava apoio a 5.000 pés de altitude.

Chegados ao local estabeleceu-se dialogo com um dos pilotos a quem dei as coordenadas e me solicitou informação de que não haveria NT num raio de 3 Km em relação ao OBECTIVO.

Foi efectuado um único lançamento (penso de bomba de 750 libras) que foi observado no PC 2. Da eficácia falarei mais à frente.

Entretanto os contactos já com menos intensidade iam acontecendo havendo necessidade de reforços.

Assim pelas 10h30 da manhã o Comando do Batalhão deu por terminada a Operação GRANDE BURACO em PONTAMATAR e com o apoio uma vez mais do Esquadrão AML/PANHARD foram recolhidos na Estrada BULA – S. VICENTE com destino a CAPUNGA.

Pelas 13h00 compareceu em CAPUNGA o 2.º Comandante de Batalhão (MajCav César Monteiro) que recebeu a CCav 8353 comandada pelo Capitão Miliciano Calado.

O estado de espírito da Companhia depois de uma Operação que apesar de não ter tido consequências não deixou de ser o primeiro contacto com a mata e a realidade da Guerra não era o melhor para enfrentar uma situação de risco elevado. É tomada a decisão de um Grupo de Combate entrar em acção perto de um local denominado Horta dos Ananases.

Em situações desta natureza em que o IN se encontra “encurralado” é sabido que para se protegerem se aproximam das NT ou dos nossos Aquartelamentos procurando evitar a acção da Artilharia e Morteiros.

Também quando em retirada após emboscada nunca fugiam na perpendicular, mas sim para as zonas laterais (esquerda ou direita).

Cerca das 13h30 chega a CAPUNGA o Capitão Salgueiro Maia vindo de PETE (sede da Ccav 3420) que comandava. Atento, Solidário e Incapaz de se manter como observador veio fazendo jus à sua experiência operacional dar o apoio possível à situação que se vivia que se veio a tornar imprescindível e muito relevante.

Pelas 14h00 o Grupo de Combate da Ccav 8353 inicia o movimento para o local atrás indicado. A distância era pequena com pouca arborização e deparam com um Grupo com pessoal branco e camuflados idênticos aos nossos (NT).

Os segundos de hesitação e infelizmente a inexperiência foram fatais. Tratava-se de um Grupo IN que de imediato reagiu causando 04 mortos (1 furriel) e 08 feridos (05 graves).

IN com mortos e feridos prováveis.

O Capitão Salgueiro Maia foi com 2 Unimog’s resgatar os feridos e mortos. Procurámos por todos os meios fazer um garrote a um dos feridos, mas todos os esforços foram em vão.

Mais uma vez a Força Aérea esteve presente com 3 Heli-Canhões, mas nada puderam fazer.

A evacuação de feridos fez-se a partir da pista ou heliporto de BULA.

A OPERAÇÃO continuava e cerca das 16h30 novo contacto em Bula (Coord. A4.64) após entrada no acampamento (bombardeado pela Força Aérea) onde foram recolhidos peças de fardamento e equipamento, utensílios, diversos documentos, munições de armas ligeiras e acessórios de armamento.

Encontrados também muitos géneros alimentícios que foram destruídos e observadas grandes manchas de sangue.

Na ausência de evacuações pela Força Aérea da mata deslocou-se à zona integrado num Grupo de Combate o médico do Batalhão, Alferes Ribeiro que assistiu no local o ferido resultante do contacto acima referido. Com o aproximar do fim do dia foi decidido fazer regressar todos os efectivos empenhados dando como terminada a OPERAÇÃO REALEZA.

Pelas 18h50 BULA foi flagelada com 08 foguetões 122 com provável base de fogos localizada em Bissauzinho.

Reagimos com Artilharia 14, morteiros 10,7 e um Pelotão do Esquadrão AML/ PANHARD deslocou-se para a Estrada BULA – S. Vicente impedindo qualquer aproximação de BULA que só podia ser feita antes do km 4 ou após o km 10 ( do Km 4 ao Km 10 existia um campo de minas com 100 metros de profundidade ).

Todos os foguetões caíram na periferia do Aquartelamento provocando 05 feridos (graves) população e incendiando algumas tabancas.

À chegada ao aquartelamento em BULA tive conhecimento da permanência de uma Companhia de Paraquedistas ( enviada para reforço ), mas que não chegou a intervir.

Cerca das 0h00 fui acordado pelo Comandante de Batalhão para me deslocar novamente a CAPUNGA onde foi colocada a Companhia de Paraquedistas que aí pernoitou.

No dia seguinte 06 de Maio fomos visitados pelo Comandante do COP 1 (Coronel Paraquedista RAFAEL DURÃO), sito em MANSOA de quem o BCav 8320 dependia manifestando a sua admiração pela brilhante actuação do BCav e de todas as Forças empenhadas.

Autor
Rui Borges Santos Silva
Coronel de Cavalaria na Reforma (ao tempo Oficial de Operações do Batalhão 8320)
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Notas do editor

Poste anterior de 21 de Janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21792: Blogues da nossa blogosfera (147): PANHARD - Esquadrão de Bula (Guiné, 1963/1974) (3): Nos dias da guerra: As Panhard em Guidage (José Ramos, ex-1.º Cabo Condutor de Panhard AML do EREC 3432)

Último poste da série de 25 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22139: Blogues da nossa blogosfera (158): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (67): Palavras e poesia

segunda-feira, 1 de julho de 2019

Guiné 61/74 - P19938: Efemérides (306): 75º aniversário do nascimento de Salgueiro Maia (1944-1992): homenagem da sua terra natal, Castelo de Vide


Foi hoje inaugurado, em Castelo de Vide, sua terra natal, o monumento de homenagem a Salgueiro Maia (1944-1992), justamente no dia em que faria 75 anos se fosse vivo (*).  O monumento consiste na museologização de um símbolo do 25 de Abril, a Chaimite V200, oferecida pelo Exército. (Fonte: CM de Castelo de Vide, com a devida vénia).

Também arrancaram, no passado dia 25 de abril, as obras para a construção da Casa da Cidadania Salgueiro Maia, que vai ficar localizada no castelo desta vila raiana do Alto Alentejo. Trata-se de  investimento superior a três milhões de euros e vai ser um espaço museológico e de educação cívica. O espólio de Salgueiro Maia, conforme a vontade expressa em testamento pelo capitão de abril, ficou na sua terra. Por outro lado, sabemos que este nosso camarada, que foi comandante da  CCAV 3420, Bula, 1971/73, fez questão, em vida, de ser inumado na sua terra natal, em campa rasa.

Por outro lado, a RTP passa hoje o documentário "Salgueiro Maia: rumo à eternidade". Ficha técnica > realização: Francisco Manso | produção: Cristina Mascarenhas | autoria: guião e texto: Francisco Manso | música: Luís Cília | intérpretes: locução de Rui Portulez | ano: 2019 | duração: 35 minutos. Depoimentos: Adelino Gomes, Alfredo da Cunha, Carlos Beato, Carlos Matos Gomes, Hermínio Martinho,  José Alves da Costa,  entre outros.

Vd. também a página no Facebook da Associação Salgueiro Maia. Tem página na Net aqui.

