terça-feira, 2 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11788: Bom ou mau tempo na bolanha (16): Afro-americanos (Tony Borié)

Décimo sexto episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.



Saindo de Nova Jersey, seguindo a rota junto ao oceano Atlântico com direcção ao sul, encontrámos diversos estados que em tempos, para vergonha de alguns capítulos da história mundial, usaram o trabalho forçado de pessoas, vindas principalmente do outro lado desse mesmo Atlântico, da costa de África, pessoas essas, que hoje nos Estados Unidos chamam de afro-americanos.
O Cifra, que neste texto se chama Tony, talvez pela sua experiência durante o conflito da Guiné, teve muitos amigos afro-americanos, teve um com quem trabalhou por dezenas de anos, e talvez lembrando o Iafane, o tal barqueiro do rio Mansoa, também lhe chamava de “brother”, conviveu com ele e com a sua família, viu os seus costumes e a sua maneira de proceder, que não faziam muita diferença dos costumes de qualquer português, do fim do século passado, oriundo de Trás-os-Montes ou da Beira Litoral.

Na sua casa a ementa era à base de carne de porco, alguma salgada, comiam couves, batatas e outros vegetais, comiam milho, que podia ser cosido ou frito, depois de um pouco triturado e mal amassado. Os sentimentos de família eram iguais, ou ainda mais puros que os nossos, era oriundo do estado da Geórgia, tinha algum orgulho em dizer que os seus avós era “escravos”, sabia o que era o bem ou o mal, apesar de ser uma pessoa com o corpo de um atleta, tinha uma humildade rara, mesmo rara, que chegava ao ponto de o Tony lhe dizer por muitas vezes que tinha que ser mais rude e agressivo, para que as pessoas lhe tivessem mais respeito.

Como vinha frequentemente à Florida, o Tony, um dia demorou três dias para fazer a distância, que é mais ou menos mil e quinhentos quilómetros, e veio de automóvel pela costa Atlântica, passando pelas pequenas vilas e aldeias, de Nova Jersey até à Florida. Como vivia do lado sul do rio Hudson, ou seja do outro lado de Manhattan, em Nova Iorque, tomou o rumo do sul e travessou o resto do estado, tomando o barco que cruza a Baía de Delaware, com algum nevoeiro pela manhã e algumas gaivotas, que quando lhe acenam com comida voam até à mão das pessoas. Atravessou o estado de Delaware, onde se pode ver barracas à beira da estrada, tal como se via no Ribatejo, no verão a venderem melões, que vendiam toda a qualidade de marisco fresco, pescado na noite anterior, no fim desse estado atravessou a ponte, que tem mais de vinte quilómetros de extensão, incluindo um túnel, na Baía de Chesapeake, túnel este que está localizado mais ou menos a meio da ponte, que é para dar passagem aos gigantes Porta-Aviões, onde podiam caber muitos milhares das nossas “LDM”, que andavam pelos rios e canais da Guiné, que saem e entram na base naval de Norfolk, no estado de Virgínia.

Passou pelo estado de Carolina do Norte, onde tirando a cidade de Greenville, com algum impacto industrial, especialmente na área farmacêutica, todas as outras povoações, pelo menos junto ao mar, ou são piscatórias ou se dedicam à agricultura, em especial o tabaco. Chegado à cidade de Wilmington, bastante animada, pelo menos à hora que por lá passou, com “música de Jazz” pelas ruas, onde na parte histórica, com um passeio junto ao rio com mais de um quilómetro de extensão, tem todo o tipo de atracções, aí parou e dormiu.

Pela manhã entrou na Carolina do Sul, onde já começou a ver algumas plantações de algodão, que lhe fizeram lembrar a tal fase menos boa da história mundial, passam na famosa praia de Myrtle Beach, com mais de vinte quilómetros de praia e atracções, dizem que nos meses de verão esta praia não dorme, segue rumo ao sul, passa na cidade Charleston, que é uma cidade portuária onde se juntam os rios Ashley e Cooper, e vão juntos para o Atlântico, tem um mercado livre onde se vende de tudo, qualquer pessoa que se queira desfazer de algo, simplesmente vai lá, expõe em alguma banca disponível, e faz o seu negócio. Há esplanadas e cafés como na Europa.

Na Geórgia, já em mangas de camisa, pois o clima já era quente e agradável, parou na cidade de Savannah, é histórica, era o principal porto de transacção de escravos para as plantações de algodão e não só, ainda hoje se pode ver onde existiu o mercado de escravos, tem casas senhoriais, autênticas mansões com extensões de terreno e entradas com portões altos e em arco demonstrando grandeza, em comparação pode ver-se nos arrabaldes junto ao rio, em terras alagadiças, as barracas que eram as habitações desses escravos, avós do amigo do Tony, a quem este chamava “brother”.Esta cidade vive muito do historial do passado, quem vai visitar a parte mais antiga fica um pouco impressionado, ao Tony cheirava-lhe a África, cheirava- lhe às tabancas de Mansoa, parece que tudo tem história, as pessoas sentem-se atraídas por essa mesma história. Próximo do porto de mar algumas ruas estreitas estão lá, a mostrar como os senhores no passado compravam, usavam e depois vendiam ou matavam qualquer bisavô do “Iafane”, barqueiro de Mansoa, que não seguisse as leis de escravatura que na época existiam, em que os bisavós, dos agora afro-americanos, eram tratados simplesmente como peças de ferramenta, nas plantações de algodão, ou numa roça de cana de açúcar, onde a vida de um ser humano tinha o mesmo, ou menos valor que a de certos animais.

