Mostrar mensagens com a etiqueta Coimbra. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Coimbra. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P13015: 10º aniversário do nosso blogue (15): Manuscrito(s) (Luís Graça): O país que via passar os comboios (Ilustração de Joana Graça)

O país que via passar os comboios

por Luís Graça


14:13h. Coimbra B.
Estação da CP.
Deprimente.
Como todas as estações B do mundo.
Como todas as estações da CP.
B, de 2ª classe.
B, segunda letra do alfabeto.
Como todas as estações da CP 

urbanas, suburbanas e rurais.
Deprimentes.
Todas as estações de caminho de ferro do mundo 

são deprimentes.
Abro talvez uma exceção para os apeadeiros.
São bonitos, os apeadeiros.
Ou eram bonitos os apeadeiros da CP,
quando havia o cavador, 

o burro, 
o boi, 
a charrua,
o camponês, 

o zé povinho, camponês e burro,
besta de carga, carrejão.
A horta, a saída direta para os campos.
As hortas.
Ah!, e os azulejos azuis e amarelos Viúva Lamego
nas quatro estações do ano!
O termo apeadeiro enternece-me,
faz-me lembrar os tempos em que se ia às hortas.
Eu já não sou desse tempo.
Mas os alfacinhas iam às hortas dos saloios:
Benfica, Porcalhota, Pontinha, Sintra, Caneças, Colares ...
Faziam piqueniques,
cantavam o fado da desgraçadinha

e no fundo eram felizes.
Gosto do termo apeadeiro.
E da ideia de ir passear às hortas.
Em família, aos domingos, de comboio.
Ronceiro, o comboio.
Ronceira, a vida da gente.
Li isso algures numa história qualquer sobre os comboios
que unificaram o país de norte a sul.
Há uma dívida de gratidão 

que é devida aos comboios.
E aos homens dos comboios.
E aos engenheiros das estradas e pontes.
E aos operários que as construíram.
Ao zé povinho da cidade e dos campos.
Ao engenho e à obra.
Ao Fontes.
Ao Pereira.
Ao Melo.
Ao fontismo.
Ao positivismo.
Ao génio organizativo.
Mesmo que a minha professora
de Sociologia Histórica das Classes Laboriosas,
discípula do E.P. Thompson,
só gostasse dos corticeiros.
Que eram anarcossindicalistas.
Sempre suspeitei que ela não gostasse dos cavadores.
Nem de comboios.
Nem de hortas.
Nem do Fontes.
Nem dos ferroviários,
Nem dos camponeses e dos burros e dos bois.
Naquele tempo parava-se em todas estações e apeadeiros.
E havia tempo, 

não havia pressa.
Não havia stresse naquele tempo.
Colhiam-se papoilas vermelhas no meio do trigo.
Não havia tempo para se ter stresse.
Morria-se cedo.
Ou nascia-se tarde,
sem tempo de ver crescer filhos e netos.
O stresse é uma construção social do meu tempo.
E não havia bombas nos comboios.
Ao alcance de um qualquer toque de telemóvel,
da Nokia, da Samsung ou da Siemens, tanto faz,
que as novas tecnologias quando nascem 

(não) são para todos!
Ou talvez houvesse stresse
mas chamavam-lhe outra coisa.
Afinal, essa coisa é tão velha como a vida.
E morria-se cedo naquele tempo.
A esperança média de vida é um artefacto estatístico.
E há sessenta e tal anos, na França ocupada,
os ferroviários também punham bombas.
Nas linhas de caminhos de ferro.
Matavam os seus postos de trabalho
em nome da liberdade.
Punham bombas para fazer descarrilar os comboios.
Sabotagem. 

Resistência ao ocupante nazi.
Hoje seriam caçados como terroristas internacionais.
Não sou ferroviário 

nem resistente 
nem terrorista.
Nem sequer anarcossindicalista.
Estou numa estação deprimente.
Coimbra B.
Coimbra merecia, pelo menos, uma estação A.
Este país, bom aluno da Europa, 

devia merecer uma letra A.
Nem que fosse Coimbra A.
Ouço uma voz gritante.
Alfarelos. 

Com paragem não sei onde.
Nunca soube, ao certo, onde fica Alfarelos.
É algures no meu país profundo.
Assim como Freixo de Espada à Cinta 
que ninguém conhece.
Não, vim de boleia.
Muito obrigado.
De Viseu.
Aguardo o Alfa Pendular para Lisboa.
Aliás, Lisboa SA.
Deve chegar às 15:16h.

── Lisboa, Santa Apolónia ?
── Não, Lisboa, Sociedade Anónima! 
──
corrijo o portuga por detrás do guiché.
── Não, não quero Santa Apolónia.
Quero a Estação de Lisboa Oriente.
E depois... o que diria o Zé (Cardoso Pires)!
── Lisboa, SA!
Pergunta o portuga, caixa de óculos,
por detrás do bunker envidraçado,
que fala em nome da CP de todos nós.
── Conforto ou turística ? ──
olhando para mim, 
como se quisesse me tirar as medidas.
Ou adivinhar a minha secreta conta bancária.
── 2ª classe, se faz favor!
── Turística.... 2ª classe, por defeito.
Para quem não ostenta sinais exteriores de riqueza.
Classe B.
E eu a pensar ingenuamente que já não havia 2ª classe.
Comboios de 2ª classe.
Gente de 2ª classe.
País de 2ª classe no desconcerto das nações.
(Ah!, meu velho José Rodrigues Miguéis,
e a tua, nossa, gente de 3ª classe
nos porões nauseabundos dos cargueiros
que rumavam às Américas da Liberdade!).
Devo ter percebido mal.
Os comboios e a CP também se democratizaram.
Agora só há conforto e turística,
no Alfa Pendular de todas as emoções e condições.
O Portugal SA já não é mais classista.
Para ter classe basta ter dinheiro no multibanco,
minha querida professora.
Mas, mais seguro, é no cofre forte da Suiça 
ou num off shore qualquer.
É o que se chama mobilidade social total.
Fugir à condição de besta de carga.
── Vê-se mesmo que o senhor 
é um utente acidental da CP,
já não há 2ª classe.
── Sou um mau utilizador do comboio, 
peço desculpa ──
Comprei um bilhete de 2ª classe.
17 euros, IVA incluído à taxa de 5%.

Apeteceu-me dizer-lhe:
── O senhor, desculpe, 
mas eu sou fã dos comboios.
Tenho uma dívida histórica 
para com os comboios,
que unificaram o meu país.
Pode não ser seu, mas é meu.
Tenho orgulho nele, o meu país.
E tinha que lhe dizer isto.
Vou para Lisboa, SA, 

capital do reino que já foi império,
desço na Gare do Oriente...

Tenho tempo.
Ou penso que tenho tempo.
Nada como esperar um comboio
numa estação de tipo B, Coimbra B
para saber o que é isso de ter tempo.
É bom ter tempo.
Uma hora de avanço.
Nada de stresse.
Não penses na morte.
Que o stresse mata, 
como uma bala de Kalash.
Peço uma sandes manhosa no bar da esquina.
Bebo uma topázio que é uma cerveja local.
Compro o Zé Cardoso Pires no quiosque.
A república dos corvos.
Um livro de contos.
Jornal Público.
Colecção Mil Folhas, ao preço de hipermercado.
Redescubro o meu velho Dinossauro Excelentíssimo,
que li na revista Almanaque, se bem me lembro.
Deambulo no cais de embarque
como o prisioneiro no pátio da prisão.
E leio a única coisa interessante
que está afixada numa das paredes da estação de Coimbra B.
Alguém ali mandou afixar,
creio que em bronze (sou mau em metais),
o seguinte:
"Neste cais da estação de Coimbra, embarcou,
no dia 15 de Maio de 1982, Sua Santidade,
o Papa João Paulo II".

O artista não quis desqualificar a estação nem a cidade.
Coimbra B ?,
O que diria a corte papal! 
Os grandes deste mundo!
E os turistas que visitam a cidade dos doutores!
E os vindouros!