Fernando José Salgueiro Maia, tenenente coronel de cavalaria, foi agraciado, com as seguntes ordens honoríficas:  

(i) ainda em vida, em 1983, Ordem da Liberdade, Grau Cavaleiro;

(ii) a título póstumo, em  1992, com a Ordem da  Torre e Espada,  Valor, Lealdade e Mérito, no grau Grande Oficial:

(iii) a título póstumo, em 2016, Ordem do Infante D. Henrique, Grau Cavaleiro.


Lisboa > Av Berna > Muro da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa (FCSH / NOVA)> Destaque para a figura do cap cav Salgueiro Maia (comandante da CCAV 3420, Bula, 1971/73), nosso camarada da Guiné,  e que eu conheci pessoalmente no ano letivo de 1975/76 no então ISCPS - Instituto Superior de Ciências Políticas e Sociais, na Rua da Junqueira, onde fomos colegas, por um ano, no curso de licenciatura em Ciências Sociais e Políticas, embora sem qualquer relacionamento pessoal.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Como já escrevi em tempos: 

Na altura, quando andávamos no ISCSP, estupidamente (!), nem sequer me ocorreu falarmos da Guiné onde estivemos na guerra, embora em alturas e sítios diferentes, eu, de 1969/71, em Bambadinca, ele de 1971/73, em Bula ... 

Nessa época, eu só queria esquecer a Guiné!... E das vezes que nos cruzámos, recordo-o como um típico militar do QP, de cavalaria, distante, reservado, e equidistante dos diferentes grupos estudantis de esquerda e extrema-esquerda que então imperavam no ISCSP.  No tenho ideia de alguma vez o ver fardado. 

Alguns dos colegas de curso não lhe perdoavam a sua participação no 25 de novembro, e quase ninguém tinha distância 'afetiva e efetiva' para antever o seu lugar na história de Portugal, enquanto operacional do 25 de abril (e do 25 de novembro). 

A crispação político-ideológica era então muito grande em 1975 e ainda em 1976... Por outro lado, os portugueses, têm, de há muito, uma 'relação bipolar', de amor-ódio,  com os seus heróis... (mas também com os seus deuses, santos, diabos e diabretes; possivelmente, essa relação 'bipolar', senão mesmo 'esquizofrénica', é universal, está longe de ser exclusiva dos tugas)... (**).

E em comentário ao poste P16275, acrescentei:

(...) "Salgueiro Maia teve a felicidade (ou a infelicidade, para os que o amavam, a esposa, os filhos, os amigos...) de 'morrer cedo de mais' (desgraçadamente, foi traído, aos 47 anos, por um cancro, que hoje poderia ter tido cura).

Nunca mais esqueceremos a cena dramática, épica, que foi o seu 'duelo' com os carros de combate que vieram da Ajuda e que lhe queriam barrar o caminho para a liberdade... É uma página extraordinária da nossa história!... 


Como cruel, e mesquinha foi a 'vingança' da hierarquia político-militar corporativa e conservadora que retomou as rédeas do poder e fez tudo para o amesquinhar e até destruir... A última parte da sua carreira militar (, 'desterrado' para os Açores e depois colocado à frente do 'presídio militar' de Santareém, afastada da sua casa, a EPC...) é  das coisas mais vergonhosas que lhe fizeram: autêntico 'bullying' castrense,  do mais mesquinho!...

Não somos bons a julgar os nossos contemporâneos, e sobretudo os melhores de todos nós. Temos uma problema de 'ejaculação precoce' nos juízos históricos do presnente ... Somos incapazes de raciocionar de maneira sinóptica, de ver,  num só relance, os que são geniais, que são mais do que homens, menos do que deuses, os nossos heróis... Só somos bons, a fazer consensos 'post mortem'... Mesmo assim é preciso, muitas vezes,  que os de fora, os 'estrangeiros',  nos deem uma dica... Temos, em suma, um grave problema de autiavaliação, de autoestima e de autoconfiança...

Não sei se é cinismo, se é fatalismo, se é morbidez, se é mesquinhez, se é inveja.... Direi apenas que é 'alma 
 pequena'... Levamos tempo e temos dificuldade em perceber de imediato a genialidade, a generosidade, a heroicidade, a santidade... dos nossos melhores: Camões, padre António Vieira, Sanches Ribeiro, Bocage, Camilo Castelo Branco, Eça de Queiroz, Amadeo Sousa Cardoso, Fernando Pessoa, Aristides Sousa Mendes, Veira da Silva, Humberto Delgado, António Damásio, Eduardo Lourenço, Jose Saramago, António Lobo Antunes, Sofia de Melo Breyner Andresen, Herberto Hélder, Salgueiro Maia, Vhils... são apenas alguns exemplos que me ocorrem, assim de repente, no campo das letras, da ciência, das artes, da ação cívica e política...

Estranho povo este... Mas não temos volta a dar: afinal somos nós, no nosso melhor e no nosso pior"...

2. Este mural [, inagem acima,] resulta de um desafio lançado pelo Instituto de História Contemporânea (IHC), unidade de investigação da FCSH/NOVA, a minha Universidade,   a que respondeu Vhils, co-fundador da plataforma Underdogs... o qual convidou mais quatro artistas (Miguel Januário, Frederico Draw, Diogo Machado e Gonçalo Ribeiro) para, em conjunto, pintarem o muro da Faculdade. 

 É uma visão (artística) do passado, do presente e do futuro do 25 de Abril de 1974. O objectivo foi “mostrar como esta nova geração de artistas interpreta o 25 de Abril e como esta data influenciou as suas vidas”, afirmou na altura, em 2014, Vhils, também conhecido por Alexandre Farto (n. Lisboa, 1987), e hoje já mundialmente famoso como artista da chamada "street art" ou arte urbana  (Fonte: FCSH/UNL).

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Notas do editor:


segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15291: Vídeos da guerra (12): "A ternura dos 20 anos", de Armando Ferreira, natural de Alpiarça, escultor de profissão, ex-fur mil cav, CCAV 8353 (Cumeré, Bula, Pete, Ilondé, Bissau, 1973/74): uma emocionante e emocionada homenagem aos seus camaradas mortos e feridos, há 42 anos, no "batismo de fogo", em 5/5/1973, em Bula, em que "deixei de ser eu" (sic)


Vídeo (11' 29'') do Armando Ferreira, nosso grã-tabanqueiro nº 704, disponível no You Tube > Armando Ferreira.





Foto nº 1 > O fur mil at cav Armando Ferreira


Foto nº 2 > O fur mil at cav Armando Ferreira


Foto nº 3 > O fur mil at cav Armando Ferreira e mais furrieis na classe turística do navio que os levou, em março de 1973, até à Guiné

Foto nº 4 > O fur mil at cav Armando Ferreira



Foto nº 5 > P fut mil cav Serafim de Jesus Lopes Fortuna, morto em combate em 5/5/1973, mês e meio depois da companhia ter chegado ao TO da Guiné. Era um dos amigos chegados do Armando Ferreira: andaram juntos desde o primeiro dia, na recruta e especiliadade em Santarém, na EPC



Foto nº 5 > O fur mil at cav Armando Ferreira


Foto nº 6 > O fur mil at cav Armando Ferreira e camaradas


Foto nº 7 > Foto sem legenda...[Segundo o "olho clínico" do nosso amigo Cherno Baldé, esta foto deve deve ter sido "tirada entre junho a agosto de 1974, no período de euforia do pós-25A74, nela estão elementos da guerrilha e jovens simpatizantes do PAIGC"... Não se sabe o local.]

