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quinta-feira, 11 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19668: José Matos: A guerra das antiaéreas na Guiné (1965/1970) (artigo original publicado na Revista Militar, nº 2601, outubro de 2018)



Um caça Fiat G.91 R/4 dos “Tigres" da Guiné. Crédito: Paulo Alegria


1. Mensagem de José Matos, com data de 31 de março p.p.:

Olá, Luís

Vinha pedir-te mais uma vez para divulgares no blogue um artigo dos meus, que julgo que os leitores vão gostar.


Ab, José Matos.


A GUERRA DAS ANTIAÉREAS NA GUINÉ (1965/1970)

Por José Matos


[Publicado originalmente na Revista Militar, nº 2601, outubro de 2018; cortesia do autor e e do editor]




José Matos [, foto à direita]: Investigador independente em História Militar, tem feito investigação sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial portuguesa, principalmente na Guiné. É colaborador regular em revistas europeias de aviação militar e de temas navais. Colaborou no livro “A Força Aérea no Fim do Império” (Âncora Editora, 2018)]. É membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo mais de 3 dezenas referências no nosso blogue]


No início da guerra na Guiné, em 1963, a fraca ameaça antiaérea permitiu que a Força Aérea Portuguesa (FAP) atuasse livremente em todo o espectro de missões aéreas, sem oposição digna de registo. 

Nessa altura, os guerrilheiros do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) atacavam os aviões portugueses com tudo o que tinham à mão, desde armas ligeiras até lança foguetes RPG 2. A falta de armamento antiaéreo específico era um dos grandes problemas da guerrilha e a situação só começaria a mudar ligeiramente em 1964, com a chegada das primeiras metralhadoras pesadas Degtyarev de 12,7 mm. 

Duas armas destas foram capturadas pelas tropas portuguesas nesse ano [1]. Na mesma altura, a guerrilha também usa uma arma mais leve, a metralhadora SG43 Goryunov de 7,62 mm, montada num suporte móvel, que pode ser usada como arma antiaérea [2], Esta arma tinha um alcance eficaz de 1000 metros na horizontal e 500 metros na vertical e uma cadência de tiro de 600 a 700 tiros por minuto sendo alimentada por uma fita de 250 cartuchos. [3]

No entanto, durante o primeiro ano da guerra, o PAIGC não consegue infligir nenhuma perda à FAP. Todas as perdas que a Força Aérea sofre na Guiné no período 1962/63 são devidas a acidentes ou então a outras causas não relacionadas com fogo antiaéreo. 

Porém, em janeiro de 1964, durante a “Operação Tridente”, na ilha do Como, um T-6 pilotado pelo Alferes Santos Pité é atingido por fogo de terra e despenha-se. Durante esta operação, outros seis aviões são atingidos por fogo da guerrilha, mas sem grandes consequências. Os combatentes do PAIGC mostram-se, no entanto, cada vez mais aguerridos contra a aviação portuguesa. Basta dizer que, nos primeiros noves meses de 1964, são atingidos 44 aviões por fogo inimigo, embora sem consequências e só por duas vezes se observam vestígios possíveis de munições de 12,7 mm. [4] 

Porém, é no litoral sul da Guiné, que a aviação portuguesa vai encontrar a sua maior ameaça na forma de um sistema de defesa antiaérea preparado para defender as chamadas “zonas libertadas”.


Os primeiros ataques à antiaérea do PAIGC

A Força Aérea apercebe-se do problema em finais de 1965 e, rapidamente, o Comando da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG) lança uma operação de ataque para eliminar a ameaça. Em dezembro de 1965, são mobilizados vários meios aéreos para a execução da Operação Resgate. Dois aviões de patrulhamento marítimo P2V5 Neptune vindos da ilha do Sal juntam-se, em Bissalanca, na Base Aérea n.º 12 (BA12), a um C-47 Dakota adaptado para bombardeamentos nocturnos, doze T-6G, um Dornier Do-27 e a um Alouette III [5].


A operação começa na noite de 17 de dezembro, com o sobrevoo das posições da guerrilha na zona de Cafine pelo C-47 e o lançamento de granadas iluminantes. A guerrilha responde de imediato com fogo antiaéreo, sendo então bombardeada pelos P2V5 equipados com bombas de 750 libras (325 kg). Os bombardeamentos continuam ao longo da noite em mais 3 vagas de ataque e prolongam-se na noite de 19 de dezembro, embora aí já sem resposta da guerrilha, tendo a operação terminado a 20 de dezembro [6]

Embora a reacção antiaérea tenha sido significativa, há apenas a registar, durante a operação, dois impactos em dois T-6G e um impacto num P2V5, em ambos os casos sem consequências [7]. No entanto, a operação terrestre que deveria complementar esta ofensiva aérea (“Operação Safari”) corre mal. A operação é lançada nos primeiros dias de janeiro de 1966, com forças do Exército apoiadas por pára-quedistas e fuzileiros, na zona de Cafine, onde a Força Aérea tinha actuado antes. Porém, as forças portuguesas são repelidas pela guerrilha, que se mostra bem implantada nessa zona [8]. 

O próprio Do-27 que fazia de PCV (Posto de Comando Volante) é atingido pelo fogo dos guerrilheiros, ficando ferido o oficial que estava a bordo. No rescaldo da operação, o comando militar em Bissau reconhece que os meios existentes na Guiné não são suficientes para controlar o Cantanhez e que o PAIGC domina a região [9]. Mesmo assim, a Força Aérea desenvolve, em março desse ano, mais uma operação no Cantanhez (Operação Mercúrio), aproveitando a ausência de fogo antiaéreo [10]. Durante o resto do ano, o objectivo de grande parte das operações continuará a ser o litoral sul da Guiné, tanto a zona do Cantanhez e Quitafine, como os corredores de abastecimento, sendo o de Guileje o mais importante.



A chegada dos Fiat


Em meados de 1966, a BA12 recebe um reforço importante: os primeiros jactos Fiat G.91 R/4 [. Com a chegada do pequeno caça italiano, a Força Aérea Portuguesa (FAP) na Guiné passa a dispor de um novo meio de combate capaz de actuar rapidamente em qualquer parte da colónia. Além disso, os novos caças, devido à rapidez e ao poder de fogo, podem actuar mais eficazmente contra posições antiaéreas da guerrilha, reduzindo assim a ameaça antiaérea. Os novos jactos são recebidos com grande entusiasmo pelas chefias militares.


São atribuídos oito jactos Fiat à BA12 (números de série 5401-4, 5406-7 e 5417-8) e nomeados os respectivos pilotos e, no começo de maio de 1966, os G.91 5402 e 5406 fazem o primeiro voo de teste na Guiné. No entanto, serão precisos sete meses até o oitavo avião (5418) ficar pronto para voar, o que acontece em novembro desse ano. 

Os primeiros sobressalentes chegam a Bissalanca apenas a 30 de agosto, sendo o seu fluxo tão fraco que o G.91 5406 tem de ser canibalizado em benefício dos outros aviões. Mesmo assim, os primeiros Fiat aptos a voar têm já o tempo limite de inspecção da cadeira Martin-Baker expirado e enfrentam também a falta de porta-bombas e de lançadores de foguetes, assim como um baixo quantitativo de bombas no paiol da base, o que restringe a actividade dos aviões praticamente ao metralhamento.


Figura 1 – Um caça Fiat G.91 R/4 dos “Tigres” da Guiné.
Crédito: Paulo Alegria


A actividade operacional dos G.91 na Guiné é assim fortemente limitada por uma série de problemas de ordem logística e também de armamento[12]. Apesar destes problemas, os jactos começam imediatamente a ser empregues em missões ofensivas, sendo a “Operação Estoque”, a primeira onde participam activamente. Esta operação começa a 9 de agosto, no Quitafine, com bombardeamentos nocturnos usando o C-47 adaptado e prossegue, durante o dia, com os Fiat a atacarem posições antiaéreas. 

Nessa altura, a guerrilha tinha já ao serviço a ZPU-4 de 14,5 mm e dois Fiat são atingidos no dia 11 de agosto. A operação continua no dia 12 de agosto com mais bombardeamento nocturno pelo C-47, acabando nesse dia[13].


Outra zona que continua a preocupar o Quartel-general em Bissau é o Cantanhez, onde o PAIGC continua activo, atacando a navegação no rio Cumbijã, entre Cafine e Cadique. Para acabar com esses ataques, a Força Aérea lança mais uma operação na zona, a “Operação Valquíria”[14]. Esta operação foi desencadeada a partir de 19 de dezembro de 1966 e envolveu o C-47 (6155) em operações nocturnas, além dos Fiat e dos T-6, em bombardeamentos diurnos. A operação durou dois dias e duas noites, tendo a aviação envolvida efectuado 25 missões e 74 horas de voo[15].

Desta forma, ao longo de 1966, a zona de maior empenhamento da FAP é, sem dúvida, o sul da Guiné com operações na ilha do Como, Cantanhez e Quitafine. Destas três zonas, o Quitafine era onde a guerrilha estava mais fortemente implantada e oferecia maior resistência à acção da Força Aérea[16].



A 12 de janeiro de 1967, o Comando da ZACVG muda de mãos. O Coronel Krus de Abecasis termina a sua comissão e é substituído pelo Coronel Rui da Costa Cesário. O novo comandante segue a política do seu antecessor, apostando em operações de curta duração com recurso à aviação e a forças especiais (pára-quedistas).



Figura 2 – Foto de reconhecimento aéreo tirada pelo Fiat G.91 na “Operação Barracuda”. As marcas no solo são os covis de alojamento dos cunhetes da arma antiaérea.
Crédito: Arquivo da Defesa Nacional - ADN/F2/102/326/11



Neste âmbito, podemos destacar a “Operação Barracuda”, em fevereiro de 1967, na zona envolvente da mata Gã Formoso, executada por forças pára-quedistas com o apoio da aviação. A zona em questão era usada pela guerrilha para atacar aeronaves em aproximação a Bissalanca, o que afectava a utilização do espaço aéreo pela aviação portuguesa[17].