Sempre rumo ao sul, no mesmo estado há povoações distantes alguns quilómetros umas das outras, a povoação surge com o aparecimento de uma ponte, sinal de que por ali passa um rio, a seguir, uma pequena casa retirada da estrada, com um pequeno cemitério ao lado dessa mesma casa, dois ou três carros em ruínas, uma pequena plantação de tabaco, uma pessoa ou duas, sentadas na frente da casa mascando tabaco, um cão e algumas galinhas à solta, às vezes um cavalo, seguem-se mais seis ou sete casas idênticas, vem uma loja utilitária, com uma bomba de gasolina, a seguir é a casa dos bombeiros, os correios, no mesmo edifício da polícia, depois uma igreja, retirada e com um largo na frente, e seguem-se mais seis ou sete casas idênticas à primeira, e termina a povoação.


O Tony parou, numa dessas povoações, para encher o depósito da gasolina, não estava ninguém a atender, tinha um letreiro, dizendo que chamasse, bem alto, por determinado nome, assim o fez e surge uma mulher, afro-americana, com três filhos, todos pela mão uns dos outros, e diz:
- Não posso encher o depósito, mas vendo alguma gasolina. Também tenho aguardente de milho, beterraba, cana de assucar e outras plantas, que o meu marido faz na floresta.


O Tony comprou, e a mulher entregou-lhe a aguardente, “moonshine”, dentro de uma garrafa de água mineral, com rótulo e tudo, dizendo que era a melhor água mineral da Geórgia!.

Finalmente, chegou à Florida!.
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Nota do editor

Último poste da série de 25 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11763: Bom ou mau tempo na bolanha (15): Os verdes anos (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P11787: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (25): As populações de Sanconhá (Guiné-Bissau) e Sansalé (Guiné-Conacri) trabalham em conjunto para criar área comunitária protegida e transfronteiriça de N' Compa, com apoio das ONG AD e Cadi-Boké


Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez > Setor de Cacine > Corredor transfonteirça > 2013 > Linha da fronteira a 40 km de Boké



Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez > Setor de Cacine > Corredor transfronteiriço > Mata de N' Compa  > 2013 > Zona de encosta  (1) 




Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez > Setor de Cacine > Corredor transfronteiriço > Mata de N' Compa >  2013 > Zona da encosta (2)



Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez > Zona transfronteiriça > Mata de N' Compa  2013 > Interior da 



Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez > Setor de Cacine > Corredor transfronteiriço > Mata de N' Compa >  2013 > Interior da mata   (1)


Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez >  Setor de Cacine > Corredor transfronteiriço > Mata de N' Compa >  2013 > Interior da mata   (2)



Guiné-Bissau > Região de Tombali >  Parque Nacional de Cantanhez > Setor de Cacine > Corredor transfronteiriço > Mata de N' Compa >  2013 > Um dos pontos de água (bebedouros) no pico da época seca


Fotos (e texto):  © AD - Acção para o Desenvolvimento (2013). Todos os direitos reservados  [Com a devida vénia...]


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Setor de Cacine > Criação da Área Comunitária Protegida e transfronteiriça de N' Compa


Mesmo no sul da Guiné-Bissau, junto à fronteira com a Guiné-Conakry, as  comunidades das tabancas de Sanconhá e Sansalé iniciaram um processo para a  salvaguarda da mata de N’Compa, importante reserva de animais selvagens que a  frequentam pelo acesso à água durante a época seca, bem como de refúgio das
ameaças dos caçadores comerciais, cada vez em maior número.(*)

Ficou decidido que se procedesse para já à identificação das principais espécies  animais que demandam este local, bem como aquelas que estão mais ameaçadas.

No futuro serão realizadas formações para guardas comunitários e guias ecoturísticos. No imediato, já foi identificado um guarda e um guia.

Fonte: Sítio da AD - Acção para o Desenvolvimento > 24 de junho de 2013.  (**)



Guiné > Região de Tombali >Mapa de Cacoca / Gadamael (1954) > Escala 1/50 mil >Posição relatiiva de Sangonhá e de Sansalé (esta já na República da Guiné-Conacri). Outras povoações do regulado de Gadamael: Ganturé, Bricama, Jabicunda... Não tenho a certeza se Cacoca pertencia (na época colonial) ao regulado de Gadamael ou de Cacine. (LG)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013)

1. Sobre o magnífico, inestimável e insubstituível trabalho dos nossos amigos da AD - Bissau, nesta região do sul da Guiné, vd. o Relatório de Actividades de 2010 a 2012, em particular o Programa Integrado de Cubucaré (PIC), dirigido pelo eng. Abubacar Serra, a quem mandamos saudações e votos de boa saúde e bom trabalho, extensivos a toda a sua equipa.

Vd. também o trabalho de investigação que o bioantropólogo português Rui Sá está fazer, desde há 7 anos, com os chimpanzés da Guiné-Bissauu: entrevista (15') ao programa Científica Mente, da RTP1, em 25 de maio de 2013.

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Notas do editor:

(*) Sobre o Parque Nacional das Florestas de  Cantanhez (que é preciso salvar!), os seus pontos fortes e fracos, bem como as oportunidades que ele representam e as ameaças que sobre ele recaem, vd. postes de

24 de abrill de 2008 > Guiné 63/74 - P2793: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (15): Salvemos o Cantanhez (I). Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Sector de Bedanda > Cananima > 2 de Março de 2008 .

15 de maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2846: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (16): Salvemos o Cantanhez (II).

(**) Vd. último poste da série > 3 de julho de 2012 > > Guiné 63/74 - P10108: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (24): questionário de opinião sobre o seu sítio na Net (que tem 8 anos) e sobre a sua página no Facebook (que tem 2 anos)

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11786: Álbum fotográfico de Carlos Fraga (ex-alf mil, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1973) (10): Imagens de postais ilustrados (Parte I)


Foto nº 1 [, Um guerreiro... felupe ?]


Foto nº 2  [Uma mulher... papel ou manjaca ?]


Foto nº 3 [. Uma máscara, de etnia não identificada...Nalu, diz o nosso camarada António J. Pereira da Costa, que é colecionador de arte guineense]


Foto nº 4 [, Uma máscara bandá nalú,  diz o nosso Tó Zé; comfirmei num livro do etnógrafo Fernando Rogado Quintino (*)]


Foto nº 5 [Um bela mulher guineense..., possivelmente mandinga, pelos adornos]


Foto nº 6 [, Um  jovem mãe, com filho às costas... Fula ?]


Foto nº 7 [, Máscara de vaca bruta,  bijagó, segundo Fernando Rogado Quintino ]


Foto nº 8  [Imagem de postal ilustrado, muito provavelmente, da coleção de postais ilustrados, edição Foto Serra, Bissau. Campune tatuada, bijagó].


1. Continuação da publicação do álbum de Carlos Fraga, que foi alf mil, na 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, na segunda metade do ano de 1973, indo depois comandar, como capitão, uma companhia em Moçambique, a seguir ao 25 de abril de 1974).(**)

Enquanto fez o seu estágio operacional no CTIG,  o alf mil Carlos Fraga  tirou fotos (e nomeadamente "slides") mas também comprou fotos, incluindo imagens de postais ilustrados.

Publicam-se a seguir 8 fotos da sua coleção de postais ilustrados. Não trazem legendas. Pedimos a colaboração dos nossos leitores para completar ou corrigir as legendas da autoria do editor.

Poucos de nós tinha um conhecimento mininamente sério e aprofundado da composição étnico-linguística da  Guiné e dos seus povos. QA"instrução" que o exército nos deu, era baseada no estereótipo etnocêntrico dos europeus...

Em 1950, os principais grupos étnicos (ou "tribos", como se dizia na época...) eram os seguintes: balantas (160 mil), fulas (108 mil), manjacos (72 mil),  mandingas (64 mil), papéis (36 mil), brâmes (16 mil), beafadas (11 mil), bijagós (10 mil), felupes (8 mil), baiotes (4 mil) e nalus (3 mil) (os números são arredondados por excesso ou por defeito)... Balantas, fulas, manjacos e mandingas representavam, só por sí, 60% do total. A população da Guiné era então de cerca de 510 mil, constituída em 98% por negros. Os mestiços eram pouco mais de 4500 e os brancos não chegavam aos 2300...

Pessoalmente, eu só lidei,  na zona leste (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), com fulas, balantas e mandingas (LG)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 24 de dezenbro de 2012 > Guiné 63/74 - P10857: Notas de leitura (442): Três estudos sobre a Guiné Portuguesa: A população de Cacine, a cestaria e o totemismo (Mário Beja Santos)

(...) António Carreira e Rogado Quintino foram dois estudiosos incontornáveis da historiografia, etnografia e antropologia da Guiné Portuguesa. Deixaram uma enorme bibliografia, basta que o leitor navegue no Google, encontrará estudos surpreendentes, alguns deles há mesmo a possibilidade de serem descarregados. 

Encontrei três pequenos estudos cuja utilidade pretendo partilhar com os confrades. O primeiro intitula-se “Guiné – A população do posto de Cacine no decénio 1950-1960”, por António Carreira. Ele vai seguramente ao encontro da curiosidade de quem, por qualquer razão, viveu ou combateu nos regulados de Gadamael, Quitafine ou Cacine. 

Carreira lembra-nos que este território entrou na posse de Portugal depois de 1886, houve retificação de fronteiras até 1929. Deplora a troca do Casamansa pela região de Cacine, dizendo que o primeiro servia de via de escoamento enquanto os cursos de água de Cacine, sinuosos e pouco profundos, não permitem a afluência do comércio do interior. Para que o leitor entenda como o território até ao início da luta armada tinha predominantemente Balantas, Nalus e Fulas, é importante compreender que a prolongada guerra de 1863-1888, travada entre Fulas e Beafadas e Mandingas, fez aproximar da região de Cacine grupos étnicos que até então viviam em outras áreas. Deu-se uma migração de Fulas que passaram a influenciar os Nalus. 