Fotos: © Armando Ferreira (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]

1. O Armando Ferreira, natural de Alpiarça, escultor de profissão, foi fur mil cav, CCAV 8353, Cumeré, Bula e Pete (1973/74). 

Esta companhia não pertenceu ao BCAV 8320/72, era independente. Foi mobilizada pelo RC 3. Partiu para a Guiné em 16/3/1973 e regressou a 29/8/1974 (17 meses de comissão). Esteve em Bula, Pete, Ilondé e Bissau. Cmdt: cap mil cav António Mota Calado

Veio  substituir a mítica companhia do cap cav Salgueiro Maia, a CCAV 3420 (Bula, 1971/73).  Neste vídeo, de mais de 11 minutos, o Armando faz um emocionado e emociante relato do historial da sua companhia, declamando em "voz off" um dramático e longo texto poético,  a que deu significativamente o título "A ternura dos 20 anos"... 

O vídeo foi colocado no You Tube,  42 anos depois do "batismo de fogo" do Armando e dos seus camaradas, a trágica emboscada que a companhia sofreu em 5/5/1973, na região de Bula,  de que resultaram as 17 primeiras baixas da companhia, das quais 4 mortos:

(i) fur mil cav Serafim de Jesus Lopes Fortuna, natural da Madalena, Vila Nova de Gaia, e que era um dos seus grandes amigos;

(ii) 1º cabo at cav José João Marques Agostinho, natural de Reguengo Grande, Lourinhã;

(iii) Sold at cav João Luís Pereira dos Santos, natural de Brejos da Moita, Alhos Vedros, Moita; e

(iv) Sold at cav Quintino Batalha Cartaxo, natural de Castelo, Sesimbra.

Mais tarde, em 4/11/1973, da mesma companhia morrerá, também em combate, Madaíl Baptista, natural de Carvalhais, Ponte de Vagos, Vagos. (Dados do portal Ultramar TerraWeb).

As fotos acima reproduzidas foram recuperadas do vídeo.  Espero que o Armando nos ceda cópias das originais, com maior resolução (**).

Esta CCAV 8353 tem um um blogue em construção, editado pelo Nuno Esteves. Até
a data da entrada do Armando Ferreira na nossa Tabanca Grande não tínhamos qualquer referência a esta subunidade. Temos alguns camaradas do tempo do Armando, e do BCAV 8320/72, que estiveram em Bula como o Fernando Súcio, o Leonel Olhero ou o José Alberto Leal Pinto.

Não confundir este BCAV 8320/72 com o BCAV 8320/73, a que pertenceu por exemplo  o Nelson Henriques Cerveira (fur mil enf, CCS/BCAV 8320/73, Bissorã e Bissau, 1974).

O BCAV 8320/72 foi mobilizado pelo RC 3, partiu para o TO da Guiné em 21/7/1972 e regressou a 25/8/1974. Esteve em Bula, sendo comandado pelo ten cor cav Alfredo Alves Ferreira da Cunha. Era composto,  para além da CCS, pelas seguintes unidades de quadrícula: 1ª C/BCAV 8320/72 (Bula, Pete, Nhamate e Bissau); 2ª BCAV 8320/72 (Bula, Nhamate); e 3ª C/BCAV 8320/72 (Bula, BIssorã, Catió, Pete).






Guiné > região de Cacheu > Bula > CCS/BCAÇ 8320/72 (Bula, 1972/74) > Casa dos geradores > O fur mil Olhero vendo os estragos causados por um míssil. O Leonel Olhero, ex-fur mil cav, e nosso grã-tabanqueiro, pertencia ao EREC 3432 (Panhard), 1971/73.

Foto: © Leonel Olhero (2012). Todos os direitos reservados [Edição: CV]


2. Enquanto artista plástico,  e nomeadamente escultor, o nosso camarada Armando Ferreira tem participado em diversas exposições individuais e colectivas: Lisboa, Porto, Faro, Monsaraz,Torres Novas,  Alpiarça.  Está representado com obras em Portugal, Espanha, França, Bélgica, Itália e Holanda. É também autor de cartazes, cenários interiores e exteriores para várias sessões comemorativas: festivais da canção infantil, encontros musicais, ilustração de livros infantis e designers for books. Tem diversas entrevistas, críticas e apreciações por nomes ligados á arte, publicadas em revistas, jornais nacionais, televisão e em várias obras literárias (Portugal e Espanha). (LG)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15287: Tabanca Grande (475): Armando Ferreira, ex-Fur Mil Cav da CCAV 8353 (Cumeré, Bula e Pete, 1973/74)

(**) Último poste da série > 31 de outubro de  2012 > Guiné 63/74 - P10600: Vídeos da guerra (11): Sete anos no bacalhau em alternativa aos dois anos no ultramar: o filme A Outra Guerra (Portugal, 2010, 48')

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9972: Efemérides (100): Guidaje foi há 39 anos... A coluna do dia 29 de maio de 1973: a participação da 38ª CCmds (Pinto Ferreira / Amílcar Mendes / João Ogando)







1. Reprodução, com a devida vénia, de um artigo, da autoria de João Ogando e Amílcar Mendes, publicado no Boletim Informativo da delegação de Comandos de Almada e Seixal, nº 11-II Série, Dezembro de 2011, p. 8. Acrescenta, à guisa de explicação, o nosso camarada Amílcar Mendes, grã-tabanqueiro: 

"Todo o relato desta coluna é feito na 1ª pessoa pelo então comandante da 38ª Companhia de Comandos Sr Capitão de Inf Cmd Victor Manuel Pinto Ferreira e constante na história da companhia. Foi publicado neste Boletim com arranjos meus e do ex-furriel mil cmd João Ogando".

Este recorte já tinha sido publicado por nós, em poste de 25 de março último, mas está  lá com resolução mais fraca, e portanto menos legível ou pouco amigável para o leitor... (*). Esta republicação do recorte faz sentido na série Efemérides, numa altura em que estamos a reviver os 39 anos da "batalha de Guidaje" (**) (***), fazendo jus aos vivos e aos mortos.

2. Sobre o "novo tipo de minas", usadas pelo PAIGC em Guidaje, e que é referido  no artigo supra,  logo no segundo parágrafo,  cite-se José Moura Calheiros (A Última Missão, Lisboa: CR - Caminhos Romanos, 2010, pp. 460/461): 

"(...) em quase todos os relatórios  eram referidos rebentamentos de minas anticarro por simples acção de 'picagem' e era-lhes atribuída a designação  de minas antipessoal reforçada com mina anticarro. Apenas o Cap Mil Inf Carlos Alberto Pereira da Silva, comandante da [2ª CCaç/BCaç] 4512/72 (que realizou a coluna de 15 de Maio) refere no seu relatório datado de 1JUN73 que o inimigo utilizava minas com dispositivo eléctrico antipicagem. E, apesar de a Repartição de Operações do Quartel-General ter sido alertada para o novo tipo de mina no final da coluna realizada pela CCP 121 e DFE4, em 23 de Maio, a coluna realizada a 30 de Maio ainda utilizou o mesmo método de detecção de minas, o que originou mais uma morte.