Figura 3 – Uma metralhadora antiaérea Degtyarev de 12,7 mm capturada durante a “Operação Barracuda”, em 1967.
Crédito: Arquivo da Defesa Nacional - ADN/F2/102/326/11


Para resolver o problema, a ZACVG lança uma operação de heli-assalto às posições da guerrilha. Esta operação é antecedida por voos de reconhecimento efectuados pelo Fiat G.91 a baixa altitude, que permitem identificar a posição da arma antiaérea usada pelos guerrilheiros junto a uma pequena tabanca. Neste caso, as fotos realizadas pelos aviões são tão pormenorizadas que chegam ao ponto de exibir as marcas do apoio do tripé da arma no solo, bem como os covis de alojamento dos cunhetes da antiaérea (ver figura 2). 

Com as posições antiaéreas devidamente identificadas é então desencadeada uma forte ofensiva aérea com aviões Fiat e T-6G de forma a paralisar a reacção antiaérea (AA), permitindo depois o assalto dos pára-quedistas[18]. O ataque mobilizou seis Fiat G.91, onze T-6G, sete helicópteros Alouette III e um avião ligeiro Do-27. Nas fotos estavam referenciadas duas posições com antiaéreas que são atacadas directamente pelos Fiat, enquanto os T-6 atacam as áreas adjacentes à mata com o objectivo de destruir as instalações de apoio aos guerrilheiros. A operação é bem-sucedida, provocando a fuga dos guerrilheiros e a captura de algum armamento ligeiro, além de uma metralhadora pesada instalada nas margens do rio Geba[19]. 

A acção mostrou também a utilidade dos voos de reconhecimento fotográfico efectuados pelo Fiat que vão ser úteis ao longo da guerra para identificar muitas das posições antiaéreas do PAIGC.


A primeira perda

Pouco dias depois do êxito obtido nesta operação, a Força Aérea perde o primeiro G.91 na Guiné, quando, a 22 de fevereiro, durante um ataque a uma posição antiaérea na região de Gã Pedro, um Fiat (5407) pilotado pelo Major Santos Moreira é atingido por estilhaços de uma das bombas de 200 kg que explode prematuramente. O piloto não consegue ejectar-se imediatamente e tenta regressar à base com o avião danificado, com o apoio do seu asa, o Tenente Egídio Lopes, mas é obrigado a ejectar-se antes de alcançar Bissalanca[20]. 

Nesta altura, é evidente que a principal ameaça aos aviões portugueses é o dispositivo antiaéreo no Cantanhez e no Quitafine, embora a guerrilha tenha também capacidade antiaérea noutras zonas da Guiné. A 28 de maio, por exemplo, um G.91 é atingido na zona de Cafale, a norte de Bissau, por fogo antiaéreo, mas sem grandes consequências. O mesmo acontece a dois T-6, que são alvejados pelas mesmas armas, mas sem consequências[21]. 

No início de agosto, o Capitão Fernando de Jesus Vasquez substitui o Capitão Costa Pereira no Comando da Esquadra 121 (Fiat e T-6) e acumula, também temporariamente, o comando do Grupo Operacional 1201 (GO1201), até à chegada, no final do mês, do Tenente-coronel Costa Gomes.



Os novos comandantes vão concentrar a sua acção na península do Quitafine, na altura classificada como Zona Livre de Intervenção da Força Aérea do Quitafine (ZLIFAQ), pois não existiam operações terrestres na zona, o que permitia a livre acção dos meios aéreos. A 10 de outubro de 1967, um Fiat pilotado pelo Capitão Vasquez é atingido por uma arma de 12,7 mm em Cassumba (Quitafine), quando fazia um passe de metralhamento. O jacto é atingido por dois projécteis, no entanto, consegue voltar à base. A posição AA é então atacada por outros aviões Fiat com bombas de 200 kg e bombas incendiárias, sofrendo o impacto directo das bombas[22].




Falta de caças


A eliminação da ameaça antiaérea no Quitafine torna-se assim uma prioridade para a Força Aérea, que vai empenhar-se fortemente nesse objectivo, nos meses seguintes, embora tenha falta de caças Fiat. 

O problema é apresentado em outubro de 1967, ao Secretariado-Geral da Defesa Nacional, depois de Amílcar Cabral ter dito que o Quitafine era uma região completamente libertada. O ministro da Defesa, o General Gomes de Araújo, considera que o problema tem de ser resolvido pela Força Aérea[23].  A FAP na Guiné defende-se dizendo que prepara frequentemente missões do Fiat para aquela zona, mas que precisa de mais caças para manter uma acção eficiente no Quitafine.

Uma análise da actividade dos G.91, na ZLIFA do Quitafine, de abril a meados de outubro de 1967, mostra uma média de dois a três aviões prontos por dia, afectados diversas vezes, durante esse período, por más condições meteorológicas devido à época das chuvas[24]. Contudo, mesmo com poucos caças prontos, a Força Aérea não desiste e desenvolve um programa de acção compreendendo missões de reconhecimento visual e fotográfico (RVIS e RFOT) da área do Quitafine para localização das posições AA, estudo das melhores rotas de aproximação aos alvos detectados, escolha do armamento a utilizar em função do tipo de ataque e concentração de armas AA, além das missões a desencadear para avaliar as condições dos alvos depois dos ataques e da escolha de áreas de ejecção e recuperação de tripulações[25]. 

Em finais de outubro, os Fiat fazem uma missão RFOT na zona, usando depois a informação recolhida para um ataque com bombas incendiárias contra uma posição AA, que é destruída[26]. Os alvejamentos continuam e, a 24 de novembro, três G.91 atacam outra posição AA em Canefaque (Quitafine) com bombas de 200 kg, conseguindo destruí-la[27]. 

O PAIGC não desiste e continua a tentar impedir o acesso da FAP ao extremo sul da Guiné, o que obriga os Fiat da BA12 a desencadearam uma série de ataques maciços, em janeiro e fevereiro de 1968, que desarticulam o dispositivo AA montado no Quitafine. Os guerrilheiros recuam então para a Guiné-Conakry e é partir daí que atacam aviões envolvidos em operações junto à fronteira.

Um Fiat abatido

No dia 28 de julho, os guerrilheiros conseguem, pela primeira vez, abater um Fiat (5411) usando armas de 12,7 mm. O caça, pilotado pelo comandante do grupo, o Tenente-coronel Costa Gomes, executava uma missão de RFOT na fronteira sul da Guiné para detectar posições AA, quando é atingido pelo fogo antiaéreo, obrigando o piloto a ejectar-se perto do aquartelamento de Gandembel, onde foi recuperado[28]. 

No entanto, apesar deste abate, os SITREPS (relatórios de situação) da ZACVG referem, constantemente, a partir de março de 1968, a ausência de reacção AA na zona do Quitafine. A região passou, então, a ser sobrevoada pelos caças portugueses sem qualquer restrição. Em setembro desse ano, o Comando da Zona Aérea passa para as mãos do Coronel Diogo Neto.


Porém, no final de 1968, em dezembro, a ameaça antiaérea voltaria ao Quitafine, mais concretamente a Cassebeche. De facto, em fins desse ano, é referenciada por uma parelha de Fiat G.91, uma ZPU-4 de 14,5 mm instalada no centro da antiga tabanca de Cassebeche. No entanto, o ataque contra esta posição AA é adiado com o intuito da guerrilha instalar mais meios na zona, para que um ataque futuro fosse mais rentável em termos de destruição e captura de armas, embora os Fiat continuem a actuar noutras zonas, como em Sangonhá, perto da fronteira com a Guiné-Conakry. A 6 de janeiro, uma parelha de caças é alvejada nesta zona por uma arma de 14,5 mm, que dava cobertura a um ataque diurno do PAIGC contra o quartel de Gadamael. 

Provavelmente, os guerrilheiros estariam a fazer um filme de propaganda usando o ataque a Gadamael para ilustrar a acção da guerrilha. Um erro que vão pagar caro. Nesse mesmo dia, quatro Fiat G.91 bombardeiam a posição com bombas de 200 kg e 50 kg, detectando, no decorrer da acção, a presença de dois canhões anticarro de 57 mm junto à arma AA. 

Três dias depois, tropas portuguesas de Gadamael dirigem-se ao local confirmando a destruição da arma antiaérea e danos nos canhões anticarro, além de várias baixas entre os guerrilheiros (16 mortes)[29].Durante os meses seguintes não se volta a verificar qualquer reacção AA da guerrilha, a não ser em março, no Cassebeche, durante a “Operação Vulcano”.




"Operação Vulcano"


Esta operação é desencadeada no início de março envolvendo, além dos meios aéreos da BA12, duas companhias de pára-quedistas, cada uma com cerca de 120 militares, que deviam executar um heli-assalto às posições do PAIGC em Cassebeche. 

No entanto, por opção do Comandante-Chefe, o General Spínola, foi decido empenhar inicialmente apenas uma companhia, comandada pelo Capitão Silva Pinto. Os pára-quedistas seriam transportados para o local da acção em Alouette III, em duas vagas de 40 elementos (5 em cada AL-III) mantendo-se em Catió, na retaguarda, uma reserva de mais 40 pronta a intervir, se necessário[30].

A operação começa a 6 de março, com o transporte dos pára-quedistas em C-47 de Bissalanca para Catió. No dia seguinte, três Fiat G.91 pilotados pelo Coronel Diogo Neto, pelo Capitão Jesus Vasquez e pelo Tenente Cruz, descolam da BA12, logo pela manhã, rumo ao Cassebeche. Um Do-27 armado com foguetes e dois helicópteros Alouette III com canhões de 20 mm também estão no ar para garantirem o apoio de fogo aos “páras”. 

São 11 minutos de voo até os Fiat chegarem aos alvos, onde encontram pelo menos sete posições AA activas, seis metralhadoras de 12,7 mm e uma ZPU-4 de 14,5 mm. O alvo principal é a ZPU que é destruída pelo Capitão Vasquez, sendo também atingida uma das metralhadoras de 12,7 mm. Pouco tempo depois, os helis colocam as duas vagas de pára-quedistas no terreno e uma parelha de Fiat efectua um segundo bombardeamento silenciando mais uma arma de 12,7 mm, no entanto, os pára-quedistas começam a encontrar forte resistência no terreno com metralhadoras pesadas e lança-foguetes RPG 2 e RPG 7. Perante a resistência encontrada, é decidido empenhar a reserva de prontidão em Catió.



Figura 4 – Guerrilheiros do PAIGC com uma arma antiaérea ZPU-4 de 14,5 mm, de origem soviética.
Crédito – Arquivo Amílcar Cabral/Fundação Mário Soares


Durante o resto da manhã, os Fiat efectuam mais alguns ataques às posições AA ainda activas, sendo dois caças atingidos, mas sem consequências de maior. No entanto, dos sete caças disponíveis na BA12, restam agora cinco operacionais. Durante a tarde, mais ataques aéreos são efectuados, o último com bombas incendiárias, tentando neutralizar uma das metralhadoras de 12,7 mm, mas sem êxito. No solo, os pára-quedistas estão encurralados e em sérias dificuldades, devido ao fogo da guerrilha. Os helicópteros armados ficam impotentes perante as baterias antiaéreas do PAIGC. Face à impossibilidade de dominar as posições da guerrilha, sem um grande número de baixas, é decidido retirar os “páras” do terreno, o que acontece ao meio da tarde[31]. No rescaldo da operação, parece que Spínola reconhece o erro de não ter empenhado logo inicialmente as duas companhias de pára-quedistas na operação e Diogo Neto percebe que, no futuro, “em casos semelhantes, o melhor é atacar de imediato com os meios aéreos e só depois comunicar superiormente o facto” [32].

Figura 5 – Metralhadora pesada ZPU-4.

Crédito – Paulo Alegria



No saldo final da operação, há a registar três aviões atingidos (2 Fiat e 1 Do-27), embora tenham sido neutralizadas cinco armas AA (1 ZPU-4 e 4 AA de 12,7 mm) e isto sem nenhuma baixa do lado português. Os Fiat fizeram nove ataques ao longo do dia[33].Quanto aos sete pilotos de G.91, tinham efectuado vinte saídas. O armamento utilizado cifrava-se em 22 bombas de 200 kg, 44 bombas de 50 kg, 4 incendiárias de 350 litros, 48 foguetes FFAR de 2.75 pol. e alguns milhares de munições de 12,7 mm, o que representava um esforço considerável no magro arsenal da BA12[34].

No dia seguinte, a 7 de março, uma parelha de Fiat vai a Cassebeche e efectua um voo RVIS na zona e verifica que os guerrilheiros tinham retirado todas as armas. Mais tarde, foi possível perceber, pela intercepção de várias mensagens do PAIGC, de que as baixas da guerrilha tinham sido de 19 mortos e 32 feridos e que Amílcar Cabral tinha mandado abrir um inquérito para apurar o que se tinha passado “no desastre de Cassebeche”[35]. 


Durante o resto do ano, não se verifica praticamente reacção AA da guerrilha.



Canhões antiaéreos

Os guerrilheiros só voltam a aparecer no Cassebeche em janeiro de 1970, tendo, a 20 de janeiro, flagelado alguns caças Fiat, mas sem consequências. Em resposta, o Comando da Zona Aérea desencadeia a “Operação Cravo Azul”, que elimina as posições AA do PAIGC, no Cassebeche[36]. Ainda nesse ano, registam-se alguns alvejamentos da guerrilha contra os G.91, noutras zonas da Guiné, nomeadamente em março, maio, junho, setembro e novembro, mas nada de significativo. 


O único facto relevante é a introdução na Guiné, em finais de junho de 1970, de canhões antiaéreos de 37 mm, que são usados na região de Sare Morso, junto à fronteira da Guiné-Conakry, contra os Fiat, durante a “Operação Pérola Azul”. É então planeado um ataque para a eliminação destes canhões, que são destruídos pelos caças da BA12[37]. Estas armas só voltariam a surgir novamente, na fronteira sul da Guiné, em maio de 1972, alvejando então uma parelha de Fiat na zona da Cacoca, mas sem consequências para os caças[38] 

Num balanço global, podemos ver pelo gráfico da figura 6 que as acções contra aeronaves são expressivas até 1966, registando, a partir daí, um decréscimo significativo até 1970. Daí para a frente, a reacção antiaérea do PAIGC é pouco significativa senão mesmo residual, não estando representada no gráfico. O pico que observamos em 1964 deve-se, em grande parte, à “Operação Tridente”, no arquipélago do Como. Muitas destas acções acontecem no sul da Guiné, onde a guerrilha era mais activa[39].



Figura 6 – Distribuição das acções antiaéreas da guerrilha contra os aviões portugueses.


Em suma, podemos concluir que a eliminação sistemática das armas antiaéreas do PAIGC, durante a guerra das antiaéreas, tornou a guerrilha incapaz de restringir a liberdade de acção dos meios aéreos portugueses, que continuaram a actuar por toda a Guiné, sem grande oposição. Esta impotência perante a aviação portuguesa levaria Amílcar Cabral a procurar uma nova arma antiaérea junto dos soviéticos. Esta nova arma seria o míssil Strela 2-M, que chegaria à Guiné em março de 1973, já depois da morte do líder do PAIGC.

O autor agradece ao Arquivo da Defesa Nacional (ADN) as facilidades concedidas para esta investigação. Ao Tenente-general Fernando de Jesus Vasquez, ao Tenente-general José Nico e ao Comandante Egídio Lopes agradece a leitura e comentários. Ao Paulo Alegria as ilustrações para este trabalho. Ainda um agradecimento especial à Fundação Mário Soares pela cedência das fotos do Arquivo de Amílcar Cabral, disponíveis em casacomum.org.

Para efeitos de publicação no blogue, com a devida vénia ao autor, José Matos, e ao editor, a Revista Militar, procedeu-se a revisão e fixação do texto por parte do editor LG]
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Notas de rodapé:

[1] Anexo K do SUPINTREP n.º 35, Repartição de Informações do COMCHEFE/Guiné, Bissau, 20 de abril de 1971, Arquivo da Defesa Nacional ADN F2/SR007/SSR1/61/35.

[2]  Ibidem.

[3]  Nota n.º 79/NI/201.41 da 2ª Repartição do Estado-Maior do Exército, ADN/F2.2/100/393.

[4]  Estudo sobre as Possibilidades e Limitações do Apoio Aéreo na Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, setembro de 1964, Espólio do Tenente-general Barbeitos de Sousa, Cx. 183-7, Arquivo Histórico da Força Aérea (AHFA).

[5]  Sitrep nº 352/65 da ZAVERDEGUINE, 19 de dezembro de 1965, ADN/F2/105/347/13.

[6]  Abecassis, Krus José, Bordo de Ataque. Memórias de uma caderneta de voo e um contributo para a História, 2º volume, Coimbra Editora, 1985, pp. 487-494.

[7]  Sitreps n.º 354/65 e 355/65 da ZAVERDEGUINE, de 20 e 21 de dezembro de 1965, ADN/F2/105/347/13.<

[8]  Baêna, Luís Sanches de, Fuzileiros, Factos e Feitos na Guerra de África 1961/1974, Crónica dos Feitos na Guiné, Comissão Cultural da Marinha, Edições Inapa, 2006, pp. 63-64.

[9]  Abecasis, op. cit., pp. 502-507.

[10] Abecasis, op. cit., pp. 518-519.

[11] Abecasis, op. cit., p. 524.

[12] Relatório do Comando da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné para Estado-Maior da Força Aérea, Assunto Actividade Operacional dos G-91, 25 de março de 1967, Serviço de Documentação da Força Aérea/Arquivo Histórico SDFA/AHFA/SEA, Guiné 1964-1974/Fiat, Processo 430.121.

[13] Abecasis, op. cit., pp. 556-562.

[14] Abecasis, op. cit., pp. 608-609.

[15] Abecasis, op. cit., pp. 609-610.

[16] Abecasis, op. cit., p. 611.

[17] Directiva n.º 1/67 do COMZAVERDEGUINE, 3 de fevereiro de 1967, ADN/F2/102/326/11.

[18] Ibidem.

[19] Relatório da “Operação Barracuda” do COMZAVERDEGUINE, 7 de fevereiro de 1967, ADN/F2/102/326/11.

[20] Informação n.º 84 da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Acidente com o avião Fiat G-91 n.º 5407 em 22 de fevereiro de 1967, Lisboa, 19 de junho de 1967, SDFA/AH.

[21] Sitrep Circunstanciado nº 4/67 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 31 de maio de 1967, ADN/F2/16/90.

[22] Sitrep Circunstanciado n.º 23/67 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 31 de maio de 1967, ADN/F2/16/90.

[23] Ofício n.º 3170/B do Secretariado-Geral da Defesa Nacional para o Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Guiné – Necessidade em aviões, s.d. ADN/F2/92/309/14.

[24] Ofício n.º 2977/C/67 do Comando-Chefe da Guiné para o Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Assunto: PAIGC – Amílcar Cabral, 19 de outubro de 1967, ADN/F2/92/309/14.

[25] Informação prestada pelo Tenente-general Jesus Vasquez, em 1 de agosto de 2013.

[26] Sitrep Circunstanciado n.º 26/67 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 31 de maio de 1967, ADN/F2/16/90.

[27] Sitrep Circunstanciado n.º 31/67 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 31 de maio de 1967, ADN/F2/16/90.

[28] Sitrep Circunstanciado n.º 31/68 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 31 de maio de 1967, ADN/F2/16/90.

[29] Sitrep Circunstanciado n.º 01/69 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 8 de janeiro de 1969, ADN/F2/16/90.

[30] Neto, Manuel Diogo, Operação Vulcano, Cassebeche, 7 de Março de 1969, Revista Mais Alto nº 257, Jan/Fev. 1989, p. 16.

[31] Neto op. cit., pp. 16-18.

[32] Neto op. cit., p. 18.

[33] Sitrep Circunstanciado n.º 10/69 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 10 de março de 1969, ADN/F2/16/90.

[34] Neto, op. cit., p. 19.

[35] Neto, op. cit., p. 19.

[36] Sitrep Circunstanciado n.º 04/70 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, 26 de janeiro de 1970, ADN/F2/SSR.002/81.

[37] Sitrep Circunstanciado n.º 26/70 e 27/70 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, junho/julho de 1970, ADN/F2/SSR.002/85.

[38] Sitrep Circunstanciado n.º 22/72 do COMZAVERDEGUINE, Bissau, maio de 1972, ADN/F2/SSR.002/81.

[39] Anexo H do SUPINTREP n.º 35, Repartição de Informações do COMCHEFE/Guiné, Bissau, 20 de abril de 1971, ADN F2/SR007/SSR1/61/35.

sábado, 10 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18400: (Ex)citações (331): Os problemas no CTIG logo em 1963: memórias de cá e de lá (Jorge Araújo)


Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Julho de 1973 > Estrada Xime-Bambadinca >  Ponte do Rio Udunduma: imagem de um buraco aberto no chão, coberto de troncos de palmeira, terra e chapas de zinco a cobri-los, protegido no exterior com bidões de gasóleo cheios de terra, com uma pequena abertura, tendo no seu interior uma cama de ferro, com colchão, do mobiliário militar. Este buraco foi o meu “quarto” durante alguns meses… 


~
Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Julho de 1973 >  Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, na estrada Xime-Bambadinca. Imagem do 'condomínio fechado'. 


Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Agosto de 1973 >  Rio Udunduma, na Estrada Xime-Bambadinca > Plano de água incluído no Destacamento da Ponte… Creio que o canoísta é o camarada José Sebastião.



Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Setembro de 1973 >  Imagem de parte da parada do aquartelamento de Bambadinca, onde estava sedeado o comando do BART 3873 e a sua CCS, e que distava 4 kms do Destacamento da Ponte do Rio Udunduma (contrastes da/na guerra). 


Fotos (e legendas): © Jorge Araújo (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 

(Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do blogue desde março de 2018



OS PROBLEMAS NO CTIG LOGO EM 1963: 

Memórias de cá e de lá


1. INTRODUÇÃO
As rotinas da minha continuada actividade operacional, constituídas por missões/ acções de obrigatória responsabilidade diária, têm-me impedido de dizer “presente no imediato” aos apelos do Blogue da Tabanca Grande (BTG), como eu gostaria que acontecesse. Mas, logo que a agenda o permite, lá vou ordenando algumas letras que funcionam, também, como “prova de vida”.

Assim, o caso em apreço relacionado com o tema em título, ainda que com algum atraso, levou-me a optar por uma triangulação entre memórias pessoais de cá e de lá, contributos já divulgados no nosso Blogue e trabalhos de investigação que começam a surgir, com mais frequência, sobre esta problemática.




Dito isto, espero contar com a vossa benevolência pelo facto de repetir algumas ideias expressas anteriormente nos trabalhos citados, a começar pela investigação histórica elaborada pelo nosso amigo José Matos, também ele membro da Tabanca Grande, e que aqui foi reproduzida em duas partes [P15795 e P15796], e já publicada na Revista Militar n.º 2566 de Novembro p.p., com o título “O início da Guerra na Guiné (1961-1964)”.

O artigo da autoria de José Matos acabou por suscitar o interesse e o elogio dos que sobre ele se manifestaram, levando cada qual a produzir o seu comentário de acordo com a sua perspectiva, sinal de que o tema [digo eu] continuará em aberto.



Porém, o principal destaque recaiu na avaliação feita pelo Coronel Fernando Louro de Sousa, na qualidade de novo Comandante-Chefe da Guiné nomeado em finais de 1962 pelo Governo de Lisboa (Oliveira Salazar), mas que só em 20 de Março de 1963 chegaria a Bissau, dois meses depois do ataque ao Aquartelamento de Tite, em 23 de Janeiro, considerado por todos os intervenientes [incluindo a literatura] como a data do início do conflito armado naquele território ultramarino.

Seis meses após ter iniciado as suas funções, exclusivamente como Comandante-Chefe, apresenta em Lisboa, em 4SET1963, uma exposição da situação ao Conselho Superior Militar, enumerando um conjunto de problemas que dificultavam a resposta das NT ao esforço de contra-subversão, a saber:

(i) Deficiente instrução das tropas e quadros;

(ii) Deficiente equipamento das unidades no terreno;

(iii) Falta de pessoal / insuficiência de efectivos;

(iv) Abastecimento (material, munições, víveres e água);

(v) Falta de enquadramento / aproveitamento militar dos guineenses;

(vi) Instalações inadequadas;

(vii) Cansaço das NT, sempre ansiosas por acabar a comissão e voltar para a metrópole.



2. ENTRE AS MEMÓRIAS DESSA ÉPOCA E AS MINHAS


A eclosão do conflito armado na Guiné que, mau grado, acabaria por ser o meu destino nove anos depois, na condição de combatente miliciano, tem lugar quando tinha somente doze, ou dez anos se considerar o início da insurreição armada em Angola, em 15MAR1961, realizada pela UPA [União dos Povos de Angola], desconhecendo por completo, na época, o que estava na génese de cada uma, apenas gravando o conceito “Guerra do Ultramar”, com que foi baptizado.

Frequentava, então, o Liceu Camões, a segunda escola pública a ser construída em Lisboa, na Praça José Fontana, e inaugurada em 16OUT1909, sendo a primeira o Liceu Passos Manuel, em 1836, e que na sequência do «25 de Abril de 1974» passou a designar-se por Escola Secundária de Camões, mudança de nome verificada, aliás, em todos os Liceus existentes nessa época.

Nesse período o que mais me marcou e que ainda hoje retenho daqueles ambientes carregados de emoção, muitas lágrimas e uma mancha humana acenando com lenços brancos, foram as imagens dos embarques, no cais da Rocha Conde de Óbidos, dos diferentes contingentes de militares zarpando rumo a Luanda, Bissau ou Lourenço Marques, então mais velhos do que eu nove/dez anos.



Lisboa > Cais da Rocha > 1963 (há mais de meio século) >  Imagem (cinzenta como o ambiente) que se viria a tornar banal em Lisboa, uma vez que passou a ser repetida tantas vezes quantos os embarques dos contingentes com jovens milicianos (combatentes) realizados com destino a um dos três Teatros de Operações (Angola, Guiné ou Moçambique). E foram largas centenas. Era o momento da despedida reciproca e que para alguns foi para sempre… lamentavelmente. A partir de 1971, passou a ser utilizado, também, o transporte aéreo através da FAP, por ser mais rápido, cómodo e económico quando comparado com o marítimo (foto de autor desconhecido).



Entretanto, a avaliação provavelmente empírica de Louro de Sousa deveria ser reflexo daquele que terá sido o primeiro grande PROBLEMA que se colocou aos responsáveis políticos da época - os RECURSOS (quer os HUMANOS quer a competente LOGÍSTICA) - sempre imprescindíveis em qualquer organização, de que a MILITAR não é excepção, particularmente em contexto de guerra. E esses problemas não estavam resolvidos… nem nunca estiveram.

De referir que o conceito de logística, enquanto ramo autónomo da ciência militar, significa a arte do planeamento e da execução de movimentos e sustentação de forças. Nela se inclui um vasto conjunto de actividades complexas e interdisciplinares que vão desde a sua concepção e desenvolvimento; obtenção, recepção, armazenagem, movimentos, distribuição, manutenção, evacuação e alienação de materiais, equipamentos e abastecimentos e todas as actividades de apoio sanitário.

Por outro lado, as distâncias entre a Metrópole e cada um dos três TO, às quais se adicionam a inexperiência em relação ao modo como gerir, com sucesso, a natureza social e política do conflito e, ainda, à teimosia cega de não o resolver com bom senso, conduziram a uma maior exigência operacional dos efectivos aí destacados. Os recursos humanos e logísticos cresceram, por isso, ao longo dos anos, concomitante com as responsabilidades atribuídas aos jovens militares, fazendo recair sobre estes, desde o seu início, o ônus da manutenção de Portugal no continente africano em nome da Pátria, isto é, em nome da perpectuação do regime político vigente, se necessário com recurso da sua própria vida, como está plasmado na vasta bibliografia existente, quer seja nacional ou internacional.

Considerando que o conceito problema [contexto acima] faz parte, justamente, do nosso léxico do dia-a-dia [ex: tenho um problema; só temos problemas; arranjaste-me um problema; como resolver este problema; …] recupero aqui a definição do escultor e escritor italiano Bruno Munari (1907-1998) que nos diz: “todo o problema implica um certo saber do não saber, ou seja, antever, se terá ou não solução e para isso é preciso experiência” (in. Das Coisas Nascem Coisas, Lisboa. Edições 70, 1982, p. 39).

Durante a presença no CTIG (1972-1974), que decorreu entre os nove e os onze anos do conflito, reconheço a existência dos problemas caracterizados anteriormente por Louro de Sousa, por experiência feita da actividade operacional na minha Unidade Orgânica [CART 3494], ainda que admita serem de menor escala face ao esforço que naturalmente foi despendido para os minimizar ao longo do tempo uma vez que foram operacionalizadas diversas mudanças no terreno em função da reformulação das estratégias/tácticas propostas pelas sucessivas chefias militares nomeadas pelo Governo Central, mas sem grandes resultados.

Contudo, esse contacto directo com as várias realidades leva-me a ter uma percepção dualista, ou seja, NÃO e SIM, uma vez que eram distintos ou desiguais a natureza de cada um deles, bem como os contextos e locais onde se actuava, variando em função da geografia do terreno e da proximidade das linhas de fronteira, quer a norte quer a Sul, onde, nestas regiões, estavam sedeadas as principais bases do PAIGC. Esta localização facilitava-lhes a vida, e muito, pois ampliava o quadro de opções de mobilidade para realizarem as suas actividades de ataques e flagelações aos alvos seleccionados. Era também desigual a vida nas Cidades, nas sedes de Batalhão (CCS), nos Aquartelamentos e Destacamentos, e quanto mais no interior maior, levando-nos a (con)viver com o fenómeno da interioridade e com as situações adversas sem alternativas.

Outro problema, não menos importante, estava relacionado com o esforço que era necessário fazer para manter em funcionamento a rede da estrutura logística, sem a qual não teria sido possível suportar tanto tempo, por efeito dos insuficientes recursos locais e financeiros, ainda que uma parte dela estivesse a cargo de cada umas das Unidades por descentralização de competências.

Voltando ao ano de 1963, recordo que a principal actividade era a de estudante no Liceu Camões onde existiam na minha turma alguns colegas que, em função de interesses comuns, convivíamos grande parte do tempo escolar partilhando ideias e actividades (comportamento normal no processo de socialização). Um dos interesses em presença estava relacionado com a prática lúdica, vulgo futebol, à hora do almoço, com jogos no relvado central do Parque Eduardo VII ou na zona cimentada perto da Estufa-Fria, umas vezes competindo entre nós (estudantes), outras envolvendo elementos estranhos ao grupo, funcionários administrativos de empresas instaladas na zona.

De entre os vários elementos do nosso grupo, e pelas razões que seguidamente justificarei, quero recordar o nome do saudoso colega e amigo Artur José de Sousa Branco, meu companheiro de alguns anos, e que face ao seu entusiasmo pelas letras e pelo desporto, conseguiu conciliar ambas as actividades, ingressando nos escalões de formação do S.L. Benfica. Ao atingir o escalão de sénior e antes da sua incorporação obrigatória no serviço militar representou (creio) o Sport Benfica e Castelo Branco.

Quis o destino que cada um de nós, depois de nos separarmos por algum tempo, fazendo percursos distintos, acabaríamos por convergir para o mesmo itinerário ultramarino, rumando à Guiné, eu para CART 3494 (Xime/Mar’72) e ele, poucos meses mais tarde, para a CCAV 8350 (Gadamael). Em 4 de Junho de 1973, dez anos depois do início da Guerra e a um do seu epílogo, acabaria por tombar no “jogo dos operacionais” ou seja, no “jogo da superação permanente e da sobrevivência”.


Recebi a notícia da sua morte ainda durante a “comissão” através da comunicação social da metrópole, que me era enviada pelo meu pai duas vezes por semana, na qual se faziam referências regularmente às principais ocorrências nos diferentes TO, em particular no que concerne às baixas d
as NT, desconhecendo, no entanto, os detalhes do sucedido com o meu/nosso camarada Sousa Branco, ex-Alf.Art., como era conhecido entre nós.

Porém, face à existência do nosso Blogue, descobri este episódio no P14325 narrado na primeira pessoa pelo nosso camarada José Casimiro Carvalho, ex-Fur Mil Op Esp, em sua memória, a quem envio um forte abraço de agradecimento, onde ele refere o seguinte: “sou (fui) um dos intervenientes desse triste e doloroso episódio na História da CCAV 8350”. Recorda que na tarde de 4JUN1973, em Gadamael, o Alf Mil Branco saiu com um reduzido grupo de combate (12 homens) para fazer um reconhecimento nas imediações do aquartelamento, na antiga pista, a cerca de 1 km do arame farpado. O grupo cai de imediato numa emboscada e só não foi totalmente aniquilado graças à pronta intervenção das tropas paraquedistas (CCAÇ 122/BCP 12, acabada de chegar a Gadamael, na manhã de 3JUN, sob o comando do cap. paraquedista Terras Marques).

Este acontecimento está, também, publicado em “A última missão, de José Moura Calheiros, 1.ª ed., Caminhos Romanos, Lisboa, 2010, pp. 527/528”.

Nesse mesmo ano de 1973, quando estava já contabilizada uma década do conflito armado, o problema das instalações inadequadas mantinha-se, situação gravada nas imagens abaixo [para memória futura], de que é exemplo o Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, sito na estrada Xime-Bambadinca. Este espaço fora ocupado a partir de 29MAI1969 pelo camarada Carlos Marques [ex-Fur.Mil da CART 2339], acompanhado por elementos do seu GComb, data em que a ponte aí existente [velha] foi danificada por elementos do PAIGC, história já narrada nos P12565, P12586 e P12734.

Trata-se de um mero exemplo e não caso único, naturalmente, como se pode provar através do riquíssimo espólio existente no Blogue da Tabanca.

Recordo, nas fotos acima , esse tempo e esse espaço no cada vez mais distante ano de 1973 [julho, agosto e setembro]..




3. UMA VISÃO HISTÓRICA SOBRE A LOGÍSTICA DE PORTUGAL NA GUERRA DE ÁFRICA (1961-1974), POR PEDRO DA SILVA MONTEIRO (CAP)

Para concluir a presente narrativa, consideramos pertinente divulgar o que vem sendo feito a nível da investigação histórica relacionada com o fenómeno da “Guerra do Ultramar”, destacando o trabalho do Capitão Pedro da Silva Monteiro, elaborado certamente no âmbito da sua formação académica e destinado à Academia, publicado na Revista Militar n.º 2539/2540 de Agosto/Setembro de 2013, com o título “A Logística de Portugal na Guerra Subversiva de África (1961 a 1974)”, e que se enquadra na nossa temática.

A investigação em referência identifica, como questão central, em que medida a manobra logística de
Portugal influenciou as operações militares nos três TO e contribuiu para a sustentabilidade da Guerra Subversiva de África, de 1961 a 1974.

Desta questão de partida inicial a investigação derivou para mais seis subtemas, a saber:

a) - Qual a estrutura logística de Portugal antes e durante da guerra?

b) - Que dificuldades sentiram os serviços de apoio logístico de Portugal e quais os maiores problemas verificados?

c) - O que esperava o governo português do sistema logístico?

d) - Quais as necessidades sentidas pelas forças em operações, e que abastecimentos foram fornecidos?

e) - Que apoios logísticos recebeu Portugal do exterior?

f) - Como é que os serviços de apoio logístico se adaptaram às exigências operacionais e que implementações foram feitas?


Eis uma parte do resumo elaborado pelo autor.





Neste sugestivo trabalho de investigação encontramos algumas análises de dimensão histórica e política que ajudam a situar a problemática identificada por Louro de Sousa, em 1963.

Recebam um forte abraço de amizade.

Jorge Araújo.

10MAR2016.

______________


Nota do editor:

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18278: José Matos: O F-86F Sabre em combate no CTIG: da Op Atlas em agosto de 1961 ao seu regresso a Portugal, por pressão do "amigo americano" e sua substituição, em 1966, pelo nosso familiar Fiat G-91, cedido pelo "amigo alemão" (Artigo original publicado na prestigiada Revista Militar, nº 2584, maio de 2017)


Figura 1 – Operação Atlas >  De 8 a 15 de agosto de 1961 > A rota dos caças F-86 de Portugal para a Guiné.Ilustração – Paulo Alegria


Figura 2 – O North American F-86F 5313, um dos caças destacados na Guiné. Ilustração – Paulo Alegria




I. Mensagem do nosso amigo e grã-tabanqueiro Jose Matos com data de 21 de dezembro último:

Olá, Luís

Vinha desejar a todos os camaradas da Guiné Bom Natal e pedir-te para divulgares no blogue mais um artigo meu da Revista Militar exclusivamente sobre a Guiné. Que passem pelo site da revista para ver.

https://www.revistamilitar.pt/artigo/1244

Ab

José Matos


PS - Podes reproduzir o texto na totalidade mas mete sempre o link para a Revista Militar pois tenho interesse que as pessoas também vejam lá....


II. O F-86 SABRE EM COMBATE NA GUINÉ


por José Matos (*)


[Investigador independente em História Militar; tem feito investigação sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial, principalmente na Guiné; é colaborador da Revista Mais Alto, da Força Aérea Portuguesa; tem publicado também o seu trabalho em revistas europeias de aviação militar, em França, Inglaterra e Itália; é membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo  mais de 25 referências no nosso blogue]


Revista Militar, nº 2584, maio de 2017 (com a devida vénia...)


No contexto do antigo império colonial português, os territórios da Guiné e de Cabo Verde desempenhavam um papel relevante nas rotas marítimas e aéreas de ligação à África Austral, onde Portugal tinha duas colónias importantes: Angola e Moçambique. 

disso, na ilha do Sal, em Cabo Verde, a Força Aérea tinha um aeródromo (AM1) que podia usar para missões de patrulhamento marítimo permitindo um controlo sobre o Atlântico. Desta forma, a manutenção da Guiné e de Cabo Verde sob o domínio português era essencial na estratégia global de manutenção do império colonial. 

Daí a pronta reacção do Governo de Salazar, quando, em Julho de 1961, ocorreram os primeiros ataques no norte da Guiné, protagonizados pelo Movimento de Libertação da Guiné (MLG) com sede no Senegal. Este movimento nacionalista desencadeia as primeiras acções armadas na colónia portuguesa, em meados de Julho de 1961, atacando algumas povoações no norte, junto à fronteira com o Senegal. 