Que mais vale um ano de tarimba
do que dez de Cloimbra ?!
Nem pensar.
Por isso lá fica a tabuleta. 
Para a história.
Para o viajante distraído, apressado ou deprimido como eu.
Ou se calhar para ninguém.
Só para a História.
Afinal, quem lê neste país placas de bronze
afixadas em estações B da CP ?
Aliás, quem lê neste país, 
perguntaria a minha querida professora ?
Histórias aos quadradinhos
mas não a História com H grande.
Um dia um arqueólogo, um historiador ou um antiquário
desaparafusa a placa 

e leva-a para casa,
para o museu 

ou para a loja de antiguidades.
Não, nada acontece em Coimbra B.
Mas por aqui passou um peregrino.
João Paulo II. 
Um dia, em 1982.
Por aqui passou Jesus Cristo,
na pessoa do seu representante na terra.
Sou mau em metais e em teologia,
mas esta é a minha leitura.
Que me desculpem os escribas mais doutos do que eu.
Que me desculpem os lentes de Coimbra.
Chega o Alfa, just in time, à tabela,
como na linha de montagem automóvel pós-taylorista 

da Auto Europa.
Entro no Alfa e sinto-me quase europeu
na ponta mais acidental da Europa ocidental.
Com o lusitano Mondego aqui ao lado.
Admiro a eficiência das sociedades pós-tayloristas e cosmopolitas.
A nossa nunca chegou a conhecer o sr. Taylor
nem os seus principles of scientific management.
Nem a ética protestante nem o alemã Max Weber.
Provinciana e ronceira, a tua terra,
lá diriam o Eça e a minha professora,
que é queirosiana e estrangeirada.
Acelera o Alfa

E bate o meu coração.
Tenho um secreta vertigem suicidária pela alta velocidade.
Dou por bem empregues os meus 17 euros,
IVA incluído à taxa de 5%.
Isto faz bem à minha autoestima.
Sobretudo depois da sandocha manhosa e da topázio morna
que engoli, de pé, 

ao balcão do bar manhoso
da estação deprimente de Coimbra B.
── Quanto vai dar ?
── Chega aos 200 ou mais! ──
diz-me um puto de brinco na orelha...
Não apostei. 
Nem gosto de apostas mútuas.
Deixei de ser solidário, 
que me desculpe a Santa Casa da Misericórdia.
── Umas cartas para passar o tempo ?
── Não, obrigado, não jogo, não aposto, não fumo.
Tenho livros para ler. 
──
Abranda o Alfa,
lá para os lados da Albergaria dos Doze.
Regresso à idade média da minha memória coletiva.
O caminho de Santiago. 
As albergarias.
Já em terra dos mouros.
La folie meutrière de la réligion.
A tua, a minha.
Deus é grande e tem muitos profetas.
São bons hortelãos, os mouros e os moçárabes.
── Chega à tabela. 
Dezassete e seis na Estação do Oriente ──
diz-me o pica, orgulhoso.
── Até que enfim que os comboios partem 
e chegam à tabela,
na nossa terra.
Fico sempre com inveja 
quando vou a Amesterdão e a Leiden.
Quando ia à Holanda, que agora já não vou.
Quero dizer, ao estrangeiro de fora.
── Já não te calha na rifa, ó Ramalho!,
agora são vinte e cinco cães a um osso, 
ó Ortigão!
── Vai desejar tomar alguma coisa ? ──
pergunta no futuro próximo o homem-do-chá-café-laranjada...
── Um Prozac, por favor.
── Lamento, mas já não temos. Esgotou-se.
── Sim ?
── Esgotou-se na última viagem que fizemos ao inferno.
11 de Março último. Estação de Atocha.

── Atocha ?
── Sim, Atocha, Madrid...Não lê os jornais ?
── Não, acabo de chegar doutro planeta.
── En Madrid existen dos estaciones principales de tren:
Chamartín y Atocha.
Ambas son estaciones de trenes 
de largo recorrido y de cercanías...
── Muchas gracias!, não sabia.
Não vou a Madrid há anos. 
Estou de costas viradas para a Europa.
── Atocha está situada en la zona sur de la ciudad,
muy cercana al centro.
Desde ella salen todos los trenes de largo recorrido
que van a levante y al sur de España.
También algunos trenes de los que pasan por la estación
se dirigen luego a Chamartín
y luego a destinos en la mitad norte de la península.
Dentro de la estación hay otra estación,
llamada Puerta de Atocha
desde donde sale el tren de alta velocidad (AVE)
que va a Andalucía.
..
── Muchas gracias! Vejo que é um homem lido e viajado.
── Só faço a península ibérica.
── Ah!, a jangada de pedra...
── Perdão ?!... 

Sabe, nasci no Entroncamento,
Filho e neto de ferroviários.
Os comboios estão-me na massa do sangue...
Mas a Espanha para mim é pura emoção.
Uma tragédia horrível, aquela..
.
── E não tem medo do futuro dos comboios ?
── Não... Sabe, com os aviões passou-se o mesmo.
Enfim, um homem tem que ganhar a vida. 
De qualquer jeito.
── Deixe, a vida continua... 
As bombas explodem...
As guerras passam.
Olhe, já agora dê-me um compal de maçã.

Fico sempre deprimido quando tomo o comboio.
Ou quando parto.
Ou penso em bombas nas casas de banho
das carruagens dos comboios.
Ou quando bebo compal de maçã.
Não sei por que pedi o raio do compal.
Reflexo condicionado. 
Empatia. 
Compaixão.
Que é coisa rara, tomar o comboio.
E pensar em bombas.
E ter empatia.
E beber compal.
Houve um tempo em que pensava em minas.
Anticarro. 
Antipessoais.
Minas. 
Bailarinas. 
O ballet da morte.
Nasci numa terra onde não passavam comboios.
É um estranho sentimento, esse,
que me acompanha desde pequeno.
Mas o compal de maçã até é bom.
É português, é nosso.
E dizem que vale mais do que uma chávena de café.
Para te tirar o sono.
Antes de partires às 3 da manhã,
para a Ponta do Inglês.
── Ponta do Inglês ?!... 

Já sei, saíste cedo da casa de teus pais,
Ainda menino e moço!
── É a voz do sangue,
o meu lado de marinheiro que nunca fui.
Em boa verdade, detesto os entroncamentos.
Rodo ou ferroviários.
As picadas. 
Os trilhos.
Detesto o Entroncamento.
Da primeira vez que lá passei.
Meia de dúzia de casas mal caiadas,
uma feixe de linhas,
cheiro a óleo, a mijo e a sucata.
Mas tenho a nostalgia dos cais de embarque.
A nostalgia do mar e da maresia.
Uma palavra que mexe comigo.
Cais. 
Cais de embarque.
Cais de partida.
Niassa. 
Rocha Conde de Óbidos.
Num comboio que veio da noite, silencioso e triste.
Do Campo Militar de Santa Margarida.
Destino: Lisboa.
Com carga para outro destino: Bissau.
Mercadoria=carne para canhão,
alguém escreveu, a spray,
um grafito na última carruagem.
na primavera de 1969.
Numa outra primavera que não chegou a haver.
── Política, meu estúpido!,
a primavera política do Marcelo Caetano.

── Sim, eras jovem.
E não vias a luz ao fundo do túnel.
Nem muito menos as luzes da cidade-luz.
Paris. 
Perdeste o último comboio para Paris.
Com o teu amigo que queria ser pintor,
Fernando Nobis.
Com paragem, talvez em Atocha,
para visitar o Greco, o Velasquez, o Goya,
os grandes de Espanha que estão no Prado...
── Paris, es doido, ou quê ?! 
Com a pide à perna,
mais os carabineiros da guardia civil!



Fazia sol e frio em Viseu.
O país profundo. 
O país que mexe, dizem-te.
Gosto sempre de ler os jornais da terra
quando estou no hotel.
Duas estrelas, o hotel. 
Novo, a cheirar a tinta.
Bom serviço. 
Comida caseira. 
Faces rosadas.
E duas mamocas que cabem na palma da mão.
Mas faz frio à noite.
── Voyeurismo! ── pensa ela,
a rapariguinha do bar. 
Oito páginas,
Entre notícias locais 
e os pequenos anúncios desclassificados.
Duas páginas de anúncios pessoais.
"A brasileira do bumbum"...
"A universitária que faz oral"...
"A mulatchinha dengosa"...

Linguagem de código.
A semiótica da solidão. 
Do sexo triste e solitário.
── Meu bem, ligue para o meu telemóvel,
que a crise bate a todas as portas,
sem distinção de género, 

etnia, 
cor, 
condição 
ou religião.
── A crise também chegou ao teu país profundo, baby.
── Ah!, mas Viseu, como cresceu, meu Deus!
── Não sei se cresceu bem... 
Não sou de cá.
O Politécnico. 
O túnel de Viriato.
Os colóquios. 
Os debates.
As ideias. 
Os intelectuais e artistas que vêm de fora.
O génio do Grão Vasco.
O comércio. 
O fórum, que há-de vir.
A Grande Área Metropolitana de Viseu.
Quase 400 mil.
O orgulho de se ser do Kavaquistão.
O que é feito do RI 14 ?
Não sei, a guerra acabou.
Foi bom para cidade,
A tropa, a guerra, o regimento.
── Ruas, estás de granito! ── 
diz o grafito.
(Ruas é o chefe da tribo, presumo.
Nada como um bom grafito na terra do Grão Vasco).
── Apreciem o lado empreendedor dos beirões.
── Só falta a Universidade,
que mais de 10 mil estudantes do politécnico já cá temos.
── Tiraram-nos a Faculdade de Medicina,
os sacanas da Covilhã.
──
(Outro lóbi beirão, o da Covilhã).
Registo o orgulho dos miúdos e miúdas
da Associação de Estudantes
da Escola Superior de Enfermagem de Viseu
que realizam anualmente as suas jornadas.
O país mexe. 
Viseu mexe.
O país profundo mexe. 
O Kavaquistão.
Os jovens deste país mexem.
Mesmo com capa e batina,
vestidos de preto,

como o corvo do Zé (Cardoso Pires).

16:30h. 
Passei o corpo pelas brasas.
Perdi um pedaço de mundo.
Revisitei outros infernos.
── O Alfa vai a 140, ó puto.
──
Temperatura: 19º interior. 20º exterior,
leio no tableau de bord.
── Mas agora abranda. 129, 101, 74, 52...
Está parado.
── Porquê ?
Uma placa com um S, outra com um M.
Não percebo nada da sinalética dos comboios.
Obras. 
Modernização da linha.
Tenho um pensamento piedoso e nobre
para com os trabalhadores anónimos
que constroem as novas linhas 
dos caminhos de ferro do futuro.
Ucranianos ? 
Africanos ?
Guineenses ? 
Ex-camaradas teus ?
Imigras ? 
Clandestinos ?
── Não lhes vejo nem a cara nem o passaporte.
── Podiam estar a trabalhar na estufas de Almeria,
O inferno na terra. 
Mas aí são magrebinos.
── O novo proletariado do Século XXI...
── Desço na Oriente.
Mandem alguém da empresa buscar-me.
── Dá o Benfica na esporte tê vê.
── 
E de novo o Alfa em marcha...
A paisagem muda.
A paisagem industrial da bacia do Tejo.
A ocupação selvagem da lezíria.
Mataram os campinos e o gado bravo.
E os flamingos. 
E as ostras,
Les petites portugaises,
acompanhadas com Champagne.
Em Paris.
Comment ils sont toujours gais, les portugais!
O branqueamento de dinheiro
que vai por essa nova Lisboa 
do Próximo Oriente.
A luxuriante estação do Oriente,
desenhada pelo Calatrava.
A ostentação dos ricos.
Just in time
17:06h. 
Cheguei.
Balanço do cliente:
── Pensei que já fosse o TGV. 
O TGV é que é.
── Não é o TGV, 
mas por mim não desgostei.
De viajar no Alfa Pendular. 
Turística, claro.
Que é como quem diz, 2ª classe.
De Coimbra B a Lisboa SA.
17 euros, IVA incluído à taxa de 5%.
Mais 10% de desconto nos Hotéis Tal &Tal.
Tive tempo para (des)arrumar algumas ideias.
── Ah!,o  país que via passar os comboios!...
E o puto tinha razão:
── Na ponta final, o Alfa Pendular dá mesmo os 210.

Um dia ainda vou ter orgulho na CP.
E na terra onde nasci, ao pé do mar.
E onde nunca vi sequer passar os comboios.
Os comboios não passam na minha terra.
onde só há moinhos de vento
com búzios do mar
que falam de mouras encantadas.
Nem os comboios chegam a Viseu.
Um abraço aos Viriatos.
Até para o ano.
Voltarei, se me convidarem,
de Expresso, por esses ipês acima.

Com regresso de comboio,
se não sabotarem o comboio 
que pára em Coimbra B.
E prometo ao barman 
que não me esquecerei de Atocha.
Sobretudo não esquecerei Atocha,
quando voltar a Coimbra B,
outra vez.
Não esquecerei as bombas de Atocha,
nem as minas e armadilhas 
da Ponta do Inglês.

Coimbra-Lisboa, Alfa Pendular, 25/3/2004. 
Revisto, Alfragide, 21 de abril de 2014

© Luís Graça  (2004). Todos os direitos reservados



Joana Graça (2014) - S/ título. Técnica mista 100 cm X 80 cm

Cortesia de © Joana Graça (2014). Todos os direitos reservados


_____________

Nota do editor:

Último poste da série > 20 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P13014: 10º aniversário do nosso blogue (14): Manhã de Páscoa, ao som da Sonata Moonligth, de Beethoven (J. L. Mendes Gomes)

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12630: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (10): Coimbra, Porto, Abrantes, com passagem por Santa Margarida (Juvenal Amado)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 20 de Janeiro de 2014:

Em pouco tempo conheci vários quartéis e outras tantas localidades.
Passei pelo Trem Auto na Av de Berna onde fiz psicotécnicos e por conseguinte tive o primeiro contacto com a vida militar.

Passado meses recebo a ordem de marcha para o CICA-4 que funcionava no mosteiro de Santa Clara de Coimbra. Aí fiz a recruta.
Além do aprender a conduzir, manuseamento de armas, mecânica auto, o conhecer os postos da hierarquia, também aí descobri a prepotência por vezes a irracionalidade militar, quanto ao aprumo das botas de instrução e barbas. As botas acabavam por ser as únicas peças de fardamento de instrução que tinham que andar sempre impecáveis, o resto podia andar enlameado até à cabeça.
Para isso trazíamos sempre no bolso uma lata de pomada e uma pequena escova.

As barbas eram refeitas duas e três vezes ao dia até serem várias as crostas de lesões provocadas pelas laminas de barbear. A juntar a isto, a instrução também passava por formaturas a qualquer hora da noite, instrução nocturna quando menos esperávamos e as formaturas por dá cá aquela palha, duravam eternidades com castigos e flexões à mistura. E cheguei a dormir vestido antecipando o castigo, que às tantas da madrugada nos era cobrado.

Éramos obrigados a saltar da cama com estivéssemos vestidos, para como popularmente se diz “não ser apanhado com as calças na mão”. Não me posso esquecer das enormes ratazanas no refeitório, quando aparecíamos de repente para a faxina, e das duas doses daquela malvada injecção que nos davam sobre a omoplata, que fez muitos caírem redondos no chão.

Mas, as saídas à cidade e a sua beleza faziam esquecer a volta de 180 graus que dava a nossa vida após a incorporação. Era e é uma cidade lindíssima cheia de história e nomes sonantes da nossa cultura. A sua universidade, as repúblicas e a vida dos estudantes que davam movimento aos lugares que nós visitávamos, em especial locais dos copos e paródias.

Aí aprendi muita coisa para além do que era suposto aprender. Aprendi a não tentar sair do quartel quando estava à porta de armas um certo sargento que nos fazia voltar para trás vezes sem conta, sem nos dizer o porquê. Também onde era a rua direita e a desenrascar-me, a evitar os sítios onde a policia militar fazia luxo em nos provocar. Ao sair do café ou do comboio, o simples facto de aparecer um bocadinho de fralda da camisa, era uma carga de trabalhos com esses senhores.



Vistas da cidade de Coimbra

Após a recruta jurei bandeira e ala que faz tarde para o RI6, da belíssima cidade do Porto. Aí a instituição castrense parecia que se regia por outro RDM. Era tempo da especialidade. Para além das marchas forçadas, instrução de armamento e instrução já com Berliets, ninguém chateava.
À noite íamos para a cidade, bebíamos um fino, às vezes comíamos uma francesinha ou íamos comer à cantina, ao pé do Palácio da Justiça, por uma ninharia e sempre melhor que o rancho.
Praça da Batalha, Av dos Aliados e Palácio de Cristal, eram passeios apetecidos para ver as belezas que transitavam nos passeios e entravam e saíam dos lugares públicos.
Aí retomei amizades antigas e conheci alguns camaradas, longe de saber que ia com eles para a Guiné. Também esse tempo acabou e nessa mesma noite fui metido num comboio direito a Abrantes ao RI6.


Vista da Cidade do Porto 

Foto do sítio PPortodosMuseus (reproduzida com com a devida vénia...)

Abrantes foi um sítio complicado, aí não conhecia ninguém. Quando cheguei não tinha cama e dormia numa cama vaga de um camarada que estivesse de reforço. Escusado será dizer-se que não me despia e dormia em cima da manta. Não raras as vezes o soldado saía de serviço e eu, tinha que ir procurar outra cama vaga.
Entretanto os dias passavam-se a fazer o que os outros não queriam fazer. Por exemplo mudar os pneus aos carros enormes da II Grande Guerra como GMC e Canadá-Ford, em que as borrachas ressequidas eram descoladas à força de cunhas e marretas. Os parafusos das jantes eram do estilo mais quebrar que torcer.
Resumindo aquilo era mais para chatear do que nos preparar para o que íamos encontrar, uma vez mobilizados. A cidade era um “valha-me Deus" ou "Deus nos acuda”,  não tinha nada para ver e se não fosse aquela ideia de sair dos muros do quartel, acabaríamos por nos limitarmos a jogar às cartas, beber, fumar e ver alguma revista de pouca roupa, que passava de mão em mão.

O facto de não ter cama nem cacifo, acabou por ditar a sorte do meu saco com roupa civil, que deve ter servido ao tipo que o roubou, para passear em Luanda, pois desapareceu na noite que transportamos um batalhão para Angola.

Panorâmica de Abrantes

Foto da internete, com a devida vénia ao seu autor

Um dia ou dois após, recebo ordem de marcha para Santa Margarida, onde me apresentei no CIME, que era então comandado pelo coronel Maçanita.
Aí tudo se conjugou para eu odiar o destacamento.
Em Novembro fazia um frio de rachar e as várias tentativas para me ser distribuído mais um cobertor foram infrutíferas, obrigando-me assim a dormir completamente fardado.
Também nessa altura uma circular obrigou-nos a fazer preparação física todas as manhãs antes do pequeno almoço. Estava tudo coberto de geada e nós a corrermos, a fazer flexões sem encostarmos o peito à relva, com temperaturas próximas do negativo, pois por essas paragens o tempo não brinca. Mas o supremo sacrifício era para sair de lá e vir a casa de fim de semana.