"No seu realatório, o Cap Cav Fernando Salgueiro Maia refere 'face ao accionamento de minas por picas, é de substituir estas por paus aguçados' (...)".

3. Ainda segundo esta fonte (Moura Calheiros, 2010, pp. 458/459), a operação para a abertura de novo itinerário, realizada a 29 de maio de 1973, teve a participação de seis agrupamentos, "cada um deles com efectivos de cerca de uma Companhia"):

(i) Agrup A: 38ª CCmds + Pel Sap / BCaç 4512;
(ii) Agrup B: 1ª CCaç / BCaç 4512 + GEsp Mil 342 (Olossato);
(iii) Agrup C: CCav 3420 + grupo de picadores de Binta;
(iV) Agrup D: CCP 121 / BCP 1;
(v) Agrup E: DFE1;
(vi) Agrup F: CCaç 3414 (Cumeré).

Os agrupamentos A, B, C e F partem de Binta, comandados pelo Cap Inf Comando Pinto Ferreira, da 38ª CCmds.  Os agrupamentos D e E (os páras e os fuzos) partem de Guidaje.

4. Depois da "batalha de Guidaje" e do seu regresso a Mansoa,  foram concedidos ao pessoal da 38ª CCmds 15 dias de descanso operacional em Bolama, na 2ª quinzena de junho de 1973, conforme se pode ler na história da unidade (vd. excertos a seguir):





38ª CCmds (Brá, 1972/74): História da Unidade > Atividade operacional entre os dias 25 de maio  e 19 de junho de 1973 (Documento disponibilizado pelo Amílcar Mendes)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9662: Guidaje, Maio de 1973: 2ª coluna a 4 companhias, a caminho de Guidage - 29/05/1973 (Amílcar Mendes/João Ogando)


(**) Último poste da série > 31 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9970: Efemérides (65): Guidaje foi há 39 anos: Relembrando a primeira trágica coluna, dos dias 8 e 9 de maio de 1973 (Manuel Marinho, 1ª CCAÇ / BCAÇ 4512, Nema, Farim e Binta, 1972/74)

(***) Sobre a participação do Salgueiro Maia e dos seus homens, nesta coluna, ver o poste 26 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1213: A CCAV 3420, do Capitão Salgueiro Maia, em socorro a Guidaje (João Afonso)

terça-feira, 29 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9963: Efemérides (97): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (3): Permanência em Guidaje (António Dâmaso)

1. Terceira parte da narrativa da "Operação Mamute Doido", de autoria do nosso camarada António Dâmaso* (Sargento-Mor Pára-quedista da CCP 121/BCP 12, na situação de Reforma Extraordinária)  que participou nesta operação levada a efeito no fatídico mês de Maio de 1973.


OPERAÇÃO ”MAMUTE DOIDO” (3)

Permanência em Guidage

Vista parcial do Quartel de Guidage em DEZ1973
Foto: © Cortesia de Albano Costa, com a devida vénia

Os dias que permaneci no Aquartelamento de Guidage foram os mais dolorosos de toda a minha vida. Chegamos lá na noite de 23MAI73, com três mortos e um ferido grave, famintos, sedentos, desidratados e com o moral em baixo.

Quando entrámos cheirava a cadáveres em decomposição, recebi ordem para colocar o meu pelotão, nas traseiras da cozinha, perto dos balneários, numa vala debaixo de umas árvores de grande porte. Vim a saber depois que naquele lugar tinham, dias antes, morrido dois militares e que estavam à espera dos caixões que deviam ter vindo na coluna que não chegou, sendo a causa do cheiro que se fazia sentir. Não sei bem onde estes mortos se encontravam, lembro-me da existência de um abrigo na parada e que servia de enfermaria, donde vinha um cheiro insuportável.

Na primeira noite só eu e mais uns quantos dormimos junto da vala, os restantes foram para um abrigo que estava perto, não sei como cabia lá tanta gente, eram beliches com camas sobrepostas, até havia militares a dormirem debaixo das camas, estavam militares do Exercito, Fuzileiros e Pára-quedistas, era tudo ao molho, pensei que se caísse lá uma granada perfurante fazia uma razia. A vala em questão estava bastante arrasada, “ficado” dois militares dias antes, daí o sentimento de insegurança de lá permanecer.

Vista parcial da “parada” de Guidage com viaturas de uma Coluna
Foto: © PC Radiotelegrafista Janeiro


Quando espreitei à porta estavam a ouvir uma rádio pirata, a voz da libertação não sei quê, entre outras coisas foi lá que ouvi pela primeira vez que o Quartel de Guileje tinha sido abandonado.

No dia 24 MAI73, foi lá o Héli em missão arriscada em voo rasante, segundo se disse na altura pilotado pelo Comandante da Base, dizia-se que os pilotos não queriam levantar, o que eu acho que não correspondia à verdade, porque estiveram na operação “ Ametista Real” e quando em 23 a CCP 121 esteve cerca de 50 minutos debaixo de fogo numa emboscada em Cuféu, eles foram lá salvar-nos o “coiro”. Esse Héli levou-nos correio e dois pares de meias novas que nos deram muito jeito, dizem ter lá ido o Gen. Spínola mas não me lembro do ter visto, vi sim, o Major Pára Calheiros, o ferido grave do 2.º Pelotão, o Melo, foi evacuado para o Hospital Militar de Bissau acabando por falecer também.

Ainda no mesmo dia manhã cedo, o chefe da Tabanca de Guidage, deslocou-se à bolanha do Cufeu e disse ter lá visto três guerrilheiros mortos, mas que não tinham as armas, ficámos assim a saber que eles também sofreram pelo menos três baixas.

Parte do quartel de Guidage estava construído já no Senegal, até diziam que metade da pista era no Senegal, uma coisa era certa é que os DO 27 para aterrarem ou levantarem, tinham que voar por cima do Senegal, isto antes de terem abatido num só dia três aviões na zona, a pista era pouco mais que o campo de futebol, era um ponto alto de onde se avistava no Senegal, relativamente perto, uma estrada com movimento de viaturas.

Como vi o meu pessoal tão por baixo, eu não estava menos mas tinha o sentido da responsabilidade de comando, pedi ao Comandante da Companhia para falar com eles. Ele assim fez e para fazer ver que ainda éramos pára-quedistas, no dia 25MAI73, saímos pela estrada que ia para Barro, mais à frente derivamos para a esquerda, a corta-mato e fomos ao Cufeu, estivemos no local onde tínhamos sofrido a emboscada, quando vi o local onde nós tínhamos estado “abrigados”, ao ver tudo arrasado deduzi que tivemos sorte por não ter havido mais baixas, viam-se espalhados pela zona alguns cadáveres abandonados, já só as ossadas por terem sido comidos pelos bichos.

Aquela saída foi muito positiva para levantar o moral, porque tanto na ida como no regresso, na zona de Ujeque fomos alvo de tentativa de flagelação, como mais tarde alguém escreveu, “que não se saía nem entrava no quartel sem haver tiros”.

Não sei se aquela saída foi ordenada pelo Comandante do COP 3, apesar de estarem lá militares de outras armas mais descansados do que nós, coube-nos a missão e ficou aqui demonstrado que naquelas condições, as Tropas sitiadas devem fazer segurança próxima e afastada, é dos livros e tem-se verificado na prática que existindo grandes abrigos fortificados, mas, se não existir segurança próxima e afastada, correm o risco de com uma simples granada lacrimogénea, os saquem de lá “pelas orelhas”.

