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segunda-feira, 19 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13164: Manuscrito(s) (Luís Graça (28): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte IV): Na antiga avenida da República (, hoje Amílcar Cabral), os edifícios da Sé Catedral (João Simões, 1945) e dos Correios (Lucínio Cruz, 1950/55)



Capa da brochura de Ana Vaz Milheiro – Guiné-Bissau: 2011. Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp. (Viagens, 5). A foto  é da  Estação Metereológica de Bissau, do arq Lucínio Cruz / Gabinete de Urbanização do Ultramar, 1952. Curiosamente, este arquiteto é meu conterrâneo (nasceu em 1914 e faleceu em finais de 1990 ou princípios de 2000). Um das suas últimas obras é o prédio, na Rua da Misericórdia, na Lourinhã. onde tenho um apartamento. Em contrapartida, são  da sua responsabilidade alguns desastres urbanísticos da Lourinhã de antes do 25 de abril. Recordo-me, por exemplo, que foi ele, enquanto presidente da Câmara Municipal (1969-1974), quem tomou tomou a decisão de deitar abaixo o "coreto" da minha  infância, na Praça da República, bem como a minha saudadosa escola "Conde Ferreira"... (LG)

Imagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2014).



Guiné > Bissau > Catedral > Postal ilustrado do final dos anos 60. Gentilmente cedido por Beja Santos, ex-alf mil, Pel Caç Nat 52 (Missirá e Bambadinca, 1968/70).   Série Postais Ilustrados. No verso deste, que não chegou a ser usado como bilhete posral, pode ler-se os seguintes dizeres, impressos: Bilhete Postal / Guiné Portuguesa / 132 - Catedral de Bissau / Fotografia verdadeira / Reprodução proibida / Edução "FOTO SERRA" / C.P. 239 Bissau / Impresso em Portugal.

Fonte: © Beja Santos (2006). Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine. Todos os direitos reservados.
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 1. Manuscrito(s) (Luís Graça)


Nota de leitura > Ana Vaz Milheiro – Guiné-Bissau: 2011.  Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp. (Viagens, 5)


Parte IV (*)

Continuação das nossas notas de leitura desta brochura da investigadora e professora do ISCTE -IUL, Ana Vaz Milheiro. Este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora, a cores.  Recorde-se que o livrinho resulta de uma singular viagem à Guiné-Bissau, de 2 arquitetos (entre as quais a autora) e de 1 sociólogo (Eduardo Costa Dias, nosso grã-tabanqueiro), durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011.

Mais do que o Palácio do Governador e a Praça do Império, o centro urbano da Bissau colonial do nosso tempo, era o núcleo formado pelos edifícios da Sé e dos Correios (CTT), um em frente do outro, na Av da República (hoje, Av Amilcar Cabral) que desembocava no mítico cais do Pidjguiti.

Mítico ? Alguém sabia lá, no nosso tempo, em meados de 1969 quando lá desembarcámos (para não falarmos já do início da década de 60), alguém sabia, dizia eu, dos trágicos acontecimentos de 3 de agosto de 1959, pronta e habilmente explorados pelo PAIGC de Amílcar Cabral, que ainda não era PAIGC mas tão somente PAI – Partido Africano para a independência  (, criado 3 anos antes)? E muito menos sabia, diga-se de passagem, do triste papel  que jogou, nesse conflito originalmente laboral, o então administrador da Casa Gouveia António Carreira (**), mais conmhecido pela posteridade pelos seus trabalhos de etnografia colonial…



Guiné-Bissau > Bissau, capital do país. Planta da cidade, pós-independência. C. 1975. Escala 1/20 mil Pormenor: a antga Av da República, hoje Amílcar Cabral, era a avenida principal de Bissau do nosso tempo Ia da Praça do Império até ao cais de Pidjiguiti. (LG).

Imagem © A. Marques Lopes (2005) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados [Edição: L.G.]



Guiné > Bissau > Postal de maio de 1966 > Cais do Pidjiguiti ou "Pigiguiti" (sic)

Foto: © Virgínio Briote  (2005) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.  Todos os direitos reservados



É aqui que vamos encontrar, de novo,  um nome incontornável da arquitetura colonial estadonovista, o arq Lucínio Guia da Cruz, um contemporâneo meu, que deixou marcas indeléveis em Bissau, noutros sítios do império, e naturalmente na metrópole (cidade universitária de Coimbra, bairro de Alvalade em Lisboa, etc., incluindo na sua terra, Lourinhã, onde, além de arquiteto, foi presidente da câmara municipal, entre 1969 e 1974, e depois provedor da misericórdia local).  Como autarca, associo sempre o seu nome ao camartelo camarário: foi ele que mandou derrubou a mina “escolinha” do Conde Ferreiro, e o meu “coreto” do Largo Convento.  Embora o senhor já tenha morrido, há cerca de 20 anos, não lhe perdoo estas duas decisões “urbanísticas” que descaraterizaram o centro da nossa terra… e sobretudo destruíram o centro das minhas brincadeiras de infância…



Lourinhã > s/ d [, c. década de 50] > Praça da República: o velho coreto [, demolido no princípio dos anos 70,]. Este foi um dos lugares (mágicos) das brincadeiras da minha infância: era aqui, neste empedrado que, na hora do recreio escolar, jogávamos ao "hoquei em patins"... sem patins e com "sticks" de pau de tramagueira... Era também aqui que ouvíamos os concertos da Banda da Lourinhã, fundada em 2 de janeiro de 1878... Postal ilustrado. Edição do GEAL - Museu da Lourinhã. [Reproduzido com a devida vénia]. (Legenda: LG).