O CIME era o único destacamento que não fornecia transporte para a estação que ficava uns quilómetros fora do campo militar. Depois tínhamos que apanhar comboio até o Entroncamento, seguidamente apanhar o comboio para a linha do Oeste, que chegava ao Valado dos Frades às tantas da noite, quando já não havia autocarro dos Claras para transportar a malta para Alcobaça ou para onde quer que fosse.
Aí fazia-se uma “vaquinha” para o táxi e lá chegávamos todos mais ao menos ao destino. Mas regressar era ainda pior.
Tínhamos que sair de casa logo após o almoço de Domingo para apanharmos o especial para militares em Santarém até ao Entroncamento e aí apanhar o comboio do “Século 19” até Santa Margarida. Chegávamos tardíssimo com uns quilómetros para fazer a pé, ou então nunca chegávamos dentro do período da licença. Nem é bom pensar nisso.
Odiei e não me custa admitir que fiquei contente quando fui mobilizado, pois aquilo era terrível e não havia forma de melhorar. Está claro que quando soube que era para Guiné, não fiquei tão contente assim.

Voltei a Abrantes com a sina lida quanto ao destino que me calhara, mas acabei por passar bons momentos de camaradagem com os indivíduos do Pelotão de Reconhecimento, com os quais tinha vindo do Porto.

Depois Angra do Heroísmo, mar calmo, peixes voadores, Madeira e logo a seguir o horizonte em fogo cada dia mais perto. Desembarcámos e fomos depositados no Cumeré.
Fui entretanto escalado para receber treino todo-o-terreno com Berliet em Bissau. Fui parar a umas instalações atrás do QG onde passei praticamente um mês. Estava lá quando se deram os graves incidentes entre a PM e os Comandos Africanos, que não aceitavam, para não variar, na maior parte das vezes,  a autoridade para além das próprias leis por que se regiam.

Uma bela manhã zarpamos de LDG para o Leste, rio Geba acima com destino a Galomaro.
Xime, Bambadinca, Bafatá, Nova Lamego, Buruntuma, Saltinho, Dulombi e Cancolim, foram sítios que visitei.

 Rua principal de Bafatá

Cancolim, 1973 - Durante as chuvas - Trinta dias de isolamento e algumas pontes levadas pelas águas quando os ribeiros se transformaram em rios revoltos.

Dulombi - TCor José Maria de Castro e Lemos, Comandante do BCAÇ 3872, após a retirada desse destacamento

Nuns demorei-me mais que noutros, mas não quero deixar de escrever algo sobre Cancolim.
Este destacamento onde esteve a CCAÇ 3489 foi um dos sítios mais difíceis onde pernoitei muitas vezes. Os problemas psicológicos, os mortos e feridos, as deserções, a má alimentação, tudo se conjugava para que fosse um sítio a evitar. Mas tinha lá muitos amigos e era sempre com alguma preocupação que me vinha de lá embora. Esta Companhia, várias vezes reforçada com para-quedistas e posteriormente com pelotões da 3491, após a retração desta do Dulombi, veio a equilibra-se após o meio da comissão, conseguindo segurar a zona que estava na sua jurisdição, felizmente sem mais problemas para além dos já tinha suportado.

Um abraço
Juvenal Amado
____________

Nota do editor

Último poste da série de 23 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12628: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (9): Mafra e Porto, como em casa (Fernando Gouveia)

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12614: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (6): Eu fiz "Tropa" em cinco cidades, em Portugal e ainda em Nhacra, Quebo e Nhala, na Guiné Bissau (Manuel Amaro)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Amaro (ex-Fur Mil Enf da CCAÇ 2615/BCAÇ 2892, Nhacra, Aldeia Formosa e Nhala, 1969 a 1971) com data de 18 de Janeiro de 2014:

Eu fiz "Tropa" em cinco cidades, em Portugal e ainda em Nhacra, Quebo e Nhala, na Guiné Bissau.

Começando pelo Sul, estive em Tavira, cidade que já conhecia desde que nasci e gosto o normal que qualquer cidadão gosta da sua terra natal.

Em Beja quase não tive tempo para conhecer a cidade, pelo que não desenvolvi qualquer relação especial de "amor" pela Pax Júlia.

Já a relação com Évora foi diferente. E foi boa... muito boa.
Apesar ter estado duas vezes em Évora, ambas mobilizado para a "guerra".

Na primeira vez, era para Angola, mas não se concretizou, passado pouco tempo nova mobilização, agora para a Guiné, levada até ao fim.
Em Évora aproveitei algum tempo para visitar a cidade e a nossa relação permanece tão intensa, que periodicamente faço uma visita com ou sem pernoita. Numa das últimas visitas, aproveitei para levar a Florbela Espanca uma mensagem de Sebastião da Gama. (foto anexa).
Gostei muito de Évora


Évora, 18 de Abril de 2012

Lisboa. Quem não gosta de Lisboa?
Lisboa, eu também já conhecia desde o Grande Encontro Nacional da Juventude.
E a "tropa" levou-me à Estrela.
Ao Hospital Militar da Estrela.
Ao Jardim da Estrela.
Aos Fados.
Aos castelos e aos bairros típicos, às tascas, à verdadeira Lisboa.

Logo que terminei o Serviço Militar voltei à Grande Lisboa, em janeiro de 1972, até hoje.
Mesmo que uma parte do tempo seja passada no Algarve, Lisboa faz parte de mim.

Lisboa - Estrela

E Coimbra?
De uma forma diferente de Évora e de Lisboa, mas Coimbra foi tão ou mais importante para mim.
E nós, para não sermos ingratos, temos que amar as "coisas" importantes.
Assim que cheguei a Coimbra, em junho de 1967, fui visitar o Penedo da Saudade. Não vi tudo e voltei no dia seguinte. No regresso passei à porta do Liceu D. João III. Lembrei-me que tinha um exame "pendente" e os livros na mala. Talvez já com o espírito da cidade, prometi ali mesmo, a mim mesmo, que em Setembro, ao abrigo da lei militar, iria fazer aquele exame e iria ficar aprovado. E assim foi. 

Sempre que vou a Coimbra, assim que deixo a autoestrada, mas principalmente depois de atravessar a ponte, sinto uma mudança de espírito. Isto, penso eu, é amor. Eu fiquei a amar Coimbra. Até hoje. 

Coimbra - Penedo da Saudade

Guiné Bissau.
Eu gostei da Guiné Bissau.
Nhacra, a D. Carlota e os seus bifes de macaco.
O "Branco" do Cumeré e o seu camarão, mais barato que os tremoços nas cervejarias de Lisboa.
Eu gostei de Aldeia Formosa (Quebo).
Tudo aquilo era novo.
A minha Escola, os meus alunos.
A assistência médica em Pate Embaló.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 20 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12611: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (5): Quartéis, Cidades e Vilas por onde passei: Coimbra, Leiria, Trafaria, Tomar, Chaves, Viana do Castelo e Porto (Luís Nascimento)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12611: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (5): Quartéis, Cidades e Vilas por onde passei: Coimbra, Leiria, Trafaria, Tomar, Chaves, Viana do Castelo e Porto (Luís Nascimento)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Nascimento, (ex-1º Cabo Op Cripto da CCAÇ 2533, Canjambari e Farim, 1969/71), através da sua neta Jéssica, com data de 17 de Janeiro de 2014:


Quartéis, Cidades e Vilas por onde passei durante a vida militar

VISEU - Assentei praça no RI 14
No primeiro dia entrei na porta de armas e passado meia hora saí pela porta do Cavalo, o Cabo de Dia (João dos Remédios), era meu amigo, mandou-me apresentar no outro dia pela manhã.

COIMBRA - Destacado durante a recruta para o RSS - Regimento de Serviços de Saúde, durante os campeonatos de atletismo da 2.ª Região Militar (à noite, estágio na Rua Direita).

LEIRIA - RAL 4 - Regimento de Artilharia Ligeira, para formação de escriturário, secretariado amanuense e Serviço Postal Militar (gato preto).

TRAFARIA - BRT - Batalhão de Reconhecimento das Transmissões, especialidade de Operador Cripto, fadista (com João Braga), com tirocínio no Arroz Doce, Gingão no Bairro Alto (onde fui de cana pela PM sob o comando do Furriel ou Aspirante(?) Encarnação, jogador de basquetebol do meu SCP.

TOMAR - RI 15 - Regimento de Infantaria 15 - Quartel dos Desenfianços, de uma vez estive 31 dias em casa, só me apresentei para receber o pré.

CHAVES - BC 10 - Batalhão de Caçadores 10 - Recebi a mensagem, em Tomar, para me apresentar lá, bebi uns copos com o pai do falecido Pavão do FCP.

VIANA DO CASTELO - BC 9 - Batalhão de Caçadores 9, o inferno no Forte da Barra, paredes-meias com os estaleiros, pior que o porão do Niassa.

PORTO - Quartel General - De dia formação de Criptologia à noite (DERBY), onde as meninas fumavam e tratavam os militares por “TU” (mais uma vez com acompanhamento da PM até ao QG, com o prémio de mais uma carecada.

De seguida CP até Alcântara-Mar onde me esperava o pasteleiro do Niassa.


____________

Nota do editor

Último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12604: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (4): Sexo, História, muita fruta das Caldas da Rainha, e dois poemas do clássico do erotismo chinês Jin Pin Mei (António Graça de Abreu)

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Guiné 63/74 - P11599: Manuscrito(s) (Luís Graça) (3): O país que via passar os comboios



Lisboa > Museu da Electricidade > 2006

Foto: © Luís Graça (2006). Todos os direitos reservados.


