Mostrar mensagens com a etiqueta Rui Silva. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Rui Silva. Mostrar todas as mensagens

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13310: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (28): O dia em que o Trovoada caiu ao poço

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 3 de Junho de 2014:

Caros amigos e ilustres editores do Blogue:
Aqui vai mais um “salpico” que espero os vá encontrar de boa saúde, harmonia e bem-estar. 

Abração.
Rui Silva



Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Do meu livro de memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”

28 - O Trovoada no fundo do poço! Os morcegos alvoraçados e o Grilo a gritar!

É verdade, o “Trovoada” (Zé) caiu ao poço, bem fundinho, ali a uns escassos quilómetros do Olossato, para os lados de Maqué, e em pleno terreno da guerrilha.
Esta, como se sabia, era já ali, era só passar o arame farpado do aquartelamento.
Foi um grupo constituído por cerca de trinta homens, à lenha e, como era habitual e necessário: a lenha e o efetivo militar.
Desta feita foram então para os lados de Maqué, aí a uns 3-4 quilómetros e o local era o de uma Tabanca abandonada e, assim, provavelmente, um bom sítio para encontrar alguma lenha.

Eu, no entroncamento do carreiro para Maqué com a estrada Bissorã-Olossato e no “intervalo” (se é que haviam intervalos) de uma operação. Na foto, vê-se, em segundo plano, se não é o celebre poilão de Maqué, é outro lá perto. Toda a Companhia (e pelo que as conheci) tinham o seu fotógrafo. Na minha era o Correia radiotelegrafista. Ainda hoje nos Convívios lá anda ele a fotografar a tudo que mexe.

Uma parte do grupo procedia à recolha daquilo que podia então servir de lenha e a outra parte fazia a necessária segurança.
O “Trovoada”, elemento dos que garantiam a segurança aos esgravatadores da lenha, com tão redobrada atenção, acabou por vislumbrar uma bananeira e então há que ir buscar um cacho que tanto jeito fazia para tirar a barriga de misérias.
Pensou e melhor o fez; foi buscar um cacho e trouxe-o para junto do “Grilo” a quem se propunha dividir as bananas, mas o “Grilo”: - “Dividir o quê? Vou é lá buscar um cacho também pr’a mim”.

E assim, com a companhia do amigo do batedor “Trovoada” foi lá arrancar um cacho, só que o “Trovoada”, que ia à frente, pois sabia onde elas estavam, pisou capim de raiz falsa, que, para grande azar dele, cobria um poço que outrora abastecia, com certeza, a referida tabanca, agora, e como disse, abandonada.

Pamba!!... tchoc, tchoc… 

O “Grilo” gritou logo, ante o desaparecimento relâmpago do seu companheiro de safra e do consequente estoiro, o qual também surpreendeu toda a gente que logo constatou que alguém tinha caído a um poço, provavelmente.

- “É o Trovoada, é o Trovoada”, grita o “Grilo”

O “Trovoada” qual voz do outro mundo, e passados uns segundos, diz lá de baixo e para sossego do alvoraçado “Grilo”.
- “Oh Grilo, eu estou bem!!”

Pois, não estava muito mal, depois de tirar a medida à altura da água, segurou-se como pôde e ficou à tona, contou ele depois, cá em cima e já algo refeito do susto.

O preto, o padeiro civil, que era também parte interessada na recolha da lenha, como já se vê, propôs-se a ir lá baixo buscar o “Trovoada”. Mas como? E com quê?


Já bastava um no fundo do poço. Uma outra versão do Black and White, podia acontecer.
Alguém se lembrou de que só com uma corda é que ele saía dali e então um pequeno grupo foi buscá-la ao aquartelamento do Olossato.

O Pinto (paz à sua alma – faleceu há meia dúzia de anos-) condutor da Unimog que iria trazer a lenha, mais 2 ou 3 elementos voaram para o aquartelamento. É verdade, por ali havia uma corda aí com 30 metros. Vá lá, vá lá…
Para lamento do “Trovoada” o Pinto, que até voou, demorou tempos infinitos.

Chegados ao local da tragédia, há que içar o “Trovoada” que apesar de tudo até nem era dos mais nervosos.

- Cara-ho (!) lá em baixo andavam morcegos que voavam à frente do meu nariz”.

O “Trovoada” a sacudir-se todo de alto abaixo, e alguém pergunta :
- “Oh carago (carago é favor) e a G3?… e as cartucheiras?”
- “ Ficaram lá no fundo!”, diz o “Trovoada” com ares de “eu é que já me safei!! Que se f… o resto…”

Bom, aí é que o preto padeiro, que estava ansioso por mostrar serviço (de coragem), com a ajuda da dita corda, amanda-se pelo poço abaixo e no regresso surge ele do poço com a arma e as ditas cartucheiras do “Trovoada”, sorridente e a mostrar toda a sua cremalheira branca encaixilhada por grossos lábios à boa maneira da natureza nativa, e com cara de quem acabou de fazer qual truque de magia.
E ele que ansiava ser protagonista.

Tudo acabou em bem, afinal, e para o Olossato veio a lenha e também vieram os cachos de bananas do “Trovoada” e do “Grilo“, que tanto custaram a apanhar, principalmente ao primeiro. Este quase que arranjou foi lenha para se queimar (afogar).

O preto padeiro, esse, nunca mais deixou de arreganhar a tacha.

Eu e o meu amigo Zé “Trovoada”, passados 48 (!) anos de o Zé ter caído ao poço, ou, (soa melhor), ter saído do poço, algures na Guiné. (foto tirada agora no último Convívio da 816 (10/5/2014)

Rui Silva
____________

Nota do editor

Último poste da série de 18 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12601: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (27): Operações Vacas

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13295: IX Encontro Nacional da Tabanca Grande (35): A missa celebrada na igreja de Monte Real, por intenção de todos os nossos camaradas já falecidos, incluindo o António Rebelo (1950-2014), vítima de morte súbita na véspera do nosso convívio (Fotos de Manuel Resende e Rui Silva)



IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real, às 11h30, conforme o programa.