Entretanto já tinham sepultado os dois mortos que estavam lá quando chegamos, agora eram os nossos que já estavam em decomposição o cheiro era insuportável, eu ia comer perto da enfermaria onde os nossos três mortos tinham sido depositados sobre camas sem colchões, não existiam sacos para cadáveres, a refeição era um arroz aguado, espécie de canja temperada com um sal dum chispe de porco enlatado, que eu vi desenterrar na “parada”, para lhe ser aproveitado o sal, estava comer e o cheiro que vinha da enfermaria interferia-me com o paladar.

Mais uma vez falei com o Comandante de Companhia no sentido de acabar com aquela situação, dando-lhes sepultura, tendo em conta a meu ver, que nada mais se podia fazer por eles. Não sei se o meu pedido teve alguma influência, mas foi assim que eles foram sepultados em “campas individuais, enrolados num lençol e pano de tenda ao lado dos outros dois que já lá estavam.

Foi uma tarefa dificílima, eu que sempre evitei situações complicadas, mas há alturas em que por muito complicadas que sejam, temos de dar um passo em frente e voluntariei-me juntamente com o maqueiro/enfermeiro do meu pelotão Carvalho (1), mesmo com mascaras embebidas em álcool, foi difícil de suportar, estavam irreconhecíveis, se não fossem as etiquetas que tinham no dedo do pé, não sabia quem eram, fez-me alguma confusão como é que tinha entrado em decomposição em tão pouco tempo.

Tive conhecimento que num alojamento dos oficiais ou dos sargentos havia vaga, sei que um tenente da minha Companhia dormia lá, não me fiz rogado e fui para lá dormir, pelo menos sempre dormia num colchão já que o risco era iminente em qualquer lado.

Não me lembro de ver sentinelas enquanto lá estive, se as havia eu não as vi, também não as fui procurar.

Enquanto lá estive, deambulei por lá sem grandes curiosidades, até porque a minha condição psico-física não mo permitia, apenas estava preocupado para que em caso de ataque iminente, teria de defender a zona que me tinha sido distribuída, nesse contesto analisei o terreno envolvente, vi onde estavam todos os meus homens, porque a segurança não podia ser descurada. Assim fui à sala de Transmissões onde funcionava o Comando e troquei impressões com quem lá estava, já tinha tido três baixas e queria fazer tudo o que estivesse ao meu alcance para não ter mais, em virtude de estar consciente do perigo que todos corríamos.

As flagelações eram frequentes, numa delas houve uma granada perfurante que entrou num abrigo de um obus matou seis ou sete numa assentada, ficaram pendurados nos beliches. Naquela zona morria-se em emboscadas, dentro do quartel em valas e abrigos, a morte espreitava em qualquer lugar.

Lá foram mais uns quantos sepultados no cemitério improvisado, assim continuámos no antro de morte, o ar que respirávamos cheirava a morte. No dia 29MAI73 recebemos ordem de ir ao Cufeu fazer segurança para que não fossem emboscar uma coluna que vinha de Farim, desta vez tiveram o bom senso de trazer um Caterpillar a abrir picada nova, mesmo assim foi mais uma viatura pelos ares, na zona de Genicó, tendo provocado um morto e um ferido grave. A coluna no lado direito vinha escoltada pela CCAV 3420 do Cap. Salgueiro Maia e 38.ª de Comandos, nós saímos para ir fazer segurança ao Cufeu e o Destacamento de Fuzos saiu atrás de nós para ir para Ujeque.

Quando estávamos a entrar no Cufeu captei no meu rádio uma transmissão entre o Cap. Salgueiro Maia (?) ou o CMDT da Força que vinha à frente e o meu Comandante de Companhia, em que o primeiro perguntava qual a nossa localização porque estavam a avançar para ele em linha, cerca de cem militares/ guerrilheiros com boina verde, o segundo respondeu que não éramos nós porque estávamos na Tabanca do Cufeu e não usávamos boina no mato. Da conversa fiquei a saber que se conheciam da Academia Militar onde o Comandante da minha Companhia era conhecido por “Vietcongue”, aqui que ninguém nos ouve, nos Pára-quedistas tinha a alcunha de “Cara de Aço”, talvez devido ao seu ar grave, (com o devido respeito).

Quase de imediato ouviu-se um forte tiroteio na posição dele, desta vez o PAIGC foi tentar a sorte mais para frente, ao que parece ainda fizeram mais duas tentativas, mas a CCAV 3420 bateu-se bem e chegou para eles, apenas tenho algumas dúvidas se o contacto foi com CCAV 3420, ou se foi com a 38.ª de Comandos, se foi com a última esta já estava feita ao terreno porque já lá tinha passado.

Até que chegaram à nossa posição, depois da travessia da bolanha, uma viatura Unimog saiu fora do trilho e acionou uma mina, mais um ferido grave. Depois de passarem por nós, a minha Companhia seguiu atrás em protecção à retaguarda, mesmo assim ainda perto da zona de Ujeque, fizeram uma tentativa de nos flagelar, desta vez coube à minha Companhia repeli-los. Já de noite lá chegamos a Guidage.

A única coisa boa de que me lembro de ver enquanto lá estive, foi haver sempre água corrente.

(1) - O Carvalho,  mais conhecido por Carvalhinho, veio a falecer em combate na Operação Topázio Poderoso, na Região de Cubonge em 22JUL73.

Saudações Aeronáuticas
Dâmaso
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 28 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9954: Efemérides (61): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (2): Desenrolar da emboscada na zona do Cufeu (António Dâmaso)

Vd. último poste da série de 29 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9961: Efemérides (62): Guidaje foi há 39 anos: a coluna que rompeu o cerco, em 10 de maio de 1973 (Amílcar Mendes, ex-1º Cabo Cmd, 38ª CCmds, 1972/74)

domingo, 27 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9951: Efemérides (94): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (1): Estadia em Binta e saída até Cufeu (António Dâmaso)

1. Em mensagem do dia 25 de Maio de 2012, o nosso camarada António Dâmaso* (Sargento-Mor Pára-quedista do BCP 12, na situação de Reforma Extraordinária) enviou-nos a primeira de quatro partes de um trabalho onde descreve a "Operação Mamute Doido" realizada no âmbito dos trágicos acontecimento que marcaram Guidaje** e as NT naquele fatícico mês de Maio de 1973.


OPERAÇÃO "MAMUTE DOIDO" (1)

ESTADIA EM BINTA E SAÍDA ATÉ CUFEU

A. Dâmaso

Muito se tem dito e escrito acerca desta operação e dos motivos que levaram à mesma, contudo há indivíduos que nunca passaram pelo Cufeu, não têm conhecimento das condições do terreno na altura, no entanto falam como se tivessem por lá passado, para mim, militares que por lá passaram pertencentes à CCAÇ 19, Destacamentos de Fuzileiros, Companhias de Comandos, CCP 121, CCAV 3420 e outros que deixaram lá os corpos dos camaradas, sangue, suor e lágrimas, esses sim, assiste-lhes o direito de se pronunciarem sobre as suas vivências naquele local, desde que não divaguem porque se passou muito tempo.

