Mostrar mensagens com a etiqueta Fantasmas ...e realidades. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Fantasmas ...e realidades. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10941: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (3): A morte, em 24/1/1971, do cap inf op esp Fernando Assunção Silva, 1º comandante da CCAÇ 2796, e meu amigo

1. Mensagem do Vasco Pires, que vive no Brasil, e que foi comandante do 23º Pel Art (Gadamael, 1970/72) [, foto atual, à esquerda]

Assunto: Fantasmas do fundo do baú

Caríssimos Luis Graça/Carlos Vinhal,
Cordiais saudações.

Esta semana, lendo um extrato do diário de uma autora americana, pensei que um blog de ex-combatentes possa ser um lugar adequado para também exorcizar fantasmas.

Quando cheguei em Gadamael, lá pelos meados de 1970, encontrei uma Companhia [, a CART 2478,], em fim de comissão, comandada pelo então Capitão de Artilharia Rodrigues Videira, experiente Oficial, já com várias comissões de serviço. Era generoso, e me ajudou muito com a sua experiência.

Dizia ele que a sorte do ser humano é a memória ser seletiva, e ir atenuando as experiências negativas, logo os eventos positivos sobressaem. Sábias palavras, contudo alguns fantasmas ficam lá no mais recôndito do "baú".

Quarenta anos após, é a momento ideal para relembrar os feitos de guerra e alegrias desse tempo de juventude.
- E os fantasmas? - pergunto eu.

A Companhia de Artilharia foi logo rendida por uma Companhia de Infantaria [, a CCAÇ 2796,] comandada pelo saudoso Capitão de Infantaria Fernando Assunção Silva, intrépido e carismático Oficial. Foram tempos agitados esses, talvez o PAIGC quisesse eliminar Guileje, aniquilando primeiro Gadamael.

O Capitão Assunção Silva comandou sempre magistralmente a reação a todas as flagelações, e ordenava patrulhas regulares, algumas delas comandadas por ele pessoalmente. Pois é, e numa delas aconteceu, um simples disparo de um franco-atirador atingiu-o mortalmente no peito.

Consternação, para mim, além de Comandante, amigo morto.

O remédio que usei, foi o "velho Scotch", errei na dose e virou veneno. Lembrou que ensaiei um discurso provavelmente desconexo, "apaguei", e uma mão generosa me retirou da câmara mortuária.

Naquela noite, os leais e eficientes Furriéis de Artilharia Oliveira e Krus assumiram o comando efetivo do 23° Pel art.

Se eu encontrasse hoje o Capitão Rodrigues Videira, reconheceria que ele estava certo, realmente a memória é seletiva, porém, as excepções à regra, às vezes pesam. (**)

Forte abraço

Vasco Pires [, foto acima, à direita, em São Domingos, no final da comissão, em 1972]
_____________

Notas do editor:

(*) Fernando Assunção Silva, natural de Oliveira de Azeméis, cap inf op esp., comandante da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72), morreu em combate em 24/1/1971. Está sepultado no cemitério de Atouguia, Guimarães (Fonte: Portal Ultramar Terraweb > Mortos do Ultramar > Concelho de Oliveira de Azeméis).

A CCAÇ 2796, independente, foi mobilizada pelo RI 2, partiu para to TO da Guiné em 31/10/1970 e regressou a 5/10/1972. Esteve em Bissau, Gadamael e Quinhamel. Comandantes:  Cap inf  Fernando Assunção Silva e Cap Art  António Carlos Morais da Silva (, este último, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael).

Como escreveu o Morais da Silva no nosso blogue, “avancei no fim de Janeiro de 1971 para o comando da CCaç 2796, em Gadamael, quando da morte em combate do seu comandante, meu camarada de curso e amigo Capitão de Infantaria Assunção Silva. Fiquei, a meu pedido, no comando desta companhia até ao final da comissão em Outubro de 72” . (Vd. poste P6690).

Outras referências à CCAÇ 2796 e ao seu primeiro comandante:

(i) 22 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9936: Memórias da CCAÇ 798 (Manuel Vaz) (9): Uma perspectiva a partir de Gadamael Porto - 65/67 - VII Parte - Evolução da situação militar - Anexo IV

(...) "A  29DEZ70 a [,CART 2478,] era rendida pela CCAÇ 2796 que, nos primeiros tempos em Gadamael, foi severamente atacada pelo PAIGC, tendo sofrido várias baixas, entre os quais, o próprio Comandante da Companhia. O esforço operacional não a impediu de se dedicar à população, construindo 80 casas no Setor Norte do Aldeamento, uma Escola e um Posto Sanitário, na zona de ligação entre os dois setores do Ordenamento, para além de um Heliporto, Casernas e uma nova Reorganização do Terreno. A 1ª foto aérea dá uma ideia do Aquartelamento e das zonas limítrofes, no tempo desta Companhia".  (...)

(ii) 21 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7817: Os nossos médicos (23): Resposta de Morais da Silva (ex-Cap Art, CCAÇ 2796, Gadamael e Quinhamel, 1971/72) a Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Med (CCS/ BCAÇ 2930, Catió, 1970/72)

(...) "A CCaç 2796 foi fustigada de forma brutal nos seus primeiros passos em Gadamael numa primeira tentativa do PAIGC de, indirectamente, eliminar a posição de Guileje (o que veio a conseguir em 1973 por via directa). Sofreu baixas, incluindo o comandante da companhia (24Jan71) e nos finais de Janeiro de 1971 era uma subunidade extenuada psicologicamente. Com muito trabalho de todos, reagiu, recuperou, deixou obra feita (reordenamento, escola, posto sanitário, casernas, organização do terreno) e garantiu a posse de Gadamael, a segurança da população, o apoio logístico a Guileje e a liberdade de movimentos no seu sector. Em suma "Cumpriu a Missão". Não desmereceu do seu primeiro e valoroso comandante de companhia – Capitão Assunção Silva, dos seus restantes camaradas mortos e feridos em combate e da confiança da população que apoiou de múltiplas formas e com quem manteve relações de respeito e amizade." (...)

(iii) 24 de junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6638: Lista alfabética dos 24 capitães que morreram em campanha no CTIG, dos quais 10 em combate, todos comandantes de companhias operacionais (9 Cap QP, 1 Cap Mil) (Carlos Cordeiro)

(...)
- FERNANDO ASSUNÇÃO SILVA : Cap Inf / Cmdt CCaç 2796 / Combate / 24 de Janeiro de 1971 (vd. poste P3451, de 13/11/2008). (...)

(iv)  Ficha de unidade: elementos recolhidos pelo  José Martins (vd. poste P3451, de 13/11/2008)

Companhia de Caçadores n.º 2796

Unidade Mobilizadora: Regimento de Infantaria n.º 2 – Abrantes

Comandantes: Cap Inf Fernando Assunção Silva e Cap Art Carlos Morais da Silva

Divisa: Gaviões

Partida: Embarque em 31 de Outubro de 1970 – Desembarque em 10 de Novembro de 1970

Regresso: Embarque em 5 de Outubro de 1972

Síntese da Actividade Operacional:

(i) Após uma curta permanência em Bissau, seguiu em 27 de Novembro de 1970, para Gadamael e assumiu a responsabilidade do respectivo subsector em 1 de Dezembro de 1970, em substituição da CArt 2478, ficando integrada no dispositivo e manobra do BArt 2865 e depois do BCaç 2930.

Em 1 de Fevereiro de 1972 foi rendida pela CCaç 3518, tendo seguido para Quinhamel, por fracções, em 24 de Janeiro de 1972 e 2 de Fevereiro de 1972. Em 22 de Fevereiro de 1972, rendendo a CCaç 2724, assumiu a responsabilidade do subsector de Quinhamel com destacamentos em Ponte Vicente da Mata, Ome e Ondame, colaborando na segurança e protecção das instalações e das populações e ainda nos trabalhos dos reordenamentos de Blom e Quiuta, na dependência do COMBIS.

Em 5 de Setembro de 1972, foi rendida no subsector de Quinhámel pela CCaç 3326, recolhendo seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

(História da Unidade (Caixa n.º 87 – 2.ª Div/4.ª Secção, do AHM)

O José Martins diz que o cap inf op esp Fernando Assunção Silva, faleceu por ferimentos em combate em Tamabofa (sic). Não encontro este topónimo na carta de Cacoca (que inclui Gadamael). Não seria
Talaiá (, a nordeste de Gadamael Porto) ? Ou Iambambuli (?), a sudeste, junto à limnha de fronteira ?...

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10535: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (2): Como fui parar a Gadamael, por acção do meu pai e reacção do 'Paizinho' ...

1. Mensagem do nosso camarada Vasco Pires, que bebeu a água do Rio Cacine e que, depois da passagem à peluda, deixou a Pátria em 1972, passando a viver desde então nesse grande país lusófono chamado Brasil...

Ficamos a saber que ele conheceu o nosso blogue em circunstâncias infelizes: no "estaleiro", em recuperação das sequelas de um acidente automóvel. 

Daqui de Angola, e com alguns problemas de comunicação com a nossa Tabanca Grande Global, aqui vai um afetuoso abraço para ele, desejando-lhe completa recuperação, e para os demais amigos e camaradas da Guiné, incluindo o Rosinha que está ansioso que eu lhe mande umas fotos da rua e da casa onde ele morou em Luanda...  Infelizmente, regresso já na 5ª feira, sem tempo para sair da "ilha" de Luanda, onde estou "prisioneiro" das 9 às 18h... (LG):


A CAMINHO DE GADAMAEL... Ou como a acção de meu pai e a reação do "Paizinho" me levaram lá.)

Caros Luis Graça/ Carlos Vinhal,

Estas mal traçadas linhas são a minha modesta homenagem à vossa coragem e determinação, para trazer à luz do dia, e administrar, tantas emoções de uma geração, guardadas lá no fundo do subconsciente (Valha- nos "São" Lacan!!!), moderando magistralmente tantas visões de uma realidade multifacetada.

É também uma oportunidade para eu agradecer a todos que me ajudaram a chegar de volta ao Aeroporto da Portela. Não poderia deixar de agradecer também a Maria Helena, que me acompanhou nos anos "pós-Guerra", e criou meus filhos.

Saí de Portugal, ainda no mesmo ano de 72, em que voltei da Guiné, e por aí vou andando até esta data, sou um desses milhões da multissecular diáspora Lusitana, que deve ter começado lá pelo século XV, quando as caravelas jogavam em terra os "lançados", que tinham pegado nas ruas ou tirado das prisões, para na volta servirem de "linguas".

A Artilharia da Guiné era de rendição individual, para oficiais, sargentos e alguns especialistas, sendo soldados e cabos da guarnição local, inexistindo posteriormente essas reuniões que vão alimentando o espírito de corpo, das Companhias e Batalhões. Dificultado o contacto com os camaradas,esses três anos de serviço militar vão ficando no fundo do "baú de recordações".

Após um acidente de automóvel recente, que me obrigou à recuperação em casa , conheci o blog. Então, como a história é mais benevolente com quem a escreve, ousei rabiscar este meu, "A CAMINHO DE GADAMAEL".


Eu venho lá da Bairrada pofunda, que na década de 50 era mais conhecida como terra da batata, ao invés de terra do vinho, o vinho ainda se vendia a granel. Apesar de haver registro de vinhas na região no século XII, a região sofreu por muitos anos da determinaçao do Marquês de Pombal de as arrancar.

O meu pai vinha de um grupo familiar, que se poderia enquadrar no que Gramsci apelida de "intelectuais rurais"; a escola de Samel no fim do século XIX começo do XX, era na casa do meu avô, sendo ele professor, como o foram meu pai e meus tios.

Meu avô materno era filho de comerciante e, como seus irmãos,  emigrou para o Brasil, e ao contrário deles voltou a Portugal, no fim da primeira década do século XX, casou com uma professora, que era duma família profundamente ultramontana, originária da Madeira.

A minha infância e adolescência foi passada em escolas da região, seguida de uma passagem de cinco anos pela efervescente cena Coimbrã da segunda metade da década de 60.

Em 69, saí desse "borbulhar" de novas ideias e atitudes, para a disciplina EPI na "Máfrica" de tantos de nós. Logo começou a minha boa sorte, de ter camaradas, subordinados e superiores que me ajudaram nesta caminhada de três anos pelos quartéis de Portugal e África.

Nesta caminhada de soldado-cadete, apareceu o Raul, que era da Mealhada, professor, com família constituida, e lá rumávamos todo Domingo para Mafra. O Raul era um gordo bem humorado, que fazia todos os exercícios como qualquer atleta, mas comer do rancho já era pedir muito, logo tratou de desarranchar e alugar apartamento, e lá fui eu "no vácuo". E assim foi-se amortecendo o choque da irreverência da Academia Coimbrã, com a disciplina do quartel.

Onde quer que estejas Raul, o meu muito obrigado!

Depois de uma recruta sem grandes altos e baixos, anúncio das especialidades. IOL, mas que raios será isso? e fui ouvindo as mais disparatadas interpretações dessa sigla enigmática. Até que uma alma caridosa explicou que IOL era a sigla de Informação, Observação e Ligação, teoricamente o Oficial que faria a ligação da Artilharia Divisionária com o Comando. Na prática tal como o PCT, Posto de Comando e Tiro, um puxador de cordão de obus.

E lá fomos nós, eu e o Raul , para Vendas Novas, lembro que num Domingó à noite, parámos no caminho, para ver a descida do homem na Lua.

Na EPA, havia dois pelotões, um de PCT e outro de IOL, e se não me falha a memória com entre 30 e 40 alunos somados os dois. O "Jornal da Caserna" informou que quem ficasse nos primeiros lugares duma lista conjunta não iria para África, como era costume. Menos gente, tratamento um pouco melhor, lembro o Tenente Carita, que penso hoje é Coronel Reformado de Artilharia e Professor na Universidade da Madeira. E lá fomos todos, fazendo o nosso melhor, para ficar por lá mesmo (Portugal). Na EPA encontrei o Vinagre de Almeida que tinha sido aluno do meu pai.

Fim de curso e começo do estágio de um mês na própria EPA, já Aspirantes, pelo menos não seríamos praxeados como soldados-cadetes nos quartéis de destino.

Resultados conhecidos, quarto lugar no curso, RAP 3 , Figueira da Foz, comecei a antegozar umas prolongadas férias à beira mar. Chegado ao RAP 3, vários Alferes de cursos anteriores, estava confirmado, minha "Guerra" seria nas areias do Atlântico, mas, do Atlântico Norte. Figueira da Foz, fora de temporada, fácil de alugar apartamento, quando perguntado qual a previsão, falei com segurança: dois anos.

Aí começaram as notícias, Fulano foi para a Guiné, Cicrano para Angola, até aí tudo normal, os últimos colocados sempre eram mobilizados. E a fila continuou andando, até que chegou no décimo colocado, e acendeu a luz amarela, mas ainda tinha seis na frente. Quando o Aspirante Conceição quinto colocado foi chamado, acendeu a luz vermelha, provável dar Atlantico Sul!

Deu Guiné, e lá fomos nós, eu e o Vinagre de Almeida, de barco rumo a Bissau. GA 7, e logo o "Jornal da Caserna", informou em "Primeira Página": Cuidado, o "Homem" é louco, desafiou até o General. O Homem em questão era o famoso "Paizinho", controverso Oficial Superior de Artilharia, com relacionamento díficil com subordinados, bem como com superiores (o General Spínola, tinha-o punido com pena de prisão e tinham um relacionamento tumultuado). Abordava a todos com um "Oh meu filho...", daí a alcunha, era também conhecido como "o Homem da voz meiga", contudo não era nada meigo na hora da punição.

Na semana seguinte à minha chegada, recebi uma ordem através de um oficial, para me apresentar em tal data no Palácio do Governo, sem mais explicações. Nada sabia, e nada pude responder às perguntas, que deviam ter sido feitas por ordem do "Paizinho".

Apresentei-me, na data marcada (não era louco!), por acaso encontrei um conhecido de Coimbra que era Chefe de Gabinete, só disse que o General ia falar comigo. Acalmei, somente quando soube que o General e meu pai tinham amigos comuns, e que ele tinha-me chamado para me dar as boas vindas, e mais não disse. Sim Senhor, Meu General!

Ora o Homem não gostou nada, que o General, com tinha péssimas relações, tivesse chamado um Oficial do seu Comando, sem nada saber. Penso eu, como "prémio", escolheu o pior buraco disponível, que no momento era Gadamael Porto, e lá fui, trocando as "férias" da Figueira da Foz, por aquelas outras à beira do Rio Sapo.

De novo a sorte me acompanhou com relação aos superiores, a quem o comando do 23° Pelart estava subordinado: (Repetindo o que já disse anteriormente),

"Cheguei a Gadamael Porto, lá por meados de 70 para assumir o comando do 23° Pelart, encontrei uma Companhia em fim de comissão, comandada pelo experiente, então Capitão de Artilharia Rodrigues Videira, que me muito me ajudou nos primeiros tempos em zona de guerra. 

"Logo em seguida veio uma Companhia de Infantaria, comandada pelo saudoso Capitão de Infantaria Assunção Silva, morto em combate, generoso e intrépido oficial , que foi substituído pelo então capitão de Artilharia António Carlos Morais Silva, sobre o qual já falei neste blog, como um dos mais brilhantes Oficiais do Exército Português que conheci, nos meus três anos de serviço". 

O mesmo devo dizer dos Sargentos, dedicados e leais:

"O Furriel Miliciano de Artilharia, Lopes de Oliveira, foi professor dos soldados, e além de ser um esforçado cozinheiro, montou uma sofisticada logística, para garantir o abastecimento de carne e peixe com o pessoal da tabanca, e o Furriel Miliciano de Artilharia Krus coordenava com eficiência a atividade operacional do Pelotão".

Assim, pois, a conjugação da acção do meu pai, com a reação do "Paizinho", me levou até Gadamael Porto.

Cordiais saudações, VP

 _____________________


Nota do editor:

Último poste da série de 13 DE OUTUBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10525: Fantasmas do fundo do baú (Vasco Pires) (1): Uma história do artilheiro de Gadamael, à beira da peluda, no 'bem-bom' de São Domingos...

sábado, 13 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10525: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (1): Uma história do artilheiro de Gadamael, à beira da peluda, no 'bem-bom' de São Domingos...




Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > O alf mil art Vasco Pires, ex-alf Mil, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72), nos últimos meses da sua comissão no 'resort' de São Domingos...

Foto:  © Vasco Pires (2012),. Todos os direitos reservados [Editada por L.G.]

1. Mensagem do nosso grã-tabanqueiro Vasco Pires,  tuga da diáspora, a viver no Brasil:

Caros Luis Graça e Carlos Esteves Vinhal,
Cordiais Saudações.
Estou em dívida com o blogue, pois ainda não enviei foto dos tempos da Guiné (*). 

Como eu disse em mensagem anterior, pedi a um parente para procurar essas fotos nos meus pertences que estão em São Paulo, contudo, teve que ausentar-se da cidade, e não pode ainda procurá-las. Me cedeu a foto, que vai anexa, que estava num álbum em seu poder.

Dita foto, acredito eu, é da fase final da minha comissão, três ou quatro meses que passei em São Domingos, na altura sede de um Batalhão de Infantaria (lamentavelmente não lembro o nome do oficial que dirige o jipe). 

Nós,  de rendição individual, por vezes tínhamos que esperar substituto, que normalmente tardava. Ao fim de mais de vinte meses de comissão, a maior parte deles passada em Gadamael, mandaram-me para São Domingos. 

A atividade operacional da artilharia em São Domingos era nula, assim quando cheguei, falei para os Furrieis, que a minha comissão tinha terminado (21 meses), mas faltava o substituto. Eram excelentes profissionais, tomaram conta do Pelotão e respeitaram a minha "aposentadoria" e,  como eu pedi, só me chamariam quando houvesse algum problema, o que nunca aconteceu. 

A minha atividade principal era jogar bridge, o Comandante do Batalhão, um Coronel à beira da reforma, era o mais entusiasta.

Chegados os 24 meses, pedi para o Tenente-Coronel,  2° Comandante, no exercício temporário do Comando do Batalhão de Infantaria, que me liberasse pois a minha hora de voltar já tardava, o que não aconteceu; dizia ele que só me liberaria com a chegada do meu substituto, sendo em vão os meus argumentos de que o Pelotão tinha dois excelentes Furrieis experimentados. 

O máximo que consegui foi autorização para ir a Bissau para ver se conseguia um substituto. Ao chegar ao GAC 7 (ou já seria GA 7?), fui-me apresentar ao Comandante, que acredito era o Coronel Cirne Correia Pacheco, que me recebeu cordialmente, e logo disse que ia mandar-me para casa, ao que eu retorqui:
- Infelizmente, não vai ser possível, porque o nosso Tenente-Coronel disse que é ele que manda, e não vai autorizar.

Vi que tinham sido "santas palavras", pois ele limitou-se a dizer 
- Ah é, ele disse que é ele quem manda ?!
- Sim,  senhor, meu Comandante - ousei dizer. 

Imediatamente ordenou a quem de direito provedenciar os meus papéis.

 Estava eu na sala de espera do Aeroporto de Bissau, quando vejo entrar o Comandante do GAC 7 [ou melhor, GA 7], dirigiu-se a mim e ao meu amigo, na altura Alferes Vinagre de Almeida, que também estava voltando, e depois de responder à nossa saudação, dirigiu-se a mim e disse em tom solene:
- Infelizmente o nosso Tenente-Coronel é quem manda e você tem que voltar!!!

Provavelmente viu que eu tinha mudado de cor, e logo emendou:
- Brincadeira, vim aqui para agradecer, e desejar boa sorte para vocês dois. 

Caro Carlos Vinhal, cá vai uma "estória" ou "causo", como falam aqui no Brasil, da nossa guerra, conforme você pediu na minha apresentação.

forte abraço, VP  [, foto atual à direita].


PS - Caros Amigos Luis Graça/Carlos Vinhal,

Ontem enviei um e-mail, e, procurando no fundo do "baú de recordações", sobre a fase final da minha comissão em São Domingos, disse que no começo de 72, era sede de um Batalhão de infantaria, ou seria um Batalhão de cavalaria?

Desculpem a minha falha mas, como disse anteriormente, saí de Portugal ainda em 72, e a Artilharia na Guiné era de rendição individual, e somente oficiais , sargentos e especialistas, pois praças e cabos eram da guarnição local. Então os contactos com os camaradas se perderam facilmente, e as memórias foram ficando mais diluídas.
forte abraço, VP


_______________

Nota do editor:

(*) 27 de setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10443: Tabanca Grande (362): Vasco Pires, ex-Alf Mil, CMDT do 23.º Pel Art.ª (Gadamael, 1970/72)