De acordo com o estudo do recenseamento, encontravam-se presentes quase todas as etnias, com raras exceções importantes, como os Bijagós. Depois o autor debruça-se sobre a estrutura familiar dos Nalus, eram profundamente animistas e, tal como os Bagas e os Landumás foram sujeitos à islamização. Possuíram, até à islamização, uma arte excecional, marcada por máscaras e tambores. De acordo com o trabalho de Carreira, dos anos 50 para os anos 60 do século passado deu-se uma evolução demográfica impressionante, ultrapassou os 50 %, os animistas foram predominantes neste crescimento (Balantas, Nalus, Beafadas e Sossos).

Quanto aos dados demográficos, no regulado de Cacine, a povoação de Cacine tinha uma população inferior a 500 habitantes, seguia-se Cassacá, depois Cacoca, Cabaz e Cabochanquezinho no regulado de Gadamael, havia mais população em Sanconhá (Sangonhá), Ganturé, Bricama, Jabicunda. Quanto ao regulado de Quitafine, o maior núcleo populacional era Cassebeche, seguindo-se Canefaque e Calaque. 

O autor discreteia ainda sobre a estrutura familiar, as ocupações por etnias e deplora que o recenseamento não contemple o grau de instrução das populações autóctones e apela a que se venha a conhecer em novos censos dados relevantes sobre as confrarias islâmicas. Este estudo apareceu publicado na revista do Centro de Estudos Demográficos, em 1972. (...)


Vd. também postes de;:




Guiné 63/74 - P11785: Notas de leitura (496): O Império Africano 1890-1930, coordenação do Prof. Oliveira Marques (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Março de 2013:

Queridos amigos,
A Nova História da Expansão Portuguesa foi um ambicioso projeto coordenado por Joel Serrão e Oliveira Marques, 12 volumes que abarcaram as origens, a expansão, a colonização atlântica, o império oriental, o império luso-brasileiro, o império africano e o seu final.
Este volume de onde se extrai a recensão em apreço tem a ver com uma Guiné que já não depende de Cabo Verde, que substituiu o comércio negreiro por uma exploração agrícola baseada sobretudo no amendoim; uma Guiné com inúmeros conflitos de tal sorte que foi necessário esperar pelo primeiro governador da República para derrubar as muralhas à volta da fortaleza de Bissau.
Enfim, uma fonte informativa que poderá pesar na curiosidade de quem pretende ir mais longe sobre a história da Guiné.

Um abraço do
Mário


A Guiné, entre a Monarquia, a República e a Ditadura

Beja Santos

“Império Africano 1890-1930”, com coordenação do Prof. Oliveira Marques (Editorial Estampa, 2001), é um dos 12 volumes da Nova História da Expansão Portuguesa, projeto que foi dirigido por Joel Serrão e Oliveira Marques.

As condições internacionais ditadas pela Conferência de Berlim exigiram às nações imperiais uma política de conquista territorial e de delimitação de fronteiras. Se é facto que na substância há uma continuidade entre a Monarquia e a República e entre esta e a Ditadura, há matizes políticos dignos de realce. A República esforçou-se por uma política de autonomia colonial, visou-se a descentralização, criou o regime dos altos-comissários, prosseguiu com maior solidez uma campanha contra o regime de trabalho indígena, mas com resultados mais aparentes do que palpáveis. A cultura colonial imiscuiu-se em múltiplas preparações profissionais, caso da Escola do Exército, da Escola Naval, do Instituto Industrial e Comercial de Lisboa, Escola de Medicina Tropical, Escola Colonial, mesmo os estudos superiores de Direito e de Agronomia foram influenciados. Quase no termo da República, a Agência Geral das Colónias e o seu boletim surgem como fontes de divulgação cultural e científica, num universo editorial de importância irrecusável. Basta pensar em Fernanda de Castro e o seu best-seller “Mariazinha em África”.

A Guiné conheceu transformações enormes: separou-se de Cabo Verde, foram definidas as suas fronteiras, a exploração agrícola substituiu o comércio negreiro. A grande falta são os colonizadores, a província desligada de Cabo Verde assenta numa orgânica administrativa que seria uma quase ficção caso não houvessem efetivos militares. Todas as divisões administrativas acabavam por ser ineficazes, os administradores não possuíam meios para as percorrer, não podiam garantir a lei nem arrecadar os tributos. Foi preciso esperar pela pacificação para desenvolverem as comunicações, cujo expoente foi dado pela abertura da estrada Bafatá-Bambadinca, ao tempo do administrador de Geba Calvet Magalhães. Foram tempos de grande agitação, estes 40 anos que levaram à afirmação da soberania portuguesa. Só a chegada de tropas e o seu envolvimento direto, na última década do século XIX, permitiram sortidas eficazes e submissões com apresamento de armas. Carlos Pereira, o primeiro governador nomeado pelo regime republicano, determinou o derrube das muralhas e assim se estabeleceu o relacionamento entre os temíveis Papéis e a população de Bissau, até então acantonada na fortaleza.

Deve-se a Teixeira Pinto a estratégia ofensiva que conduziu à pacificação na área continental, até 1916. Submeter os grumetes, foi o seu primeiro objetivo, sem o qual Bissau permaneceria na agitação. Como ele escreveu: “Os grumetes são papéis batizados, tendo parentes na ilha e estão ligados aos cabo-verdianos, hão de opor uma resistência enorme à ocupação da ilha – o que é necessário fazer, custe o que custar, pois é deprimente para nós que no primeiro posto da província onde vão vapores estrangeiros nós só dominemos dentro dos muros da praça. Dizem que a ilha de Bissau há de ser o meu cemitério mas, apesar disso, hei de tentar a ocupação porque prefiro lá morrer a deixar manter a humilhação porque o Governo passa todas as vezes que os estrangeiros passam na praça e perguntam porque se não pode ir ao interior da ilha".