Vieram dois militares que estiveram na emboscada dizer que tinha sido “aqui”, só que eles estavam na retaguarda da coluna, outro andava nas alturas, quem esteve na chamada zona de morte fui eu o “aqui” deles não corresponde com o meu, também disseram que morreram os três primeiros o que também não é verdade porque o 3.º era eu e estou cá, infelizmente morreram o 1.º, 2.º, 5.º e o penúltimo, seguindo as orientações do Blogue de Luís Graça, “não deixes que sejam os outros a contar a tua história”, segue a minha versão dos acontecimentos na primeira pessoa. Fui contactado pela TVI para lá ir em Fevereiro de 2007, de início acedi, tratei de passaporte e vacinas, só num dia levei quatro, mas por motivos de saúde declinei, acabando por ter ido o camarada Victor Tavares que pertencia ao 2.º Grupo que no momento em questão ia nas últimas posições na Coluna, julgo que o camarada Victor Tavares deu melhor conta do recado do que tivesse sido eu. Posteriormente quando foram entregues os restos mortais aos familiares, estava em Castro Verde uma repórter da RTP quando soube por alguém que eu tinha estado no local, tentou-me entrevistar mas quando eu lhe disse que não era capaz de falar no assunto sem me comover, foi compreensiva e não insistiu, ainda hoje tenho muita dificuldade em falar sobre o assunto.

Passando aos factos, depois de terminada a Operação Ametista Real, como comandante Interino do 3.º Grupo de Combate da CCP 121, ficamos em Binta à espera de uma coluna de viaturas de reabastecimento a realizar entre Farim e Guidage, a Companhia ir fazer segurança.

As conversas ouvidas em Binta no momento, eram que uma coluna de reabastecimento tinha sido emboscada pelos “turras”, que tinham feito um grande número de mortos, tinham incendiado as viaturas e levado as granadas de morteiro 81 e depois as devolveram pelos ares através dos morteiros 82, para o quartel de Guidage.

Em Binta não vi nenhum obus mas vi uma base de fogos de morteiros 81, já posicionados em várias direcções, sobre os morteiros dizia-se que em determinada altura em que o Aquartelamento foi atacado, quando foram para repelir o ataque, encontraram os tubos com terra no fundo, impedindo que as granadas percutissem, era este o “jornal de caserna”.

Em Moçambique, no ano de 1970, na operação “Nó Górdio”, em que por causa das minas, para se realizar uma coluna de viaturas era necessário a Engenharia abrir picada nova (estrada), fiquei pasmado como é que os chefes militares descoraram esse pormenor e até fiz um comentário em relação a isso a um tenente, que hoje é general que também lá estava nessa operação.

Agora passo a descrever a minha vivência nessa operação, que vale o que vale por se tratar da minha ”verdade”: 

No dia 22MAI73, tivemos um briefing na sala de operações da Companhia do Exército sediada em Binta, onde foram apresentados e discutidos os tópicos relacionados com a citada operação.

Foi-nos dito que no dia 23MAI73, a minha Companhia (CCP 121) ia fazer guarda avançada de flanco esquerdo, em protecção à coluna de viaturas de reabastecimento ao Aquartelamento de Guidage, junto à fronteira Norte.

Guiné > Região do Cacheu > Carta de Binta (1954) (Escala 1/50)  > Detalhes: posição relativa de Binta, Genicó, Cufeu e Ujeque (na picada Binta - Guidaje).

Depois de analisar a carta topográfica em questão, no quadro da sala de Operações da citada Companhia, vendo que a zona era bastante aberta, (com pouca mata) alertei o meu Comandante de Companhia para a utilidade de se levarem mais granadas de morteiro de 60mm, no que ele concordou e pedimos dois cunhetes destas granadas ao Comando de Binta, granadas essas que foram distribuídas pelos meus homens, atadas no equipamento com cordel, em virtude de calhar ao meu Grupo de Combate ir à frente na zona mais perigosa.

Seguidamente transmiti aos homens sob o meu comando, o tipo da missão, a perigosidade da mesma, a nossa posição no local crítico que era na frente da coluna, quanto à posição, testa da coluna na zona crítica, não me recordo se os critérios tiveram a ver com escala, rotação ou escolha.

Saímos de Binta no dia 23 pelas 6 horas da manhã, seguimos até ao cruzamento com a picada que vinha de Farim, tomamos posições defensivas e aguardamos pela coluna de viaturas que vinha de Farim, o que aconteceu cerca das 8 horas.

Iniciou-se a coluna tinha progredido pouco, a progressão era lenta, porque os picadores tinham de ir picando o terreno, para detecção de minas anti-carro e outras, como ia com atenção ao terreno, comecei a ver cepos de onde tinham sido cortadas árvores centenárias, talvez até milenares, apercebi-me que as viaturas se iam desviando para a direita para fugirem ao campo minado.

Quando atingimos a zona de Genicó, começámos a ouvir rebentamentos à nossa direita para os lados da picada, através do rádio ouvi que tinham deflagrado uma mina anti-carro e várias anti-pessoal que causaram várias baixas nos picadores, face a este incidente, houve um compasso de espera e passado muito tempo, o comandante do COP 3, Major Correia de Campos resolveu dar ordem para a coluna voltar para trás.

Ficámos um pouco parados em posição defensiva, até que o Comandante de Companhia recebeu ordem do PCA (Posto de Comando Aéreo) para continuarmos rumo a Guidage sem a coluna, no momento pensei que não fazia sentido continuarmos sem a coluna, mas ordens eram ordens e na tropa eram para serem cumpridas.

Continuamos a progressão sempre à esquerda da picada, mais ou menos a meio caminho entre Genicó e Cufeu, fizemos uma paragem para comer uma “bucha”, a mata era aberta e cheia de clareiras sentíamos o efeito do calor abrasador, traduzindo-se em suor e muita sede.

Continuámos a progressão cada vez mais sedentos, mais ou menos entre 500 e os 1000m do Cufeu, obliquamos para atravessar a picada para a direita e de seguida o meu pelotão passou para a frente como estava estipulado, calhando ser a 1.ª a secção a ir à frente, descemos uma encosta e já em terreno plano, obliquámos para a esquerda, na leitura de sinais, observamos algum silêncio anormal, pelo que foi dado sinal para se manterem atentos, a nossa progressão era como que em ziguezague.

O apontador de reserva do morteiro que passou a efectivo, tratava-se do Vitoriano, um Pára de alcunha Lisboa, e que quando o meu pelotão passou para frente, por ordem minha passou para a quinta posição na coluna, porque a meu entender, dadas as características do terreno e vegetação, por ser uma arma importante de defesa em caso de emboscada, o que se veio a verificar.

Era usual nas progressões a corta mato, que era o caso, ir um municiador à frente para abrir picada, se necessário, eu até cheguei a ir à frente para não serem sempre os mesmos, mas naquele dia, tendo em conta a mata ser aberta, com muitas clareiras, quem foi para primeiro lugar foi o apontador de metralhadora, da secção que calhava ir à frente, indo o municiador em segundo lugar e eu em terceiro. Não me lembro quem ia em quarto mas sei que em quinto ia o apontador do morteiro, por eu lhe ter dado ordem para ir nessa posição, recordo ainda que momentos antes da emboscada, ter olhado para trás e ver que o Comandante da Companhia seguia nos primeiros dez.