Lucínio Cruz trabalhou toda a sua vida  no Gabinete de Urbanização Colonial (depois, rebatizado Gabinete de Urbanização do Ultramar, em 1951). Era um arquiteto do regime do Estado Novo, o que não nos impede de reconhecer qualidade técnica e estética a algumas das suas obras, onde se incluem, por exemplo, o hospital de tisiologia (mais tarde, Hospital Militar 241, o edifício dos CTT, o projeto da Cãmara Municipal, e a estação metereológica de Bissau..

Mas ouçamos a opinião da conceituada cicerone Ana Vaz Milheira, ma sua crónica de viagem, a Bissau, em outubro de 2011. Sobre o edifício da Sé, diz ela:

(…) “ A Sé que hoje existe é urdida por João SDimões ainda 1945,. Em plena génese do Gabinte de Urbanização Colonial. O projeto anterior de Vasco Regaleira (1942), já sobre uma estrutura em construção, propunha uma ‘uma igreja do tipo colonial português integrando assim a composição do ambiente local’. Ao que Simões contrapõe um templo delineado ‘dentro do critério da simplicidade’, contornando assim ‘as grandes insuficiências de meios’ na Guiné, ‘no campo da construção civil’. O resultado é um edifício que se aproxima  da primeira abordagem que os arquitectos do Estado Novo tentam em África: a elaboração de um estilo original para os Trópicos,s em  abdicar dos temas da arquitectura tradicional portuguesa. Preferem,por afinidade climatérica, o sul” (p. 18).

Sita na mesma avenida, que era a avenida principal de Bissau, já traçada pelo republicano João Quinhones (que eu vim a descobrir ser o avô da nossa grã-tabanqueira, Isabel Levy Ribeiro, viúva do Pepito), temos o edifício dos CTT, em frente à Sé. Sobre ele escreveu a Ana vaz Milheiro:

(...) No lado oposto  da Avenida [da República, hoje Amílcar Cabral] encontra-se a sede dos Correios, de Lucínio Cruiz. O projeto ocupa o lote previamente destinado à Câmara Municipal, do mesmo arquitecto, que não se construiirá.  Os Correios conhecerão dois projetctos. Vinga o último, já de 1955. A fachada é monumentalizada 'à maneira' das obras do Estado Novo na metrópole, ou melhor, dos novos edifícios que emergem  no 'campus' universitário  da Alta de Cloimbra, emq ue Lucínio também trabalha. A orientação estílística  é já ouytra e ao 'maneirismo regionalista' da Sé sobrepõe-se um oputro ' maneirismo cde  Estado', mais historicista e monumental" (p. 18).


Guiné > Bissau > Anos 50 >" O novo edifício dos correios. Anteriormente os CTT eram no edifício que se encontra do lado direito e onde continuou funcionando a Emissora da Guiné ( 1º andar ). De notar a curiosa viatura que era um dos luxuosos autocarros da época que, pela semelhança, eram conhecidos por ambulâncias. Esta (ambulância) pertencia à firma A. Brites Palma. Havia ainda, tanto quanto me recordo, outras duas empresas de transportes que faziam carreiras de autocarros (ambulâncias) para toda a Guiné. Eram o Costa, sedeado em Bissau e o Escada em Teixeira Pinto (Canchungo). Tenho a vaga ideia de existir uma outra na região de Bafatá-Gabú, propriedade de um libanês, mas não tenho a certeza. Talvez alguém me possa ajudar nesta dúvida. De notar as árvores recentemente plantadas, fruto da alteração do traçado da avenida que referi neste texto". (***)



Guiné > Bissau > Anos 50 > "Perspetiva da Avenida da República , hoje, Amílcar Cabral], obtida a partir da torre da catedral já ao final do dia. O primeiro edifício, de que se vê pouco mais que o telhado, é a sede da uma das importantes firmes comerciais da Guiné: Nunes & Irmão. Mais ao fundo, do lado direito, o cinema UDIB e o palácio do governador na praça do Império. O edifício da Associação Comercial (hoje PAIGC) situado na mesma praça, ainda não existia".(***)

Fotos (e legendas): © Mário Dias (2006). Direitos reservados.





Sé Catedral de Bissau > Projeto de reformulação de João Simões / Gabienete de UIrbanização Colonial  (1945) > Fachada principal (à esquerda) e alçado posterior (à direita)






Lisboa > CCB - Centro Cultural de Belém > Garagem Sul > Exposições de Arquitectura > "ÁFRICA – VISÕES DO GABINETE DE URBANIZAÇÃO COLONIAL". A curadoria foi da Ana Vaz Milheiro (com Ana Canas e João Vieira). A exposição esteve aberta ao público de 7 de dezembro de 2013 a 28 de fevereiro de 2014 [com prolongamento até 2 Março].

Fotos de Luís Graça (2014).