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real, celebrada pelo padre Patrício Oliveira, vigário paroquial da Marinha Grande.



IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real >  O Manuel  dos Santos Gonçalves (Carcavelos / Cascais).


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real >  O Joaquim Mexia Alves (Monte Real / Leiria), membro da Comissão Organizadora


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real > O celebrante, vigário paroquial da Marinha Grande 


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real > O Joaquim Luís Fernandes (Maceira / Leiria).



IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real >  Aspeto parcial da assistência > Em primeiro plano, a Isaura Serra, mulher do Manuel Resende, e a sua mãe Palmira Serra, de 95 anos. Em segundo plano, à esquerda, o nosso camarada Joaquim Luís Fernandes (Maceira / Leiria). E à direita  na ponta, o Joaquuim Mexia Alves.


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real > À saída da igreja, dois camaradas da 3ª CART /BART 6520/72 (Fulacunda, 1072/74), o Jorge Pinto (ao meio, de camisola vermelha, entre o Joaquim Jorge e o Eduardo Jorge Ferreira), e o José Louro (de perfil, no lado direito) que deveriam ter trazer com eles o António Rebelo,  também da mesma companhia, e que infelizmente foi vítima de morte súbita, no passado dia 10 do corrente.

Fotos: © Manuel Resende  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]



IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real >  Aspeto geral da assistência (1).


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Missa na igreja paroquial de Monte Real >  Aspeto geral da assistência (2).

Fotos: © Rui Silva  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]


1. Um dos momentos de grande recolhimento, espiritualidade e solidariedade,  neste  nosso encontro, foi a missa celebrada às 11h30 na igreja paroquial de Monte Real,  pelo jovem vigário paroquial  da Marinha Grande, padre Patrício Oliveira, de 29 anos, e amigo do Joaquim Mexia Alves, da comissão organizadora, e que é também seu paroquiano.

Devemos ao padre Patrício e ao Joaquim o privilégio deste momento. O ato religioso teve a assistência de numerosos camaradas nossos e seus acompanhantes. Publica-se a seguir dois textos, da autoria do Joaquim Mexia Alves, e que foram lidos no decorrer da celebração litúrgica.


INTENÇÕES DA MISSA

Esta Eucaristia é celebrada pelas seguintes intenções:

(i)  por todos aqueles nossos camaradas de armas que faleceram na guerra do Ultramar:

(ii) por todos aqueles que lutaram contra nós e faleceram na mesma guerra;

(iii) por todos os civis inocentes que morreram nessa guerra; 

(iv) por todos aqueles nossos camaradas de armas que faleceram já depois do seu regresso a casa; 

(v) por todos aqueles que de alguma maneira ainda sofrem por causa da guerra; 

(vi) pelas nossas famílias, e as famílias de todos aqueles que combateram na guerra do Ultramar;

(vii) muito especialmente ainda pelo nosso camarigo António Rebelo e sua família, que, estando inscrito para este nosso encontro, faleceu repentinamente no dia 10 de Junho.


ACÇÃO DE GRAÇAS

Senhor, somos ex-combatentes que serviram a sua Pátria.

O que fizemos de bem e o que fizemos de mal, colocamos nas tuas mãos, agradecendo-te pelo bem e pedindo-te perdão pelo mal.

Nós Te damos graças, Senhor, pelo dom da amizade, que colocas em todos nós, irmanados num mesmo sentir, porque vivemos as mesmas experiências.

Nós Te damos graças, Senhor, pelas famílias que nos deste e nos sabem acolher no dia a dia, às vezes com dificuldades, por causa das marcas de guerra que alguns de nós ainda vivem.

Nós Te damos graças, Senhor, porque ao fazermos a guerra percebemos bem melhor a importância do dom da paz.

Nós Te damos graças, Senhor, porque hoje “tocaste a reunir” e nós aqui estamos, reunidos à tua volta, pedindo-te que nos ensines e ajudes a sermos sempre testemunhas e proclamadores da paz, para que os homens se amem, como Tu, Senhor, nos amas.

Amen.

2. Comentário de L.G.:

Joaquim: tive pena de não ter conhecido pessoalmente o teu jovem vigário paroquial, mas fica aqui, no blogue, uma palavra de apreço pela sua preciosa colaboração neste evento, em que celebrámos também 10 anos de camarigagem (como tu gostas de dizer, usando um palavra nova, da tua autoria, e que nós já grafámos no léxico da Tabanca Grande).  Dá-lhe um alfabravo nosso, dos grandes, e diz-que eu, pessoalmente,  lhe desejo as melhores venturas para a sua carreira sacerdotal e para sua missão espiritual.

Obrigado também pela  oração que me mandaste, que, não tendo estado presente na missa,  li agora com emoção e que te agradeço do fundo do coração. Obrigado também em nome dos camaradas do António Rebelo, da 3ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74), presentes no nosso encontro e na missa, o Jorge Pinto e o José Miguel Louro. Obrigado em nome de todos nós, grã-tabanqueiros, membros da Tabanca Grande. 
________________

Nota do editor:

Guiné 63/74 - P13293: IX Encontro Nacional da Tabanca Grande (33): Monte Real, 14 de junho: novos e velhos amigos, nas fotos do Rui Silva


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > > O reencontro de 3 amigos e vizinhos do oeste estremenho: da esquerda para a direita, Joaquim Jorge Jorge, de Peniche, e o Luís Graça e o Eduardo Jorge Ferreira, da Lourinhã. O Joaquim Jorge é a primeira vez que vem ao nosso encontro e vai para entrar para a nossa Tabanca, logo que nos mande uma foto da tropa.


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > > Da esquerda para a direita, o Carlos Alberto Pinto (Reboleira / Amadora), o Manuel Joaquim (Agualva / Sintra) e o José Saúde (Beja).