Acrescento que o Comandante da Companhia, conhecia bem os homens do 3.º pelotão, por quando em actuação de bigrupo que ele sempre acompanhou, ia muitas vezes neste pelotão, mesmo a nível de actuação de Companhia, quase sempre o vi no neste Pelotão, isto talvez se explique por ter na Companhia um Tenente do Quadro que ocuparia a posição da retaguarda, assegurando ele a posição da frente.

O Comandante de Companhia já tinha em 68/70, feito uma comissão de Serviço na Guiné como Comandante de Pelotão, onde passou por Gandembel. Eu estava na 3.ª comissão na Guiné, 2.ª em Companhia de Combate, tinha passado por Moçambique na Operação “Nó Górdio” e tinha em 1964 feito uma operação em Angola, portanto em termos de experiência acho que tínhamos mais que os outros graduados com funções de comando. Sem qualquer acordo prévio, optámos por ocupar aquelas posições na coluna como que a dizer aos homens, nós estamos aqui!

Provavelmente se eu tivesse lá o meu camarada Primeiro-Sargento Comandante da Secção, talvez eu tivesse ocupado uma posição mais à retaguarda, mas como o Cabo que ia a comandar a secção tinha sido ferido no Navio Patrulha e evacuado, resolvi estar em 3.º, quanto ao Comandante da Companhia deve ter pensado o mesmo que eu, e ir para os primeiros dez da coluna.

Eu ia com algum à-vontade, pensando que por ir a corta-mato me pudesse trazer alguma vantagem, contudo desconhecia em parte aquele terreno por ser a primeira vez que lá entrava, também desconhecia que a partir do momento que as viaturas voltaram para trás, os guerrilheiros do PAIGC passaram a vigiar toda a nossa progressão, por ironia do destino andamos às voltas e fomos ter mesmo ao local onde eles estavam treinados a fazer emboscadas, como tive oportunidade de verificar mais tarde.

(Continua)

Um Ab
A. Dâmaso
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Maio de 2012 Guiné 63/74 - P9939: Efemérides (59): A Operação Ametista Real foi há 39 anos (António Dâmaso)

(**) Vd. postes:

Guiné 63/74 - P9934: Efemérides (56): Guidaje foi há 39 anos: reconstituindo a 5ª coluna, de 22 e 23 de maio de 1973 (Victor Tavares e † Daniel Matos)

Guiné 63/74 - P9935: Efemérides (57): Guidaje foi há 39 anos... Pergunto: Por que é que a FAP não bombardeou com napalm a área de Genicó até Ujeque ? Por que é que não se utilizou o obus 14 no apoio às colunas ? No cerco de Guidaje muito eu desejei ter uma antiaérea... (Arnaldo Machado Veiga)
e
Guiné 63/74 - P9937: Efemérides (58): Guidaje foi há 39 anos... Alguns pequenos reparos e a minha homenagem a Amílcar Mendes, Daniel Matos e Victor Tavares (Manuel Marinho)

domingo, 6 de março de 2011

Guiné 63/74 - P7903: Álbum fotográfico de Vitor Raposeiro (Bambadinca, 1970/71) (4): Em Bula, com o Cap Cav Salgueiro Maia, e com o Gen Spínola



Guiné > Região do Cacheu > Bula > O Cap Cav Salgueiro Maia (comandante da CCAV 3420, Bula, 1971/73) observando a visita do Gen Spínola a Bula em Fevereiro ou Março de 72. 



Guiné > Região do Cacheu > Bula > 1972 > Visita do Gen Spínola em Fevereiro ou Março de 72 



Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa  > Junho ou Julho de 1970 > Operação helitransportada com tropas especiais...

Fotos: © Vitor Raposeiro (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.


Fotos do Álbum do Vitor Raposeiro (ex-Fur Mil, Radiotelegrafista, STM, de rendição indiviual, que passou por Aldeia Formosa, Bambadinca, Bula e Bissau, 1970/72) (*).



1. Mensagem de Vitor Raposeiro, com data de 19/11/2009:


Companheiros:


Ontem quando me referi ao dia 13 de Janeiro está claro que foi em 1971 e não em 1970 (*), pois neste ano ainda não tinha chegado à Guiné.Eu acho que vocês perceberam o lapso. 

Aqui vão mais algumas curiosidades,  não de Bambadinca,  mas tambêm são interessantes para a história da Guiné daquele tempo. Vivo em Setúbal e conheço bem o Durães.

Primeira  foto: visita do Gen Spínola a Bula em Fevereiro ou Março de 72. As fotos que fiz foram com o zoom no máximo pois fomos proibídos (toda a tropa) de sair do quartel porque ele queria provar aos jornalistas estrangeiros que o povo estava com ele e o resto era propaganda anti-lusitana.

Segunda foto: o Capitão Salgueiro Maia e outros oficiais e sargentos observam a cena em cima de um dos abrigos do quartel. Quando tiver tempo e pacência conto-vos uma história que se passou entre mim e o Cap Salgueiro Maia que só no dia 25 de Abril eu percebi e dei valor.

Terceira foto,  tirada em Junho ou Julho de 1970. Refere-se a uma grande operação helitransportada com tropas especiais,  etc. Observe-se a arma que o Parafuso está a usar.Tenho muito mais fotos desta operação.Bom por agora já

Chega,  já me doem as costas de tanto escrever. Saudações do Vitor
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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 4 de Março de 2011 > Guiné 63/74 - P7898: Álbum fotográfico de Vitor Raposeiro (Bambadinca, 1970/71) (3): O malogrado Fur Mil At Inf Luiciano Severo de Almeida (CCAÇ 12, 1969/71)

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7299: O Nosso Livro de Visitas (103): A Tabanca Grande não é para todos? (Eduardo G. Silva / José Marcelino Martins)

1. Um dos nossos Camaradas, visitante do blogue, com o nome de Eduardo G. Silva, deixou no passado dia 16 de Novembro de 2010, a seguinte mensagem:

Assunto: Tabanca Grande não é para todos?
Há já alguns meses, escrevi algumas linhas onde me identifiquei e pedi um contacto, o do "Zé Bigodes", camarada da CCAV 3420, cujo nome verdadeiro não conhecia.
Sei agora que se chama António José Fernandes Ogando.
Espero que tudo esteja bem com ele, assim como para os restantes camaradas.
Resposta não tive até hoje!
A Tabanca não atende desconhecidos?
Eduardo G. Silva
E-mail: eddygsilva@gmail.com

2. Ao tomar conhecimento o nosso Camarada José Marcelino Martins, (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), mais uma vez entrou em acção em 17 de Novembro e prestou mais uma das suas preciosas ajudas, através do seguinte esclarecimento ao nosso camarada: Assunto: Tabanca Grande não é para todos? Boa noite, Eduardo Silva

«Caiu-me» na caixa do correio a sua mensagem, reencaminhada pelo Luís Graça. Como poderá constatar pelo cabeçalho do blogue, há apenas quatro elementos a «alimentar» este local de encontro e, alguns deles ainda estão na vida profissional activa, o que lhe deixa pouco tempo livre, que é preciso retirar ao descanso que, começamos a achar necessário.

Existem alguns «voluntários», onde me incluo, que vão colaborando na medida do possível.

Não temos os contactos, como é natural, de todos os camaradas que connosco cumpriram a sua missão na Guiné. Conseguimos alguns elementos nos documentos que se encontram em arquivos oficiais mas, para tal, teremos que nos deslocar aos locais onde se encontram, mas não contêm as moradas.

Terei muito prazer em tentar ajudá-lo, em nome da Tabanca que, permita-me, é de todos, por ser aberta. Quando digo todos, refiro-me a Internos e Externos, já que nem todos estivemos na Guiné, mas que podem pertencer à mesma com a «categoria de amigos».

Pelo teor do seu e-mail, apercebo-me de que pretende obter o contacto do António José Fernandes Ogando, que pertenceu a CCAV 3420, que esteve na Guiné entre 1971 e 1973.

No nosso blogue, à esquerda, está uma listagem que refere os temas que vão sendo tratados neste espaço.

Sobre a
CCAV 3420 existem alguns textos e, numa pesquisa efectuada nos mesmos, localizei um contacto para a realização de um encontro em 2006, tendo como telefone de contacto 917 768 721.

Da nossa tertúlia faz parte um camarada que pertenceu à CCAV 3420, para quem endereço em BCC o presente e-mail, para que o mesmo, se souber do paradeiro do nosso camarada Zé Bigodes, não deixe de dar noticias dele ou, pelo menos, dar-lhe conhecimento deste seu desejo de contacto.

Espero ter ido de encontro ao seu desejo.

Com amizade
José Marcelino Martins
Fur Mil Trms da CCAÇ 5

3. Atento a tudo o que passa no blogue e sempre pronto a judar no que lhe é possível, o nosso Camarada José Câmara, enviou ao josé Martins a seguinte mensagem, que logo este último reenviou ao Eduardo Silva:
"Pesquizando na net encontrei estes dados que podem muito bem ser de quem o Eduardo procura.
António J Fernandes Ogando
Santarém - São Nicolau 2000-464
CASÉVEL STR 243 441 301
Não custa tentar.
Boa sorte!
José Câmara
4. Comentário de L.G.:

O camarada da CCAV 3420, que faz parte da nossa Tabanca Grande, é o José Afonso, que vive no concelho do Fundão. Foi num poste dele que encontrámos o nome do António José Fernandes Ogando (de alcunha, na tropa, o Bigodes), autor de dois poemas, dedicados ao seu antigo comandante, o Cap Cav Salgueiro Maia (1944-1992). O Eduardo Silva, ou qualquer outro camarada desta sub-unidade, que mostrou a sua valentia em terras da Guiné, será bem vindo, caso deseje integrar a nossa Tabanca Grande. Obrigado ao Zé Martins, nosso colaborador especial, o nosso especialista dos perdidos & achados, por mais uma vez ter dado a cara. Como ele muito bem sublinhou, a Tabanca Grande é, de facto, para todos, para todos aqueles, camaradas ou simples amigos, que têm uma special relationship, uma relação especial com a Guiné de ontem (1961/74) e de hoje...
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Nota de M.R.: Vd. último poste desta série em:

3 de Novembro de 2010 >
Guiné 63/74 - P7217: O Nosso Livro de Visitas (102): Parabéns pelo vosso fantástico projecto (Maria João Rocha)


terça-feira, 4 de maio de 2010

sábado, 25 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4247: Histórias da CCAV 3420, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia (3): Almoços de confraternaização e Homenagem Póstuma (José Afonso)

1. Terceira e última parte do texto anexo à mensagem de José Afonso, ex-Fur Mil da CCAV 3420, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia, com data de 22 de Abril de 2009, sobre a sua Companhia e seu Comandante, Capitão Salgueiro Maia. 


ALMOÇOS DE CONFRATERNIZAÇÃO

Foi, durante alguns anos o Comandante da Companhia, Salgueiro Maia, que teve por missão a organização dos convívios. Foram talvez 4 os que organizou. Mas, devido ao seu estado de saúde, esses convívios estiveram suspensos, durante a sua doença e após a sua morte. 

Mas, em 20 de Outubro de 2002, os ex-Elementos da Companhia de Cavalaria 3420 voltaram de novo a esses convívios, sendo o 1.º realizado em Castelo de Vide para, na terra onde repousa lhe ser prestada Homenagem Póstuma por todos aqueles que com ele conviveram nos bons e maus momentos, alguns deles bem críticos mas que com a disciplina por ele mantida e a sua forma de agir, souberam contornar todos esses maus momentos e a Companhia de Cavalaria 3420, ainda que tendo sido uma Companhia de Intervenção, conseguiu regressar ao fim de 27 meses de Comissão na Guiné sem mortos e com 10 feridos, 3 deles graves.

HOMENAGEM POSTUMA AO CAPITÃO SALGUEIRO MAIA COMANDANTE DA COMPANHIA DE CAVALARIA N.º 3420



ALMOÇOS DE CONFRATERNIZAÇÃO


Já passaram trinta anos Entre esperanças, desenganos Nesse tempo do fascismo. Fomos todos p’ra Guiné Uns com medo; outros com fé. No Angra do Heroísmo. Chegados ao Cumeré Com toda a descarga a pé E depois de bem formados! Ouve um granjola que disse: Soldados e marinheiros! Marinheiros e Soldados. Para Bula lá seguimos, Uns chorando, outros rindo. Emboscadas com critério. Choquemone e Ponta Matar; Estrada de Binar e Cemitério; Depois os destacamentos. Mato Dingal e Capunga Pete e Ponta Consolação. Mais tarde, Mansoa e Cacheu Depois, a nossa raiva cresceu Pois não há ninguém que não sinta Lá fomos todos para Binta E Guidage, contrariados Maia: - Até passaste maus bocados Mas, conseguiste conversar E foi tão bom depois voltar Todos vivos. Corpo cansado. Para ti: o nosso obrigado. E é com emoção na voz Que todos, mas todos nós Que ainda temos existência Fazemos-te hoje, Capitão Aquela Ex - Obrigação, Esta nossa continência Que nos apraz, com alegria. Diz ela: - Descansa em paz! Descanso merecido: - com razão Até breve Capitão António José Fernandes Ogando (Bigodes) Outubro de 2002 

AQUELES QUE RECORDAMOS COM SAUDADE 

A vós! A todos vós! Que pelo mesmo motivo Não estais entre nós Mas, que passaram pelo perigo Tal, como nós… A vós! Que estão longe Mas presentes; Na nossa recordação; Poderão estar ausentes Por anos; - por momentos. Algo deve ter mudado! Mas no nosso coração E no nosso pensamento, Vocês estão aqui ao lado. Sentimos vossa presença Mas! - seja aqui, ou no além, Não há decerto ninguém A que tal não aconteça. A vós! Caros companheiros Amigos, e bons guerreiros Que voltaram para a terra Que estiveram na Guerra, Que recordações não traz! Para todos, – todos vós! Desejamos todos nós: Descansem por fim em paz. Obrigado, companheiros, Pelos momentos porreiros. Que passamos, nesta vida, Bilhetes! – já todos temos, Mas também todos sabemos Que é só bilhete de ida. Nenhum de nós teme a morte; Aguardamos o transporte… Até lá companheiros. António José Fernandes Ogando (Bigodes) Maio de 2003


Primeiro aniversário 3420 - Mansoa

Binta
Operação da 3420 

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 Notas de CV: 

 Vd. postes de: