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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8840: Notas de leitura (279): Os Anos da Guerra Colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Setembro de 2011:

Queridos amigos,
Esta aturada investigação de Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso (na sequência de trabalho anterior, de que aqui já se fez recensão) é indubitavelmente a obra de maior fôlego até hoje publicada, permitindo ao leitor mesmo não-iniciado acompanhar os principais factos e acontecimentos que na cena internacional e nacional se projectaram nos teatros de operações e vice-versa.
Profusamente ilustrado, assegura ao leitor o conhecimento das unidades militares envolvidas e comporta um apreciável acervo bibliográfico.
Como se compreenderá, delimitaram-se as apreciações da recensão exclusivamente a feitos e factos da Guiné.

Um abraço do
Mário


Os anos da guerra colonial

Beja Santos

Editado primeiro em 16 cadernos e depois sob a forma de livro, “Os Anos da Guerra Colonial”, por Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso constituem um importante levantamento de eventos de grande significado, seja na política internacional ou na política nacional, procurando estabelecer as respectivas ondas de choque na evolução dos teatros de operações (Quidnovi Editora, 2010).

Os autores dão a seguinte justificação, logo no preâmbulo: “Publicámos há 11 anos um livro em fascículos intitulado “Guerra Colonial 1961 – 1975”. 11 anos depois voltamos ao tema. Quisemos aprofundar o conhecimento dos factos, ensaiar a sua explicação e, essencialmente, saber e compreender o que se passou. A obra assenta numa cronologia de factos que procuram transmitir o essencial do que aconteceu nos vários palcos onde a guerra se travou – nos campos de batalha, nos corredores dos vários poderes, em Portugal e um pouco por todo o mundo que interferiu com as acções de Portugal e dos movimentos de libertação africanos. É sobre o saber mais e compreender melhor os anos da guerra colonial que trata esta obra”.

Tratando-se de um trabalho monumental, apela-se à compreensão do leitor para a necessidade de só relevar alguns dos principais acontecimentos que envolvem a Guiné. Logo no primeiro caderno consta o relatório do Tenente-Coronel Filipe Rodrigues, Comandante Militar da Guiné, sobre os acontecimentos do Pidjiquiti de 3 de Agosto de 1959. Talvez valha a pena equacionar o que aqui se diz com o que é referido no relatório do Comando da Defesa Marítima da Guiné e que consta dos anexos da História dos Fuzileiros de autoria do Comandante Sanches de Baêna. Não há entendimento sobre o número de mortos e feridos, a propaganda do PAIGC procurou explorar a dimensão dos incidentes, é crível que se tenham registado 7 mortos, 20 feridos e um número equivalente de detidos pelas forças policiais e que vieram a ser interrogados pela PIDE.

É no número 4 dos cadernos que se começa a falar das hostilidades desencadeadas pelo PAIGC em 23 de Janeiro de 1963. Fala-se na data de 1960 como do início das acções anticoloniais na Guiné, é um pequeno lapso, os ataques conduzidos pelo Movimento de Libertação da Guiné tiveram lugar em 1961. Procede-se a um pequeno historial dos acontecimentos e estranha-se que mesmo numa obra de divulgação histórica, a propósito das razões de Amílcar Cabral se escreva que este “Para a garantir a viabilidade da Guiné, engendrou a aliança de Estados com Cabo Verde, que possuía uma posição estratégica invejável. Infelizmente, os guinéus pensaram que a aliança era favorável a Cabo Verde, por lhe dar acesso ao interior de África, ao deserto, esqueceram-se de considerar a vantagem mútua”. Quem isto escreveu emitiu um juízo subjectivo, o historiador não tem que deplorar nem exaltar, são os políticos que respondem pelas estratégias e são os povos que as acolhem ou rejeitam, nada mais. Os acontecimentos referentes a 1963 na Guiné apontam para a sublevação e desarticulação do Sul e a criação da base do Morés, não há uma palavra para a constituição das bases do PAIGC no Leste, que tanta influência vieram a ter na região do Corubal, que ficou sob o comando de Domingos Ramos, que faleceu mais tarde em Madina do Boé.

De um modo geral, as sucessivas sínteses militares que precedem os diferentes anos da guerra destacam os factos mais salientes. Pegando, a título exemplificativo, em 1972, encontramos em Janeiro a captura pelas forças portuguesas de duas rampas de foguetões na região de Aldeia Formosa, em Abril uma delegação da ONU visitou zonas libertadas da Guiné, em Abril duas bombas explodiram em Bissau, mês em que Spínola enviou uma carta a Caetano e onde se menciona que “não ganharemos esta guerra pela força das armas”; e no mês seguinte Spínola encontrou-se com Senghor em Cap Skiring, mas Caetano determinou que esta política de contactos não devia continuar (os analistas consideram que estes pontos de vista irredutíveis constituíram uma viragem no relacionamento entre Caetano e Spínola; em Julho começam as referências ao fornecimento de mísseis terra-ar ao PAIGC e em Outubro a Assembleia Geral da ONU passou a reconhecer o PAIGC como o legítimo representante da Guiné-Bissau. Os autores procedem a uma memória sobre a africanização da guerra e a constituição das forças especiais africanas na Guiné.

No volume dedicado ao fim do Império, é igualmente importante o que Josep Sánches Cervelló escreve quanto ao 25 de Abril na Guiné: “Em Bissau, quatro dias depois do golpe de Estado, um grupo de militares redigiu uma carta dirigida ao general Spínola, na qual lhe pediam o cessar-fogo imediato, a entrega do poder ao PAIGC e a imediata repatriação dos soldados. O MFA assinalou que se recolheram mais de 300 assinaturas em 24 horas, algumas de oficiais superiores. No princípio de Maio, o batalhão de artilharia 6520 recusou-se a partir para Cadique para render um Batalhão com 16 meses em zona de combate e mais de 50 % de baixas. A decisão foi assumida por todos, excepto pelo Comandante. Depois de dias de negociação, acabaram por cumprir a ordem, depois de conseguirem a destituição do Comandante e o compromisso de que em Cadique se procuraria o cessar-fogo com o PAIGC. Estes protestos estenderam-se a todas as unidades sem excepção (…) Enquanto se desenrolavam estes acontecimentos, a guerra ainda não tinha terminado oficialmente. Desde o 25 de Abril até finais de Maio houve acções bélicas que provocaram 84 baixas portuguesas e mais de 60 entre a população que lhes era afecta. Quando, no princípio de Maio, o Tenente-Coronel Fabião chegou ao território como novo representante do Governo, e depois de comprovar "in situ" a degradação da situação militar, passou a colaborar estreitamente com o MFA local”.

Em jeito de síntese, Carlos de Matos Gomes analisa o conceito de combater pela Pátria e comenta que “A Guerra Colonial, do ponto de vista dos movimentos independentistas, tem dois tempos, o da guerra, na qual obtiveram o inegável sucesso de desgastarem as forças portuguesas a ponto de estas terem optado pela sua auto-regeneração através da sublevação contra a hierarquia, e o da descolonização e da pós-descolonização. A descolonização foi rápida a destruir a herança colonial. O período posterior está ainda hoje enredado na contradição entre o real, que é construir e administrar um Estado-Nação e a utopia de criar uma Nação africana com um povo africano dirigida por uma nova aristocracia constituída pelos sobreviventes vitoriosos das várias guerras anteriormente travadas”. Aniceto Afonso falando da história e da memória da guerra colonial recorda que o Movimento dos Capitães nasceu da necessidade de acabar com a guerra, desenvolveu-se em torno dos quadros médios do Exército, sendo eles os mais sacrificados estavam em melhores condições para se aperceberem da irracionalidade da guerra e eram os únicos capazes de se envolverem num movimento que levasse à queda do regime. Este trabalho sobre os anos da Guerra Colonial, refere este autor, não seria possível sem a abertura dos arquivos militares.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8830: Notas de leitura (278): Tarrafo, de Armor Pires Mota: censura e autocensura, em tempo de guerra. Cotejando as edições de 1965 e 1970 (Parte I) (Luís Graça)

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7434: Agenda cultural (95): Os anos da guerra colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes: hoje, 3ª feira, às 18h30, no Corte Inglês Gaia Porto


OS ANOS DA GUERRA COLONIAL
Sessão de Lançamento >  Convite




A editora QuidNovi, os autores Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes e o El Corte Inglés Gaia Porto têm o prazer de o(a) convidar para a sessão de apresentação do livro Os Anos da Guerra Colonial que ocorrerá no próximo dia 14 de Dezembro, 3ª feira, às 18:30h, na Sala de Âmbito Cultural, piso 6, do El Corte Inglés Gaia Porto (Av. da República, 1435, V.N. de Gaia).

A apresentação da obra estará a cargo do coronel David Martelo.

A nossa editora fez um levantamento sobre os blogs militares relacionados com este tema. Gostaríamos de o convidar a estar presente nesta sessão de lançamento e contamos coma a sua ajuda para a divulgação deste evento. (...)

Para qualquer questão ou pedido deverão ser utilizados os contactos indicados na nota de imprensa.

Com os melhores cumprimentos e devidos agradecimentos,

Miguel Gonçalves
Editor Adjunto
QUIDNOVI
QN - Edição e Conteúdos S.A.
Praceta D. Nuno Álvares Pereira, 20 3ºCJ
4450-218 Matosinhos - Portugal
tel/fax: +351 22 938 81 55

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7387: Os Anos da Guerra Colonial (1961-1975), de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (1): Um obra enciclopédica, de 838 pp.


Título: Os Anos da Guerra Colonial (1961 - 1975) (*)
Autores: Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes
Editora: Quidnovi
Local: Matosinhos
Ano: 2010
Formato: Brochado
Nº pp.: 838
Preço de cappa: c. 45€

Infelizmente não pude estar presente, por razões profissionais,  na sessão de lançamento do livro dos nossos camaradas Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes, no passado dia 29  de Novembro (*). Gostaria de ter podido lá estar, para dar um abraço a estes dois autores, e manifestar-lhes o meu apreço e o meu respeito pelo seu labor enciclopédico e historiográfico.

Já conheço o essencial da obra, através dos 16 volumes que foram lançados em 2009 pelo Correio da Manhã, sob a chancela da QuidNovi. Mas sei que o livro, de 838 pp.,  traz algumas melhorias (e correcções) em relação à edição anterior,  distribuída em fascículos. De qualquer modo, ficam aqui os nossos votos de sucesso para mais esta obra monumental  de historiografia da guerra colonial que passa a ser de incontornável referência.

O livro conta ainda com a colaboração do historiador catão Joseph Sánchez Cervelló (que conheci em Bissau, por ocasião do Simpósio Internacional de Guiledje, 1-7 de Março de 2008, foto à esquerda, na Amura, com o Matos Gomes; fez o seu doutoramento com uma tese sobre a Revolução Portuguesa e sua Influência na Transição Espanhola, 1961-1976, de que há um livro, em português, editado pela Assírio e Alvim, 1993).A colaboração é ainda extensiva aos portugueses David Martelo, Nuno Santa Clara Gomes, João Moreira Tavares, Sandra Araújo e Dulce Afonso. 

Sinopse

Saber o que aconteceu durante os anos de 1961 a 1975, os anos em que a Guerra Colonial esteve no centro da nossa História, das nossas vidas. Saber o que aconteceu em cada um dos locais onde a guerra foi travada, nas “picadas” mais perigosas, nas “matas” do Norte de Angola e de Moçambique, nas “chanas” do Leste, nas “bolanhas” da Guiné, a bordo de navios e lanchas, de aviões e de helicópteros. Saber o que pensaram os homens que decidiram a guerra, que a conduziram, que a fizeram de ambos os lados. Mas pretendemos também Compreender. Compreender por que foi assim que os factos aconteceram, por que foram escolhidas estas soluções e não outras. Compreender as dúvidas dos homens que tiveram de decidir num momento o caminho a seguir e ajudar a perceber as consequências dessas decisões. É, pois, sobre o Saber mais e o Compreender melhor os anos da Guerra Colonial que trata esta obra.

Sobre os autores:


ANICETO AFONSO

(i)  Coronel do Exército na situação de Reforma; 
(ii) Nasceu em Vinhais em 1942;
(iii)  Fez os estudos secundários em Bragança;
(iv) Concluiu o curso de Artilharia da Academia Militar em 1963;
(v) Cumpriu comissões em Angola (1969-71) e em Moçambique (1973-75);
(vi) Fez a licenciatura em História pela Faculdade de Letras de Lisboa em 1980 e o Mestrado em História Contemporânea de Portugal pela mesma Faculdade em 1990;
(vii) Foi professor de História na Academia Militar de 1982 a 1985 e de 1999 a 2005;
(viii) Foi director do Arquivo Histórico Militar (Lisboa) de 1993 a 2007, integrando vários grupos de trabalho e comissões relacionadas com os arquivos militares, a documentação e a História;
(ix) Foi responsável pelo Arquivo da Defesa Nacional de 1996 a 2007;
(x) É membro da Comissão Portuguesa de História Militar e do Comité dos Arquivos da Comissão Internacional de História Militar, desde 1998; 
(xi) É investigador do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa e autor de várias obras, incluindo O Meu Avô Africano, editado pela Casa das Letras (2009).

CARLOS DE MATOS GOMES  [, foto à esquerda, Guiné-Bissau, Bissau, Amura, 7 de Março de 2008. Foto de L.G.]

(i) Coronel do Exército, na situação de reserva;
(ii) Nasceu a 24 de Julho de 1946 em Vila Nova da Barquinha;
(iii) Fez os estudos secundários no Colégio Nun’Álvares, de Tomar e o curso de Cavalaria da Academia Militar;
(iv) Durante a guerra colonial cumpriu três comissões, em Moçambique, Angola e Guiné, nas tropas “Comando”;
(v) Foi ferido e condecorado;
(vi) Foi auditor do Curso de Defesa Nacional, do Instituto de Defesa Nacional;
(vii) Paralelamente à carreira militar desenvolveu desde 1983 uma continuada actividade literária, tendo escrito argumentos, romances e várias obras de cariz histórico; como ficcionista usa o pseudónimo Carlos Vale Ferraz, entre eles o Nó Cego, considerado já um clássico não só da literatura da guerra colonial, como da literatura lusófona.


Fonte: Adapt. parcialmente de Quidnovi



Lisboa > Centro Comercial Plaza, nas Picoas > Livraria Bertrand  > 30 de Novembro de 2010 > 18,30 h > Sessão de lançamento do  livro “Os Anos da Guerra Colonial, 1961-75”, da autoria dos nossos camaradas Aniceto Afonso e Carlos Matos, editado pela QuidNovi. Na mesa,  da esquerda para a direita: Joaquim Furtado (apresentador da obra), Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso (autores)

Foto: Cortesia de QuidNovi (página no Facebook) (**)
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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 25 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7332: Agenda Cultural (91): Lançamento do livro Os Anos da Guerra Colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes, dia 30 de Novembro de 2010 na Bertrand Picoas Plaza, Lisboa (Carlos Matos Gomes)
 
(**) A QuidNovi, com sede em Matosinhos, é  "uma editora especializada na produção de livros e outros conteúdos para venda associada a jornais". Desde a sua fundação, em 1995, a editora tem colaborado regularmente com todos os principais jornais e revistas portugueses.


O sucesso deste projecto  levou a empresa A dar um novo passo, criando paralelamente uma "editora tradicional", orientada para o mercado livreiro. A  QuidNovi surge assim, em 2005, "com esta nova faceta, marcando presença no mercado editorial português, com um catálogo diversificado, onde se tem destacado sobretudo pela colecção de autores portugueses, com vários títulos premiados e muito elogiados pela crítica".




sábado, 21 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1198: Antologia (53): Guidaje, Maio de 1973: o inferno - Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (Luís Graça)

Muitos dos nossos amigos e camaradas da Guiné, dos nosso tertulianos, não têm suficiente informação sobre a ofensiva do PAIGC, a partir de 1973, e que se traduziu na utilização, pela primeira vez, em 25 de Fevereiro de 1973, dos mísseis terra-ar Strella, e em Maio/Junho num tremenda ofensiva contra três aquartelementos nossos, fronteiriços, Guidaje, norte, e Guileje e Gadamael, no sul. É por isso que publicamos hoje, na série Antologia, um texto dos conhecidos especialistas da guerra colonial, Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (autores do livro Guerra Colonial, publicado pelo Diário de Notícias, Lisboa, 1999). Esse texto é sobre Guidaje, o inferno que foi o mês de Maio de 1973, tanto para as NT como para o PAIGC... Pelo lado português, a batalha de Guidaje traduziu-se em quatro dezenas de mortos e e mais de 120 feridos... Matos Gomes, capitão comando na altura, participou na Op Ametista Real, já aqui evocada pelo seu comandante, Almeida Bruno, também em texto antológico (1).


Guiné Maio de 1973 – O Inferno

por Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes

Extraído, com a devida vénia, do sítio da A25A - Associação 25 de Abril. Os links são da nossa responsabilidade.

No início de 1973, o ano decisivo da guerra na Guiné, o Comando-Chefe contava assim com forças de modo geral mal preparadas, mal equipadas e mal comandadas, que se procuravam defender nos seus aquartelamentos e, como unidades de manobra e de reserva, dispunha apenas das tropas especiais: um batalhão de pára-quedistas com três companhias, um batalhão de comandos com cinco companhias, sendo três delas africanas, e cinco destacamentos de fuzileiros especiais, dois deles também africanos.

É neste pano de fundo que os mísseis Strella começam a abater aviões a hélice e a reacção, provocando sérias limitações ao emprego dos meios aéreos e ao seu apoio às forças de superfície. Este apoio dizia respeito a três áreas fundamentais: a evacuação sanitária de feridos retirados por helicóptero dos campos de batalha; o apoio aéreo próximo, que permitia às tropas portuguesas realizarem rupturas de contacto em situação vantajosa, e que era efectuado por aviões Fiat G-91 e T-6 e o transporte logístico de artigos críticos, como medicamentos, soro, pilhas para equipamentos de comunicação. Os helicópteros, em Maio, deixaram de realizar evacuações, pois seriam facilmente abatidos (voltariam a voar, mas com outros perfis de voo, a muito baixa altitude), os Fiat G-91 tiveram de adaptar os seus procedimentos de voo à nova ameaça, o que demorou algum tempo, e os T-6, a hélice, foram retirados das missões, reduzindo a disponibilidade de meios aéreos para apoio às tropas. Por fim, os transportes aéreos só voltaram a realizar-se, e com grandes limitações, após um período de estudo, voando os aviões acima dos 6.000 pés e operando em número muito reduzido de pistas.

São casos de ansiedade e desespero por ausência de evacuação de feridos que precipitam as situações das tropas quer em Guidaje, quer em Guileje.

Maio de 1973 constituiu a prova mais dura a que as forças portuguesas foram sujeitas nos três teatros de operações.

Com efeito, o PAIGC, revelando notável capacidade de manobra e tirando partido do extraordinário acréscimo de potencial de combate, alterou profundamente o seu conceito de manobra, passando da actuação dispersa, em superfície, para a concentração maciça sobre objectivos definidos.

Neste contexto, desencadeou poderosas e prolongadas acções de fogo ajustado sobre as guarnições fronteiriças de Guidaje, Guileje e Gadamael, as quais conjugou com acções terrestres de isolamento, que efectivamente conseguiu, durante alguns dias, em Guidaje. Nestas acções, intensificou o emprego de mísseis Strella e fez uso sem restrições de armas pesadas de longo alcance e elevado poder de fogo, com a colaboração de observadores avançados na regulação do tiro, que atingiram notável grau de eficácia. Esta actividade do PAIGC alcançou valores que são os mais altos de sempre desde o inicio da guerra – 220 acções durante o mês –, o mesmo sucedendo em relação as baixas causadas as tropas portuguesas – 63 mortos e 269 feridos.

Na Zona Oeste/Norte, o PAIGC exerceu o seu esforço na área de Bigene/Guidaje, concentrando três corpos de exército, dois grupos de foguetões, um grupo de morteiros 120 mm e um grupo especial de sapadores, num total de cerca de 650 elementos, na região do Cumbamori, no Senegal, flagelando Guidaje 43 vezes e Bigene 21.

Na Zona Sul, desencadeou uma acção de moldes clássicos sobre Guileje, conjugando acções terrestres de isolamento com maciços de fogos de artilharia, com pleno êxito, obrigando a retirada da guarnição portuguesa, e transferindo depois esforço para Gadamael.

Estas operações, a que o PAIGC deu o nome de «Amílcar Cabral», integraram-se no processo de reconhecimento internacional das capacidades do partido para inverter a seu favor a situação militar no terreno, culminando com a declaração da independência, em Setembro desse ano.

Como manobra, a tenaz com as pontas Guidaje e Guileje, revela a elevada capacidade do Estado-Maior do PAIGC para controlar grandes efectivos e coordenar os seus movimentos, o que implicou transferir unidades que se encontravam interior do território para o exterior, balancear meios entre o Norte e o Sul, acção efectuada através do território dois países, e realizar acções conjuntas com grandes volumes de efectivos de infantaria, de artilharia e de unidades de armas antiaéreas. Embora pudesse não ser essa a intenção dos estrategistas do PAIGC, o seu ataque à posição portuguesa de Guidaje, executado ao longo de vários dias com grande violência, obrigou o comando português a concentrar ali a quase totalidade das unidades de intervenção e de reserva, e veio a funcionar como acção de diversão, que permitiu atacar Guileje, a sul, sem que houvesse possibilidade, da parte portuguesa, de dar a mesma resposta que em Guidaje.

O ataque e o cerco a Guidaje constituíram alteração profunda na manobra do PAIGC, o qual tivera sempre algumas limitações aos seus movimentos no Senegal. Um ataque desta envergadura quer em duração, quer em violência significava que o movimento dispunha agora de apoio total e de facilidades idênticas às que recebia da Guiné-Conacri. Naquele país, a base de Cumbamori, a curta distância de Guidaje, desenvolveu-se apoiada pelas bases de Zinguichor e de Kolda, sendo a partir dela que se desenhou toda a operação, embora grupos de antiaéreas e bigrupos de infantaria se tenham posicionado entre Guidaje e Binta, na região de Cufeu, de modo a cortar esse itinerário que constituía o cordão umbilical de Guidaje.

O cerco de Guidaje

No início de Maio de 1973, a guarnição militar de Guidaje era constituída por uma companhia de caçadores do recrutamento local, a Companhia de Caçadores 19, e pelo Pelotão de Artilharia 24, equipado com obuses de 10,5 cm.

Guidaje estava sob o comando operacional do COP3, que tinha sede em Bigene. Com o agravamento da situação, o comandante, tenente-coronel Correia de Campos, deslocou-se para Guidaje em 10 de Maio, com o seu posto de comando avançado, onde se manteve até 12 de Junho.

O PAIGC dispunha, concentradas, as seguintes forças na região de Cumbamori:

Corpo de Exército (CE) 199/B/70, com quatro bigrupos de infantaria e uma bateria de artilharia;
Corpo de Exército (CE) 199/C/70, com cinco bigrupos de infantaria e uma bateria de artilharia;
Grupo de Foguetes da Frente Norte, com quatro rampas;
Três bigrupos de infantaria, um grupo de reconhecimento e uma bateria de artilharia do CE 199/A/70, deslocadas de Sare Lali (Zona Leste).

Foram ainda referenciados em Cumbamori um pelotão de morteiros de 120 mm, um grupo especial de sapadores e diversos elementos recém-chegados do estrangeiro.

Em termos de efectivos, a guarnição portuguesa teria cerca de 200 homens, na maioria do recrutamento da província, com as suas famílias, existindo em redor do quartel uma pequena aldeia com cada vez menos habitantes.

Do lado do PAIGC estimavam-se em cerca de 650 a 700 os efectivos que empenhou nesta operação, comandados por Francisco Mendes (Chico Te) e pelo comissário político Manuel dos Santos, que era o responsável pelos mísseis em todo o território.

O primeiro objectivo do PAIGC foi isolar Guidaje, cuja localização era excelente, situada em cima da fronteira, o que diminuía a frente de um possível contra-ataque ou de um reforço. Dada a inibição das forças portuguesas em manobrar pelo território do Senegal, elas só poderiam vir de sul, ou seja de Binta e de Cufeu. Nesta zona, sensivelmente a meio caminho entre as duas localidades, o PAIGC havia instalado forças significativas e lançado vasto campo de minas. O ataque a Guidaje por norte garantia contínuo fluxo de reabastecimento de munições e efectivos, dado que podiam efectuar-se por viatura a partir de Zinguichor, Cumbamori, Yeran ou Kolda, o que permitia manter o cerco durante largo período de tempo.

Para cercar Guidaje, o PAIGC começou por cortar o itinerário de Binta e instalar sistemas antiaéreos com mísseis Strella. O isolamento aéreo de Guidaje iniciou-se com o abate de um avião T-6 e de dois DO-27 e o terrestre acentuou-se em 8 de Maio, quando uma coluna que partira de Farim, escoltada por forças do Batalhão de Caçadores 4512, accionou uma mina anticarro e foi emboscada, sofrendo 12 feridos. Em 9 de Maio, a mesma força foi de novo emboscada, mantendo-se o contacto durante quatro horas.

A coluna portuguesa sofreu mais quatro mortos, oito feridos graves, dez feridos ligeiros e quatro viaturas destruídas, deslocando-se então para Binta, em vez de subir para Guidaje.

Em 10 de Maio, no deslocamento de Binta para Guidaje, o conjunto de unidades envolvidas, sob o comando do comandante do batalhão de Farim, sofreu mais um morto e dois feridos e encontrou a picada cortada por abatises. Entretanto, as forças da CCaç 19, saídas de Guidaje para proteger o itinerário na sua zona de acção, tiveram cinco contactos, sofrendo oito mortos e nove feridos.

No relatório desta acção, o seu comandante descreve assim a violência do contacto de fogo: «... em relação às NT, o IN estava de frente, dos dois lados da picada, e foi impossível fazer uma reacção conveniente pelo fogo. A primeira sessão pelo fogo causou-nos imediatamente três mortos (..) o IN voltou à carga com maior ímpeto, mas as NT já estavam preparadas para o receber e aqui teve as primeiras baixas.

Estando um cabo gravemente ferido com um estilhaço no pescoço, o soldado auxiliar de enfermeiro correu para junto dele a fim de o socorrer. Estando ajoelhado a seu lado foi atingido por uma rajada que lhe provocou a morte. Começavam a escassear as munições e foi dada ordem para fazer fogo de precisão, tanto quanto possível. Quando o fogo parou por escassos segundos um dos furriéis tentou chegar junto dos mortos para recuperar os corpos. Quando se levantava para realizar esta acção, pela terceira vez o In atacou as nossas posições. Notando a impossibilidade de recuperar os corpos dos mortos e porque a falta de munições era quase total, o comandante viu-se coagido a ordenar a retirada».

Em 12 de Maio, chegou a Guidaje uma coluna de reabastecimentos constituída pelos destacamentos de fuzileiros especiais 3 e 4. Em 15, no regresso a Farim, accionaram duas minas e sofreram dois feridos graves e, numa emboscada entre Guidaje e Binta, cinco feridos.

Uma coluna que entretanto saiu de Binta alcançou Guidaje no mesmo dia. Contudo, em 19, no regresso, accionou várias minas e sofreu emboscada violenta. Teve um morto e sete feridos, esgotou as munições e regressou a Guidaje.

Em 23 de Maio, saiu uma coluna de Binta para Guidaje protegida por uma companhia de pára-quedistas. A coluna regressou ao ponto de partida, porque a picada estava minada em profundidade, e a companhia de pára-quedistas, apesar de ter sofrido violenta emboscada feita por um grupo de cerca de 70 elementos, que lhe causou quatro mortos, chegou a Guidaje.

Em 29 de Maio, foi organizada uma grande operação para reabastecer Guidaje. Constituíram-se quatro agrupamentos com efectivos de companhia em Binta e dois agrupamentos em Guidaje, estes para apoiar a progressão na parte final do itinerário. A coluna alcançou Guidaje nesse dia, tendo sofrido dois mortos e vários feridos.

Em 30 de Maio, em virtude da informação de agravamento da situação no Sul (Guileje), estas forças regressam às suas bases para serem de novo empregues.

Em 12 de Junho, considerou-se terminada a operação de cerco a Guidaje. Uma coluna partiu desta guarnição para Binta, trazendo o tenente-coronel Correia de Campos, que comandara o COP3 durante este difícil período.

Baixas das colunas de e para Guidaje, entre 8 de Maio e 8 de Junho de 1973:

Mortos 22
Feridos 70
Viaturas destruídas 6

Em suma, o primeiro objectivo do PAIGC foi isolar Guidaje, o segundo foi flagelar a posição e destruir o espírito de resistência das forças portuguesas e o último seria conquistar a povoação. Guidaje sofreu, entre o dia 8 e o dia 29 de Junho, 43 flagelações com artilharia, foguetões e morteiros. Logo no dia 8 esteve debaixo de fogo por cinco vezes, num total de duas horas, em 9 sofreu quatro ataques, em 10 três, e até ao final todos os dias foi atacada. No total dos 43 ataques, a guarnição de Guidaje sofreu sete mortos, 30 feridos militares e 15 entre a população civil. Foram causados estragos em todos os edifícios do quartel.

Munições consumidas pela Companhia de Caçadores 19:

- 7,62 mm (espingarda) 32000;
- Granadas de mão ofensivas e defensivas 40
- Granadas de morteiro 760;
- Granadas-foguete 6 cm 120;
- Granadas-foguete 8,9 cm 50;
- Munições de artilharia disparadas no dia 17 (10,5 cm) 43


Operação Ametista Real – a resposta

O nítido agravamento da situação em Guidaje, que era particularmente nítido a partir de 8 de Maio, as notícias de grandes movimentações de tropas do PAIGC junto à fronteira com o Senegal, a dificuldade de reforçar e apoiar por terra aquela guarnição, dada a resistência encontrada pelas colunas que ali se dirigiam, e a existência de vários feridos que não podiam ser evacuados para os hospitais pelas limitações de emprego de meios aéreos, levaram o comandante-chefe a lançar uma operação de grande envergadura para envolver as forças do PAIGC que atacavam Guidaje e aliviar a pressão sobre aquela guarnição militar que permitisse reabastecê-la, retirar os feridos e substituir pessoal.

Esta tarefa foi atribuída ao Batalhão de Comandos da Guiné, que recebeu a missão de «aniquilar ou, no mínimo, desarticular a organização IN na região de Guidaje-Bigene». As forças executantes, num total de cerca de 450 homens, foram assim organizadas:

Comandante da operação: major Almeida Bruno.

Agrupamento Romeu: 1.ª Companhia de Comandos; capitão António Ramos.

Agrupamento Bombox: 2.ª Companhia de Comandos; capitão Matos Gomes.

Agrupamento Centauro: 3.ª Companhia de Comandos; capitão Raul Folques

As forças do batalhão de comandos saíram em 18 de Maio de Bissau numa LDG, apoiadas por duas LFG, e desembarcaram em Ganturé nessa tarde, depois de um briefing em Bigene, saíram pelas 23 e 50 para norte, pela seguinte ordem: agrupamentos Bombox, Centauro e Romeu.
Pelas 5 e 30 de 19 de Maio, a testa da coluna alcançou o itinerário que apoiava a base de Cumbamori, objectivo principal da operação. O agrupamento Bombox passou para norte da estrada, o agrupamento Centauro ocupou posições a sul e o agrupamento Romeu instalou-se à retaguarda, numa pequena povoação.

Ás 8 e 20 iniciou-se o ataque aéreo com aviões Fiat G-91, que destruíram os paióis da base, tendo as munições explodido durante algum tempo.

Às 9 e 05 o agrupamento Bombox executou o assalto inicial, provocando o primeiro contacto com as forças do PAIGC. Estes combates desenrolaram-se até às 14 e 10, quando o comandante da operação deu ordem para o agrupamento Centauro apoiar uma ruptura de contacto entre as suas forças e as do PAIGC. Foi uma operação de grande dificuldade, porque os combatentes de um e outro lado se encontravam muito próximos. O comandante do agrupamento Centauro foi ferido, mas conseguiu realizar essa separação

Às 14 e 30 o batalhão de comandos iniciou-se o movimento para a base de recolha e às 18 e 20 os seus primeiros elementos chegaram a Guidaje. Em 20 de Maio, o mesmo batalhão saiu de Guidaje para Binta, a pé, deixando ali os seus feridos e os militares que não se encontravam em condições de prosseguir a marcha. Em Binta, embarcou numa LDG de regresso a Bissau
Nesta operação, o batalhão de comandos sofreu dez mortos, 22 feridos graves e três desaparecidos, estimando ter causado 67 mortos, entre os quais, segundo informação mais tarde obtida no Senegal, uma médica e um cirurgião cubanos e quatro elementos mauritanos.

Durante a acção, as forças do batalhão de comandos consumiram as seguintes munições:

- 7,62 mm (G-3) 26.700
- 7,62 mm (Kalash) 4600
- Granadas de lança-granadas foguete de 6 e 8,9 em 292
- Granadas de RPG-2 e RPG-7 71
- Granadas de morteiro 195
- Granadas de mão ofensivas e defensivas 268

A situação melhorou durante algum tempo, até porque o esforço do PAIGC se passou a concentrar na frente sul, sobre Guileje e Gadamael.

Nestes 20 dias do mês de Maio e nesta região em torno de Guidaje, as forças portuguesas sofreram 39 mortos e 122 feridos.
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Nota de L. G.:

(1) 16 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXV: Antologia (16): Op Ametista Real (Senegal, 1973) (JOão Almeida Bruno)