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Sejam bem vindos, camaradas! O Carlos Vinhal, sob o olhar da Dina Vinhal e da Regina Teresa (, esposa do Rui Silva), dá um valente alfabravo ao Jorge Rosales... Em segundo plano, o Hélder Sousa com o camarada José Nunes Francisco, emigrado no Luxemburgo, que veio pela primeira vez ao nosso Encontro por iniciativa de sua filha Graça Nunes.


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 >  É bom vê-los e tê-los de novo no nosso convivio anual: ao centro a Irene e à direita o Virgínio Briote, à esquerda, de perfil, o "comandante" Jorge Rosales, como a gente trata carinhosamente o régulo da Tabanca da Linha


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > O (re)encontro dos primos: Joel Silva (à esquerda) que veio de Vila Nova de Gaia, e o Virgínio Briote (ao centro)... Do lado direito, de costas, a Irene, esposa do nosso camarada (e editor jubilado) Briote.


IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > Na segunda fila, o António J. Pereira da Costa e a Isabel (Mem Martins / Sintra) que já  têm direito a diploma de honra pela sua assiduidade aos nossos encontros... Na primeira fila, da esquerda para a direita, o Jorge Canhão, a Maria Rosa Pinto (, esposa do Carlos Alberto Pinto, da Reboleira / Amadora) e a Maria de Lurdes, espoa do Jorge.



IX Encontro Nacional da Tabanca Grande > Palace Hotel Monte Real > 14 de junho de 2014 > O Jorge Canhão e a Maria de Lurdes (Oeiras): é um simpatiquísismo casal que já é "cliente" dos nossos encontros há uns anos... A Maria de Lurdes veio, pela primeira vez, se não erro, em 2011 (VI Encontro Nacional). Pelo aspeto, o Jorge Canhão "tem-se portado bem", impressão minha que foi corroborada pela alentejana Maria de Lurdes. Leia-se: já ultrapassou os seus problemas de saúde.

Fotos: © Rui Silva (2014). Todos os direitos reservados. {Edição e legendagem: LG]
________

terça-feira, 27 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13199: Manuscrito(s) (Luís Graça) (29): "A boda e a baile mandado... não vás sem ser convidado"... E os bailes que organizávamos, na tabanca do Bataclã, nos intervalos da guerra ?

1. Há um provérbio nortenho que diz: "A boda e a baile mandado... não vás sem ser convidado"...

No norte, e em especial na região de Entre Douro e Minho, faziam-se bailes "particulares" na casa de um homem de "respeito", com "filha casadoira", que contratava um tuna rural (viola, violão, rabeca...) e um "mandador"...

E claro, convidava os seus amigos e vizinhos e mais aqueles das suas relações que na próxima também o haveriam de convidar,  a ele e á sua filha...

A figura do "mandador" tinha duas funções: (i) por um lado, era um homem que sabia da "poda", isto é, tinha voz, sabia mandar, e sobretudo sabia das coreografias, das voltinhas que os pares tinham que dar (e daí a expressão "baile mandado", que é de influência francesa); (ii) por outro era um "homem respeitado, respeitador, e que sabia impor o respeito" (às vezes,  tinha que ser à chapada e a varapau)...

Porque,  no baile com mandador no Norte, os homens estão de um lado e as mulheres do outro. E o "mandador" no meio da sala... Os "homes" (sic) só dançam por indicação do mandador; as raparigas não podem dar o nega, recusar um convite para dançar,  a menos que já estejam "comprometidas"... (Nesse caso, só dançam com o namorado ou o noivo; e ai dela se se "astreve" a violar a regra!)...

A primeira vez que fui a um baile destes, com "mandador", tive que esperar a minha vez para dançar... E quando a vez chegou, a tuna tocava "a dança do fado"... Eu, que vinha de Lisboa, terra do fado, nunca tinha dançado o fado e fiquei meio enrascado, tendo que disfarçar a minha santa ignorância no que dizia respeito à coreografia...

Sim, senhor, eu sabia (iu melhor, soube mais tarde, por ter estudado o assunto) que o fado em tempos (séc. XIX) era (i) batido, (ii) dansado e (iii) cantado... Agora é só cantado!... E muitas vezes tristemente maltratado...

Está visto que, no antigamente, neste bailes, havia muitas vezes porrada... Eram sempre mais os machos que as fêmeas "descomprometidas", isto é, elegíveis para dançar...

Em Bissau, no final dos finalistas, a lógica era a mesma (*)...

Camaradas, levem isto para a brincadeira (**)...

Marco de Canaveses > Uma tuna rural dos anos 40 do séc. XX... 


(Fonte: AGUIAR, P. M. Vieira de - Descrição Histórica, Corográfica e Folclórica de Marco de Canaveses. Porto: Esc Tip Oficina de S. José. 1947). (Reproduzido com a devida vénia...)


2. Comentário de Rui Silva ao poste P13177 (*)
.
Se é para falar de bailes na Guiné, oh carago!,  há muito que contar ai há, há.

Começaram logo em casa do Sr. Rui libanês em Bissorã após um mês de chegarmos à Guiné, passando pelas verbenas do Sporting em Bissau, na sede do Benfica ali na estrada que ligava a praça do Império ao aeroporto, acabando na Associação Comercial aonde entrei porque houve engano.

Com "molho" ou sem "molho". Havia por ali muito menino que,  se não houvesse porrada nem parecia dia...
Hoje lemos o jornal a uma sombra e de óculos já com algumas dioptrias, mas naquele tempo o que a gente queria era dar à perna (ou às pernas). (...)

3. Comentário de L.G.:

Rui, quem é que não gostava da "bailação" ? Em Bambadinca, em Bafatá, em Bissorã, em Bissau... Toca a falar desses bailes, que fazíamos no intervalo da guerra... Até Monte Real, dia 14 de junho, ainda há tempo para escreveres uma crónica... Ab. Luis

PS - Também eu tenho um caso de um baile para contar; na  extensão de Bambadinca do Bataclã de Bafatá, e que acabou  dramaticamente, às tantas da manhã,  com a tentativa de reanimar, no posto médico, uma criança, filha de uma das nossas amigas, acometida de um grave (e fatal) problema de insuficiência cardiorrespiratória...Possivelmente, seria um caso de morte súbita durante o sono...

Um dia vou arranjar tempo e coragem para reconstituir este trágico episódio... se os meus camaradas, presentes nessa noite, me ajudarem a refrescar a memória... Há pormenores a rever. O médico de serviço, esse, lembro-me bem dele, também estava presente, tentando divertir-se: era o Alf Mil Méd Joaquim Vidal Saraiva, da CCS/BART 2917 (, o tal que ficou retido um dia no mato, connosco, CCAÇ 12 e Pel Caç Nat 52, na Op Tigre Vadio, uma operação a uma base do PAIGC em Madina / Belel, em Março de 1970; nunca tinha visto um médico a "alinhar" numa operação, no mato, e a sofrer connosco)...

Apesar de todos os esforços (e sobretudo do nosso Pastilhas e do dr. Vidal Saraiva), a criança morreu nas nossas mãos, já no posto médico de Bambadinca...  Ou já vinha morta, da morança onde a malta dançava...Sei que o baile acabou, com grande consternação... Fizemos, logo de manhã cedo,  uma coleta para pagar o funeral, em Bafatá...Já não me recordo bem do nome da jovem mãe, uma das nossas companheiras de noitadas, mas penso que era a Ana Maria...

_______________

Notas do editor:

(*)  Vd. poste de 22 de maio de  2014 > Guiné 63/74 - P13177: Efemérides (157): Como é que a revista Plateia e o seu correspondente local, João Benamor, 1º sargento e cartunista, "viram" o baile dos finalistas da Escola Técnica de Bissau em 5/6/1965... e as perturbações da "ordem pública", provocadas por uma "bando de energúmenos", possivelmente influenciados pelos relatos das tropelias dos "teddy boys" de Liverpool... (Virgnio Briote)

E ainda: 

22 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13176: Efemérides (153): Ainda a propósito do baile dos alunos finalistas da Escola Técnica de Bissau na Associação Comercial, Industrial e Agrícola, em 5 de junho de 1965: Apanhei 3 dias de prisão simples, dados pelo comandante militar, brig Gaspar de Sá Carneiro (Virgínio Briote, ex-alf mil cav, cmd, cmdt Gr Cmds "Os Diabólicos", CCmds / CTIG, Brá, 1965/66)

(**) Último poste da série > 22 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13176: Efemérides (153): Ainda a propósito do baile dos alunos finalistas da Escola Técnica de Bissau na Associação Comercial, Industrial e Agrícola, em 5 de junho de 1965: Apanhei 3 dias de prisão simples, dados pelo comandante militar, brig Gaspar de Sá Carneiro (Virgínio Briote, ex-alf mil cav, cmd, cmdt Gr Cmds "Os Diabólicos", CCmds / CTIG, Brá, 1965/66)

terça-feira, 20 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13170: Convívios (598): Rescaldo do Encontro do pessoal da CCAÇ 816, realizado no passado dia 10 de Maio de 2014 nas Caldas das Taipas ( Rui Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 12 de Maio de 2014:

Caro e estimado amigo Vinhal:
Recebe um abração!

No passado sábado, e como é habitual fazer no segundo sábado de Maio, a Companhia de Caçadores n.º 816, que esteve na Guiné entre 1965 e 1967, realizou mais um Convívio anual e que, mais uma vez, teve, para grande satisfação da malta, uma boa presença.

Cerca de 60 (!) militares da Companhia conviveram alegre e fraternalmente durante praticamente todo o dia. Esposas, muitas, filhos e netos – não faltará muito para haver bisnetos- juntaram-se também à grande festa da 816.

O evento realizou-se desta feita nas Caldas das Taipas (Guimarães), terra do seu realizador, o grande amigo “Manel das Taipas”, um elemento da 816, claro está.

A festa começou com a concentração do pessoal no Largo da Feira junto aos bombeiros.
Seguiu-se a habitual missa por Ação de Graças dos que faleceram, os muito saudosos e queridos da Companhia, o Furriel Silva e o soldado Manso que deixaram a vida em combate, e outros que entretanto e ao longo do tempo nos foram deixando. A Missa teve lugar na bonita Igreja de Sande S. Martinho onde pontificavam bonitos altares em talha dourada e pinturas no teto adequadas à religião.
Um bonito Grupo Coral deu mais brilho à cerimónia.

No restaurante Albino, também na localidade de Sande S. Martinho, seguiu-se o almoço de confraternização.
Pelo meio da tarde, o momento solene da divisão do Bolo tradicional, sempre com o emblema da 816 destacado, e com o champanhe a acompanhar.

O Capitão, Comandante da Companhia (hoje Tenente Coronel reformado) Luís Riquito, fechou a cerimónia com a habitual e reconfortante alocução.

A despedida teve então lugar com abraços e mais abraços agora já com lágrima a aflorar nos olhos (sempre são quase 50 anos que partimos para a Guiné) de muitos, pois, como alguém disse, a vivência na guerra da Guiné tornou-nos muito, muito mais, que amigos.

Eu, com o amigo Jorge, figura incontornável da Companhia que veio com esta para Portugal. Viveu e cresceu com a família Marques (o Luís José Marques, Furriel da Companhia) que o acolheu e protegeu de forma insuperável

 A cerimónia litúrgica na bonita Igreja de Sande S. Martinho

 Na escadaria da Igreja houve lugar à foto de família (só os ex-militares)

A sala do restaurante preenchida com os militares da 816 e suas famílias

O bolo tradicional muito bem desenhado e confecionado

O Capitão Luís Riquito parte o bolo com a “ajuda” de um neto do “Manel das Taipas”
____________

Nota do editor

Último poste da série de 20 DE MAIO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13168: Convívios (597): Rescaldo do Convívio da CART 2679 e Pel Caç Nat 65, realizado nos passados dias 10 e 11 de Maio de 2014 em Tomar (José Manuel Matos Dinis)

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P13025: 10º aniversário do nosso blogue (18): Sou um privilegiado. Faço parte dos 650 (Rui Silva)



10.º Aniversário do Blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné”

- Claro que não podia deixar passar o 10 .º Aniversário do Blogue sem vir à “parada” dizer o que me vai na alma -

Em primeiro lugar, parabéns ao Blogue, nas pessoas:

- Do seu distinto fundador, camaradão Luís Graça, a que é oportuno se louvar o seu grande nível quer cultural quer intelectual, que valorizam extraordinariamente o Blogue e que, em boa e feliz hora, o montou e desenvolveu.

Bem hajas Luís, e o meu continuado obrigado (!)

- Parabéns ao abnegado, prestimoso e estimado co-editor, meu grande amigo Carlos Vinhal.

- Parabéns ao co-editor e grande colaborador também, meu grande amigo Magalhães Ribeiro.

- Parabéns ao Hélder Sousa e à colaboração, também pelos seus desenhos, ao Miguel Pessoa.

- Parabéns a outros colaboradores que, não estando em cena atualmente, muito contribuíram também ao desenvolvimento de tão notável como importante rubrica na internete, afinal o mais atual e sofisticado meio de comunicação na sociedade de hoje.

- Parabéns a todos que colaboram com as suas escritas, as suas histórias, a sua poesia, os seus comentários e até os seus pensamentos.

Afinal, parabéns 649 camaradas!!

P. S. - peço desculpa ao Miguel por utilizar o excelente trabalho gráfico que ele fez.

Rui Silva
____________

Notas do editor

Rui Silva foi Fur Mil na CCAÇ 816 (BissorãOlossatoMansoa, 1965/67)

Último poste da série de 23 DE ABRIL DE 2014 > Guiné 63/74 - P13024: 10º aniversário do nosso blogue (17): A Tabanca do Centro associa-se a este dia grande para a Tabanca Grande e para a sua tertúlia

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12926: Convívios (577): Encontro comemorativo do 47.º aniversário do regresso da CCAÇ 816, a realizar no próximo dia 10 de Maio de 2014 nas Caldas das Taipas (Rui Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 15 de Janeiro de 2014:

Caríssimos:
O que me ocorre logo e antes de tudo, é formular o desejo de uma boa saúde nas vossas pessoas e familiares queridos.
Agradecia que fosse publicado no “Querido Blogue” o programa da festa da família 816 que este ano ocorre na simpática terra de Caldas das Taipas.
Manda di ronco no dia 10 de maio e que faz sensivelmente 47 anos da chegada ao cais da Rocha do Conde de Óbidos. Isso mesmo, da chegada!... Irra!!).

Um abraço para toda a tertúlia.
Rui Silva


____________

Nota do editor

Último poste da série de 30 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12916: Convívios (576): XVII Encontro do pessoal do BCAÇ 4514, Estarreja, dia 5 de Abril de 2014

sábado, 18 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12601: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (27): Operações Vacas


1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 15 de Janeiro de 2014:

Caros amigos Luís, Vinhal e M. Ribeiro:
Aí vai, com um abração, mais um conto extraído do meu caderno de memórias.
Rui Silva



Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Do meu livro de memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa” 

27 - OPERAÇÕES - VACA

Na minha Companhia era assim e provavelmente na tua também.
O que se apanhava, e refiro-me aqui e agora à recolha (desvio, mudança de dono, etc.) de gado no mato, era compartilhado irmãmente pela população do Olossato: vaca para nós; vaca para eles.

- Não serei o primeiro a dar-lhe este nome (operação-vaca) aqui no Blogue, pois o Veríssimo Ferreira assim lhe chama no Post 12413.
(Não sabia que no célebre K3 - bifurcação das estradas para o Olossato e para Mansabá, para quem vinha de Farim - já lá havia tropa em 1966). Andámos lá perto em operações de golpes-de-mão e emboscadas -.

O nosso Capitão, e honra lhe seja feita, tinha uma filosofia da guerra muito ortodoxa (para mim e por certo para toda agente da 816). Grande comandante operacional no terreno e também no desenvolvimento dos valores morais, da ética e sobretudo humanos e culturais das povoações por onde assentávamos arraiais.
O tratamento com os seus militares era insuperável, era como se diz, “terra-a-terra” mas sem a mínima quebra do respeito hierárquico. Respeitava e fazia-se respeitar.
Uma das suas primeiras preocupações, não militares, era pôr as crianças numa “escola” com um Furriel a ensinar.
A simbiose população-tropa ou tropa-população, era um dos seus propósitos prioritários.
Não me esqueço mais, e isto já no campo militar, ele tirar a MG 42 do tripé e pô-la no parapeito da autometralhadora improvisada numa GMC (o “Águia Negra” Rogério Cardoso sabe do que estou a falar) expondo-se assim, muito a jeito, à trajetória das balas e dos estilhaços (destes não se livrou, ainda que não gravemente) das granadas inimigas (não foram poucas) numa das emboscadas mais problemáticas que a Companhia sofreu durante a refrega africana. Outra atitude de rara coragem e aqui vou citar o meu grande amigo Rui Alexandrino no seu extraordinário e singular livro “Rumo a Fulacunda”:

...acorri ao local onde deparei com uma cena terrivelmente chocante e verdadeiramente trágica.
Numa viatura GMC da Companhia que estava parada junto à arrecadação, anexa à caserna dos Soldados que se aprontava para escoltar aquela coluna, envoltos em chamas, atingido que fora o depósito da gasolina, ardiam 2 militares do 3.º pelotão.
Rebentavam ininterruptamente granadas de mão e de morteiro que já tinham sido colocadas na caixa da viatura.
O pandemónio e a desorientação eram gerais.
Imóveis os sinistrados, já mortos, ardiam.
Incrédulos, protegiam-se os restantes encobertos pelos cantos e pelas paredes dos edifícios anexos sem saber muito bem qual a atitude a tomar, qual a acção a desenvolver.
Tomou então a iniciativa o Capitão Riquito, comandante da 816 que, protegido por uma auto-metralhadora DAIMLER se aventurou até junto da viatura em chamas, a destravou, lhe engatou um cabo de reboque para que fosse arrastada para o meio da parada, longe da arrecadação onde existiam mais granadas e munições.
Esgotado o combustível e arrefecida a viatura, foi então possível fazer o rescaldo do incêndio e resgatar os corpos que estavam completamente carbonizados.
Uma verdadeira desgraça! Um inacreditável horror!