Estes primeiros ataques levam o Governo em Bissau a destacar efectivos militares para as zonas atingidas, o que parece ter dissuadido novos ataques por parte do MLG (1). Contudo, estes primeiros ataques são um sinal de que a guerra de guerrilha está prestes a começar na Guiné, o que leva a Força Aérea Portuguesa (FAP) a destacar da base de Monte Real, oito caças North American F-86F Sabre para aquele território ultramarino. Durante os anos de permanência na Guiné, os F-86 vão ser o principal avião de combate da FAP, desempenhando vários tipos de missões por todo o território.

Antes dos ataques do MLG, a Força Aérea não tinha ainda meios aéreos na Guiné, nem qualquer tipo de estrutura de apoio no aeródromo de Bissalanca (AB2), situado a uma dezena de quilómetros a noroeste de Bissau. Em 1961, esta pequena infraestrutura aeronáutica tinha, além da aerogare civil, um hangar em acabamento, não tendo meios aéreos próprios atribuídos. O único avião militar que passava, uma vez por semana, pela capital guineense, era um P2V-5 Neptune de patrulha marítima, habitualmente estacionado a mais de 500 milhas de distância, na ilha do Sal, em Cabo Verde. Porém, as acções do MLG no norte da colónia levam a FAP a tomar medidas e a reforçar o dispositivo aéreo na Guiné, sendo o destacamento dos F-86 a medida mais significativa.

Já no princípio de 1961, se falava com insistência, em Monte Real, na possibilidade de caças F-86 fazerem uma deslocação às ilhas de Cabo Verde (2) Perante o agravamento da situação, é então decidido enviar os caças para Bissau. Foram escolhidos os aviões da linha da frente que apresentavam menor probabilidade de avarias graves e também os que tinham maior potencial de horas de voo antes da próxima grande inspecção, para que se mantivesse a sua operacionalidade pelo máximo período de tempo (3).

Os F-86 não tinham sido a primeira escolha do comando da 1ª Região Aérea (1ª RA), que englobava a Guiné. O comandante da 1ª RA, General Machado de Barros, tinha inicialmente escolhido o F-84G para ser enviado para o AB2. Os aviões estavam sedeados na base aérea da Ota e a intenção das chefias da 1ª RA era enviar oito caças para Bissalanca. A ordem é recebida na Ota pelo Capitão Gomes do Amaral, que começa a preparar os aviões para um voo directo entre Portugal continental e a Guiné (4) . Porém, com o início da guerra em Angola, os F-84 são enviados para Luanda, sendo então decidido pelas chefias da 1ª RA o envio de um destacamento de F-86F para a Guiné.


Operação Atlas

Em Monte Real começam então os preparativos para uma longa viagem de duas mil milhas náuticas, sob o nome de código “Operação Atlas”. Por ordem do Estado-Maior da Força Aérea (EMFA), é decidido que os caças devem partir da base aérea do Montijo, fazendo depois escala na base de Gando, nas Canárias, e na ilha do Sal, em Cabo Verde (Figura 1). Na linha da frente, em Monte Real, são então preparados dez caças (oito, mais dois de reserva) para a primeira parte da viagem entre Monte Real e o Montijo.

Os dez caças descolam de Monte Real, na manhã de 8 de Agosto, transportando sob as asas, nos suportes externos, dois depósitos de 200 galões e, nos suportes internos, dois outros de 120 galões, o que confere ao avião a máxima capacidade de transporte de combustível. 

Os F-86 passam um dia no Montijo, sendo visitados, na manhã de 9 de Agosto, pelo Secretário de Estado da Aeronáutica, Coronel Kaúlza de Arriaga, acompanhado pelo comandante da base, Coronel Rodrigues Frutuoso. Nessa mesma manhã, os oitos caças destacados para a missão na Guiné descolam do Montijo para uma viagem de 722 milhas náuticas até às Canárias, chegando nesse mesmo dia a Gando. 

Os pilotos passam a noite na base espanhola, partindo no dia seguinte, para a segunda etapa da viagem até à ilha do Sal, o que representa mais 800 milhas náuticas de voo sobre o oceano. Mantendo o mesmo regime de velocidade e de altitude usado na viagem para Gando, os caças atingem a pista do Sal ao fim de 2h27min de voo. Os F-86 chegam sem problemas aquele aeródromo, sendo então preparados para a última etapa da viagem até Bissau, num trajeto de 526 milhas náuticas. 

No entanto, a saída para Bissau é condicionada por um súbito mau tempo em Cabo Verde (já não chovia há sete anos), o que impede a partida dos caças e da equipa de apoio aos aviões. Finalmente, as condições meteorológicas melhoram no dia 15 de Agosto e os caças iniciam a última parte da viagem chegando à Guiné ao fim de 1h17min de voo. 

Toda a viagem, desde Portugal, decorre sem incidentes, sendo à época, uma deslocação digna de registo, devido à distância percorrida (5). Para este primeiro destacamento são escolhidos oito pilotos: quatro oficiais e quatro sargentos, sob o comando do Capitão Ramiro de Almeida Santos. Além deste oficial, estão neste destacamento o Capitão José Almeida Brito, os Tenentes Aníbal Pinho Freire e Alcides Teixeira Lopo e os Sargentos José Pombo Rodrigues [, mais tarde, conhecido no TO da Guiné como comandante Pombo],  Rui Salvado da Cunha, António Rodrigues Pereira e Humberto Cartaxo da Silva (6). 

Os pilotos de F-86 fazem destacamentos de três meses na Guiné, sendo substituídos no final desse tempo. Esta rotação de pessoal vai proporcionar aos pilotos de Monte Real uma experiência importante num teatro de operações africano até então desconhecido para os pilotos portugueses. Em termos operacionais, os caças portugueses podiam desempenhar vários tipos de missões, que passavam pela defesa área do território, apoio aéreo às forças de superfície e missões de reconhecimento visual, além da presença dissuasora que exerciam em função do poder do fogo disponível e da rapidez com que podiam chegar a qualquer ponto do território (Figura 2).


Os primeiros tempos na Guiné

Os primeiros tempos do F-86 na Guiné são relativamente pacíficos com os aviões a desempenharem missões de reconhecimento visual (RVIS) e armado (RECA) sobre a colónia. Os grandes problemas que os caças portugueses enfrentam são, na verdade, a falta de condições do AB2, ainda em fase de consolidação para receber os novos meios aéreos. 

Bissalanca apresentava, nessa altura, grandes carências, como infra-estruturas militares. Podemos ver isso nos primeiros relatórios que o comandante do destacamento envia para Lisboa. Ramiro Santos refere que a pista de rodagem se encontrava muito suja e com muitas pedras, não sendo fácil limpá-la devido à ausência de uma vassoura mecânica. A placa de estacionamento não suportava a acção corrosiva do JP-4 usado pelos F-86 e o abastecimento dos aviões era feito por bidons, o que tornava a operação muito demorada (7). Os equipamentos UHF de comunicações, que existiam na torre de controlo, não satisfaziam as necessidades e a gestão do tráfego aéreo era muito incipiente, não existia serviço meteorológico e a pista apresentava vários problemas de segurança com pessoas e animais a atravessarem a zona de rodagem (8).

Os primeiros voos de F-86 na Guiné ocorrem no dia 19 de Agosto e, logo numa das primeiras saídas, a cargo do Tenente Teixeira Lopo e do Sargento-ajudante Cartaxo da Silva, o F-86 “5361” do primeiro sofre um “birdstrike” com um jagali, ficando o “cannopy” manchado de sangue e sofrendo também danos no estabilizador do leme de profundidade do caça. 

Este primeiro acidente deixaria o “5361” fora de serviço por várias semanas, até à chegada ao AB2 de uma cauda nova pedida a Monte Real (9).  No dia seguinte, dois F-86 pilotados pelo Capitão Almeida Brito e pelo Sargento-ajudante Rodrigues Pereira sobrevoam a cidade de Bolama, a baixa altitude, durante uma visita do Governador e Comandante-Chefe da Guiné, Comandante Peixoto Correia, isto depois do avião do Capitão Brito ter falhado três tentativas de arranque (10). 

Durante os meses seguintes, os caças portugueses vão fazendo vários voos de reconhecimento, principalmente na região norte da Guiné, embora com o recurso a um mapa de estradas deficiente, o que dificultava os voos na zona de fronteira, devido ao risco de violação do espaço aéreo do Senegal.

Em Outubro de 1961, dois F-86 fazem uma deslocação à ilha do Sal, de grande importância estratégica para a Força Aérea. Como sublinhava Ramiro Santos, no seu primeiro relatório sobre a viagem dos F-86 para Bissau, Cabo Verde tinha uma importância estratégica extraordinária no controle do Atlântico (11). No entanto, a deslocação ao Sal visava, sobretudo, resolver um problema administrativo que era a renovação da diligência dos pilotos no AB2. Como estavam em serviço fora da sua base de origem, que era Monte Real, os pilotos deslocados tinham direito a ajudas de custo, que podiam ser canceladas caso os pilotos estivessem mais de um mês no AB2. Para contornar este problema, os pilotos faziam um voo à ilha do Sal, o que lhes permitia renovar a diligência.

Ainda em Outubro[de 1961], os pilotos do primeiro turno do Destacamento 52 fazem a sua despedida sobre Bissau com uma exibição acrobática em formação de seis caças, tendo o F-86 “5322” pilotado pelo Tenente Lopo ultrapassado a barreira do som sobre a cidade (12). Em finais desse mês, chegavam a Bissalanca os pilotos do segundo turno, prosseguindo assim a missão dos F-86 num território onde a guerra ainda não tinha chegado.

Durante o ano seguinte [1962], os chamados voos de soberania ocuparão a maior parte das missões dos F-86, ao mesmo tempo que se sucedem as rotações de pilotos vindos de Monte Real. No entanto, a 17 de Agosto de 1962, um acidente envolvendo um F-86 provoca a perda total do avião. O acidente acontece no regresso a Bissalanca, quando o Capitão Gomes do Amaral e o Tenente Amílcar Barbosa são surpreendidos por um forte aguaceiro sobre o AB2. Devido à fraca visibilidade, o Tenente Barbosa efectua várias aproximações à pista e acaba por aterrar no terço final da faixa de aterragem. O piloto acaba por sair fora da pista, embatendo nuns montes de terra enlameados ficando o F-86 voltado de lado. Quando chegam os primeiros socorros encontram o avião sem o piloto, que já tinha abandonado o F-86 apenas com ligeiras escoriações (13).