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Nota de leitura:

(*) Vd. postes anteriores:

25 de abril de  2014 > Guiné 63/74 - P13042: Manuscrito(s) (Luís Graça (26): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte III): Sarmento Rodrigues, o seu palácio e a sua praça do império (fotos de Benjamim Durães, julho de 1971)

14 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12980: Manuscrito(s) (Luís Graça (25): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte II): o Pavilhão de Tisiologia, mais tarde HM 241

29 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12911: Manuscrito(s) (Luís Graça (24): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial

Último poste da série >

17 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13157: Manuscrito(s) (Luís Graça) (27): Os nossos convívios anuais: não há fome que não dê em fartura... Os (des)encontros do BCAÇ 2852, do BART 2917, da CCAÇ 12 e outras subunidades, gente de Bambadinca, 1968/72...
(**) Vd. I Série do nosso blogue > 15 de fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXV: Pidjiguiti, 3 de Agosto de 1959: eu estive lá (Mário Dias)

(...) Acordo estabelecido, as várias firmas comerciais começaram a pagar aos marinheiros o novo salário. Porém, a Casa Gouveia não procedeu ao aumento e continuou a pagar pela tabela do ano anterior. Passaram-se meses e os marinheiros questionavam o gerente - na altura o ex-funcionário do quadro administrativo Intendente Carreira - sem resultados e até com uma certa sobranceria, tique que lhe deve ter ficado dos tempos de funcionário administrativo. Com o descontentamento a aumentar e ânimos cada vez mais exaltados se chegou à tristemente célebre tarde de 3 de Agosto de 1959. (...)

(***) Vd. poste de 27 de março de 2008 > Guiné 63/74 - P2691: Memórias dos Lugares (6): A Bissau dos anos 50, que eu conheci (Mário Dias)

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P13042: Manuscrito(s) (Luís Graça (26): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte III): Sarmento Rodrigues, o seu palácio e a sua praça do império (fotos de Benjamim Durães, julho de 1971)


Foto nº 1 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > O palácio do Governador (Gabinete de Urbanização Colonial / Arquitetos João António Aguiar e José Manuel Galardo Zilhão, 1945)


Foto nº 2 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > O  monumento ao "esforço da raça"


Foto nº 3 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Praça do Império



Foto nº 4 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Av da República, ao fundo a Praça do Império



Foto nº 5 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Estátua de Diogo Gomes


Foto nº 6 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Estátua de Honório Barreto


Foto nº 7 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Estátua de Teixeira Pinto

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Foto nº 8 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Rua de Bissau 



Foto nº 9 > Guiné, Bissau, julho de 1971 >  Zona ribeirinha de Bissau


Foto nº 10 > Guiné, Bissau, julho de 1971 >  Forte da Amura


Foto nº 11 > Guiné, Bissau, julho de 1971 > Aeroporto de Bisslanca... O avião da TAP


Guiné > Bissau > julho de 1971 > Fotos de Bissau, tiradas por Benjamim Durães (fur mil op esp, Pel Rec Info, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72), aquando da sua ida de férias à metrópole. 


Fotos: © Benjamim Durães (2011). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


1. Manuscrito(s), por Luís Graça

Nota de leitura > Ana Vaz Milheiro – Guiné-Bissau: 2011.  Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp. (Viagens, 5)


Parte III

Recorde-se o que já dissemos em dois  postes anteriores sobre esta brochura da investigadora e professora do ISCTE -IUL, Ana Vaz Milheiro. Este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora, a cores, resulta de uma singular viagem à Guiné-Bissau, de 2 arquitetos (entre as quais a autora) e de 1 sociólogo (Eduardo Costa Dias, nosso grã-tabanqueiro), durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011.

Continuação das notas de leitura:

Em 1919, em nome da I República, o engenheiro de minas João Guedes Quinhones já tinha imaginado e planeado  o sítio onde mais tarde se ergueria o Palácio do Governador da Colónia da Guiné (hoje Palácio da Presidência da República da Guiné-Bissua). Éo memso sítio, num ligeiro promontório, onde a partir do qual se irá rasgar a Praça do Império (hoje, Praça dos Heróis Nacionais).

Segundo a cicerone que nos guia pelas ruas (esburacadas) de Bisssau, em outuro de 2011, à procura das marcas da arquitetura portuguesa, colonial, estado-novista, Ana Vaz Milheiro, o edifício (e o seu espaço envolvente) é “uma arquitetura de representação política”, ligada à nova cartografia do Portugal imperial que vai “do Minho a Timor”, desenvolvida pelo Estado Novo e que terá o seu apogue nos anos 40/50.

O edifício, que remonta aos anos 30, conheceu muitas vicissitudes e contrariedades. O projeto definitivo foi (re)desenhado em 1945 (, já que havia uma pré-existência), pelo Gabinete de Urbanização Colonial (GUC), pelos arquitetios João António Aguiar e e João Manuel Galhardo Zilhão. Recorde.se que o GUC tinha sido criado em finais de 1944, em Lisboa, dependente do Ministério das Colónias, cuja titular era então Marcelo Caetano.

O palácio vai ficar pronto em 1946, por ocasião do 5º centenário do desembarque de Nuno Tristão no território, graças a um nova intervenção da brigada de Paulo Cunha. E faz parte de um vasto conjunto de obras públicas, indelevelmente associado ao mandato do governador Sarmento Rodrigues (1945-1948)

(…) “Manuel Maria Sarmento Rodrigues, oficial da Marinha portuguesa, é destacado por Marcelo Caetano para governador da Guiné, antes ainda do final da Segunda Guerra, num tempo muito próximo à formação do GUC. Durante o seu governo, a província conhece uma época de desenvolvimento, servindo de “campo de ensaio” aos “novos rumos da política colonial portuguesa.” (…). Este período progressista tem a sua expressão mais emblemática na revogação do “Diploma dos Assimilados” que valerá a Sarmento Rodrigues ser visto como tendo responsabilidades na formação de uma “nova escola de política ultramarina” (…).