A despeito de inúmeras conspirações, e lavado à prisão Abdul Indjai, inicia-se um período de um certo desenvolvimentismo. Era escasso o povoamento de europeus, o número de não indígenas em 1924 não seria superior a 500 pessoas distribuídas por Bolama, Bissau, Cacheu, Farim e Bafatá. A presença francesa e alemã tinha grande significado e os sírios, chegados depois da proclamação da República, passaram a ser os comerciantes do interior. Entra-se pois na ocupação territorial, vivia-se já um período de paz, fora ultrapassada a época em que se pensara dar concessões a companhias majestáticas, ideia que fizera o seu curso no final do século XIX, na Guiné não tivera nenhum sucesso. O amendoim, que no final do século XIX, estava no topo das exportações, com a República encontrou novos produtos concorrentes: a borracha, o coconote, a cera e os couros, mas foram produtos que não aguentaram a concorrência mundial. Uma parte substancial dos produtos importados não existia em Portugal: vejam-se as nozes de cola, o tabaco e os tecidos.

Finda a I Guerra Mundial, a Alemanha voltou a ser um parceiro ativo, grande comprador de coconote, mancarra, óleo de palma, cera, borracha e arroz. Uma economia tão pobre iria ditar a pequenez das receitas mesmo com um montante por palhota, os emolumentos e a carga aduaneira.

Este documento sobre a Guiné foi escrito por Célia Reis que apresenta uma boa bibliografia, onde ela destaca a investigação de René Pélissier, bastante enquadradora do período em questão, já que ele investigou os acontecimentos entre 1841 e 1936.
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Nota do editor

Último poste da série de 28 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11773: Notas de leitura (495): A Guiné que vou encontrando na Feira da Ladra (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P11784: Os nossos médicos (56): respostas ao questionário: José Manuel Matos Dinis [,CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71]; José Santos [CCAÇ 3326, Mampatá e Quinhamel, 1971/73]; Rui Santos [4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65]; Mário Serra de Oliveira [, BA12, Bissalanca, 1967/68]; e João Martins [, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69]

1. Mais algumas respostas ao questionário sobre Os Nossos Médicos (*):

José Manuel Matos Dinis [, ex-fur mil, CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71]:


Vou procurar responder sucintamente, embora aqui ou ali me espalhe um bocadinho.

1 - Eu tive necessidades várias  [, de recorrer ao médico e/ou enfermeiro].

2 - Mais que uma vez { fui visto por médico].

3 - A minha companhia não tinha médico. Em Piche, enquanto ali estivemos, também não havia médico, Mais tarde, a espaços, tivemos um médico de proximidade em Pirada. Só fui visto por médicos em Bissau, no HM 241.

4 - Usei dos serviços dos enfermeiros por várias vezes. Os enfermeiros da minha companhia, e os que estiveram ao nosso serviço oriundos de outras unidades, foram sempre extraordinários de competência e dedicação. E no que me diz respeito, quero expressar uma grande gratidão. Até um puto que fazia de enfermeiro em Bajocunda tinha a nossa confiança, como se de um profissional se tratasse.

5 - Vide resposta anterior.

6 - Não havia. Faleceu um camarada por indução errada de diagnóstico. Se tivesse sido seguido mais de perto, talvez estivesse entre nós.

7 - Como referi, em Piche, na ocasião, não havia médico. Mais tarde, a espaços, em Pirada havia consulta.

8 - Sim. Estive lá, [no HM 241, em Bissau,]  25 dias, e pedi alta para regressar ao mato. Era um cliente de luxo, e não me queixo do tratamento, nem dos sumos italianos, nem das frutas sul-africanas. No penúltimo dia, um médico (miliciano?) referiu-me que a minha baixa, apesar dos dias decorridos, não justificava a evacuação para Lisboa, mas que podia ali reter-me mais algum tempo. Agradeci, mas senti saudades da família.

9 - Vide resposta anterior e um post publicado.

10- Não, senhor, com muita pena [,de nºao ter sido evacuado para o HMP, em Lisboa].

11- Vide resposta anterior.

Faço votos de muita saúde aos camaradas.

Abraços fraternos


José Santos [ex-1.º cabo aux enf, CCAÇ 3326, Mampatá  e Quinhamel, 1971/73]


1) Eu fui enfermeiro em Mampatá
2) Fui visto no HM 241, em Bissau
3) Sim
6) Não
7) Não
8) Sim, fui queimado estive lá, [no HM 241,] 45 dias,  internado
10) Fui evacuado de avioneta
11) Não

Fui muita vez ao Hospital levar doentes de Mampatá e colegas nossos, andei bastante de avião pois o furriel nunca ia, o capitão tinha mais confiança em mim, porque eu já lidava com medicamentos,  estava empregado numa farmácia, e ele não tinha confiança no furriel,  daí ser sempre eu que andava com os doentes.
Um alfa bravo
José Santos


Rui Santos [ex-alf il da 4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65]
Luís, Boa noite!!!

Tive três ataques de paludismo no território da Guiné, um em Bedanda (tratado pelo enfermeiro da unidade 4ª CC) e em Bolama tive dois, penso que porque bebi a autêntica água salobra das bolanhas, que tanta gente fala, mas eu bebi-a juntamente com os meus amigos/soldados pretos (tratadas pelo enfermeiro e por ordem do Dr. Guilherme Peixe, médico do CIM). Não desejo a ninguém que isso aconteça pois já cá no continente tive mais três vezes, é obra ...

Claro que minha mulher foi assistida ... pelo nascimento da minha filha no Hospital Principal de Bissau (Civil) pelo dr. Círio Andrade, mas como minha mulher teve um ataque de paludismo dias antes de acabar o tempo, eis que tomou,  por minha autorização e acordo do Dr. Círio, a velha camoquina (antipalúdico mas abortivo), e assim nasceu uma miúda em chão papel. que tem agora 48 anos e tr`^e filhos, bem haja dr.Círio.

Abraço
Rui G dos Santos

Mário Serra de Oliveira [, ex-1º cabo escriturário, BA 12,
Bissalanca, Bissau, 1967/68, a viver hoje nos EUA]
 Camarada Luis Graça!

Recordo com admiração um médico do exército - eu era da FAP -, o  Dr. Trigo. Forte de fisíco e forte de mentalidade. recordo que um dia dei sangue no Hospital militar e,  creio que foi ele, para recuperar mandou dar ums "biscoitos e um cálice de vinho do Porto tinto!"...  Fiquei como novo.

Mais tarde, creio que já na vida civil, se bem recordo, recebi-o como cliente no restaurante O Pelicano. Poderei até estar confundido mas creio que não. Boa pessoa e bom médico.

Abraço a todos.

PS - Seria verdade [, como eu já vi escrito no nosso blogue,] que alguns militares "bebiam cerveja, e comiam bananas em jejum!...para apanharem uma "hepatite" que dava direito a evacuação?


João Martins [, ex-alf mil art, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69 ]
Caros camarigos:

Recordo que fui assistido por um médico quando estive cerca de uma semana em Gadamael Porto, porque, na sequência do meu exercício matinal de natação nas águas do rio, começaram-me a doer os ouvidos. A assistência foi rápida e consistiu na introdução nos ouvidos de um aparelho para extração da "porcaria" e colocação de um desinfetante. As melhoras foram imediatas.

Quando estive em Ingoré, em fins de 69 e com quase 24 meses de comissão, tive um forte ataque de paludismo em que já não via quase nada à minha frente, tendo mesmo dificuldade em deslocar-me. Recordo que, na altura, fui chamado à presença do comandante do batalhão que pretendia levar novamente os obuses para um lugar afastado do aquartalamento para fazer fogo para mais dentro do Senegal, é claro que o informei que não estava em condições de efectuar tal operação e que, face à distância e às condições, o tiro não tinha grande hipótese de ser certeiro embora eu utilizasse para o efeito um goniómetro. Fiquei sempre com a convicção, simples premonição, que se lá voltasse perderia a vida, porque o IN, prevendo que tal facto poderia ocorrer, teria armadilhado o local. Dessa vez não recordo qualquer assistência médica. Limitei-me a cobrir-me completamente por cobertores e a curar-me com o calor da cama.
Grande abraço

João Martins
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Nota do editor:

Postes anteriores da série:

27 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11770: Os nossos médicos (55): Sondagem (n=93): 35% dos respondentes dizem ter passado pelo HM 241 (Bissau), e 8% foi evacuado para o HMP (Lisboa)

(...) Mesmo assim, estes dados, respeitantes a 93 respondentes não deixam de ser curiosos, podendo revelar algumas tendências:

(i) Só uma minoria (17%) é que nunca esteve doente, ou pelo menos nunca terá recorrido ao médico ou ao enfermeiro;

(ii) Três em cada cinco foram vistos, uma ou mais vezes, pelo médico; e outros tantos pelo enfermeiro;

(iii) Havia um ou mais médicos em cada batalhão; já o mesmo não aconteciam a nível de companhia (segundo 37% dos respondentes);

(iv) 35% da rapaziada conheceu o HM 241 (Bissau); ou esteve lá internado, ou foi lá a uma consulta externa (de especialidade):

(v) Oito por cento do total dos respondentes foram evacuados para a metrópole, para o HMP (Hospital Militar Principal), em Lisboa...

Seria interessante que estas respostas, apesar do seu nº relativamente reduzido (n=93), pudessem ser objeto de comentários de respondentes e não-respondentes... Como sempre, as respostas são anónimas. E a sondagem realizou-se ao longo de 6 dias (de 22 a 27 de junho, tendo terminado às 13h).. Mais uma vez os nossos agradecimentos a que se dispôs a perder um minuto e fez questão de colaborar. Bem hajam, camaradas! (...)