O país que via passar os comboios

14:13h.
Coimbra B.
Estação da CP.
Deprimente.
Como todas as estações B do mundo.
Como todas as estações da CP.
B de 2ª classe.
B, segunda letra do alfabeto.
Como todas as estações da CP urbanas, suburbanas e rurais.
Deprimentes.
Todas as estações de caminho de ferro do mundo são deprimentes.
Abro talvez uma excepção para os apeadeiros.
São bonitos, os apeadeiros.
Ou eram bonitos os apeadeiros da CP,
Quando havia o cavador, o burro, o boi, a charrua,
O camponês, o zé povinho, camponês e burro,

Besta de carga.
A horta, a saída direta para os campos.
As hortas.

Os azulejos azuis  e amarelos Viúva Lamego 
Nas quatro estações do ano.
O termo apeadeiro eternece-me,

Faz-me lembrar os tempos
Em que se ia às hortas.
Eu já não sou desse tempo.
Mas os alfacinhas iam às hortas dos saloios.
Benfica, Porcalhota, Pontinha, 
Sintra, Caneças, Colares ...
Faziam piqueniques, cantavam o fado.
Gosto do termo apeadeiro.
E da ideia de ir passear às hortas.
Em família, aos domingos, de comboio.
Ronceiro, o comboio.
Ronceira, a vida da gente.
Li isso algures numa história qualquer sobre os comboios
Que unificaram o país de norte a sul.
Há uma dívida de gratidão que é devida aos comboios.
E aos homens dos comboios.
E aos engenheiros das estradas e pontes.

E aos operários que as construíram.
Ao zé povinho da cidade e dos campos.
Ao engenho e à obra.
Ao Fontes.

Ao Pereira.
Ao Melo.
Ao fontismo.

Ao positivismo.
Ao génio organizativo.
Mesmo que a minha professora 
De Sociologia Histórica das Classes Laboriosas,
Discípula do E.P. Thompson,
Só gostasse dos corticeiros
Que eram anarcossindicalistas.
Sempre suspeitei que ela não gostasse dos cavadores.
Nem de comboios.
Nem de hortas.
Nem do Fontes.
Nem dos ferroviários,
Nem dos camponeses e dos burros e dos bois.
Naquele tempo parava-se em todas estações e apeadeiros.
E havia tempo, não havia pressa.
Não havia stresse naquele tempo.

Colhiam-se papoilas vermelhas no meio do trigo.
Não havia tempo para se ter stresse.
Morria-se cedo. 
Ou nascia-se tarde.
Sem tempo de ver crescer filhos e netos.
O stresse é uma construção social do meu tempo.
E não havia bombas nos comboios.

Ao alcance de um qualquer toque de telemóvel,
Da Nokia, da Samsung ou da Siemens, tanto faz.
Que as novas tecnologias quando nascem 
(não) são para todos.
Ou talvez houvesse stresse
Mas chamavam-lhe outra coisa.
Afinal, essa coisa é tão velha como a vida.
E morria-se cedo naquele tempo.

A esperança média de vida é um artefacto estatístico.
E há sessenta e tal anos, na França ocupada,
Os ferroviários também punham bombas. 

Nas linhas de caminhos de ferro.
Matavam os seus postos de trabalho em nome da liberdade.
Punham bombas para fazer descarrilar os comboios.
Sabotagem.
Resistência ao ocupante nazi.
Hoje seriam caçados como terroristas internacionais.
Não sou ferroviário nem resistente nem terrorista.
Nem anarcossindicalista.
Estou numa estação deprimente.
Coimbra B.
Coimbra merecia, pelo menos, uma estação A.

Este país, bom aluno da Europa,
Devia merecer uma letra A.
Nem que fosse Coimbra A.
Ouço uma voz gritante.
Alfarelos.
Com paragem não sei onde.
Nunca soube, ao certo, onde fica Alfarelos.

É algures no país profundo.
Assim como Freixo de Espada à Cinta
Que ninguém conhece.
Não, vim de boleia.

Muito obrigado.
De Viseu.
Aguardo o Alfa Pendular para Lisboa.
Aliás, Lisboa SA.
Deve chegar às 15:16h.

── Lisboa, Santa Apolónia ?
── Não, Lisboa, Sociedade Anónima!
 Corrijo o portuga por detrás do guiché.
── Não, não quero Santa Apolónia.
Quero a Estação de Lisboa Oriente.
E depois... o que diria o Zé (Cardoso Pires)!

── Lisboa, SA!

Pergunta o portuga, 
Caixa de óculos, por detrás do bunker, 
Que fala em nome da CP.
── Conforto ou turística ?
Olha para mim, como se quisesse me tirar as medidas.
Ou adivinhar a minha secreta conta bancária.
──  2ª classe, se faz favor!
──  Turística...
... 2ª classe, por defeito.
Para quem não ostenta sinais exteriores de riqueza.
Classe B.
E eu a pensar ingenuamente que já não havia 2ª classe.
Comboios de 2ª classe. 

Gente de 2ª classe.
País de 2ª classe no desconcerto das nações.
(Ah!, meu velho José Rodrigues Miguéis,
E a tua gente de 3ª classe
Nos porões nauseabundos dos cargueiros
Que rumavam às Américas!).

Devo ter percebido mal.
Os comboios e a CP também se democratizaram.
Agora só há conforto e turística.
No alfa pendular de todas as emoções e condições.
O Portugal SA já não é mais classista.
Para ter classe basta ter dinheiro no multibanco,
Minha querida professora.

Mas, mais seguro, é na Suiça ou num off shore qualquer.
É o que se chama mobilidade social.
Fugir à condição de besta de carga.
── Vê-se mesmo que o senhor é um utente acidental da CP,
Já não há 2ª classe.

── Sou um mau utilizador do comboio, peço desculpa ──.
Comprei um bilhete de 2ª classe.
17 euros, IVA incluído à taxa de 5%.
── O senhor, desculpe, mas eu sou fã dos comboios.
Tenho uma dívida histórica para com os comboios,
Que unificaram o meu país.
Pode não ser seu, mas é meu.
Tenho orgulho nele.
E tinha que lhe dizer isto.
Vou para Lisboa, SA,

Capital do reino,
Desço na Gare do Oriente...





Lisboa > Museu da Água > Aqueduto das Águas Livres  > 18 de abril de 2013

Foto: © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados.

Tenho tempo.

Ou penso que tenho tempo.
Nada como esperar um comboio 

Numa estação de tipo B, Coimbra B
Para saber o que é isso de ter tempo.
É bom ter tempo.

Uma hora de avanço.
Nada de stresse.
Não penses na morte.
Que o stresse mata
Como uma bala de Kalash.
Peço uma sandes manhosa no bar da esquina.
Bebo uma topázio que é uma cerveja local.
Compro o Zé Cardoso Pires no quiosque.
A república dos corvos.
Um livro de contos.
Jornal Público.
Colecção Mil Folhas, ao preço de hipermercado.
Redescubro o meu velho Dinossauro Excelentíssimo.
Que li na revista Almanaque, se bem me lembro.
Deambulo no cais de embarque 

Como o prisioneiro no pátio da prisão.
E leio a única coisa interessante
Que está afixada na parede da estação de Coimbra B.
Alguém mandou afixar.
Creio que em bronze (sou mau em metais):

"Neste cais da estação de Coimbra, embarcou,
No dia 15 de Maio de 1982, Sua Santidade,
O Papa João Paulo II"
.
O artista não quis desqualificar a estação nem a cidade.
Coimbra B ?, 

O que diria a corte papal!
Os grandes deste mundo!
E os turistas que visitam a cidade dos doutores!
E os vindouros!
Mas lá fica a tabuleta.
Para a história.
Para o viajante distraído, apressado ou deprimido como eu.

Ou se calhar para ninguém.
Só para a História.
Afinal, quem lê neste país placas de bronze 
Afixadas em estações B da CP ?
Aliás, quem lê neste país, perguntaria a minha professora ?

Histórias aos quadradinhos 
Mas não a História com H grande.
Um dia um arqueólogo, um historiador ou um antiquário
Desaparafusa a placa e leva-a para casa,
Para o museu ou para a loja de antiguidades.
Não, nada acontece em Coimbra B.
Mas por aqui passou um peregrino.
João Paulo II.

Um dia,  em 1982.
Por aqui passou Jesus Cristo,
Na pessoa do seu representante na terra.
Sou mau em metais e em teologia.
Mas esta é a minha leitura.
Peço desculpa aos poetas mais doutos  do que eu.
Peço desculpa aos lentes de Coimbra.

Chega o Alfa.
Just in time,
Como na linha de montagem automóvel pós-taylorista da AutoEuropa.
Entro no Alfa e sinto-me quase europeu
Na ponta mais ocidental da Europa acidental.
Com o lusitano Mondego aqui ao lado.
Admiro a eficiência
Das sociedades pós-tayloristas e cosmopolitas.
A nossa nunca chegou a conhecer o Sr. Taylor,

Nem os seus principles of scientific management.
Nem a ética protestante nem o Max Weber.
Provinciana e ronceira, a tua terra,

Lá diriam o Eça e a minha professora, 
Que é queirosiana e estrangeirada.
Acelera o Alfa.
Tenho um secreta vertigem suicidária pela alta velocidade.
Dou por bem empregues os meus 17 euros,

IVA incluído à taxa de 5%.
Isto faz bem à minha autoestima.
Sobretudo depois da sandocha manhosa e da topázio morna
Que engoli, de pé, ao balcão, do bar manhoso
Da estação deprimente de Coimbra B.

── Quanto vai dar ?
──  Chega aos 200 ou mais!, ──
Diz-me um puto de brinco na orelha...
Não apostei.
Nem gosto de apostas.
Deixei de ser solidário, que me desculpe a Santa Casa

Da Misericórdia.
── Umas cartas para passar o tempo ?
── Não, obrigado, não jogo, não aposto, não fumo. 
Tenho livros para ler. 
Abranda o Alfa lá para os lados da Albergaria dos Doze.
Regresso à idade média da minha memória coletiva.
O caminho de Santiago.
As albergarias.
Já em terra dos mouros.
La folie meutrière de la réligion.
A tua, a minha.
Deus é grande e tem muitos profetas.
São bons hortelãos, os mouros e os moçárabes.

── Chega à tabela.
Dezassete e seis na Estação do Oriente,
Diz-me o pica, orgulhoso.

── Até que enfim que os comboios partem e chegam à tabela,
Na nossa terra.
Fico sempre com inveja
Quando vou a Amesterdão e a Leiden.
Quando ia à Holanda, que agora já não vou.
Quero dizer, ao estrangeiro de fora.

── Já não te calha na rifa, ó Ramalho!,
Agora são vinte e cinco cães a um osso, ó Ortigão!

── Vai desejar tomar alguma coisa ?,
Pergunta no futuro próximo o homem-do-chá-café-laranjada...

── Um Prozac, por favor.
── Lamento, mas já não temos. Esgotou-se.
── Sim ?
── Esgotou-se na última viagem que fizemos ao inferno.
11 de Março último.
Estação de Atocha.
Madrid.

── Atocha ?
── Sim, Atocha...Não lê os jornais ? 
── Não, acabo de chegar doutro planeta.
── En Madrid existen dos estaciones principales de tren:
Chamartín y Atocha.
Ambas son estaciones de trenes de largo recorrido y de cercanías
...

── Muchas gracias!, não sabia.
Não vou a Madrid há anos.

Estou de costas para a Europa.
── Atocha está situada en la zona sur de la ciudad,
Muy cercana al centro.
Desde ella salen todos los trenes de largo recorrido
Que van a levante y al sur de España.
También algunos trenes de los que pasan por la estación
Se dirigen luego a Chamartín
Y luego a destinos en la mitad norte de la península.
Dentro de la estación hay otra estación llamada Puerta de Atocha
Desde donde sale el tren de alta velocidad (AVE)
Que va a Andalucía
...

── Muchas gracias! Vejo que é um homem viajado.
── Só faço a península ibérica.
── Ah!, a jangada de pedra...
── Perdão ?!... Sabe, nasci no Entroncamento,
Filho e neto de ferroviários.
Os comboios estão-me na massa do sangue...
Mas a Espanha para mim é pura emoção.
Uma tragédia horrível, aquela...

── E não tem medo do futuro dos comboios ?
── Não... Com os aviões passou-se o mesmo.
Enfim, um homem tem que ganhar a vida.
De qualquer jeito.

── Deixe, a vida continua... As guerras passam.
Olhe, já agora dê-me um compal de maçã.
Fico sempre deprimido quando tomo o comboio.
Ou quando parto. 

Ou penso em bombas nas casas de banho
Das carruagens dos comboios.
Ou quando bebo compal de maçã.
Não sei por que pedi o raio do compal.
Reflexo condicionado.

Empatia.
Compaixão.
Que é coisa rara, tomar o comboio.

E pensar em bombas.
Houve um tempo em que pensava em minas.
Anticarro. Antipessoais.
Minas. Bailarinas. O ballet da morte.
Nasci numa terra onde não passavam comboios.
É um estranho sentimento, esse,
Que me acompanha desde pequeno.
Mas o compal de maçã até é bom.
E dizem que vale mais do que uma chávena de café 
Para te tirar o sono.
Antes de partires às 3 da manhã,
Para a Ponta do Inglês.
── Ponta do Inglês ?!...
Já sei, saíste cedo da casa de teus pais, 
Ainda menino e moço!
── É a voz do sangue, 
O meu lado de marinheiro que nunca fui.
Em boa verdade, detesto os entroncamentos.
Rodo ou ferroviários.

As picadas. Os trilhos.
Detesto o Entroncamento.
Da primeira vez que lá passei.
Meia de dúzia de casas mal caiadas, 
Uma feixe de linhas e cheiro a óleo e a sucata.
Mas tenho a nostalgia dos cais de embarque.
A nostalgia do mar e da maresia.
Uma palavra que mexe comigo.
Cais.
Cais de embarque.
Cais de partida.
Niassa.
Rocha Conde de Óbidos.
Num comboio que veio da noite, silencioso e triste.
Do Campo Militar de Santa Margarida.
Destino: Lisboa.
Com carga para outro destino: Bissau.

Mercadoria=carne para canhão,
Alguém escreveu, a spray,  
Um grafito na última carruagem.
Na primavera de 1969.
Numa outra primavera que não chegou a haver.

── Política, meu estúpido!,
A primavera política do Marcelo Caetano.
Eras jovem
E não vias a luz ao fundo do túnel.
Nem muito menos as luzes da cidade-luz.
Paris.
Perdeste o último comboio para Paris.
Com o teu amigo que queria ser pintor.
Fernando Nobis.
Com paragem, talvez em Atocha,
Para visitar o Greco, o Velasquez, o Goya,
Os grandes de Espanha que estão no Prado...

── És doido, ou quê ?!
Com a pide à perna,
Mais os carabineiros da guardia civil!



Portugal > Alto Douro Vinhateiro, Património Mundial da Humanidade > Vila de Foz Coa > Pocinho > 3/9/2010 > Estação terminal da linha de caminho de ferro do Douro (Porto-Pocinho) > Pormenor dos azulejos da estação, da Fábrica Sant'Anna (fundada em 1741): a vindima...

Foto: © Luís Graça (201o). Todos os direitos reservados.


Fazia sol e frio em Viseu.
O país profundo.
O país que mexe, dizem-te.
Gosto sempre de ler os jornais da terra
Quando estou no hotel.
Duas estrelas, o hotel. Novo, a cheirar a tinta.
Bom serviço. Comida caseira. Faces rosadas.
Mas faz frio à noite.

── Voyeurismo!  ── pensa ela.
A rapariguinha do bar.
Oito páginas,
Entre notícias locais e os pequenos anúncios classificados.
Duas páginas de anúncios pessoais.
"A brasileira do bumbum"...
"A universitária que faz oral"...
"A mulatchinha dengosa"...

Linguagem de código.
A semiótica da solidão.
Do sexo triste e solitário.

── Mue bem, ligue para o meu telemóvel,
Que a crise bate a todas as portas,
Sem distinção de género, etnia, cor, condição ou religião.

── A crise também chegou ao teu país profundo, baby.
── Ah!, mas Viseu, como cresceu, meu Deus!
── Não sei se cresceu bem...
Não sou de cá.
O Politécnico. 
O túnel de Viriato.
Os colóquios. 
Os debates. 
As ideias.
Os intelectuais e artistas que vêm de fora.
O comércio.
O fórum, que há-de vir.
A Grande Área Metropolitana de Viseu.
Quase 400 mil.
O orgulho de se ser do Kavaquistão.

O que é feito do RI 14 ?
Não sei, a guerra acabou. 
Foi bom para cidade,
A tropa,
O regimento.
── Ruas, estás de granito!,
Diz o grafito.
(Ruas é o chefe da tribo, presumo).
Nada como um bom grafito na terra do Grão Vasco:

── Apreciem o lado empreendedor dos beirões. 
── Só falta a Universidade,
Que mais de 10 mil estudantes do politécnico  já cá temos.

── Tiraram-nos a Faculdade de Medicina,
Os gajos da Covilhã.
Outro lóbi beirão, o da Covilhã.
Registo o orgulho dos  miúdos e miúdas
Da Associação de Estudantes 
Da Escola Superior de Enfermagem de Viseu
Que realizam anualmente as suas jornadas.

O país mexe.
Viseu mexe.
O país profundo mexe.

O Kavaquistão.
Os jovens deste país mexem.
Mesmo com capa e batina,
Vestidos de preto como o corvo do Zé (Cardoso Pires).

16:30h. Passei o corpo pelas brasas.
Perdi um pedaço de mundo.

Revisitei outros infernos.
── O Alfa vai a 140, ó puto.
Temperatura: 19º interior. 20º exterior,
Leio no tabelau de bord.

── Mas agora abranda. 129, 101, 74, 52...
Está parado.

── Porquê ?
Uma placa com um S, outra com um M.
Não percebo nada da sinalética dos comboios.
Obras.
Modernização da linha.
Tenho um pensamento piedoso e nobre 

Para com os trabalhadores anónimos
Que constroem as novas linhas dos caminhos de ferro do futuro.
Ucranianos ? Africanos ? 
Guineenses ? Ex-camaradas teus ? 
Imigras ? Clandestinos ?
── Não lhes vejo nem a cara nem o passaporte.
── Podiam estar a trabalhar na estufas de Almeria, 
O inferno na terra.
Mas aí são magrebinos.

── O novo proletariado do Século XXI.
── Desço na Oriente.
Mandem alguém da empresa buscar-me.

── Dá o Benfica na esporte tê vê.
E de novo o Alfa em marcha...
A paisagem muda.
A paisagem industrial da bacia do Tejo.
A ocupação selvagem da lezíria.
Mataram os campinos e o gado bravo.

E os flamingos. E as ostras,
Les petites portugaises.
O branqueamento de dinheiro
Que vai por essa nova Lisboa do Póximo Oriente.
A luxuriante estação do Oriente.

A ostentação dos ricos.
Just in time.
17:06h.
Cheguei.
Balanço do cliente:

── Pensei que já fosse o TGV.
O TGV é que é.

── Não é o TGV,
Mas por mim não desgostei.
De viajar no Alfa Pendular.
Turística, claro.

Que é como quem diz, 2ª classe.
De Coimbra B a Lisboa SA.
17 euros, IVA incluído à taxa de 5%.
Mais 10% de desconto nos Hotéis Tal &Tal.
Tive tempo para (des)arrumar algumas ideias.

── O país que via passar os comboios...
E o puto tinha razão:

── Na ponta final, o Alfa Pendular dá mesmo
Os 210.
Um dia ainda vou ter orgulho na CP.
E na terra onde nasci
E onde nunca vi sequer passar os comboios.
Os comboios não passam na minha terra.
Nem chegam a Viseu.
Um abraço aos Viriatos.
Até para o ano.
Voltarei, se me convidarem,
De Expresso, por esses ipês acima.
Com regresso de comboio.

Se não sabotarem o comboio que pára em Coimbra B.
E prometo ao barman

Que não me esquecerei de Atocha.
Sobretudo não esquecerei Atocha.
Quando voltar a Coimbra B.

Outra vez.
Não esquecerei as bombas de Atocha.
Nem as minas e armadilhas da Ponta do Inglês.

25/3/2004. Revisto nesta data.


_______________

Nota do editor:


Último poste da série > 14 de maio de 2013 >Guiné 63/74 - P11566: Manuscrito(s) (Luís Graça) (2): Humor com humor se (a)paga: RIP... Requiescat In Pace... Lápides funerárias da minha coleção!

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11089: Agenda cultural (254): Uma sugestão do Eduardo Moutinho Santos: Apresentação de "Os media na guerra colonial", tese de dissertação de mestrado da jornalista Carolina Ferreira... Coimbra, Livraria Minerva, sábado,16, 15h30

1. Com pedido de divulgação por parte do nosso camarada Eduardo Moutinho Santos, advogado com escritório no Porto, cofundador da Tabanca de Matosinhos,  e que no dia passado dia 2 festejou as suas 66 primaveras. Mesmo com um atraso de 10 dias, aqui vão 600 alfabravos de toda a Tabanca Grande. [Desculpa. Eduardo, mas esse teu dado biográfico não constava do nossos ficheiros secretos...].

Só há relativamente pouco tempo, em outubro passado, o Eduardo Moutinho Santos, "regularizou os papéis" como residente da Tabanca Grande. Recorde-se que ele foi alf mil  da CCAÇ 2366 (Jolmete e Quinhámel) e cap mil grad. cmdt da CCAÇ 2381 (Buba, Quebo, Mampatá e Empada).

Os Media na Guerra Colonial: A manipulação da Emissora Nacional como altifalante do regime, de Carolina Ferreira

Está prevista para Sábado, dia 16 de Fevereiro, pelas 15H30, na Livraria Minerva Galeria em Coimbra, Rua de Macau, 52 (Bairro Norton de Matos) em Coimbra, a sessão de apresentação do livro, de Carolina Ferreira. Vd. convite em anexo.

A apresentação será feita pela historiadora Isabel Nobre Vargues, que dirige a Colecção"Comunicação,
História e Memória".  E conta ainda com João Sansão Coelho e José Manuel Portugal como oradores convidados, para evocar o Dia Mundial da Rádio (13/2),  olhando para a radiodifusão de ontem, de hoje e de amanhã.

Cpts E Moutinho Santos





CAROLINA FERREIRA:

(i) Nasceu em 1980 em Oliveira do Bairro, cidade onde ainda hoje reside;

(ii) É licenciada em Jornalismo pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC);

(iii) Já a trabalhar, decidiu prosseguir a carreira académica, tendo concluído o Mestrado em Comunicação e Jornalismo da FLUC em 2007, com a dissertação deu origem a este livro;

(iv)  Ainda nos tempos de estudante, colaborou com diversos projectos de media a nível regional, com destaque para a Rádio Universidade de Coimbra:

(v) Mas foi na SIC Notícias que começou a trabalhar em pleno na profissão que a apaixona, com estágio curricular e profissional, entre 2002 e 2003:

(vi) Desde 1 de Outubro de 2003 integra a redacção da RTP em Coimbra, como jornalista de rádio e televisão:

(vii) Entre os directos e as reportagens, a noticiar os acontecimentos com palavras, sons e imagens, é como se sente "em casa":

(viii) Em 2011 recebeu o prémio Rádio "Os Direitos da Criança em Notícia", promovido pelo Fórum sobre os Direitos das Crianças e dos Jovens, com a reportagem "Filhos de Ninguém".

_____________

Nota do editor:

Último poste da série > 9 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11082: Agenda cultural (254): Apresentação dos livros: "Os Resistentes de Nhala", de Manuel Mesquita e "Ultrajes na Guerra Colonial", de Leonel Olhero, dia 14 de Fevereiro de 2013, pelas 16 horas, na Messe de Oficiais, Praça da Batalha - Porto

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Guiné 63/74 - P8631: Convívios (365): I Encontro da CCAÇ 3414, Coimbra, dia 30 de Julho de 2011 (Joaquim Carlos Peixoto)

1.º ENCONTRO DA CCAÇ 3414
SARE BACAR, BAFATÁ

COIMBRA - 30 DE JULHO 2011

Sendo um frequentador assíduo da Tabanca Pequena de Matosinhos e companheiro inseparável dos encontros da Tabanca Grande, onde num e noutro lado, revivo com muita emoção e franca camaradagem a vida passada nesse mundo quase irreal que é a Guiné. Revivendo momentos maus e menos maus que lá passámos, ficava pensativo e com certa mágoa ao recordar os meus camaradas e amigos da CCAÇ 3414 e não nos encontrarmos nem sabermos nada uns dos outros.

Tinha conhecimento que esta e aquela Companhias tinham convívios.
E a C CAÇ 3414?
Nada !!!

Compreendia, que sendo esta Companhia formada na maioria por soldados açorianos (apenas os graduados e os soldados especialistas eram do Continente), havia mais dificuldade em organizar um encontro, mas isso não me satisfazia, nem servia de justificação.

Algo tinha que ser feito. Através do nosso Blogue, mails, sms, net e alguns telefonemas, consegui o contacto do Silva nos Estados Unidos e do Caldeira nos Açores. Com muito empenho, trabalho e alguma sorte conseguimos muitos contactos e marcamos o nosso primeiro encontro para Coimbra no dia 30 de Julho.

Conseguimos contactar com todos os camaradas que residiam no Continente. Apenas quatro não puderam comparecer por motivo de trabalho ou saúde.

No dia marcado parti com o Brito para Coimbra. Como iria ser o nosso primeiro encontro passados trinta e oito anos?

Chegados ao local do encontro (antes da hora marcada) já lá se encontravam alguns camaradas mais apressados e ansiosos. Mas, quem seriam eles? Não reconheci nenhum, apenas o Capitão (hoje Coronel) Ribeiro de Faria. Aos outros, o Chaves, o Silva da secretaria e o Macedo, não os reconheci.

Era impressionante, um a um iam chegando e a chegada de cada um trazia mais emoção e mais alegria. Era uma “granada” de sentimentos, de emoção, era um reviver de situações que nos confundia, que nos animava. Não há palavras para exprimir semelhantes sentimentos.

Que lindo retrato!!!
Parecidos com os periquitos de 1971/73 ?!

Aos poucos foram aparecendo o Zé Maria, Caldeira, Pires, Gomes, Alcides Rocha, Vieira, Neves, Pinto, Coutinho, o Silva Enfermeiro, Abreu, Tavares e Bacalhau. Certamente que não foi bem por esta ordem, mas não recordo exactamente os que chegaram primeiro.

Após os primeiros abraços e as primeiras impressões:
- Já não te conhecia.
-Estás mais gordo.
- Onde está o teu cabelo?
-Tás velho pá.
-Eras metade!
E tantos, tantos comentários.

Dir-se-ia, à primeira vista que nada mudara mas não era bem assim.Explicações que dávamos da vida e situação actual, cruzavam-se com as recordações de outrora.

Depois deste primeiro contacto e acabados os aperitivos, passamos à sala onde iria ser servido o almoço.

Após cada um ter tomado o seu lugar, o nosso “Capitão” (Coronel) Ribeiro de Faria proferiu algumas palavras. Palavras essas de amizade e de reconhecimento. Porém, a emoção traiu-o aquando da lembrança dos camaradas que não regressaram: o Ribeiro e o Parreira. A voz falhou-lhe e a emoção tomou conta dele, e no rosto de cada um, era notória a tristeza e a desilusão dessas perdas.

A refeição decorreu animada e cada um ia relembrando o passado. Em cada rosto estava estampada a alegria.


A sobremesa foi coroada com um bolo onde se destacava a CCAÇ 3414 – OS FALCÕES – LEALDADE E JUSTIÇA.


Sem ninguém se aperceber o Lopes tinha uma surpresa para todos: fomos presenteados com “ Fados de Coimbra”, que fizeram a delícia de cada um de nós.

Também o Alcides Rocha, nos surpreendeu ao oferecer-nos umas garrafas do seu vinho “Aravos”.

Não posso deixar de referir a forma curiosa como o Silva (da secretaria) ia reconhecendo alguns camaradas que iam chegando: Pela maneira de andar, por alguns tiques e por algumas atitudes que tomavam.

Antes da despedida, formou-se uma comissão que irá organizar o próximo convívio em Setembro de 2012 na Ilha Terceira, onde a Companhia foi formada.

O encontro foi registado com várias fotos, e no regresso a casa todos levávamos a alma mais leve, pois partilhamos uns com os outros, as vivências de uma guerra que não era nossa. Recordamos, revivemos e abraçamo-nos com a esperança que outros encontros surgirão.


Foi feito um convite a todos, que ao passarem pelo Norte se juntem na Tabanca Pequena de Matosinhos (às Quartas-feiras).

Obrigado a todos pela vossa presença e pelo bem que fizemos uns aos outros neste convívio

Até sempre.
Joaquim Carlos Peixoto
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8607: Convívios (358): 2º Almoço-Confraternização do BCAÇ 4610/73, 3 de Setembro de 2011 em Pombal (José Romão)

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Guiné 63/74 - P8302: Os nossos camaradas guineenses (31): O José Carlos Suleimane Baldé, ex-1º Cabo At Inf, CCAÇ 12 (1969/74), está em Portugal até 3 de Junho, e quer estar connosco! (Odete Cardoso / Luís Graça)




Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Finete > 1969 > CCAÇ 12 > 4º Gr Comb: Fir Mil At Armas Pesadas Inf Henriques, 1º Cabo At Inf José Carlos Suleimane Baldé e o Sold At Inf Umaru Baldé (apontador do Mort 60)...  Zé Carlos foi o primeiros dos soldados arvorados a ser promovido a 1º cabo (em Setembro de 1969)...  Ambos, o Zé Carlos e o Umarú, pertenciam à 2ª secção, comandada pelo Fur Mil At Inf António Marques, até ao fatídico dia 13 de Janeiro de 1971...


CCAÇ 12 > 4º Gr Comb > 2ª secção (em meados de 1969)
Fur Mil 11941567 António Fernando R. Marques
1º Cabo 17714968 António Pinto
1º Cabo 82115569 José Carlos Suleimane Baldé (Fula)
Soldado Arvorado 82118369 Quecuta Colubali (Fula)
Soldadado 82110469 Mamadú Baldé (Fula)
Sold 82115869 Umarú Baldé (Ap Mort 60) (Fula)
Sold 82118769 Alá Candé (Mun Mort 60) (Fula)
Sold 82118569 Mamadú Colubali (Futa-Fula)
Sold 82119069 Mamadu Balde (Fula)



Foto: © Luís Graça (2005). Todos os direitos reservados






Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xime > Amedalai > 26 de Julho de 2006 > O José Carlos com a família. A Odete Cardoso, esposa do ex-Alf Mil Jaime, é madrinha da filha mais nova do Zé Carlos.

Foto:
© Odete Cardoso (2010). Todos os direitos reservados


1. Duas mensagens recentes da Dra. Odete Cardoso, esposa do nosso camarada Jaime Pereira, ex-Alf Mil da CCAÇ 12 (Mar 71/Dez 72):


(i) Data: 13 de Maio de 2011 21:54
Assunto: Vinda do José Carlos Suleimane Baldé aos almoços da CCAÇ 12


Luís Graça

Regressei esta semana do estrangeiro e ouvi que tentou falar comigo.

Venho com muito gosto dizer-lhe que,  após uma série de vicissitudes relacionadas com a obtenção do passaporte e visto, o José Carlos parte de Bissau a 18 deste mês com chegada a Lisboa a 19 e estará cá até 3 de Junho.

O Jaime já falou com o António Dumas Murta e ficou combinado levar o José Carlos ao vosso almoço pelas 16 h. e  sugeriu a possibilidade de o José Carlos poder estar alguns dias convosco no período da sua permanência em Portugal.

Desta vez, o Vacas de Carvalho vai ser faltoso aos  almoços, pois tem um baptizado de um neto e, assim, perdemos a sua presença tão animada e fadista.

Ao dispor, para falarmos.
Um abraço para si e sua mulher.

Odete Cardoso

ii Data: 19 de Maio de 2011 15:11
Assunto: José Carlos - já chegou

Luis Graça

O José Carlos chegou hoje.  Eu e o Vacas de Carvalho já o levamos ao Mosteiro dos Jerónimos e CCB. 

Ele traz os documentos da sua vida militar na Guiné e pretende saber a que serviço público português se há-de dirigir para indagar se esse tempo lhe dá direito a alguma pensão. Tem alguma informação que lhe possa dar a esse respeito?

Sábado, vai ao almoço? O Jaime levará lá o Zé Carlos.
Um abraço
Odete Cardoso


2. Comentário de L.G.:

O Jaime Pereira, tal como o José Sobral, foi alferes da CCAÇ 12, de rendição individual. Pertencem à chamada 2ª geração. Os outros dois alferes eram o Ferreira e o Florindo Costa. O Jaime, hoje engenheiro e gestor, era o comandante do 4º Gr Comb. O José Carlos Suleimane Baldé era 1º cabo, nesse Gr Comb. Aliás, foi o primeiro dos nossos camaradas guineenses a ascender ao posto de 1º cabo. 

Em 1999, o Jaime Pereira e o José Sobral (que vive em Coimbra, onde é médico estomatologista) foram à Guiné, com as respectivas esposas, e andaram à procura dos antigos militares da CCAÇ 12 do seu tempo. A partir daqui ficaram a corresponder-se com regularidade com o Zé Carlos, que vive em Amedalai, perto do Xime...e que tem uma filha, de seis anos, cuja "madrinha" é a nossa amiga Odete Cardoso.

Há tempos, o J. L. Vacas de Carvalho convidou-nos para uma ida aos fados, numa casa típica onde  ele costuma cantar, em Algés. Éramos quatro casais. Foi nessa altura que eu conheci o Jaime e Odete, mais o Sobral e a esposa (cujo nome não recordo agora). Foi também nessa  noite que soube do projecto, muito acarinhado pela Odete, de trazer o Zé Carlos e a filha, a Portugal, por ocasião de mais um convívio anual da CCAÇ 12 (2ª geração)...

Os quadros da CCAÇ 12, de origem metropolitana, que renderam os "pais fundadores" (Maio de 1969/Março de 1971) são poucos... A CCAÇ 12 (2º geração) já ia ao recrutamento local buscar os cabos, os condutores, os mecânicos, os operadores de transmissões, etc. Na prática, só oficiais e sargentos é que eram da Metrópole, a partir de 1971. 

Logo em 1973, o pessoal (metropolitano) da CCAÇ 12 (2ª geração)  reuniu-se em convívio que se repete todos os anos, até hoje. São poucos mas bons: muitas dezenas duas ou três dezenas, entre antigos combatentes e familiares.

E até agora não foi possível reunir-se com a malta da CCAÇ 2590 (a CCAÇ 12 da 1ª geração), com excepção de um caso ou outro (por ex., o ex-fur mil SAM Victor Alves foi o ano passado ao 16º convívio da malta de Bambadinca, 1968/71, que se realizou em Óbidos, tal como o ex- Cap Inf Celestino Ferreira da Costa, hoje Maj Ref, residente na Trofa).   

Este ano, embora com locais diferentes, os dois grupos reúnem-se em Coimbra, no mesmo dia, 21 de Maio. Aguardo, com expectativa, a oportunidade (única) de estar com os meus camaradas da CCAÇ 12, entre eles o Jaime Pereira o José Sobral e o Victpor Alves (que já conheço), além do Zé Carlos Suleimane Baldé, de quem guardo as recordações mais afectuosas, incluindo a única foto que possuo (com ele).

Vou fazer todos os possíveis para dar um salto a Coimbra ou encontrar-me com o Zé Carlos em Lisboa. Espero que, entretanto, outros camaradas que com ele privaram possam estar com ele, até 3 de Junho, e inclusivamente ajudá-lo nos seus conatactos com a burocracia militar... O que poderemos fazer pelo Zé Carlos ?
____________

Nota do editor:

Último poste da série > 5 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8222: Os nossos camaradas guineenses (30): Cherno Baldé, 4º Gr Comb, 1ª Secção (Comandada originalmente pelo Fur Mil At Inf Joaquim A. M Fernandes), Sold, Ap Metr Lig HK 21, nº mecanográfico 82115269, fula... O mesmo que terá abatido em finais de 1972 o comandante de bigrupo Mário Mendes