“O perfil empreendedor de Sarmento Rodrigues, revelado enquanto governador da Guiné e confirmado mais tarde aquando da sua passagem como ministro pelo MU [, Ministério do Ultramar,], reflecte-se também na promoção de obras públicas. Coincidindo o seu governo com o arranque do Gabinete, a sua actuação permite analisar como se exercem as relações, nesta primeira fase, entre o poder colonial – que está no terreno – e os técnicos que permanecem em Lisboa. Entre os seus “discursos e afirmações”, que reúne em livro um ano depois de deixar o cargo, há menções a edifícios públicos projectados no âmbito do GUC. Estas referências surgem, p.e., no discurso à primeira sessão do Conselho de Governo, logo a 3 de Julho de 1945, onde apresenta a estratégia que pretende implementar para a região e não apenas na capital Bissau. Nela afirma figurar “no primeiro plano das realizações, como mais visível, o trabalho de obras públicas”, adiantando possuir “uma vasta lista de obras projectadas para um período… bastante curto” (…). Desta lista fazem parte construções em andamento, como o “Palácio, Sé, capelas de Catió, Bafatá, Canchungo, Mansoa e Gabu, moradias projectadas para os funcionários em Bissau, o monumento ao Esforço da Raça, edifício da Praça do Império… e outras tentativas dispersas pela Colónia” (…). Para lá da reorganização dos serviços que a possibilidade de novos edifícios proporciona, as suas preocupações principais são as infra-estruturas de transportes (…), a assistência sanitária (…) e o saneamento básico (…). (Milheiro e Dias, 2009, pp. 89/90) (**).


A fachado do edifício é arte deco. Foi bombardeadoem 7/6/1998, na sequência da guerra civil. Resistiu, graças a sua cnstrução sólida e aos materiais de baixo custo de manutenção usados na época nas obras do Estado Novo.. Esteve estes anos todos em ruínas. Foi reconstruído recentemente pelos chineses.

Ainda sobre o palácio do Governador, escrevem Milheiro e Dias (2009):

(...) "Em 1947, Sarmento Rodrigues refere-se à situação da obra do “Palácio de Bissau”, peça emblemática da presença portuguesa no plano da representatividade, que “continuará ainda com maior intensidade, de modo que a sua conclusão já não leve anos, mas apenas meses” (…). O palá­cio do governador, localizado no topo superior da antiga Avenida da República, hoje Avenida Amílcar Cabral, posiciona-se como centro simbólico do poder. A sua implantação faz sobressair a estrutura urbana assente em quadrícula e hierarquizada através de um sistema de ruas rectilíneas que tem nesta avenida semi-arborizada o seu eixo monumental e onde se irão situar os principais serviços públicos (…). É adaptado por João Aguiar, ainda em 1945, seguindo um esquema “clás­sico” de composição tripartida e simétrica e recorrendo a elementos decorativos historicistas que reforçam a sua filiação numa arquitectura nacional, figurativamente próxima do que Marcelo Caetano apelida de “português suave”. Não considerada no desenho original é a galeria térrea que protege a entrada e providencia uma estadia superior sobre a avenida. “ (Milheiro e Dias, 2009, p. 94) (**).

Ainda sobre Sarmento Rodrigues (o melhor governador da Guiné em tempo de paz, sendo o Spínola o melhor em tempo de guerra)… Com ele, o Estado Novo vai aproveitar os 500 anos da chegada de Nuno Tristão para dar início a um plano de embelezamento do espaços públicos em Bissau e noutras localidades (Bafatá, Catió, Cacheu…). No essencial, esse programa que se porolonga pelos anos 50, consistiu na colocação de estátuas aos “heróis da colonização”, de Nuno Tristão a Teixeira Pinto, de Honório Barreto a Diogo Gomes, sem esquecer Oliveira Muzanty (Bafatá)…

Os pedestais são obra dos homens do Gabinete de Urbanização do Ultramar (que sucedeu ao GUC, em 1951). As estátuas serão desmanteladas depois da independência e o que resta delas encontra-se no forte do Cacheu, para um futuro museu da colonização. Símbolos de regime, muitas das estatátuas não sobrevivem à queda desses regimes. Veja-se o que se passou com Salazar, Portugal no pós 25 de abril, com Estaline, em muitos países do leste europeu, depois da queda do muro de Berlim, em 1989.

É a roda da história. De qualquer modo, portugueses e guineenses têm interesse (e obrigação) em conhecer, divulgar e proteger este património ligado à sua história comum…

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Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores:

14 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12980: Manuscrito(s) (Luís Graça (25): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte II): o Pavilhão de Tisiologia, mais tarde HM 241

29 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12911: Manuscrito(s) (Luís Graça (24): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial

(**) Vd. Milheiro, Ana Vaz, e Dias, Eduardo Costa - A Arquitectura em Bissau e os Gabinetes de Urbanização colonial (1944-1974). usjt - arq urb , nº 2, 2009 (2º semestre), pp.80-114 [Disponível aqui em pdf ]

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12980: Manuscrito(s) (Luís Graça (25): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte II): o Pavilhão de Tisiologia, mais tarde HM 241


Guiné > Bissau >  s/d > O antigo Pavilhão de Tisiologia, desenhado pelos arquitectos Licínio Cruz e Mário Oliveira, do Gabinete de Urbanização do Ultramar, Projeto de 1951/53. Passará a Hospital Militar, o HM 241, com o início da guerra, em 1963, Foto comprada na Feira da Ladra, pelo nosso infatigável Mário Beja Santos.