27 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11769: Os nossos médicos (54): Respostas ao questionário: José Colaço (CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) , Fernando Costa (BCAÇ 4513, Aldeia Formosa, mar73 / set74) , e Rogério Cardoso (CART 643 / BART 645, Bissorã, 1964/66)

26 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11764: Os nossos médicos (53): Homenagem ao pessoal da saúde do meu BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74 (Juvenal Amado)

24 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11756: Os nossos médicos (52): Com o pessoal do meu batalhão, partiram, em 24/4/70, no T/T Carvalho Araújo, très alf mil médicos: Vitor Veloso, José A. Martins Faria e Eduardo Teixeira de Sousa (António Tavares, ex-fur mil, CCS/ BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72)

19 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11731: Os nossos médicos (51): O BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) teve pelo menos 4 médicos e prestava assistência à população civil (Benjamim Durães)

18 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11724: Os nossos médicos (50): Os batalhões que passaram pelo setor de Farim tinham um número variável de médicos, de 1 a 4... Quanto ao HM 241, era só... o melhor da África Ocidental (Carlos Silva, 1969/71)

14 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11704: Os nossos médicos (47): Qual era a dotação médica de um batalhão ? Três médicos por batalhão, diz-nos o ex-alf mil méd J. Pardete Ferreira (CAOP1, Teixeira Pinto; HM 241, Bissau, 1969/71)

(...) Questões:

(i) Quantos médicos seguiram com o vosso batalhão, no barco ?

(ii) Quantos médicos é que o vosso batalhão teve e por quanto tempo ?

(iii) Lembram-se dos nomes de alguns ? Idades ? Especiallidades ?

(iv) Precisaram de alguma consulta médica ?

(v) Estiveram alguma vez internados na enfermeria do aquartelamento (se é que existia) ?

(vi) Foram a alguma consulta de especialidade no HM 241 ?

(vii) Foram evacuados para a metrópole, para o HMP ?

(viii) Tiveram alguma problema de saúde que o vosso médico ou o enfermeiro conseguiu resolver sem evacuação?

(ix) O vosso posto sanitário também atendia a população local ?

(x) (E se sim, o que é mais que provável:) Há alguma estimativa da população que recorria aos serviços de saúde da tropa

Guiné 63/74 - P11783: Convívios (519): XXVIII ENCONTRO/CONVÍVIO da CART 3494, decorreu em 15 de Junho - Paredes (Sousa de Castro)

1. O nosso camarada Sousa de Castro (ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, 1971/74), enviou-nos a seguinte mensagem.


XXVIII ENCONTRO/CONVÍVIO da CART 3494
Sobrosa/Paredes – 15 de Junho de 2013

Camaradas, 

Carvalho de Sousa com o apoio de seus 2 filhos, planeou e organizou uma festa muito interessante. Concentração das forças em Felgueiras, o “rancho” servido na Quintinha do Nelo em Sobrosa – Paredes. O ex. Fur. Mil.º João Ruivo Fernandes, homem que foi render o malogrado e camarada Furriel Bento, morto em combate, apresentou-se pela primeira vez, acompanhado de sua esposa e com ele a sua concertina, o que de alguma maneira ajudou alegrar por momentos o ambiente. Repetiram-se “Estórias” contadas e recontadas, nomeadamente uma em que um 1º cabo chegou a vias de facto com um Oficial Superior, quase no final de comissão de serviço, devido à qualidade da comida, sem consequências para ambas as partes, perdurou o bom senso. 

O Coronel de Art.ª António José Pereira da Costa, antigo CMDT da CART 3494 depois de proferir palavras de circunstância, foi guardado um minuto de silêncio em memória dos nossos camaradas que tombaram no campo de batalha em defesa da Pátria e os outros que por vários motivos deixaram a vida terrena. 

Para o próximo ano, o XXIX encontro/convívio terá lugar em Leiria, na data mais próxima do 10 de Junho. Será responsável pelo evento o veterano Ex. Alf. Milº António Joaquim Serradas Pereira.





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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em:

26 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11766: Convívios (518): 6ª jornada da Tabanca da Ajuda Amiga, no Forte da Lage, em Paço d' Arcos, Oeiras, 5ª feira, dia 27 de junho (Carlos Silva)

 

Guiné 63/74 - P11782: Efemérides (134): Monumento aos Combatentes do Ultramar em Olhão, foi inaugurado no passado dia 16 de Junho (Henrique Matos)


1. O nosso Camarada Henrique Matos, ex-Alf Mil, 1.º Comandante do Pel Caç Nat 52, Enxalé, 1966/68, enviou-nos a seguinte mensagem:

OLHÃO - Monumento aos Combatentes da Guerra do Ultramar


Camaradas,

A cidade de Olhão já tem o seu Monumento aos Combatentes do Ultramar, inaugurado no passado dia 16, dia da cidade. A concretização deste projecto fica-se a dever ao empenho do Presidente da Direcção do Núcleo de Olhão da Liga dos Combatentes, João Peres, também ele um ex-Combatente na Guiné e restantes membros da Direcção.




Grande abraço
Henrique Matos
Ex-Alf Mil CMDT do Pel Caç Nat 52

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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em:

 22 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11748: Efemérides (133): Lisboa /Belém, 10 de Junho de 2013: Fotos das Cerimónias junto ao Monumento dos Combatentes da Guerra do Ultramar (Jorge Canhão) 


Guiné 63/74 - P11781: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (40): 41.º episódio: Memórias avulsas (22): Alô Guiné... estou a chegar

1. O nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67), em mensagem do dia 24 de Junho de 2013, enviou-nos mais umas peripécias d"Os melhores 40 meses da sua vida", dando-nos conta do seu contentamento por finalmente ter chegado à Guiné.


OS MELHORES 40 MESES DA MINHA VIDA

GUINÉ 65-67 - MEMÓRIAS AVULSAS

22 - ALÔ GUINÉ... ESTOU A CHEGAR

E pronto... embarquei e cheguei todo lampeiro a Bissau, naquela manhã de Agosto de 1965.

Afinal não havia grande diferença da África que eu já conhecia através dos filmes do Tarzan e lá estavam os macacos dependurados nas árvores e os autóctones a descarregar farinha dos barcos, o que lhes dava a cor mais branca que branca. Pareciam gentes boas, nanja como aqueles que depois nos tentavam atingir nas matas do Oio, selvagens que não se mostravam... que utilizavam a crueldade das minas.

Diziam os seus mentores, que não combatiam o Povo Português, mas então se cada Companhia tinha cerca de 150 homens, todos (exceptuando os 4 ou 5 profissionais militares, mas Povo também) arrancados às suas terras e forçados a ir e a maioria nem sabia do porquê nem para quê, todos Portugueses que se tornaram heróis, então combatiam quem?
Porque utilizaram o assassinato cobarde com o uso das minas?

Se num verso inspirado, houve um poeta que disse: "num monte de pedra pode nascer uma flor", porque substituíram a flor por tais artefactos de morte, encafuados num buraco tapado com terra?

É que dói... e hoje 12 de Junho de 2013, completam-se 47 anos, que homenageio só, mas com um grande abraço, o Capitão Dinis Alberto Corte Real, Comandante que foi da minha CCAÇ 1422, vil e traiçoeiramente liquidado por uma, comandada à distância, ali perto de Farim na estrada que liga ao K3.
E já antes, a 17 de Maio de 1966, se fora o meu amigo Fur Mil Higino Arrozeiro, levado pelo mesmo método de horror, ali perto dos "carreiros".
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Dizia eu atrás... cheguei a Bissau.
Ali passei uns dias e logo a seguir andei a apagar fogos, por aqui e por ali, apenas com a minha Secção de morteiros 60.
Assim conheci Manhau, onde aprendi a dor da perca, em 22 de Setembro de 1965, doutro amigo, o Jaime Feijão, Fur Mil da CCAÇ 1421, ele também vitimado por uma "bailarina" e recordo o seus gritos "arame" (o estrondo) e "médico" e mais não disse.

Conheci Mansabá e saber o que custa ser emboscado perto da Serração;
depois Bissorã e a flagelação junto ao rio;
Jolmete onde pela primeira vez reagi ao ataque ao quartel;
Pelundo e o sossego durante um mês, com morança na tabanca, a guardar um cofre do Homem Grande.

Localização da Serração na estrada Mansabá/Mansoa, e de Manhau na antiga picada que ligava Mansabá a Bafatá
Vd. carta de Farim

Interior do quartel de Bissorã em 1969
Foto: © Carlos Fortunato (2005)

Vista aérea de Jolmete
Foto: © Albino Silva (2007)

Entrada do aquartelamento do Pelundo
Foto: © António Teixeira (2011)

Só após o Natal de 1965, que passei na Amura, fui de novo integrado na Companhia que iria ser colocada em Mansabá, ao que se dizia e até fiz parte da Secção de Quartéis.
Deram-nos a volta, tal não aconteceu e acabámos sim, por trocar com a 1421, na época a construir de raiz o K3.

O depósito, onde se pode ler, ao comprimento, “Água Quente” e no topo, “Cerveja a Copo”. Era só escolher!
Foto: © Gil André, ex-Alf Mil. Bat Caç 2879 / C Caç 2548, retirada com a devida vénia da página Rumo a Fulacunda

O local era aprazível, as instalações de primeira, quartos em terra vermelha, algumas bem acomodadas suites.
A cozinha requintada e bem fornecida, comida excelente e igual para todos, talheres em prata de lei... copos de cristal e tudo servido por profissionais de libré e acima de tudo o bar 5 estrelas.

Se estou a mentir... que me saia o euromilhões.

Não tínhamos vizinhos e como tal fui "povo que lava no rio" pois que nem lavadeiras existiam mas por escasso tempo porque um pouco mais tarde e gradualmente vieram a juntar-se, na Companhia, alguns militares "guias" casados e residentes em Farim que nos disponibilizaram tais úteis serviços.

Certo dia (Julho de 1966) e por motivos alheios à minha vontade, tive que me oferecer para a 3ª CCOM e para a qual pediam voluntários com alguma já comprovada experiência no uso das artes da guerra. Acabei contudo, por ir prestar serviço na Secção de Funerais e Registo de Sepulturas/QG.

Saíra do Inferno, entrei noutro sem querer, embora em termos de perigosidade nada tivesse a ver com o que me fora ofertado até então, mas muito mais difícil de gerir psicologicamente. Sei que tenho aqui um vazio de dois meses, que não descobri ainda como foi, mas que se deve talvez, ao uso de alguns adormecedores alcoólicos, utilizados contra-gosto mas numa tentativa, que não resultou, de atenuar o calvário das visitas que de quando em vez tive de fazer à morgue do Hospital Militar e elaborar todo um processo doloroso próprio duma realidade que magoava mesmo.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 23 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11752: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (39): 40.º episódio: Memórias avulsas (21): De lá para cá e vice-versa