Recordo bem das primeiras advertências do Capitão (particularmente, e ainda hoje, chamamos-lhe Grande Capitão) dele, logo nos primeiros dias de campanha: Quem fizesse engravidar assumia a paternidade. Balizava o procedimento do pessoal de uma forma humana e muito altruísta. Aquele foi um dos mandamentos a cumprir. Terá sido cumprido?... Julgo que sim.

O povo do Olossato e a tropa da 816 puxavam para o mesmo lado.
Olossato era uma povoação guineense das mais pequenas certamente.
Fomos ali substituir a 566 (um abraço Zé Ribeiro) uma Companhia que tinha feito um belíssimo trabalho quer no campo da luta, quer na construção e na defesa do aquartelamento, quer ainda na ajuda aos sacrificados nativos. Fomos “apresentados” numa ida à base de Iracunda e que foi o batismo de fogo para 2 Grupos de Combate da 816, um batizado que demorou aproximadamente 25 minutos de fogachada (chamei pela minha mãe ali a primeira vez - será que ela ouviu? Até pareceu…-).

Para começar… nada mau…. e eu que me gabava de não me meter com ninguém.
Julgo que a 566 foi a primeira Companhia a sediar e a reconstruir o Olossato.
Nós da 816, fomos render aquela Companhia em outubro de 1965.
Ficamos por ali praticamente 1 ano.

O Olossato foi por assim dizer a nossa terra na Guiné. Fomos encontrar meia dúzia de casas em alvenaria, supostamente outrora de colonos, e o resto era a pequena tabanca das gentes nativas do Olossato.

Havia um chefe de posto com casa própria. Do lado para Farim a loja de panos do Sr. Fodé, a casa do padeiro do outro lado e pouco mais. Isto logo a seguir ao cavalo de frisa que fechava o aquartelamento desse lado. Do lado de Bissorã, já havia mais casas. Logo imediatamente antes da “Porta d’armas”, 2 a 3 casas a vender miudezas, panos garridos e diversidade de coisas muito simples e corriqueiras, regionais e artesanais - a necessidade aguça o engenho - ouvi já isto em qualquer lado. Por ali também inevitavelmente o grande barracão, outrora serração onde se acomodava a guarnição dos Obuses do meu querido amigo Alferes miliciano Brandão.

Libaneses, nem um, ao contrário de Bissorã onde lembro os bailes em casa do Sr. Rui. (eu? Não, o Libanês). Saudades? Talvez! Até então onde tínhamos estado.
No Olossato, bem dentro do aquartelamento, este bem fortificado com troncos de palmeira e chapa de bidão a guarnecer, e de planta quadrada, apenas um civil: um velhote cabo-verdiano que cultivava ananases não sei onde e para o lado de Maqué. Saía de bicicleta e usava um chapéu típico de expedicionário africano. Para ele não havia guerra.
Tinha uma casa também em alvenaria e esta ficava escondida num matagal de plantas e árvores, com algum toque de ajardinado, diga-se. Figura um pouco enigmática.

Dentro do quartel só havia casas em alvenaria e também mais um barracão (sempre as serrações) que servia de caserna aos soldados.
A tabanca da população flanqueava todo o lado Norte do aquartelamento e do lado de fora deste.
Olossato, bem dentro do Oio, e relativamente perto de Morés sempre foi uma povoação da Guiné mas terá sido completamente abandonada aquando de Morés se tornar uma das principais bases inimigas na Guiné. Aqui e julgo que foi a 566 que recolheu gente no mato e trouxe para o Olossato e aí renasceu aquela terra.

Um momento de festa e alegria do humilde povo do Olossato. Senti o pulsar da franca alegria daquela gente. Arrepiava, o chão, vermelho, até tremia. O riso das bajudas e até das mais velhas (estas mais traquejadas nos movimentos da dança) era largo. De face a face, e a mostrar toda uma dentadura muita branca e alinhada. Dentes tinham, nozes? Nem tanto…

Passado este introito (talvez longo. Desculpem!) vamos então às célebres e denominadas “Operações-vaca”.
As “Operações-vaca” tinham por fim, e daí a afinidade com o seu nome, o apanhar, para não usar outro termo mais apropriado, de gado ao inimigo ou pró-inimigo. A maioria do gado em poder daqueles, sabia-se, que era “roubado” aqui e acolá em pequenas povoações indefesas ou aquelas que não queriam colaborar com eles, e que na maioria dos casos não tinha qualquer proteção da tropa. Acresce dizer, que nestas povoações, sem qualquer proteção da tropa, o pessoal aí habitante era sempre suspeito, claro, de colaborarem com os “turras”, ou, no melhor das hipóteses, jogarem com um pau de 2 bicos - coitados pelo dilema -, isto é, eram por eles quando estes apareciam e eram por nós quando aparecíamos nós. Claro que esta situação nunca era de nos convir e, portanto, sempre que eles se negavam ao nosso convite de virem fazer a sua vida e o seu trabalho na povoação de Olossato, onde estariam a coberto das investidas e da política inimiga, ficavam então rotulados de "meio-turras” senão de “turras” mesmo, e daí as consequências. Estas no entanto não eram bem dentro da maneira de atuar da 816 mas, outras Companhias, para quem não acompanhasse a tropa ia-se lá ao outro dia…
Não estou, seguramente, a fazer juízos de valor.
O inimigo também fazia as suas retaliações, para com aquele pessoal, oh(!) se fazia!

Bom, mas para não me desviar das “Operações-vaca”, então sempre que nos inteirávamos de que o inimigo tinha algures grande quantidade de vacas que justificasse a nossa ida (e a nossa necessidade) lá nos púnhamos a caminho. O gado normalmente era guardado por um ou outro indígena, quase sempre armado, e que logo tratava de se por ao fresco, fazendo no entanto antes uma rajada ao pressentir a aproximação da tropa. A rajada era mais para avisar as “casa-de-mato” próximas do que alvejar alguém, mas se pudesse acontecer as duas coisas…

Como estas operações se faziam com alguma frequência nunca faltava carne à tropa e à ávida população, pois o Capitão compartilhava o “apuro” com os nossos fieis amigos e nativos do Olossato.

Era uma operação típica e grotesca; o risco a correr pela malta, salvo um encontro fortuito, embora sempre de admitir logo fora do arame farpado, não era muito previsível, pois, como atrás disse, as vacas nunca estavam, obviamente, perto dos refúgios dos “turras”, e, uma vez as vacas na nossa posse, toda a cena decorrente fazia lembrar o “Far-West”. Aquela grande quantidade de reses, só de uma vez foram à volta de 100, em fila indiana, acompanhada da malta de arma nas mãos, também a fazer lembrar os pistoleiros daquelas paragens do Oeste americano. Havia soldados que chegavam a montar nas vacas, ao bom estilo do rodeo americano, o que elas, aos pulos, tentavam sacudir. Alguns bem queriam mas não havia hipótese, e tudo aquilo tinha feições de um filme de “cow-boys”. Um rodeo (!), isso mesmo! Como víamos nos filmes.

Raramente os terroristas apareciam emboscados, pois como o sequestro era feito de surpresa e em jeito, só tarde eles se apercebiam do golpe, e quando eles apareciam, o azar que havia, era ficar uma ou outra vaca com uma rajada no lombo, pasto para os abutres que andavam sempre por perto. Homem armado, abutre por perto, parecia.

Junto da nossa cozinha, refiro-me à cozinha dos Furriéis, havia uma enorme árvore e por lá estavam sempre meia dúzia de abutres. Apetecia fazer tiro ao alvo, mas constava-se que era proibido (?) matar abutres. E por falar em abutres também lembro-me bem de encontrarmos um burro morto ali para os lados da célebre serração na estrada para o K3 inteirinho na carcaça exterior e com todo o interior comido.
Parecia que estava a dormir. Curioso. Os abutres tiveram o cuidado de preservar a total fisionomia exterior do burro. Literalmente. Prontinho a encher para embalsamar. Impressionante o trabalho cirúrgico dos sinistros abutres.

Carne (aqui já estou a falar das vacas não da do burro), portanto não faltava mesmo com semanas a comer com arroz (mal) pilado, por falta de reabastecimento. O pontão de Maqué (entre Bissorã e Olossato, mais ou menos a meio caminho) onde obrigatoriamente passavam as colunas motorizadas e de reabastecimento era destruído com alguma regularidade pelo inimigo. Mais tarde teve ali lugar um destacamento.
Na nossa companhia havia um magarefe de profissão (civil), o que ajudava e muito a seleção criteriosa de toda a carne do animal Os miolos fritos bem regados a cerveja era um pitéu logo ao meio da manhã.

As operações-vaca rendiam uma boa petiscada ao meio da manhã: miolos fritos muito bem regados a cerveja. Como se pode ver, nos Furriéis também havia bons corneteiros. Eu estou a dizer para a objetiva “ai que rico pitéu”.


Vistas aéreas (de ângulos diferentes - quase opostos -) de Olossato . A primeira foto, propriedade do meu amigo José Ribeiro (CART 566) foi tirada em 1965 e a segunda em 1966, com a diferença sensivelmente de um ano, portanto. Como ponto de referência das duas fotos a caserna dos soldados (A).
____________

Nota do editor

Último poste da série de 22 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12188: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (26): Como se faz acabar o vício de cravar cigarros aos outros

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12466: Boas Festas (2013/14) (8): Tony Borié, Rui Silva, Ricardo Figueiredo, José Colaço, Jorge Picado e Torcato Mendonça

1. Mensagem natalícia do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66:



Como me chamo já não importa, pois nunca esqueço que fui combatente.
Depois da escola, na minha inocência, esperei pela guerra com ar sorridente.
Era o Tó d’Agar, era aldeão, era feliz, pastoreava as ovelhas, sempre contente.
Depois era o “Cifra”, um nome de guerra, havia tiros, havia luta, na África ardente.

No século passado, nos anos sessenta, tal como vocês, fui mobilizado.
Passei dois “Natais”, sempre com medo, de arame farpado estava cercado.
Era um jovem, nos melhores anos, mas já não era um camponês, andava fardado.
Andei por bolanhas, vi terra vermelha, mosquitos ferozes, desesperado.

Sujo de sangue, pó, lama, água da bolanha, suor do calor, quente e abafado.
Todos o usavam, o Curvas Refilão, o Setúbal, o Trinta e Seis, ou o Marafado.
Servia de manto, onde enrolavam um companheiro de balas crivado.
Roto, sem mangas, já não era amarelo, verde ou castanho, aquele camuflado.

Havia algum álcool, cigarros feitos à mão, arroz da bolanha e muitos tormentos.
Agora é Natal, ano de 2013, esquecemos a guerra por alguns momentos.
Vamos festejar, eu sei que há guerra, mas ainda virão alguns melhores tempos.
Estamos vivos, uns com saúde, outros vivendo com os seus sofrimentos.

Os anos passaram, Portugal está longe, a minha bandeira, por quem combati
Não vos esqueço, meus companheiros, heróis combatentes, com quem convivi.
Neste Natal, época festiva, de amizade e com alegria, que jamais esqueci.
Sorriam, sejam felizes, vão ter saúde, olha o Pai Natal, que eu acredito, mas nunca vi!

Vamos abraçar, os familiares, os amigos, trocar prendas, “fugir daquele canto”.
Comer bolo-rei, esperar mais um ano, ver aquelas fotos a preto e branco.
Ouvir música, dançar, rir, beber um bom vinho, seja tinto ou branco.
Andar por aí, apanhar sol, nem que às vezes, tenha que ser, sentado num banco.

O vosso companheiro, que está feliz, por ter chegado ao Natal de 2013, que vos deseja o mais Feliz Natal do mundo e que o Ano de 2014 vos traga muita saúde e tudo o que mais desejarem.

Tony Borie, 2013

************

2. Mensagem de Natal do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67):

Todo o sempre com os camarigos no coração, esta quadra é um bom pretexto para os contatar e assim poder desejar-lhes umas Boas Festas, na melhor da saúde e felicidade.

Bem hajam e tenham um Natal 365 dias por ano!

Um abraço para todos.
Rui Silva

PS: No “postal”, que junto, pendurei a vista aérea do Olossato, prestando (ou querendo prestar), uma simples homenagem aquele sacrificado povo a que natureza só lhes deu bom coração, nada mais, nada mais…
Boas festas Guineenses.


************

3. Mensagem do nosso camarada Ricardo Figueiredo (ex-Fur Mil da 2.ª CART/BART 6523, Cabuca, 1973/74):

Aos meus Bons Amigos e Familia
Desejo um SANTO NATAL e que o novo Ano de 2014 que se avizinha, seja mensageiro de muita PAZ, SAÚDE e AMOR.

São os votos sinceros do
Ricardo Figueiredo e Família



************

Monte Real, 2012 - VII Encontro da Tertúlia
Foto: Juvenal Amado


4. Mensagem do nosso camarada José Colaço (ex-Soldado Trms da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)

Desejo a todos os camarigos aqui presentes e ausentes, uns por motivos imponderáveis, outros por opção, um Santo Natal e um bom ano novo 2014.

Cumprimentos
Colaço


************

5. Mensagem do nosso camarada Jorge Picado (ex-Cap Mil na CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, na CART 2732, Mansabá e no CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72):

Caríssimo Amigo Carlos
A poucos dias de entrarmos em mais um inverno das nossas vidas e próximo da chegada do Natal, aqui vai o meu sinal de que continuo "agarrado", ainda que não pareça, ao Blogue.

Para toda a Grande Família desta Tabanca, onde incluio os que possam não estar na "Grande", mas participam nas "Tabancas Adjacentes", envio os votos de um Bom Natal com muita saúde e alegria, bem como o desejo de que 2014 seja tão cheio, tão cheio de melhorias como este moliceiro tão carregado de moliço da Ria de Aveiro, nos tempos de outrora.

Grande Abraço
Jorge Picado


************



6. Mensagem do nosso camarada Torcato Mendonça, ex-Alf Mil da CART 2339, Mansambo, 1968/69:

Natal de 1968
Foi o único que passei na Guiné – embarquei, para lá, em Janeiro de 68 e regressei em meados de Dezembro de 69.
Quarenta e cinco anos já passaram em tempo rápido, demasiado apressado e encurtando, cada vez mais, a distância à meta.
Ainda recordo aquele Natal por ter deixado marca certamente e, sempre que acontece Natal, vou até lá um pouco.

Agora, neste ano, quarenta e cinco depois, fui ler o “Historial da Companhia” para ver o mês de Dezembro de 68, lá estava uma Operação no dia 23,duração de dois dias, juntamente com militares de outra Companhia à zona do Galoiel e Biro. Tivemos fraco contacto com o IN que, talvez por gentileza devido à data que se aproximava, bateu em retirada apressada. Deixou uma prenda que foi desativada. Tudo bons rapazes e ainda hoje temos exemplos.
Nessa Operação participou o Ten-Coronel Pimentel Bastos, Comandante do BCaç 2852 de Bambadinca. Creio mesmo, a memória não me atraiçoa, que nesse dia fez 51 anos.

Regressamos a Mansambo a tempo das festividades Natalícias. Talvez tenhamos comido melhor, talvez tenhamos tentado dar um pouco de “Espirito de Natal”, talvez. De certeza, que o mais presente foram os olhares para o céu, um céu diferente nas estrelas mas, para a maioria daqueles homens, gentes do Norte e com forte religiosidade, conseguiram certamente trazer para ali o céu de seu País e sentiram-se assim mais perto de suas famílias. Muitos já eram casados e tinham filhos. A maioria não entendia porque ali estava metida em oito abrigos, semienterrados e aprisionados naquele hectare, de forma quadrada, na mata desbravada, com fiadas de arame farpado e garrafas de cerveja dependuradas, sem luz, duvidosa água potável e comida desenxabida.

Nesse Natal tentavam comer, beber e abrir sorrisos de encomenda, sorrisos que eram mais esgares em rostos habituados a estarem fechados. Mas era Natal e certamente lá longe as famílias enviavam pensamentos para eles… talvez se encontrassem no caminho.
Natal diferente este de sessenta e oito como fora o de sessenta e sete e seria o de sessenta e nove. Um, onde fortemente se sentia a partida próxima, outro lá onde a amizade e a camaradagem marcaram forte presença e o outro, já cá, depois do regresso com a família, as recordações do outro e dos camaradas e sentirem-se um pouco perdidos em pensamentos de confusão na habituação à vida civil.

Quarenta e cinco anos depois as recordações ainda aparecem, algumas fortes e a recordarem tempos de afetos no sentir Natal.
Diferente hoje, já Século XXI, onde a força do marketing e do consumismo nos presenteiam com Natais de desembrulha e deita fora. Certamente deixam brevíssimas recordações.
Pessimista? Talvez!

PARA TODOS UM SANTO NATAL, COM O VELHO ESPÍRITO NATALÍCIO.
UM ÓPTIMO 2014 COM SAÚDE E RESPEITO PELO HOMEM.

____________

Nota do editor

Último poste da série de 15 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12454: Boas Festas (2013/14) (7): Alberto Sousa e Silva, Manuel Maia, Jorge Teixeira, Giselda e Miguel Pessoa, Felismina Costa, Hilário Peixeiro, Manuel Lema Santos e Joaquim Cardoso