Foto: © Mário Beja Santos (2013). Todos os direitos reservados.


Guiné > Bissau > HM 241 > 1970 > Varanda do Hospital Militar de Bissau. Foto do álbum de Elias dos Anjos Rodrigues, ex-soldado atirador do 3.º pelotão (, comandado pelo alf mil Ravasco), da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72). O Elias mora em Vale de Anta, Chaves. Foi gravemente ferido em 10 de Agosto de 1970, numa mina A/C na região de Jifim.

Cortesia do blogue CCAÇ 2700 - Dulombi (1970/72), criado (em 2007) pelo nosso grã-tabanqueiro Fernando Barata. Foto reproduzida com a devida vénia.

Foto: © Elias Anjos Rodrigues (2012). Todos os direitos reservados.



Guiné > Bissau > 1972 > O edifício do Hospital Militar, o HM 241... Os horrores da guerra (os mutilados, os politraumatizados, os feridos graves...) eram ali despejados todos os dias, de helicóptero... Foto do Carlos Américo Rosa Cardoso que pertenceu aos Serviços de Saúde Militar, com o posto de 1º Cabo Radiologista.

Foto: © Carlos Américo Rosa Cardoso (2007). Todos os direitos reservados



Guiné- Bissau > Bissau > Novembro 2000 > Antigo Hospital Militar de Bissau, HM 241, num processo já de degradação irreversível...

Foto: © Albano Costa (2005). Todos os direitos reservados


1. Manuscrito(s), por Luís Graça

Nota de leitura >  Ana Vaz Milheiro – 2011: Guiné-Bissau. Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp. (Viagens, 5)

Parte II   

Recorde-se o que já dissemos em poste anterior sobre esta brochura da investigadora e professora do ISCTE -IUL, Ana Vaz Milheiro.

Este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora, a cores, resulta de uma singular viagem à Guiné-Bissau, de 2 arquitetos (entre as quais a autora) e de 1 sociólogo (Eduardo Costa Dias, nosso grã-tabanqueiro),  durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011.

Com a promoção de Bissau a capital da colónia, em 1941, em plena II Guerra Mundial e em plena batalha do Atlântico, dificultando as ligações marítimas da Metrópole com as colónias africanas, agravam-se os problemas de habitação. A procura é maior do que  a oferta.

Em, 1944 chega finalmente a Bissau  uma "Brigada de construção de moradias", sob a cehefia do arq Paulo Cunha. E com ele vêm mais um arquiteto adjunto, um construtor, um desenhador, 5 carpinteiros e 8 pedreiros. Vão ser construídas casas de 3 tipologias. Por exemplo, as de 2 pisos custavam o triplo do seu valor em Lisboa. O que seria explicado por Ana Vaz Milheiros,  por 3 ordens de fatores: (i) escassez de materiais; (ii)  atrasos nas remessas financeiras da metrópole; e (iii)  falta de qualificação da mão de obra local. 

O trabalho da Brigada (1944-46) é objeto de críticas de um lado e outro. Mas, de entre os eliogios, destacam-se: (i) o desenho inovador dos projetos, superando o tradicional bangalô tropical; (ii) as preocupações de ordem estéstica que passam também a ser tidas em conta  pelos promotores imobiliários, públicos e privados; e (iii)  a atenção que é dada às condições locais de clima, luz e calor.

A volumetria de Bissau resulta em grande parte deste "padrão unifamiliar, impresso pelos projetos residenciais da Brigada", marcando a sua escala, e "contribuindo para acentuar uma fisionomia de tipo Garden City [,Cidade Jardim,] que continua a qualificar o actual ambiente urbano" e que remonta à I República (p, 12).


Do Pavihão de Tisiologia (1951-53) ao Hospital Militar 241 (a partir de 1963), com assinatura de um lourinhanense, o arq Lucínio Guia da Cruz

O antigo hospital militar, o HM 241, é hoje uma triste ruína.  Mas já fora um Pavilhão de Tisiologia, do   Hospital de Bissau  (hoje, Hospital Nacional Simão Mendes).

Localizava-se fora do perímetro urbano, a cerca de 6 km do centro. Tem risco dos arquitectos Lucínio Cruz e Mário Oliveira, ambos do Gabinete de Urbanizações do Ultramar. Data de 1951-1953. A sua localização fora da cidade, e longe do seu  buliço, obedecia às concepções higiossanitárias da época, ou sejam, as da luta antituberculose (que, na metrópole, impunham a localização dos sanatórios em altitude ou nas zonas marítimas, com "bons ares"). (A tísica, ou tuberculose pulmonar, ainda era então um grave problema de saúde pública, tranto noa metrópole como nos trópicos).

São arquitectos de regime, conservadores, mas com qualidade técnica e conhecimento da realidade local. Curiosamente, fico a agora a saber que o meu conterrâneo e vizinho arq Lucínio Cruz, já falecido, tem obra vária, edificada em  Bissau e outras partes do império. Por ex., a Estação Metereológica, em Bissau, também é dele (1952), bem como o edifício dos CTT (1950, alterado). Também fez o projeto para a Câmara Municipal de Bissau (1948, não construído). E, já agora: a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (1952-58), o Departamento de Física e Química da FCT/UC (1956-1975), parte do projeto da nova Cidade Universitária de Coimbra, exemplo acabado da arquitetura estadonovista.

Tem também, o arq Licínio Cruz, obra espalhada por outros sítios, incluindo a sua terra natal (n. 1914 e faleceu em finais de 1990 ou princípios de 2000). Inclusive o prédio, onde tenho um apartamento, na Rua da Misericórida, Lourinhã,  foi desenhado por ele. Ao que soube, na altura, terá posto termo à vida, na presença na sua última companheira, de origem africana. Foi presidente da Câmara Municipal da Lourinhã (1969-74) e provedor da Misericórdia local, no pós-25 de abril. Também era conhecido por Licínio Guia da Cruz. Lamentavelmente não encontro, na Net,  uma simples nota biográfica sobre ele, contrariamente ao seu colega Mário Oliveira (1914-2013), "o arquiteto que morreu duas vezes", no dizer de Ana Vaz Milheiro, que também é jornalista do Público.

(...) "O desaparecimento do arquitecto Mário de Oliveira, que morreu na terça-feira [, 17/12/2013,]no Hospital de Vila Real, equivale a uma segunda morte. A primeira ter-se-á dado simbolicamente, quando, nos anos de 1980, decidiu retirar-se voluntariamente da vida pública e exilar-se no Hotel Mira Corgo, em Trás-os-Montes, para pintar.

A sua actividade ao serviço do Ministério do Ultramar e o esquecimento a que Mário de Oliveira e os seus colegas arquitectos estiveram votados durante os anos que se seguiram ao 25 de Abril talvez tenham, em parte, justificado a opção. (...)

"Quanto às ruínas do velho Pavilhão de Tisiologia, estas parecem desmentir  rumores que as descrevem como mal construídas e com problemas estruturais graves (...). O estado ruinoso é já  uma realidade pós-colonial" (p. 16).

Na prática isto é uma elogio a dois dos arquitectos que fizeram carreira no Gabinete de Urbanização Colonial (1944-51), e depois Gabinete de Urbanização do Ultramar (1951-57) e por fim Direcção de Serviços de Urbanização e Habitação da Direcção Geral de Obras Públicas e Comunicações do Ministério do Ultramar (1957-74).

Estes e outros são homens, hoje  injustamente esquecidos. Tal como a arquitetura que deixamos na Guiné-Bissau

O Pavilhão de Tisiologia (que com o início da guerra colonial em 1963 vai transformar-se em Hospital Militar 241, dramaticamente familiar a muitos de nós, e tornar-se um dos melhores de África, nomeadamente ao nível  da cirurgia ortopédica. É um edifício público, tal como outros da época, que seguia a "cartilha estadonovista" da arquitetura colonial: (i) funcionalidade, (ii) resistência; e (iii) adaptação ao clima...

Já em artigo publicado, em 2009, na revista brasileira "on line" Arquitectura e Urbanismo, do mestrado de arquitectura e urbanismo, da Universidade São Judas Tadeu, em São Paulo, Ana Vaz Milheiro e Eduardo Costa Dias chamavam a atenção para o facto de  "o trabalho do Gabinete de Urbanização Colonial – um organismo central dependente  do Ministério das Colónias, criado em 1944 e exclusivamente dedicado à execução de projectos  de arquitectura e de urbanismo para as colónias, nunca foi objecto de uma investigação monográfica, embora surja parcialmente citado em algumas investigações sobre arquitectura portuguesa em  África"... Os autores, neste artigo, elegem a cidade de de Bissau, capital da Guiné Portuguesa a partir de 1941, como um caso de estudo demonstrativo dos diferentes papéis que o Gabinete assume ao longo das suas  três décadas de existência".... Assim, e como "primeira etapa da análise dos princípios de actuação dos arquitectos  ao serviço do Gabinete e da cultura de projecto seguida, procura-se aqui conhecer a extensão dos  projectos efectivamente realizados, a datação de edifícios e a identificação algumas autorias assim  como verificar o estado de conservação em que este património actualmente se encontra"...







Gabinetes de arquitetura e urbanismo coloniais (1944-1974) > Bissau > Lista de obras (feitas e por fazer) e respetivos arquitetos 






Fonte: Milheiro, Ana Vaz, e Dias, Eduardo Costa - A Arquitectura em Bissau e os Gabinetes de Urbanização colonial (1944-1974). usjt - arq urb , nº 2, 2009 (2º semestre), pp.80-114 [ Disponível aqui em pdf ]

(Continua)

sábado, 29 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12911: Manuscrito(s) (Luís Graça (24): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial

Nota de leitura >

Ana Vaz Milheiro – 2011: Guiné-Bissau. Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp.  (Viagens, 5)




1. Foi pena que tenha passado despercebida, a muitos de nós, ex-combatentes da Guiné, ou que se interessam pela historiografia da presença portuguesa em África, a xposição "África - Visões do Gabinete de Urbanização Colonial", que esteve patente ao pú8blico, no CCB, em Lisboa, de 7 de dezembro de 2013 a 2 de março de 2014.

Passei por lá em 26 de janeiro, com um amigo meu, arquiteto, o José António Paradela, de Ílhavo  (que fez, aos 16 anos, a "guerra colonial" na pesca do bacalhau,  na Terra Nova...) e tinha a intenção de fazer uma poste no âmbito da série "Agenda Cultural"...

Paciência.. Não se pode "ir a todas"... De qualquer modo, tomei  a liberdade de recolher algumas imagens e tomar algumas notas... que apresentarei mum próximo poste.




Cartaz promocional > CCB - Centro Cultural de Belém > Garagem Sul > Exposições de  Arquitectura >  "ÁFRICA – VISÕES DO GABINETE DE URBANIZAÇÃO COLONIAL"

Foto de Luís Graça (2014).


A curadoria foi da Ana Vaz Milheiro (com Ana Canas e João Vieira). A exposição esteve aberta ao público de 7 de dezembro de 2013 a 28 de fevereiro de 2014  [com prolongamento até 2 Março].

Segundo o programa, "África – Visões do Gabinete de Urbanização Colonial propõe um percurso por uma paisagem africana desenhada (e inventada) a partir do coração da metrópole, em Lisboa, no período final da colonização portuguesa (1944-1974).

O texto é da investigadora e docente do ISCTE-IUL, curadora desta exposição, Ana Vaz Milheiro. A exposição resulta de um projeto de investigação, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), e que decorreu entre 2010 e 2013: "Gabinetes Coloniais de Urbanização: Cultura e Práctica Arquitectónica"

(...) "Inicia-se com imagens de edifícios públicos fortemente marcados pela tradição portuguesa do sul, fixa-se numa arquitectura oficial do Estado Novo, e abre a possibilidade de ensaiar uma primeira expressão de 'nativismo africano', através do conhecimento progressivo que os arquitectos portugueses vão adquirindo das diferentes culturas locais, antecipando visões de autonomia e de independência."

Pela primeira vez mostrados em público, a exposição, que se realizou na Garagem Sul do CCB,  era enriquecida por  "um conjunto de desenhos, relatórios, fotografias, actualmente à guarda do Instituto de Investigação Científica Tropical".

Mas hoje do que vos quero falar é de livrinho que comprei lá, por 10 euros, e que é uma espécia de guia de bolso, um roteiro de visita guiada à Guiné-Bissau e ao património arquitetónico que os portugueses lá deixaram.  E que merece ser melhor conhecido, estudado, divulgado e protegido. O livro tem a assinatura da incontornável  e voluntariosa Ana Vaz Milheiro.

2. Ana Vaz Milheiro (n. 1968, Lisboa) é licenciada e mestre em arquitetura pela Universidade Técnica de Lisboa, e doutora pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (2004). Docente do ISCTE-IUL, prepara o seu pós-doutoramento em arquitetura lusoafricana da época do Estado Novo.

Este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora,  a cores, resulta de uma singular viagem,  à Guiné-Bissau,  de 2 arquitetos e de 1 sociólogo,  durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011.

O sociólogo, ou melhor, antropólogo social é nem mais nem menos do que o Eduardo Costa Dias, do meu tempo do ISCTE, e nosso grã-tabanqueiro, que serve de “cicerone”, nesta viagem, a dois colegas, também do ISCTE-IUL, a autora da brochura, e o Paulo Tormenta Pinto.

O Eduardo, que vai à Guiné-Bissau, quase todos os anos, desde 1980,  foi desta vez, como especialista da cultura e história guineenses, integrado no projeto de investigação “Os Gabinetes Coloniais da Guiné-Bissau – Cultura e Prática Arquitectónica”, de que a Ana Vaz Milheiro é a responsável principal.

Como ele nos conta no curto texto que escreveu à laia de prefácio (p.7), rapidamente passou de “cicerone” para “ciceroneado”, de tal maneira foram as descobertas feitas, no terreno, a partir das “novas leituras” que lhe proporcionaram, em matéria de arquitetura e urbanismo coloniais, os seus dois  colegas, arquitetos… Para mais, “num terreno que eu pensava que puco de novo ainda tinha para me dizer” (p. 7).

Como leitor, entusiasta, do livrinho, também partilho do mesmo sentimento que o nosso amigo Eduardo. Basta, de resto, ler-se  o guião da viagem (e agora índice da publicação, enter parênteses a página):

Guiné-Bissau (7), Missão arquitetónica (9), Bissau, cidade da I República (11), A cidade jardim dos trópicos (13), O futuro de África é a China (15), Ruínas pós-colonais (17),  Arquiteturas maneiristas (19), Estação metereológica de Bissau (21), O bairro de Santa Luzia (23),  o bairro da Ajuda (25), O melhor edifício da cidade (27),  Geometrias (29), Migrações africanas (31), Mais mundo houvera (33), Bafatá (35), Um hospital com vista sobre a cidade (37), Contuboel (39), Mercados (41), A escola primária do Cacheu (43), Cine-Canchungo (45),  A estação dos CTT do Gabú (47), Ponte sobre o rio Mansoa (49), Bibliografia (50), Biografias (51).

“Last bu not the least”, neste conjunto de 2 dezenas de fontes de documentação consultadas e citadas pela autora, sabem qual é a última que vem na lista, na página 50 ? O nosso blogue, o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné que cumpre, assim,  um dos seus  propósitso, que é o de também ser uma fonte de informação e conhecimento relevante no que diz respeito à documentação da presença portuguesa na Guiné-Bissau (*)… De resto, como eu gosto de dizer, os ex-combatentes da Guiné "não querem morrer sem deixar rasto"... E o rasto são as "as nossas memórias e afetos"...

Para além de ser especialista num domínio como este o das arquiteturas lusotropicais, e mais exatamente coloniais, a Ana Vaz Milheiro  tem a vantagem, nesta viagem, de ser uma “estreante”, embora  de modo algum “virgem” no que diz respeito à arquitetura e urbanismo  da Guiné-Bissau da época colonial.  O seu olhar não era, pois, o do “leigo”, muito menos o do “turista à força” que fomos nós, os ex-combatentes, que foram  desembarcando  em Bissau, aos milhares, entre 1961 a 1974…

Ela não deixou nada ao acaso ou ao improviso: tinha feito o seu trabalho de casa, e compulsado vasta documentação:

(i) livros e opúsculos  (a maior parte da Agência Geral do Ultramar);

(ii) desenhos, projetos e documentos (do Arquivo Histórico Ultramarino  e do Centro de Documentação do IPAD);

 (iii) fotografias registadas pelo arquiteto Luís Possolo, nos anos 60, ao serviço do Ministério do Ultramar;

 (iv) fotos do Eduardo Costa Dias,  tiradas em  2009, de acordo com uma lista de edifícios públicos construídos em Bissau depois da II Guerra Mundial, amostragem de obras estado-novistas;e , por fim,

(v) cruzamento das imagens com os projetos arquivados em Lisboa…

De acordo com o roteiro da viagem, os primeiros dias foram passados em Bissau e arredores, seguindo-se:

(i) no dia 6/10/2011 Safim, Empada, Nhabijões [mas imediações de Bambadinca], Bafatá, Gabú, Sonaco, Contuboel;

 (ii) no dia 8, Bula, Canchungo, Cacheu;

e  (iii) no dias 9/10, Mansoa.





Guiné-Bissau > Bissau, capital do país. Planta da cidade, pós-independência.  C. 1975. Escala 1/20 mil  Pormenor

Imagem © A. Marques Lopes (2005). Todos os direitos reservados [Edição: L.G.]



Guiné > Bissau > s/d > Vista aérea parcial e Ilhéu do Rei. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 142". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte - Publicações e Artes Gráficas, SARL).




Guiné > Bissau > s/d > Vista aérea de Bissau. Ao centro, o Palácio do Governo e a a Praça do Império. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 118". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte - Publicações e Artes Gráficas, SARL).


Guiné > Bissau > s/d > Sem legenda: A antiga Av 31 de Janeiro, hoje, Av Amílcar Cabral > Ao fundo, o Palácio do Governador, e a Praça do Império; do lado direito, a Catedral de Bissau (Edição Comer, Trav do Alecrim, 1 -Telef. 329775, Lisboa).

Colecção de postais ilustrados: Agostinho Gaspar / Digitalizações: Luís Graça & Camaradas da Guiné

Imagens: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010). Todos os direitos reservados.


3. Bissau, uma cidade da I República

É o Estado Novo [, e nomeadamente  com Sarmento Rodrigues como governador, 1945-1949] que vai ter, para a cidade, uma intervenção pensada e estruturada. Até então o “making of” do espaço urbano resultara de um “processos de adição” (p. 10):

(i) a construção da fortaleza de São José da Amura, na margem direita do estuário do Geba;

(ii) a Bissau Velha, que nasce fora de muros, e que é o primeiro assentamento urbano;

(iii)  o esforço para estabilizar a presença portuguesa na então ilha de Bissau, na sequência da “guerra de pacificação”,  levada a cabo sob o comando de Teixeira Pinto (1913-1915);

 (iv) a chegada, em 1919, do engenheiro de minas José Guedes Quinhones, da Repartição de Fomento, Direção de Agrimensura,  e com ele o propósito republicano de “embelezar a cidade”.

Cito a autora:

“O plano de 1919 (…) não só dá início ao processo de minumentalização  do espaço urbano,cmo corresponde à expansão para lá do primitivo perímetro. Cruza a baixa densidade da Garden City [Cidade Jardim, movimento de planeamento urbano iniciado em 1898] com as ideias culturalistas do City Beautiful movement [Movimento  da Cidade Bonita, dos anos 1890-1900], propondo uma praça radial, implantada na cota mais elevada, ligando-se, através de um boulevard, à zona baixa e portuária [imagem da Av 3 de Agosto].”

Recorda a Ana Vaz Milheiro que a atual Av Àmílcar Cabral era a Av 31 de Janeiro [, uma data grata aos republicanos, por recordar a  primeira tentativa de derrube da monarquia, a revolta do Porto, em 1891]. “Os limites da cidade são assegurados por uma ‘Avenida de Cintura’, que faz a fronteira com os ‘Subúrbios’, onde a população africana se irá fixar. Identificam-se os lotes das instalações  de energia elétrica e de abastecimento de água, do Pal´«acio do Governo, do Novo Hospital e do Banco Nacional Ultramarino”…

Trata-se, enfim, de um programa mínimo, de equipamentos, acrescidos em 1922 com a escola primária, e  que o Estado Novo  vai reforça depois de 1945. “A estratégia estado-novista passa por diminuir os vestígios deste urbanismo de perfil republicano, apropriando-se dos seus símbolos” (p,. 10), conclui a autora. (**)

(Continua)

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Notas do editor

(*) Sobre a cdiade de Bissau, temos inúmeros postes, vd. por ex.:

10 de novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1264: Postais Ilustrados (10): Bissau, melhor do que diz o fotógrafo (Beja Santos / Mário Dias)