Entretanto, na Guiné-Conakry, o PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), liderado por Amílcar Cabral, vai-se preparando para a luta armada, que terá início a 23 de Janeiro de 1963, com um ataque ao aquartelamento de Tite, muito perto de Bissau.


O começo da guerra

A partir de Janeiro de 1963, a guerra na Guiné é protagonizada pelo partido nacionalista de Amílcar Cabral, o PAIGC, que faz o seu primeiro ataque contra o quartel de Tite. Este ataque é protagonizado por 15 a 20 elementos do PAIGC que atacam o quartel de madrugada, provocando um morto e dois feridos entre as tropas portuguesas. Os guerrilheiros mantêm o quartel sob fogo intenso durante meia hora e, na escaramuça, sofrem três baixas (14).

O ataque, no entanto, assinala simbolicamente o início da guerra na Guiné, embora a actividade subversiva do PAIGC fosse já anterior a esta data. Nessa mesma noite, as forças portuguesas sofrem uma emboscada na região de Fulacunda (área de Buba) perdendo dois soldados (15). Quatro dias depois, um novo ataque da guerrilha na mesma região provoca mais duas baixas e quatro feridos nas tropas portuguesas (16).

Ainda no mês de Janeiro[de 1963], as forças portuguesas registaram as primeiras emboscadas na região de Bedanda, no sul da Guiné, e as acções da guerrilha continuam nos meses seguintes aumentando de intensidade (17) Enquanto o PAIGC ataca no sul da província, o MLG ataca a norte efectuando várias acções contra povoações e emboscadas a viaturas militares (18).

Quanto à Força Aérea, não sabemos exactamente quando terá sido efectuada a primeira acção ofensiva, mas, a 4 de Abril de 1963, um avião de observação Auster é alvejado com armas ligeiras a partir da tabanca de Darsalame, o que leva a FAP, no dia seguinte, a desencadear uma acção de demonstração de força sobre a povoação em questão, usando para o efeito oito caças F-86F, que bombardeiam as imediações da aldeia (19).

Os caças portugueses estavam equipados com seis metralhadoras Browning Colt TM3, calibre 12,7 mm, e podiam transportar vários tipos de armamento, como os foguetes de 2,75”, bombas GP de 50 e 250 kg e tanques de napalm de 350 l. Em Portugal, usavam também os mísseis ar-ar Sidewinder AIM-9B, em missões de defesa aérea, mas que nunca foram usados na Guiné.



Figura 3 – Armamento do F-86F da Força Aérea Portuguesa. lustração Paulo Alegria


O pretenso bombardeamento do Senegal

A 9 de Abril, o Governador da Guiné, Vasco Rodrigues, recebe uma informação do cônsul do Senegal em Bissau, segundo a qual a emissora de Dakar noticiara que quatro aviões da Força Aérea teriam bombardeado, na manhã desse dia, uma aldeia senegalesa perto da fronteira com a Guiné.

 No seguimento da notícia, o comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG), Tenente-coronel Durval Serrano de Almeida, informa o comandante militar da Guiné, Brigadeiro Louro de Sousa, que, no dia 9, não descolara qualquer avião da FAP para missões de fogo. Porém, no dia anterior, quatro aviões, sendo dois F-86F e dois T-6, tinham bombardeado as tabancas Bunhaque, muito perto da fronteira com o Senegal.

 Para apurar o que se passou, o comando da ZACVG envia um oficial ao local, juntamente com os oficiais envolvidos no ataque, chegando à conclusão que o ataque dos aviões portugueses tinha ocorrido de facto do lado português e não do lado senegalês (20).  No entanto, o Governo de Dakar solicita uma reunião urgente do Conselho de Segurança (CS) da ONU, onde apresenta queixa contra Portugal, o que dará a origem a uma moção no CS de condenação de qualquer incursão de forças militares portuguesas em território senegalês.


Mais uma perda

No mês seguinte, a 31 de Maio, a FAP perde outro F-86, quando o avião “5322”, pilotado pelo Capitão Fausto Valla, é atingido por estilhaços de uma bomba de 250 kg, que acabava de largar, na zona de Bedanda, no sul da Guiné, perto do rio Cumbijã. Este piloto efectuava, juntamente com outro F-86 “5356”, pilotado pelo 2.º Sargento Manuel Pereira Clemente, um bombardeamento rasante (BOR), quando ambos os aviões são atingidos pelos estilhaços das próprias bombas.

 Com vários furos na fuselagem, os pilotos tentam regressar ao AB2, transportando ainda cada avião uma bomba na asa. Ao cruzar o rio Geba, o F-86 de Fausto Valla sofre um flame-out no motor e o piloto é obrigado a ejectar-se sob o olhar atento de Pereira Clemente. O avião explode no solo, embora a bomba que trazia permaneça intacta, tendo sido desarmada mais tarde. Quanto a Pereira Clemente consegue aterrar em Bissalanca depois de largar a bomba que transportava, no rio Geba (21).


O relatório Deslandes

Em meados de Maio de 1963, uma missão de avaliação, liderada pelo Secretário-Geral da Defesa Nacional, General Venâncio Deslandes, visita a Guiné durante uma semana e analisa a situação militar no terreno, produzindo um relatório para o ministro da tutela. Juntamente com o relatório principal há também um relatório do Tenente-coronel Augusto Brito e Melo, que identifica os principais problemas que as forças portuguesas enfrentam na Guiné e que nos ajuda a compreender a situação dos F-86 em Bissalanca. Por este relatório anexo podemos ver que a Força Aérea tinha no AB2, em Maio de 1963, os seguintes meios: sete F-86F, oito T-6, oito Auster, três DC-3, um Broussard e um P2-V5 em diligência.

Quanto aos F-86, a operação dos Sabre é a que apresentava mais problemas. Os aviões voavam muito pouco, com 8 a 23 saídas operacionais por mês, carecendo todos de urgente substituição devido a terem ultrapassado o período de Inspect and Repair as Necessary (IRAN), em mais de um ano. Tinham também problemas de comunicação rádio com as forças terrestres, pois só podiam comunicar em UHF, o que tornava inviável a comunicação com as tropas no solo equipadas com rádios PRC-10. Desta forma, os F-86 só podiam efectuar missões pré-planeadas, ficando o apoio próximo a cargo dos T-6 com fraco poder de fogo e muito vulneráveis a fogo antiaéreo (22).

 As células dos aviões encontravam-se muito mal tratadas, em virtude das irregularidades na pista e no estacionamento. A pista estava a ser reparada, mas o estacionamento, em virtude de ser de alcatrão, quando devia ser de cimento, não tinha solução, pois seria sempre corroído pelo combustível dos aviões (JP-4). 

Brito e Melo salientava ainda que os pilotos de F-86 eram bem preparados, mas não tinha dúvidas que, se o ritmo de voos aumentasse, provocaria, provavelmente, a ruptura do sistema de manutenção do AB2 (23).  Convém referir que, nesta altura, os F-86 que estavam na Guiné ainda não tinham sido substituídos por novos aviões, mas, finalmente, em Julho de 1963, chegam a Bissalanca, por via marítima, oito caças novos (24).


A visita de Krus Abecasis


Três meses depois da visita de Deslandes, o Chefe do Estado-Maior da 1ª Região Aérea, Coronel Krus Abecasis, decide também visitar a Guiné, em particular a Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG), produzindo depois um relatório para o Estado-Maior sobre a situação dos meios aéreos do AB2 e a sua actividade operacional, no mês de Julho.

 Este relatório é entregue, a 14 de Setembro de 1963, e dá-nos uma boa perspectiva sobre o estado de prontidão dos F-86 (25). Os oito caças destacados em Bissalanca estavam na generalidade prontos, embora um estivesse prestes a atingir o prazo do IRAN e apenas quatro estivessem equipados com rádio VHF, o que limitava a capacidade de contactar as tropas no terreno apenas a metade das unidades disponíveis.

 Apesar de as condições serem boas, na generalidade, já se começavam a detectar problemas relacionadas com o armamento interno dos aviões, que se encontrava “em situação precária falta de diversas origens, desde utilização imprópria por parte de alguns pilotos até menos cuidada manutenção” (26). As inspecções das 25, 50 e 100 horas eram realizadas localmente e a manutenção era de bom nível. Tinham sido voadas 51,4 horas/avião pronto, em Julho, e o destacamento contava com catorze pilotos aptos a voar o F-86.


As pressões norte-americanas

Por essa altura, a presença dos F-86 na Guiné já suscitava preocupações no Departamento de Estado norte-americano, que não queria ver equipamento militar cedido no âmbito do Military Assistance Program (MAP) desviado para África.

 A questão dos F-86 era das mais relevantes neste domínio e começam a surgir pressões para que os aviões regressem a Portugal. O assunto vai-se arrastando ao longo de 1963, sem que o Governo Português acate as exigências norte-americanas. O próprio Ministro dos Negócios Estrangeiros português, Franco Nogueira, tem uma longa conversa, em Junho de 1964, com o embaixador americano em Lisboa, George Anderson, em que o problema é novamente abordado. Nogueira argumenta que os F-86 não estavam na Guiné em operações, mas que serviam apenas como factor dissuasor contra possíveis ataques aéreos vindos dos países vizinhos. Anderson concorda com o argumento, mas considera que não era de prever qualquer ataque aéreo estrangeiro e que, “no caso de tal ataque, criar-se-ia uma situação política nova que alterava os dados do problema, mesmo para os Estados Unidos”.

 Nogueira pergunta então se “Washington tomaria uma posição de activa reacção contra uma agressão aérea provinda de fora”, ao que o embaixador americano responde que “não podia prever como reagiria o seu Governo, e muito menos assumir compromissos”. Anderson insistiu que o problema dos F-86 na Guiné “se tratava de uma questão de princípio” e que era um tema muito explorado pelos inimigos de Portugal, ao que Nogueira comentou que deviam de existir muitos no Departamento de Estado, “porque todos pareciam aferir a política dos Estados Unidos para com Portugal pelo que sucedesse aos F-86” (27).

Pouco tempo depois deste encontro, a pressão americana aumenta de tal forma, ao ponto de Washington se recusar a fornecer sobresselentes para a Força Aérea, caso os portugueses não retirassem os caças da Guiné (28).  Lisboa acaba por ceder, o que provoca grande preocupação no novo Comandante-Chefe da Guiné, Brigadeiro Arnaldo Schulz (29).

 Em carta ao Ministro da Defesa, General Gomes de Araújo, Schulz salienta a importância deste meio aéreo na guerra da Guiné e a falta que ia fazer no apoio às tropas terrestres, que ficariam assim completamente dependentes dos T-6, “que se manifestam cada vez mais vulneráveis em face da melhoria constante dos meios antiaéreos do inimigo e mesmo assim em número insuficiente” (cinco aparelhos operacionais).

 Constrangido, Gomes de Araújo, explica a Schulz (30) a verdadeira razão da retirada ao dizer que “os americanos recusam-se agora a venderem-nos as peças sobressalentes para estes aviões (F-84 e PV2) e ainda todo e qualquer outro material. Recusam mesmo qualquer espécie de negociações enquanto nós mantivermos os F-86 na Guiné”. Face a isto, o ministro só via duas soluções: “a primeira consistiria em mantermos aí os F-86, pois certamente eles não iriam aí buscá-los; mas esta situação elimina qualquer espécie de entendimento em relação a todos os outros materiais, em especial quanto ao F-84, PV2 e DC-6, que em breve estariam imobilizados; a segunda consiste na retirada dos F-86 da Guiné, atitude que abre portas a negociações (…)”.


Em busca de uma alternativa

Para compensar a falta dos Sabre, o ministro propunha várias medidas alternativas. Uma delas era reforçar o dispositivo na Guiné com aviões T-6 e alguns PV2 provenientes de Angola, a outra, era procurar rapidamente no mercado mais aviões F-86 e, caso isso não fosse possível, transferir alguns F-84 de Angola para a Guiné. 

Neste sentido, escreve ao Comandante-Chefe de Angola, dando conta da decisão do ministério de transferir para a Guiné os aviões F-84 de reforço em Angola. A decisão do ministro é analisada no comando da 2ª Região Aérea em Luanda, que emite um parecer desfavorável quanto a um possível envio de caças F-84 para a Guiné (31).

 Em alternativa, o Governo Português tenta comprar um lote de caças canadianos F-86 Sabre 6 ao serviço da Luftwaffe, mas o negócio é vetado pelo Canadá por influência dos EUA (32).  Perante a recusa canadiana, a Alemanha Ocidental oferece então um lote de caças Fiat G.91 R/4, que se revelaram mais adequados ao tipo de guerra subversiva que se desenrolava em África (33).

 Contudo, a retirada dos F-86 reflectiu-se no rendimento dos meios aéreos em Bissalanca. Enquanto, em 1964, se registaram 13 820 horas de voo no AB2, esse número decresceu para 13 417 horas, em 1965 (34).  A falta só seria compensada em 1966, com a chegada dos primeiros Fiat G.91 à Guiné.


Comentário final


Num balanço final, podemos dizer que o destacamento dos F-86F, de Monte Real para a Guiné, foi uma operação bem-sucedida, apesar das dificuldades iniciais de operação num aeródromo ainda em fase de consolidação. O objectivo inicial caracterizava-se por uma acção dissuasora sobre os movimentos insurgentes que os F-86 exerceram por toda a colónia, passando depois a desempenhar missões de combate com o início da guerra.

 Ao longo dos três anos de permanência destes caças na Guiné, os pilotos e mecânicos dos diversos destacamentos ganharam experiência num ambiente de guerra africano, que foi útil para a operação de outros meios de combate nos teatros de guerra das antigas províncias ultramarinas. Muitos destes pilotos e técnicos seriam depois mobilizados para outros cenários de guerra, onde aplicariam os conhecimentos obtidos na Guiné.

Em termos operacionais, os aviões realizaram inúmeras missões de combate em apoio às forças terrestres, usando vários tipos de armamento à disposição do caça da North American. Embora fosse um avião concebido para missões de defesa e combate aéreo, o F-86 tinha alguma capacidade de ataque ao solo, que foi usada intensamente na Guiné.

 Durante a atividade operacional perderam-se apenas dois aviões: um, devido a um acidente durante uma aterragem em condições meteorológicas adversas, mas em que o piloto escapou apenas com pequenas escoriações, e outro, devido a um bombardeamento mal calculado, em 1963, que levou à ejecção do piloto e consequente perda da aeronave.

 No entanto, a utilização de meios OTAN fora dos limites geográficos da Aliança Atlântica continha elevados riscos políticos, que acabaram por se manifestar na intransigência norte-americana dos caças regressarem à metrópole, o que levou Portugal a procurar outras alternativas porventura mais adequadas à guerra subversiva que se desenrolava em África.


Arquivos consultados

1 – Arquivo da Defesa Nacional (ADN)

2 – Arquivo Histórico da Força Aérea (AHFA).

[Revisão / adaptação e fixação de texto / edição para o blogue: LG] (**)
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Notas do autor:

(1) FELGAS, Hélio, Guerra na Guiné, 1ª Edição, Serviço de Publicações do Estado-Maior do Exército, SPEME, Lisboa, 1967, p. 61.

(2) LOPO, Alcides Teixeira, Viagem dos Falcões, Kiak-Revista dos Pilotos de Caça da Esquadra 51, Base Aérea nº 5, Junho de 1968, p. 13.

(3) LOPO, op. cit., p. 15

(4) Informação prestada ao autor pelo Coronel Gomes do Amaral, em 2 de Julho de 2013.
(5) Missão Atlas, Relatório sobre a viagem dos F-86F para Bissau, 17 de Agosto de 1961, Arquivo Histórico da Força Aérea (AHFA) ZACVG Cx. 91.

(6)  LOPO, op. cit., p. 16.

(7) Missão Atlas, Relatório sobre a viagem dos F-86F para Bissau, 17 de Agosto de 1961, AHFA, ZACVG Cx. 91.

(8) Relatório mensal do Destacamento de F-86, Bissau, 1 de Setembro de 1961, AHFA, ZACVG Cx.91.

(9) Ibidem.

(10) Ibidem

(11) Missão Atlas, Relatório sobre a viagem dos F-86F para Bissau, 17 de Agosto de 1961, AHFA, ZACVG Cx. 91.

(12) Informação prestada ao autor pelo Dr. Alcides Lopo, em 19 de Agosto de 2014.

(13) Informação prestada ao autor pelo Coronel Gomes do Amaral, em 22 de Setembro de 2014.

(14) Telegrama do Governador da Guiné para o Ministério do Ultramar, Bissau, 23 de Janeiro de 1963, ADN F2/102/324/4.
(15) Comunicado do Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Serviço de Informação Pública das Forças Armadas, Lisboa, 24 de Janeiro de 1964, ADN F2/102/324/4.

(16) Telegrama do Governador da Guiné para o Ministério do Ultramar, Bissau, 27 de Janeiro de 1963, ADN F2/102/324/4.

(17) FELGAS, op. cit., pp. 66-68.

(18) FELGAS, op. cit., pp. 61-64.

(19) BISPO, António de Jesus, Guiné, algumas notas sobre o teatro de operações, Revista Mais Alto n.º 406, Nov/Dez 2013, p. 22.

(20) Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, Relatório respeitante a uma pretensa violação do espaço aéreo e ataque ao solo da República do Senegal, Bissau, 4 de Abril de 1963, ADN F2/105/345/1.

(21) Informação prestada pelo Comandante Manuel Pereira Clemente, em 19 de Agosto de 2014.

(22) Ibidem.

(23) Ibidem.

(24) CORREIA, José Manuel, Rotina de Guerra – Os F-86F Sabre na Guiné, Revista Mais Alto n.º 358, Nov/Dez 2005, p. 37.

(25) Relatório da missão do CEM do Comando da 1ªRA à Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, 3 a 23 Agosto 1963. ADN/FG/SGDN Cx. 6093.2.

(26) Ibidem.

(27) NOGUEIRA, Franco, Diálogos Interditos, Volume II, 1ª Edição, Editorial Intervenção, Braga, 1979, pp. 58-60.

(28) MATOS, José, A saga do Sabre Mk.6, 1ª parte, Revista Mais Alto nº 394, Novembro/Dezembro de 2011, pp. 37-38.

(29) Carta do Comando-Chefe da Guiné para o Secretariado Geral da Defesa Nacional, 4 de Julho de 1964, ADN F1/07/31/21.

(30) Carta do Ministro da Defesa Nacional para o Comando-Chefe da Guiné, 10 de Julho de 1964, ADN F1/07/31/21.

(31) Carta do Comando-Chefe das Forças Armadas de Angola para o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, Assunto: Transferência de aviões F-84 para a Guiné, Luanda, 1 de Agosto de 1964, ADN/FG/Cx. 6093.2.

(32) MATOS, José, A Saga do Sabre 6, Revista Mais Alto nº 394 e 395, Nov/Dez 2011 e Jan/Fev 2012.

(33) MATOS, José, Projecto Feierabend, Revista Mais Alto nº 396 e 397, Mar/Abri e Mai/Jun 2012.

(34) ABECASSIS, Krus José, Bordo de Ataque. Memórias de uma caderneta de voo e um contributo para a História, 2º volume., 1ª Edição, Coimbra Editora, 1985, p. 514.

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Notas do editor: