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terça-feira, 14 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16201: Álbum fotográfico de Francisco Gamelas, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 3089, ao tempo do BCAÇ 3863 (Teixeira Pinto, 1971/73) - Parte III: Canchungo e o amor em tempo de guerra




Foto nº 14 > Maio de 1973 > Casa  de tipo colonial, situada na avenida. Em primeiro plano, a Maria Helena Gamelas



Foto nº 16 > Habitação nativa típica,  na tabanca de Cachungo, março de 1983


Foto n º  12  > Janeiro de 1972 > Edifício do ciclo preparatório do ensino secundário e casa do director (à esquerda),  Foi nesta casa que nos instalámos. A Maria Helena Gamelas foi a professora de português no lano lectivo de  1972/73. Em frente, do outro lado da ruam ficavam as camaratas dos sodlados da 35ª CCmds.






Foto nº  8 > Embondeiro (ou cabaceira)



Foto nº 9 > Bolanha



Foto nº 10  > Cais acostável

Guiné > Região do Cacheu > Teixeira Pinto > Janeiro 72 / maio de 1973


Fotos (e legendas): © Francisco Gamelas (2016). Todos os direitos reservados [Ediçõa: LG]



1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Francisco Gamelas (*), ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 3089 (Teixeira Pinto, 1971/73), adido ao BCAÇ 3863 (1971/73) e novo membro da nossa Tabanca Grande [, foto à direita, em Capó, janeiro de 1972) (**).

Francisco Gamelas:

(i) é engenheiro eletrotécnico de formação;

(ii) foi quadro superior da PT Inovação, estando hoje reformado;

(iii) vive em Aveiro;

e (iv) acaba de publicar "Outro olhar - Guiné 1971-1973. Aveiro, 2016, ed. de autor, 127 pp. + ilust. P.reço de capa 12,50 €. 


No seu livro, a pp. 16 e ss., pode encontrar-se  mais imformação sobre a vila (e depois cidade) de Teixeira Pinto daqueles tempos, de 1971/73:

[Vd. fotos 10, 12 e 14].(Gamelas, 2016, pp. 18-120). [Respeitámos a opção do autor que escreve de acordo com a "antiga ortografia". Reprodução de excerto, por cortesia do autor.]


(…) A cidade tinha um posto médico  aberto à população local, suportado médicos milicianos militares, um posto de correios e telefones, logo à saída do quartel, do lado leste, um ciclo preparatório do ensino secundário, apenas com uma sala de aulas, anexa à casa do diretor escolar, cujo edifício  se situava em frente das camaratas dos comandos [, 35ª CCmds,] na primeira saída da avenida para oeste.(…) Havia também um lavadouro público, o edifício da Assembleia do Povo, onde os chefes tribais da região se reuniam regularmente, uma cas de espectáculos onde se projetactavam filmes de vez em quando e se reaalizava um ou outro espectáulo musical, com artistas europeus, ambos gratuitos e abertos à comunidade local (…)

(…)  A cidade tinha distribuição de energia elétrica e água canalizada, ploe mnos no quartel e ao longo da avenida. Anexa ao quartel, ainda que no exterior, oara oeste, existia uma pequena pista de aterragem parta pequenas aeronaves e ehelicópteros. Um caminho em terra batida ligava o quartel à bolanha. No seu terminus, um maciço em cimento  delimitava um cais de acostagem para pequenas embarcações, em princípio  militares” (…)


2. Capa (abaixo, do lado direito,) do livro de Francisco Gamelas ("Outro olhar - Guiné 1971-1973. Aveiro, 2016, ed. de autor, 127 pp. + ilust. P.reço de capa 12,50 €. Os interessados pode encomendá-lo ao autor através do seu email pessoal franciscogamelas@sapo.pt.

O design é da arquiteta Beatriz Ribau Pimenta. Tiragem: 150 exemplares. Impressão e acabamento: Grafigamelas, Lda, Esgueira, Aveiro.

O livro, feito de pequenas crónicas e poemas, e profusamente ilustrado com as fotos do álbum da Guiné, é dedicado "à memória de Maria Helena" e às as "nossas filhas Sara Manuel e Maria João e os nossos netos  Sara, Francisco José e João Gil". 

Sobre a sua primeira esposa, Maria Helena, já falecida, e sua companheira da aventura guineense, o Francisco escreveu um belíssimo poema "Amor em tempo de guerra" (pp. 99/101), de que reproduzimos um excerto:

(...) “Mesmo assim, amor, decidimos casar
e começar a nossa vida em comum
neste reino de guerra sempre latente
aproveitando os intervalos
de alguma normalidade
para nos inventarmos
como casal.
Éramos jovens.
Sentíamo-nos imortais
apesar da evidência em contrário.(...)

(...) Foi aqui, no Canchungo,
e nestas condições que aceitámos,
que o nosso amor floriu,
que nos fomos aprendendo
na partilha permanente,
nas cumplicidades do presente
e nela germinou a semente
que foi crescendo
no teu ventre,
sangue do nosso sangue,
carne da nossa carne,
até nos acrescentar
em forma de rebento
a quem demos o nome de Sara
Então,

domingo, 16 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10809: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (20): Notícias da minha antiga companhia, a CCAÇ 3460/BCAÇ 3863, e do meu substituto, o alf mil Potra


   1. No Diário da Guiné, do António Graça de Abreu (AGA), há apenas duas ou três referências à sua antiga companhia, ao seu substituto, o alf mil Potra, e ao comandante, o cap mil Morgado...  .. Aqui se reproduz alguns excertos  do Diário do AGA, com a devida vénia... Procuramos assim colmar a ausência de referências, no nosso blogue,  à CCAÇ 3460, esperando que outros leitores possam trazer informação complementar sobre essa subunidade (que andou por Bolama, Cacheu, Bianga e Bissau... (LG):   
                                 
(...) Canchungo, 18 de Setembro de 1972

Entrei para a tropa em Outubro de 1970. Durante seis meses em Mafra, com a recruta e especialidade, fizeram de mim um pequeno aspirante a oficial miliciano atirador de Infantaria. Fui colocado no Batalhão de Caçadores 5, em Lisboa, onde dei instrução a soldados durante um curto espaço de tempo. 

Segui para Tancos, para a Escola Prática de Engenharia e em dois meses tirei um curso de Minas e Armadilhas. Fui mobilizado para a Guiné e colocado no Regimento de Infantaria 1 na Amadora, para formar Batalhão, exactamente este Batalhão 3863 que veio para o chão manjaco. A minha companhia 3460 foi parar ao Cacheu, mas eu não parti para a Guiné juntamente com estes homens.[1] 

Uma operação a uma velha luxação crómio-clavicular no ombro direito, resultado de uma cena de pancadaria em que fui o personagem principal quando tinha dezassete anos, devidamente explorada, possibilitou-me a passagem aos serviços auxiliares. Fui reclassificado com a especialidade de Secretariado e desmobilizado. 

Fiquei no R I. 1, como simples alferes amanuense no batalhão de Mobilização. Permaneci na Amadora durante um ano e já estava convencido de que o Ultramar não seria o meu destino. Até que fui novamente mobilizado para a Guiné, destinado a este CAOP. Quando deixei de pertencer ao Batalhão 3863 e à sua companhia 3460 [2], fui substituído no lugar de comandante de um pelotão de trinta homens, todos operacionais, pelo alferes miliciano Potra. Vi-os partir, reencontrei-os agora aqui, conheço quase toda a gente do Batalhão.

O Potra, o alferes nomeado em minha substituição na companhia 3460, devia encontrar-se no Cacheu, onde praticamente não há guerra. Está em Bissau, no hospital militar, sem a perna direita, desfeita pelo rebentamento de uma mina anti-pessoal. O Rocha, o alferes meu amigo que comanda um pelotão no Bachile é que me deu a notícia, no bar de oficiais do CAOP. Foi como se tivesse recebido um soco no estômago, caí como um pedregulho numa das cadeira de lona e lá permaneci um pedaço, sem mexer. Quantos homens sem pernas, quantos mortos, mas eu não os conheço e a vida continua!… Desta vez foi o Potra, podia ter sido eu. Que mal fez o rapaz para merecer tal sorte?

Ele permaneceu apenas durante dois meses no Cacheu. Como tinham militares a mais na vila, o Potra foi transferido para uma companhia de africanos em Mansabá, uma zona de muita porrada. Numa das saídas para o mato, pisou a mina anti-pessoal que lhe levou a perna.
_____

[1] Quando o batalhão 3863 deixou a Amadora e viajou para a Guiné, metamorfoseei a cantiga “Partindo-se” de João Roiz de Castelo-Branco, escrita no século XIV, assim:


Partem tão tristes os tristes,
Tão tristes de levar guerra
Que nunca tão tristes vistes
Outros nenhuns nesta terra.
Tão tristes, amargurados,
Tão doentes nesta vida,
Tão doídos, revoltados,
Em tempo de despedida.
Partem tão tristes, chorosos,
Tão longe de esperar bem,
Tão perdidos, tão saudosos
“Que nunca tão tristes vistes
Outros nenhuns por ninguém”.

[2] Para a história resumida do Batalhão de Caçadores 3863 e da “minha” companhia 3460, ver Resenha, 7º. vol., tomo II, pag. 157-158.
___________________

(...) Canchungo, 25 de Setembro de 1972

No início de Outubro vou a Bissau, tratar da minha primeira viagem de férias a Portugal e comprar uma máquina fotográfica. Vai-me fazer bem sair daqui, mudar de ares. Como é que vou para Bissau? De avião, a passarola pode cair, de coluna, por estrada, estamos sujeitos a ser emboscados. Mas estas coisas são tão raras que nem se podem ter em conta. A morte não espreita atrás de cada palmeira. É verdade que todos os dias acontecem desgraças - o Potra ficou sem uma perna, -  mas é preciso não mistificar, nem mitificar a situação militar. Eu não sou um operacional, sei onde me meto.

Ultimamente isto tem andado num virote, a guerra A, B, C, tantas letras até ao fim do alfabeto! (...)

(...) Canchungo, 30 de Setembro de 1972

O capitão Morgado veio do Cacheu até cá, o que sucede com alguma frequência, para tratar de pequenas operações com o meu coronel ou de outros assuntos com o seu comandante de batalhão. O Morgado é miliciano e comandante da Companhia 3460, a que pertenci. Sempre mantivemos um bom relacionamento, é boa pessoa, afável no trato e nas ideias. Hoje dizia-me: “Você não sabe o que perdeu em não vir para a minha Companhia, aquilo lá no Cacheu é uma estância de férias formidável:” E ria, ria. Não lhe falei nos fuzileiros mortos, recordei-lhe apenas a perna desfeita do alferes Potra, meu substituto. Já não riu, não me falou mais nas delícias do Cacheu.

Mas é verdade que o lugar, uma das vilas mais antigas da Guiné, vive em paz, não é atacada. O problema é a Caboiana e Jopá, as zonas libertadas do PAIGC perto do Cacheu e de Canchungo. A companhia 3460 não vai lá, por isso vivem tranquilos.

Sinal de paz e boa vida, o capitão trouxe-nos uns quilos de camarão cozido, fabuloso, grande, gostoso, pescado nas águas do rio Cacheu.

(...) Mansoa, 15 de Maio de 1973


Não há evacuações de helicóptero directamente do mato por isso os rapazes de Mansabá chegaram aqui ontem, os corpos sujos, as caras cobertas de pó, os olhos cheios de lágrimas, com um soldado que tinha uma perna desfeita por uma mina. O médico fez o que pôde e depois o infeliz foi levado para o hospital de Bissau. Lembrei-me do alferes Potra, meu substituto, que também ficou sem perna em Mansabá. Compreender estes homens, o porquê disto tudo. Sem literaturas. Eu, quase sem reacção, o coração ainda dói mas a cabeça esfria.

[, Foto à esquerda:  o AGA, em Cufar, 1973]

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Nota do editor:

Último poste da série > 30 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10597: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (19): A pobreza em chão manjaco

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10597: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (19): A pobreza em chão manjaco


1. No Diário da Guiné, do António Graça de Abreu (AGA), há algumas referências à "pobreza" e à miséria" em que viviam as populações guineenses, nomeadamente  no chão manjaco... AGA tinha chegado à Guiné, há pouco tempo, tinha vivido em países ricos como a Alemanha... O contraste é duro, aos seus olhos, mesmo cotejando as duas pobrezas, a nossa e a deles...  Aqui se reproduz essa parte do Diário do AGA, com a devida vénia... (LG):


(...) Teixeira Pinto ou Canchungo, 27 de Junho de 1972

Fui dar uma volta pela terra e já ouvi uma enormidade de coisas sobre o lugar para onde me atiraram os acasos da sorte e da pouca fortuna.

Teixeira Pinto ou Canchungo é a quarta ou quinta maior povoação da Guiné, tem uma larga avenida central quase com um quilómetro e casas razoáveis estendendo-se para ambos os lados. Ao fundo situa-se a praça Dr. Oliveira Salazar. Isto é airoso e parece sossegado. À volta da avenida, para norte, ficam as tabancas ou moranças, centenas e centenas de casas pobres da população predominantemente de etnia manjaca, uma das muitas existentes neste território. Estamos no Chão Manjaco, a terra destes negros. Os miúdos pretos são uma ternura que dói. A carapinha, os olhos muito escuros, nus e sujos, as barrigas grandes, subalimentados, mas por dentro são iguais aos meninos loiros e morenos da nossa Europa. O mundo à sua volta é que os faz diferentes! (...).

(...) Canchungo, 5 de Julho de 1972 

Não é tempo de inventar coisa nenhuma, são horas de tudo descobrir.  Não posso falar, escrever sobre a guerra se não a conhecer, se não a viver até dilacerar o sentir, não posso falar deste povo, deste solo queimado se desconheço os negros e os brancos, a terra que pisamos.

Hoje, a primeira saída. Fui até ao Bachile, um aquartelamento uns quinze quilómetros a norte, na estrada para o Cacheu, junto às florestas que dão acesso ao Balanguerez e à Caboiana, zonas libertadas pelo PAIGC. Dois jipes, no da dianteira, um capitão e dois cabos armados, no meu, três homens desarmados. Fui à confiança, esta zona é controlada pelas nossas tropas, não há perigo. As populações da região, de etnia manjaca, parecem estar do nosso lado e os guerrilheiros vivem ainda longe, não atacam, não costumam atacar.

O que vi? Logo à saída de Canchungo, tabancas paupérrimas cobertas de colmo, negros indolentes, lixeiras, vacas esqueléticas, cabras, porcos passeando pela estrada. A savana africana, terras pobres para se cultivar o que quer que seja. O jipe do capitão atropelou um porco e seguiu em frente.  (...)

(...) Canchungo, 11 de Julho de 1972 

Faz amanhã um mês que estive de serviço como adjunto do oficial de dia no quartel do Depósito Geral de Adidos, na calçada da Ajuda, em Lisboa. Há quanto tempo isso foi! 

Precisava de comer um bom bacalhau ou um borrego assado, um cozido, um esplendoroso bife em qualquer parte do nosso Portugal mimoso. Parece que saí daí há três anos e ainda não tenho três semanas de Guiné.

Hoje dei comigo a pensar na grande Europa por onde já derramei algum suor durante um dos meus vinte e cinco anos de vida. Quero atravessar outra vez o velho continente, saltitar de país para país, falta-me conhecer Londres, Viena, Budapeste, Florença, Roma, sei lá, tanta coisa! Há-de acontecer. A esperança é uma menina com olhos de todas as cores.

De tarde, resolvi sair e dar uma grande volta a pé, sozinho pelas ruelas e tabancas de Canchungo, Guiné, África. Tanta pobreza! Só o que os alemães gastam para alimentar principescamente os seus cães de estimação - o que tanta admiração me causou quando dos dezanove para os vinte anos ancorei a minha vida em Hamburgo, no norte da Alemanha, - só esses marcos, moeda forte alemã, davam para alimentar milhões de crianças desta África pobre.

Mas isto não é assim tão simples. Os problemas do continente africano são muito complexos e é aqui que têm de ser resolvidos. Está quase tudo por fazer. Como passar de uma sociedade primitiva e agrária para estádios de desenvolvimento mais decentes? Há ventos que sopram quer do leste, quer do ocidente e ajudam quem? Essa ajuda é mesmo “ajuda”? Aqui na Guiné a agricultura é um desastre e funciona como a única fonte de subsistência e riqueza. Eles têm as bolanhas, os arrozais, mas são tão difíceis de cultivar! Hoje, nas tabancas vi os negros a comer. Fazem uma bola de arroz e metem-na na boca com a mão. Não têm facas nem garfos, fiquei impressionado. 


(...) Canchungo, 3 de Agosto de 1972 

Estou rico. No meu quarto tenho agora uma cadeira com encosto de lona, outra de pau e uma mesa quadrada sobre a qual escrevo. A Companhia 122 de pára-quedistas seguiu ontem para Bissau a fim de reforçar a segurança da capital nestes dias “tenebrosos” que se aproximam, com as comemorações do aniversário do PAIGC. Fui incumbido da difícil tarefa de guardar as chaves dos quartos dos alferes pára-quedistas, companheiros de degredo nas terras da Guiné. Vai daí, fui-lhes buscar duas cadeiras e uma mesa que tanto jeito fazem no meu quarto. Os páras regressam daqui a doze dias e então devolverei a mobília, ficarei de novo pobre.



Guiné > Região do Cacheu > Teixeira Pinto > 1972 > Meninos (manjacos) a caminho da escola, em transporte militar.


Fotos: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados




Canchungo, 4 de Agosto de 1972 

Ontem a brincar com a minha pobreza, hoje a sentir a pobreza a sério, brutal, dilacerante. Como se já não bastasse a guerra!... 

É uma fatalidade nascer na Guiné, a terra é avara, o clima é mau, as populações também sofrem com o calor e as doenças.

Esta manhã Canchungo foi assolada por um pequeno tufão que passou sobre uma extremidade da vila e arrasou vinte tabancas, as casas de adobe e colmo das famílias negras. Meti-me no jipe e fui ver o que se podia fazer.

Um espectáculo impressionante. Os telhados das casas de palha ou de zinco voaram e despedaçaram-se, estilhaçados. Algumas tabancas ruíram completamente arrastando as pobres mobílias, os tarecos e as gentes. Felizmente não morreu ninguém, só três feridos graves que foram hoje evacuados para Bissau.

O que me arrepiou foi a atitude dos negros. Os homens tentavam salvar os restos dos haveres, as mulheres choravam, um choro feito de berros, de esponjar na lama, de gestos como eu nunca tinha visto. O corpo encarna a dor total, é o máximo da expressividade possível. Ao olhar para aquela miséria toda e para os negros transfigurados em desgraça, lembrei-me do que será a destruição de uma aldeia aqui perto, nesta mesma Guiné, pela guerra, pelo napalm, pelo fogo. São coisas que escapam à nossa compreensão. Só quem as vive pode entender.

Isto do tufão e miséria está mal escrito. É tudo muito pior do que as palavras possam dizer. Eu ainda sou “periquito” nesta guerra. Vi pouco, continuo a tentar entender. (...)


______________

Nota do editor:

Último poste da série > 12 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10025: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (18): A ponte Alferes Nunes, a CCAÇ 16, o Bachile, a 38ª CCmds, o Canchungo, o cor pára Rafael Durão, o futebol, a violência, a morte...

segunda-feira, 19 de março de 2012

Guiné 63/74 - P9625: Memória dos lugares (178): Sobre a ponte da estrada Canchungo - Cacheu, ao Km 6 (Carlos Schwarz/Pepito)

 

1. Mensagem e fotos do Engº Agrº Carlos Schwarz, Pepito sobre a ponte da estrada Canchungo - Cacheu, ao Km 6, enviada em 18 de Março de 2012 ao nosso Camarada Luís Graça.

Luís,

Contributo para o esclarecimento da controversa ponte da estrada Canchungo - Cacheu, ao Km 6.

A ponte existe mesmo

A ponte vista de outro ângulo
  Está localizada mesmo ao lado da estrada
A 600 metros de distância fica a ponte melhorada, no local onde sempre existiu
 Imagem do rio

abraço
pepito

__________
Nota de MR:

Vd. último poste da série em:

29 DE FEVEREIRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P9547: Memória dos lugares (177): Canquelifá, a ferro e fogo, fevereiro / abril de 1974 (José Marques)

 

sábado, 14 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9352: Excertos do Diário do António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (4): Os foguetões 122 mm que vi, ouvi e contei ao longo de quase dois anos...





Lisboa > Museu Militar > O foguetão 122 mm ou a arma especial Grad (na terminologia do PAIGC).Era uma arma de artilharia, de bater zona e não de tiro de precisão, com   alcance máximo de 11.700 m para 40º de elevação. Segundo um relatório do PAIGC a distância maior a que se efectuou tiro, teria sido contra Bolama, em 4 de Novembro de 1969, a 9.800 m. O foguete dispunha de um perno (assinalado a vermelho ) que, percorrendo o entalhe em espiral existente no tubo, imprimia uma rotação de baixa velocidade afim de estabilizar a vôo. As alhetas só se abriam depois do foguete sair do tubo. Enviei para o blogue, há algum tempo, a fotografia do Tubo que se encontra no Museu Mil Lisboa, que julgo ser o capturado em Cufar, em Janeiro de 1973.  (NR)

Fotos (e legenda): © Nuno Rubim (2007). Todos os direitos reservados.



1. Do nosso camarada e amigo, António Graça de Abreu (AGA), publica-se mais uns tantos excertos do seu Diário da Guiné, 1972/74, a partir do ficheiro em word que serviu de base à edição do livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp). (*) 

Desta vez selecionámos passagens em que há referências a ataques ou flagelações a aquartelamentos e destacamentos com foguetões 122 mm, enquanto ele esteve no CAOP1 (Canchungo, Mansoa e Cufar)... Tudo somado, ao fim de quase dois anos de comissão são muitas centenas de rebentamentos, com especial especial destaque para os que caíram no sul, na região de Tombali... O António  esteve em Cufar, no CAOP1, de Junho de 1973 a Abril de 1974. 

Com a devida vénia ao nosso camarada que nos autorizou a utilização do seu trabalho... LG
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Canchungo, 7 de Julho de 1972

(...) Recebi carta da minha mãe. Diz-me que foi ao Porto e que, por amor de mim, colocou um grande ramo de flores no altar de Santo Ildefonso, na igreja da praça da Batalha. Que o santo me proteja!

Mas não me parece viver em situação de grande perigo. Tenho muitos privilégios, não sou propriamente um operacional, não saio para o mato de G 3 em punho em busca do IN. Há apenas o problema dos bombardeamentos, flagelações ou de uma emboscada na estrada.

Quase há um ano que Canchungo não é atacada pelo PAIGC. A última vez, a 3 de Agosto de 1971, foi com foguetões 122 disparados a onze quilómetros de distância. Durante quatro minutos sobrevoaram o quartel, sibilando no ar e foram rebentar lá longe, na bolanha, nos arrozais a sul. Foi só susto, não houve mortos nem feridos, apenas um capitão, ao fugir, caiu numa vala e partiu uma perna.
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(...) Canchungo, 22 de Agosto de 1972

Existe um CAOP 2. Fica em Nova Lamego, terra dos homens de etnia fula, lá no leste, não muito longe da fronteira. É uma zona menos pacífica do que a nossa. Foram agora flagelados com foguetões 122

Não sei ainda o que são, nem o estrago que provocam. A semana passada, nos arredores de Nova Lamego, uma mina anti-carro fez ir pelos ares um camião Berliet, tendo provocado 19 feridos, alguns graves. Nova Lamego nem é do pior. Aqui a nordeste, o aquartelamento de Olossato foi bombardeado a semana passada durante hora e meia. Nós, em Canchungo, fomos atacados (?) durante um minuto. O ataque em Olossato veio de todas as direcções com um potencial de fogo de arrepiar. No entanto, não se deve abrir muito a boca nesta guerra, as nossas tropas só tiveram um ferido grave e três feridos ligeiros. Os abrigos e as valas para alguma coisa servem.
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(...) Canchungo, 27 de Janeiro de 1973

Mansoa é o nosso destino. Entre as três possibilidades, Bula, Bissorã e Mansoa, não sei qual é a melhor, é dos tais casos em que “venha o diabo e escolha.”

Pouco sei sobre Mansoa, o meu baluarte nos próximos catorze meses. Mas é a maior das três que nomeei atrás e tem uma vantagem, a sua proximidade de Bissau - uns 60 quilómetros, -   e o facto de existir uma estrada asfaltada onde se circula normalmente sem escolta. Para oeste, entre Mansoa e Bissau, o IN não actua. No entanto, a vila é menos pacífica do que Teixeira Pinto. Para norte, leste e sul já os guerrilheiros se movimentam entre a malha dos aquartelamentos portugueses e encontram-se bases IN não muito distantes. Não vou falar mais da sagrada e intocável Caboiana, agora vai ser o Morés, o Queré, o Choquemone, o Oio.

Mansoa tem a grande desvantagem de “embrulhar” em média uma vez por mês. Tanto quanto sei, fazem pontaria para o quartel e disparam os foguetões 122, os canhões sem recuo, a uma distância que varia entre os quatro e os dez quilómetros. 

Eles são maus artilheiros, não costumam acertar na tropa e pelo que tenho lido nos relatórios diários que historiam esta guerra, quem normalmente paga as favas nas flagelações a Mansoa é a população negra das tabancas. A tropa tem abrigos, os disparos IN acertam com mais facilidade nas casas da vila do que no quartel.
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(...) Mansoa, 12 de Março de 1973

Bissá, um pequeno aquartelamento doze quilómetros a sul de Mansoa, foi atacado sábado passado às nove e meia da noite, estava eu a beber um café na esplanada do Simões, o restaurante. Foi um ataque a sério que se prolongou por quarenta e cinco minutos, apesar da distância ouviam-se os disparos e rebentamentos com muita nitidez. Os dois obuses de Mansoa ajudaram ao barulho e dispararam cinquenta e sete granadas de canhão sobre as zonas prováveis de retirada do IN. Só hoje soube os números.

Resultado, o IN destruiu e queimou oitenta e sete tabancas, houve três mortos entre a população, muitos feridos e gente intoxicada. As NT de Bissá não sofreram nada, além do desgaste psicológico que uma flagelação tão dura como esta costuma provocar.

Mantive-me tranquilo, mas se em vez de Bissá a ser atacada tivesse sido Mansoa diria, por certo, adeus à pacatez e à calma. Estar dentro de um quartel cercado de arame farpado e experimentar as sensações fortes de ouvir os foguetões, as granadas de morteiro e canhão sem recuo a vir em nossa direcção ou a cair não muito longe de nós, faz com que os rebentamentos comecem a ficar cá dentro. Agora entendo melhor porque é que, depois do regresso a Portugal, um ex-combatente ouve um foguete rebentar na romaria da aldeia e corre, tremebundo, a esconder-se no primeiro buraco que lhe aparece.
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(...)  Mansoa, 19 de Março de 1973

Foi a vez de Infandre “embrulhar”, um aquartelamento com quarenta militares e cerca de mil habitantes, dez quilómetros a norte daqui. Levaram com foguetões, canhão sem recuo, RPG, morteiros, armas automáticas, foram atacados com um enorme potencial de fogo. No destacamento, não houve feridos, apenas os usuais estragos materiais. A pobre da população é que pagou as favas.

Em Infandre, como em muitos outros lugares da Guiné, os negros tanto fazem o nosso jogo como apoiam o PAIGC. Mas a população é sempre infeliz. Nas flagelações à distância, os guerrilheiros não acertam na tropa portuguesa e acabam por provocar mortos e feridos nos habitantes negros que tantas vezes até não lhes são adversos. É a guerra impiedosa, cruel.
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(...) Mansoa, 6 de Maio de 1973

Os militares do quartel de Bula, ainda na zona se acção do CAOP 1, estão a passar por dificuldades. A vila fica mais perto de Bissau do que de Mansoa, a norte, e é um lugar estrategicamente importante. Um grupo grande de guerrilheiros anda por lá a fazer estragos. Numa emboscada próxima da povoação, as NT tiveram sete mortos, quatro soldados brancos e três negros e bem podem agradecer a Deus. Eram só trinta e cinco soldados portugueses contra duzentos guerrilheiros, não foram todos dizimados por acaso.

Em seguida, Bula foi atacada com foguetões, sem consequências. O batalhão da terra é constituído por “periquitos” acabados de chegar de Portugal, inexperientes e medrosos. Os guerrilheiros sabem que eles são novos na Guiné e vá de atacar, atacar, atacar.

O meu coronel [comandante do CAOP1] foi hoje de urgência para Bula, às cinco da manhã, orientar as operações de contra-guerrilha, dar força aos militares de lá. Seguiu sozinho de jipe, por companhia apenas a sua espingarda Kalashnikov, em sessenta quilómetros de estrada. Se o itinerário não é muito perigoso porque atravessa zonas controladas pelas NT, não posso deixar de reconhecer a coragem deste homem, já com mais de dois anos de comissão na Guiné. Tenho tido os meus problemas com ele, sobretudo devido à minha incompetência como pequeno oficial do exército, mas reconheço-lhe uma enorme valentia e excepcionais qualidades de comando.

Ao meio-dia e meia hora, estava de regresso a Mansoa, de novo sozinho no jipe, depois das reuniões com os oficiais de Bula. Voltou célere porque para hoje estava marcado um almoço de despedida em sua honra, oferecido pelos oficiais e sargentos do CAOP1. Não me admira que amanhã parta outra vez para Bula, ou para qualquer outro lugar da Guiné onde se justifique a sua presença, o seu comando de operações. (...)

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(...) Cufar, 25 de Junho de 1973

Não estou encantado com o lugar que vim encontrar, mas Cufar é melhor do que eu imaginava. Em termos de guerra, segurança pessoal, companheiros de armas e instalações.

Ponto Um: Estou no sul da Guiné, rios, canais, bolanhas, florestas. Até Dezembro de 1972, isto era quase tudo território do PAIGC. Havia os aquartelamentos de Catió, Cufar e Bedanda bem defendidos onde a tropa portuguesa não punha muito o nariz de fora. Em Abril de 1972 estiveram por aqui observadores do Comité de Descolonização da ONU para conhecer as realidades das zonas libertadas pelos guerrilheiros. Vieram de Conacry, entraram pela zona de Guileje, chegaram até perto de Cufar, sempre a pé, abrigados pelas florestas. (...)

Há três meses, em Março [de 1973], Cufar foi atacada com uma dezena de foguetões 122. Só um caiu dentro do nosso arame farpado e, por incrível que pareça, bateu numa árvore, tombou para uma vala onde estavam quatro soldados e não rebentou. Só vendo se acredita, e eu vi. Os soldados penduraram na árvore o resto da fuselagem do foguetão, como um autêntico troféu de guerra. O local fica a trezentos metros da minha secretaria e esta tarde voltei lá para confirmar o que os meus olhos tinham visto, claramente visto. (...) 
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Cufar, 2 de Julho de 1973

Catió “embrulhou” ontem às seis e meia da tarde. Seis foguetões, como de costume caíram fora do quartel. Em Cufar, ouvem-se sempre os rebentamentos mas a maioria do pessoal está tão habituado que já nem estranha. Hoje, às seis da manhã, acordei com mais pum, catrapum, pum, pum, tão diluídos na distância que voltei a adormecer. Era Gadamael.

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(...) Cufar, 20 de Julho de 1973

 A guerra acalmou, sossegou na nossa zona. Anda tudo admirado, mas isto tem uma explicação, é por causa da época das chuvas que conhece agora o seu auge. Chove todos os dias, as bolanhas, o mato enchem-se de água, é difícil caminhar quilómetros e quilómetros por trilhos na floresta, carregando às costas foguetões, morteiros, granadas, etc., para flagelar um aquartelamento. Num ataque em forma, o terreno precisa de estar firme para um bom apoio e eficiência das armas mais pesadas. No período das chuvas, a terra está mole, húmida, empapada em água. As saídas das granadas de morteiro, por exemplo, fazem com que o tubo de morteiro recue e se enterre no solo. Com as chuvas, os guerrilheiros aproveitam a menor actividade das NT para se reabastecerem, construir tabancas, trabalhar nos arrozais.

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(...) Cufar, 26 de Setembro de 1973

 O PAIGC declarou ontem a independência. Por aqui nada mudou a não ser que agora, oficialmente, somos nós portugueses quem está a ocupar a pátria deles.

Temos um novo tenente-coronel no CAOP 1, com apenas cinco dias de Guiné. Andou pelo Estado-Maior e fez comissões em Angola e Moçambique, sempre nas delícias do ar condicionado. Está a estranhar as realidades deste abençoado lugar. Ontem até chamou Cafur a Cufar! No dia em que chegou, Bedanda esteve aí a “embrulhar” durante uma hora, com foguetões 122, mais de trinta, sem consequências. Meio assustado, o tenente-coronel perguntou-me: “Isto é sempre assim?” Eu respondi-lhe: “Não, meu tenente-coronel, isto costuma ser muito pior!”


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(...) Cufar, 8 de Novembro de 1973

 Os dias fabulosos, as histórias que não conto, os whiskies que bebemos, às vezes a morte, espantalho de sangue agitado ao vento diante da menina dos olhos.

De madrugada, Gadamael, chão com cadáveres, juncado de medos. Quarenta e seis foguetões 122 disparados pelos guerrilheiros do PAIGC sobre o aquartelamento, aqui a sul, na fronteira. Apenas me apercebi de rebentamentos distantes, no sono do resto da noite. É normal, já nem estranho. Mas na mente de cada um de nós, a preocupação cresce. Quarenta e seis foguetões sobre Cufar, como seria?

As bebedeiras, cerveja, vinho, whisky, o álcool a circular no sangue temeroso. Os homens tontos de mágoa, solidão e medo.


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(...) Cufar, 11 de Novembro de 1973

 Outro dia duríssimo para Gadamael. Às seis da manhã, eu dormia mas acordei sonolento com os muitos rebentamentos distantes. Foram duas horas de flagelação com quarenta e dois foguetões 122. Tiveram dois mortos e muitos feridos.

Quando chegou a Cufar, o meu tenente-coronel “periquito” vinha cheio de ideias para pôr num brinquinho o que resta do CAOP 1. Começa a baixar a cabeça, a entrar na realidade. Ficou alterado com os ataques a Gadamael, hoje à noite apanhou uma bebedeira monumental. As pessoas, quer as do pequeno, quer as do grande mando, quando têm vinho dentro ficam claras como água.


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(...) Cufar, 14 de Novembro de 1973


Vieram os “jactos do povo”, como os guerrilheiros lhes chamam. Gostei, desta vez não apontaram aos vizinhos do lado, era connosco e, como costuma acontecer, tivemos sorte. Foram disparados oito foguetões 122 e só rebentaram três, a mais de quinhentos metros de Cufar.

Eram oito da noite, eu estava no gabinete do capitão a jogar xadrez com o Eiriz, o alferes das transmissões, quando ouvimos o silvo de um foguetão e um primeiro rebentamento. Saltámos rapidamente para a vala situada ao lado do edifício onde já havia gente abrigada, caímos uns por cima dos outros e ficámos quietinhos, à espera. Uns dez minutos depois, porque não havia mais foguetões, saímos da vala, não muito assustados. Foi um ataque pequeno, daqueles que só servem para criar insegurança e medo.

O médico, o Bastos, ficou por baixo de uma molhada de alferes e saiu da vala zangadíssimo, agastado com o Miguel Champalimaud (sobrinho do António Champalimaud, o “tio Patinhas” português). O rapaz caíra-lhe em cima e, com os foguetões a rebentar, o Miguel peidara-se, cagara-se como um rei por cima da cabeça do Bastos. Uma cena de antologia digna do Chaplin, do “Charlot nas Trincheiras da Guiné”. (...)

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(...) Cufar, 21 de Novembro de 1973

Guerra todos os dias. Ontem às seis de tarde, hoje às seis da tarde. Ontem foi Cobumba, estávamos a começar a jantar e pum, catrapum, pum, pum. Alguns de nós saltaram das mesas e começaram a correr para as valas. Cobumba fica aqui mesmo ao lado e como têm lá uma nova companhia de “periquitos”, os guerrilheiros trataram de lhes fazer condigna recepção, com foguetões, morteiros, canhão sem recuo, tudo a disparar numa cadência de fogo impressionante. O pessoal de Cobumba teve sorte, estão lá estacionados quatrocentos homens – a companhia velha e os “periquitos” que os vêm substituir – e não sofreram uma beliscadura.

Hoje foi a vez de Gadamael, já não era atacada há dois dias e meio! Embora muito mais distante do que Cobumba, ouviam-se os rebentamentos com extrema nitidez. Foram só vinte minutos de fogo, também a um ritmo capaz de assustar o mais valente, as granadas rebentavam de dez em dez segundos. Não sei se houve consequências para as NT em Gadamael, mas a flagelação foi tremendamente feia. O ataque a Cufar dia 13 passado, comparado com estes dois que ouvi ontem foi uma brincadeira.


Em resumo, a nossa tropa anda acagaçada. O PAIGC movimenta-se, põe, dispõe e manda lembranças. Começamos a ver a guerra com os olhos cada vez mais tortos. A aviação actua, os Fiats fartam-se de bombardear aqui em redor, numa cintura aí de quarenta quilómetros. Volta e meia ouvimos o zumbido dos aviões a jacto e os rebentamentos secos das bombas a cair. (...)
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(...) Cufar, 4 de Dezembro de 1973


Mais foguetões 122 e de novo para Cufar, direccionados para o interior do nosso aquartelamento. O Chugué, há dois dias levou com vinte e cinco foguetões, sem consequências, Gadamael tem sido tão flagelada, com consequências, que já perdemos a conta ao número dos foguetões. Nós, mais humildes, fomos brindados com dez projécteis explosivos disparados durante quinze minutos.

Eram nove e um quarto da noite, eu estava na varanda do meu quarto a ouvir a BBC e senti o silvo, os rebentamentos próximos. Logo de seguida soaram as rajadas das nossas metralhadoras. Os foguetões IN caíram todos fora do perímetro de Cufar, felizmente. É o costume, são disparados de muito longe, a onze quilómetros de distância, os guerrilheiros têm má pontaria, os foguetões são difíceis de orientar, ou desorientam-se no ar, e por isso não costumam acertar. Mas assustam, assustam sempre.

Vim ter com os meus soldados. Havia uma certa excitação, ainda para cúmulo choveu esta tarde. As valas estavam cheias de água e lama, e uma vez mais havia soldados que saíam das valas cobertos de lama, borrados de medo.

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(...) Cufar, 9 de Dezembro de 1973

 Esta noite fui obrigado a ir dormir a cama alheia. Ao chegar ao quarto, deparei com uma majestosa invasão de formigas gigantes baga-baga, aquelas que ostentam umas tenazes afiadas e mordem como santolas. Haviam entrado por duas frinchas na parede grossa e começavam a fabricar o seu formigueiro exactamente sob o vão do colchão da minha cama. Não as contei, mas seriam cinco a dez mil formigas laboriosas e trabalhadoras que tinham tido o bom gosto de habitar o espaço onde durmo. Era tarde, quase meia-noite, estivera a jogar xadrez, limpei cinco alferes, começo a jogar bem. Depois, não havia insecticida à mão e, à paulada, não era fácil correr com aqueles milhares de monstros pequeninos. Por isso, peguei nos meus lençóis, na almofada e resolvi ir pedir asilo ao meu amigo alferes Neto, da 4740, que habita um quarto grande, com duas camas.

Às cinco menos dez da manhã, fomos acordados pelos pum, catrapum, pum, pum. Era Cobumba, os nossos vizinhos mais próximos. Mais um ataque filho da puta! Estava tudo a dormir e durante meia hora a cadência de fogo era impressionante. Se fosse connosco, lá teria eu de fugir em cuecas para a vala. Cobumba levou o tratamento do costume, foguetões, canhão sem recuo, RPGs e morteiros. Também como é habitual, nem uma beliscadura nos duzentos homens que por lá padecem.

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(...) Cufar, 21 de Janeiro de 1974 

Cumpriu-se um ano sobre o assassinato do Amílcar Cabral e o PAIGC comemorou a data. Aqui na zona atacaram os aquartelamentos de Gadamael, Cafal, Cafine, Cadique, Cobumba, Bedanda, Chugué, Catió e … Cufar. 

Eram dez da noite, sozinho no quarto, lia umas “Vidas Mundiais” antigas e ouvia uma cassete com o Concerto de Aranjuez, de Joaquin Rodrigo. Por cima da guitarra e dos violinos espanhóis gravei outra música, outro concerto, uma parte do ataque, rebentamentos, tiros, rajadas, mais rebentamentos, meti na fita a minha reacção onde se nota algum nervosismo e se ouvem demasiados palavrões. Assim:
(…)

Boum, boum, pum, catrapum, pum.
-Aí está, um ataque!...Caralho! Um ataque, foda-se!

Tá, tá, tá, tá, tá.
- Um ataque, caralho! Venham mais. Aí vêm elas!...

Boum, boum…
- Tumba, um foguetão, caralho!...

Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, pum.

- Dá mais Manel! Estamos a levar no coco, estamos a “embrulhar”, caralho!

Pum, catrapum, tá, tá, tá, tá, tá, tá…
- Espera aí um bocadinho!

Boum…
- Espera aí que me eu vou-me já vestir, espera aí um bocadinho!
- Tumba, aí vem outra… Toma lá mais!...Espera aí um bocadinho, João…

Boum, boum…
- Estou-me a vestir, é preciso é calma!

Boum, pum, pum…

- Espera aí um bocadinho, estou-me a vestir, é preciso é calma.

Boum, boum…
- Estamos a “embrulhar”, caralho! É preciso ter calma. Estou no meu quarto. Hoje é o dia…

Boum, boum…
- Tumba, tumba, tumba!...

Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, pum, catrapum, pum...

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(...) Cufar, 22 de Fevereiro de 1974

 Regressei [, de Bissau,] no Nordatlas, na viagem certinha até cá abaixo. Tudo calmo em Cufar. No nordeste da Guiné, em Copá junto à fronteira, é que tudo vai mal. Mal para as NT, bem para o IN. Ouvi falar num ataque com cem foguetões, valha-lhes Deus! Começa a ser insustentável aguentar Copá.

Em Portugal as coisas também aquecem, com manifestações contra a carestia de vida organizadas pelos maoístas do MRPP. Houve pancadaria da grossa, três polícias feridos, um deles levou uma pedrada na cabeça. O povo não anda bom.

Em Bissau rebentou uma bomba no quartel-general. E que dizer do novo livro de António de Spínola “Portugal e o Futuro”? O antigo Caco Baldé, meu ex-comandante-em-chefe, propõe soluções federalistas para a resolução dos conflitos do Ultramar. O livro vai ter sucesso entre os liberais, o grupo do Balsemão e do “Expresso, e também entre alguma da Oposição. Abençoadamente, agitará os espíritos de muitos portugueses.

O Marcello Caetano começa a ficar exasperado. No essencial, o mestre de Direito limitou-se a dar continuidade à política de Salazar e não sabe, ou esqueceu-se, como diz o Bob Dylan que “the times, they are a’changin”. O general Spínola aponta caminhos enviesados, é verdade, mas indica possíveis saídas para o pântano fétido em que vivemos.

Que futuro para Portugal?
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(...) Cufar, 28 de Fevereiro de 1974

O nosso 1º. sargento Afonso informa-me que o tal alferes Saldanha nomeado para me render, já está em Bissau mas não virá para Cufar, foi colocado na secretaria do Batalhão de Comandos, no Cumeré, logo ali às portas da capital. Quer isto dizer que já estou substituído na província, o que vai acelerar a minha rendição definitiva. A partir de Bissau, o 1º Afonso é impecável, interessa-se pela nossa vida, conhece todas as capelinhas de Bissau, trata dos nossos assuntos com extremo cuidado e rigor. É um diamante no CAOP1.

Mais uma história de guerra. D. Cecília Supico Pinto, a “generala Cilinha” do Movimento Nacional Feminino anda de visita à Guiné, a dar coragem e conforto moral aos briosos militares que defendem a integridade do império. No seu peregrinar por este sagrado solo pátrio desembarcou segunda-feira passada em Cacine, de helicóptero, às nove da manhã. Às onze o aquartelamento foi atacado com trinta e seis foguetões, uma flagelação que se prolongou por hora e meia. Só se registaram alguns estragos em tabancas, mas dizem-me que a Cilinha mostrou alguma coragem, aguentou-se muito bem, aninhada como toda a gente no fundo de uma vala.

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(...) Cufar, 12 de Março de 1974

 Os guerrilheiros continuam a marcar pontos. Caboxanque tem sido massacrada. Ontem, flagelação às quatro e vinte da madrugada. Acordei sobressaltado. Caboxanque fica mesmo aqui em frente, a oito quilómetros em linha recta e, ao ouvirem-se os primeiros rebentamentos, não sabemos se é com os outros ou connosco. Estes nossos vizinhos estão a ser atacados todos os dias. Bedanda, ontem, também esteve sob o fogo dos foguetões durante duas horas. Tiveram dois feridos, um deles gravíssimo, com um estilhaço na cabeça. Noite, escura desceram o rio até Cufar, Depois, a cena habitual, iluminar a pista, esperar pelo Nordatlas, evacuar o rapaz para Bissau.

Não estamos livres, um destes dias de sermos também atacados. Todos pensamos nisso, todos pensamos que da próxima vez pode ser qualquer um de nós a levar com um estilhaço, a ser desfeito por um projéctil qualquer.

Ontem também tivemos um problema grave mas de outra natureza, um enorme incêndio. Se soprasse mais vento ardiam as tabancas todas dos negros. As casas são construídas com estacas e adobe, têm telhados de colmo, não chove desde Dezembro, está tudo ressequido e em três tempos o fogo avançou de tabanca em tabanca. Arderam seis.

Parece que o incêndio começou com o rebentamento de um fogareiro a petróleo. Teria sido fácil controlá-lo se não se tivesse pegado à tabanca do lado onde o pessoal das Fox, as viaturas blindadas, guarda o seu material e tem uma espécie de paiol. Ora com as tabancas a arder e com muitas granadas dentro de uma delas, foi um festival de rebentamentos e estilhaços projectados pelo ar. A maioria da população negra fugiu para longe, mesmo assim houve imensa sorte porque ninguém foi atingido. Mais desgraças para os pobres negros que ficaram sem casa.

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(...) Cufar, 3 de Abril de 1974 

A guerra está feia. Bedanda embrulhou durante todo o dia, um ataque tremendo, doze horas consecutivas de fogo. A festa só acabou à noite com uma espécie de cerco à povoação levado a cabo pelos homens do PAIGC.

Em Cufar, tão próximo, além de distinguirmos nitidamente as rajadas de metralhadora de mistura com os rebentamentos dos RPG, foguetões e canhão, à noite viam-se as balas tracejantes e as explosões no ar. Uma novidade, os guerrilheiros utilizaram viaturas blindadas na flagelação a Bedanda. Existe uma estrada que vem da Guiné-Conacry, passa junto a Guileje – abandonada pela tropa portuguesa, – entra pela região do Cantanhez e termina em Bedanda. O IN está a utilizar esse percurso para deslocar camiões carregados com todo o tipo de armamento, em seguida é só despejar sobre os aquartelamentos portugueses mais expostos e fáceis de alcançar, como Chugué, Caboxanque, Cobumba, Bedanda, Cadique e Jemberém.

Bedanda é uma povoação grande, a maior do sul da Guiné depois de Catió. Terá uns cinco mil habitantes e ontem já se falava em abandonar o aquartelamento. A população africana saiu da vila, ficando por próximo.

Bedanda levou com mais de sessenta foguetões e centenas e centenas de granadas de RPG, morteiro e canhão sem recuo. Foi medonho, há muita coisa destruída, mas tiveram sorte, contam-se apenas dois feridos, um furriel e um negro que levou um tiro nas costas. A tropa passou mais de doze horas metida nas valas.

Espera-se novo ataque a Bedanda. As NT já foram remuniciadas e há promessa de se enviarem mais militares para defender a terra. Os guerrilheiros também devem ter ido descansar e reabastecer-se.

Todas estas flagelações, apesar de serem destinadas aos vizinhos do lado, deixam marcas em todos nós. São horas, dias, meses a ouvir continuamente o atroar dos canhões da guerra. Eu ando um bocado desconexo, excitado, “apanhado”. Quase não tenho dormido, são as sensações finais, o cansaço, o desamor à mistura com o alvoroço do regresso a casa. (...)


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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 4 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9308: Excertos do Diário do António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (3): Começar o ano novo com medo de levar uma porrada

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8602: Agenda cultural (146): Reportagem, na TVI, em data a anunciar, sobre a expedição Latitude Zeroº - Rota Ingoré 2011 (24 de Fevereiro / 4 de Março de 2011)



Imagem da página principal do sítio Latitude Zero - Rota Ingoré... Webmaster:  João Brito e Faro, da Moreira da Maia.

 
1. Estava prevista para hoje, na TVI, mas foi adiada para data... oportunamente a anunciar, a exibição de uma  reportagem sobre a expedição à Guiné-Bissau 2011, organizada pelo projecto Latitude Zeroº - Rota Ingoré 2011.

 Eis o teor da mensagem que recebemos do nosso leitor António Morais, com data de 18 do corrente:

No dia 25 de Julho, depois do telejornal das 20 horas – entre as 20h30 e as 21h30 – a TVi em Portugal irá apresentar a reportagem, de 30 minutos, realizada sobre a expedição da Latitude Zeroº – Rota Ingoré 2011,  pela Guiné-Bissau.

Recordamos que durante nove dias, de 24 de Fevereiro a 4 de Março de 2011, António Vieira, jornalista, e Norberto de Sousa, operador de imagem, da TVi, acompanharam esta expedição por Bissau – Ilhandé – Buba – Nhala – Guileje – Iemberem (Parque de Cantanhez) – Mato de Lautchande – Bambadinca – Bafatá – Farim – Bigene – Ingoré – Quinhicam – Canchungo – Cabienque – Tame – Canhobe – Ponta Pedra - Ilha de Pecixe – Bissau.

Em Canchungo, na Região de Cacheu, o tema será a Bankada Andorinha e o seu projecto de promoção da Língua Portuguesa e da Cultura em Língua Portuguesa.


Relatos e fotos da viagem pela Guiné-Bissau: podem ser vistos aqui. A ONG Andorinha em Canchungo tem um blogue próprio, que pode ser visto aqui.

2. E a propósito, acrescente-se: A ONG Bankada Andorinha... (i) tem como objectivo promover a Língua Portuguesa e a Cultura em Língua Portuguesa (Canchungo, Região de Cacheu, Guiné-Bissau); (ii) nasceu de um programa radiofónico de promoção da Língua Portuguesa e da Cultura em Língua Portuguesa na Rádio Comunitária Uler A Baand e Rádio Babok em Canchungo na Guiné-Bissau; (iii) deu origem a diversas bankadas nos bairros de Canchungo, nas tabankas do sector de Canchungo, na Região de Cacheu e em Bissau, de jovens alunos e professores que se agrupam para falarem (treinarem, ultrapassarem o receio) a Língua Portuguesa e organizarem diferentes actividades (Nô Pensa Cabral!, Nô Mindjers bali pena!, Feira do Livro, sessões de sensibilização em escolas, etc).

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Nota do editor:
 
Último poste da série > 22 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8586: Agenda cultural (145): Concerto de Bubacar Djabaté, natural da mítica tabanca de Tabatô, terra de Kimi Djabaté e de outros grandes cantores e músicos, tocadores de balafon e de kora, dia 23, 6ª feira, às 23h, em Lisboa, no Arte & Manha

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6216: Ser solidário (64): Teixeira Pinto (actual Canchungo). Manjaco Francês (Fabien Gomis)


1. O nosso Amigo e leitor guineense, a viver actualmente em França, Fabien Gomis, em 21 de Abril de 2010, enviou-nos um e-mail a solicitar-nos ajuda no seguinte:

Teixeira Pinto

(actual Canchungo)

Manjaco Francês

Bom dia.

Gostaria de agradecer ao blogue pelos “uploads” de imagens do meu país. Mas, mais importante para mim, é que o site permite-me compreender melhor as condições de vida dos soldados na guerra, bem como as dos povos indígenas nessa fase.

Mas primeiro quero me apresentar.

Eu sou francês de origem da Guiné-Bissau (Manjaco de Canchungo), nascido em 1973, em Paris, e secretário de uma Associação de Assistência às Aldeias Manjacas da Guiné.

Também organizamos muitos eventos guineenses na diáspora, em particular em França, onde estamos presentes em eventos culturais, em especial nos “Dias da Cultura”.

Para ser breve, eu solicitava 2 serviços:

Se me poderiam enviar fotos e tudo o que têm, sobre a região de Teixeira Pinto (actual Canchungo), e a devida autorização, a fim de expô-las durante o nosso “Dia Cultural”.

Queria também pedir ao Jorge Picado se me enviava o máximo possível de fotos, sobre os estágios de vida das pessoas, paisagens, casas...

Os meus pais contaram-me que, antes de eu nascer, o meu tio (irmão do meu pai), morreu durante um ataque entre Bachile e Cacheu...

A única informação certa que temos é que ele pisou/accionou uma mina.

O seu nome era Fara Gomes e foi aposentado um dia, mas decidiu regressar à tropa para junto dos seus antigos camaradas, quando foram convidados.

A morte ocorreu durante o 1º trimestre de 1968. Mas eles não sabem mais nada, porque estavam na França, naquele tempo, e as únicas pessoas que podiam adiantar mais alguns dados já faleceram.

Além das fotos, se tiverem notícias ou qualquer documento daquele tempo… tudo seria bem-vindo.

O meu e-mail pessoal é:
mandjako@free.fr

Atenciosamente,
Muito Obrigado.
Fabien Gomis

2. Tradução em francês do e-mail:

Manjaco Français

Bonjour.

Je tiens d'abord a vous remercier de mettre en ligne des images de mon pays. Mais surtout, le site me permet de mieux comprendre la les conditions de vie aussi bien des soldats que celles des autochtones durant la guerre.

Mais tout d'abord je tiens a me presenter.

Je suis un francais d'origine Bissau guinéenne (manjaco de Canchungo ) né en 1973 a Paris et secretaire d'une association d'aide aux villages manjacos de Guinée.

Aussi nous organisons beaucoup d'evenements ou la diaspora guinéenne de france est tres presente notament lors des journées culturelles.

Pour etre bref, j'ai 2 services a vous demander:

Serait-il possible de vous emprunter des clichés sur tout ce que vous avez concernant la region de teixeira pinto afin de les exposer durant notre jornée?????
A defaut, est-il possible de demander à Jorge Picardo s'il est possible de lui emprunter un maximum de clichés sur les scènes de vie de la population, les paysages, les édifices....

Mes parents m'ont dit qu'avant ma naissance le frere de mon pere est decede durant une attaque entre bachile et cacheu... C'etait durant le 1er trimestre 1968. Mais ils n'en savent pas plus car ils étaient en France a cette epoque et les seules personnes à meme de fournir des details sont aujourd'hui décédées.

Aussi, si vous aviez des infos, une photo, un quelconque document qui pourrait m'aider serait le bienvenu.

La seule info que l'on a est qu'il aurait marché sur une mine.

Pour info, mon oncle s'appelait Fara Gomes, il était à la retraite au moment des faits, mais il a décidé d'aller se battre avec ses anciens camarades lorsqu'ils furent appelés.

Merci beaucoup,
Fabien Gomis
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Nota de MR:

Vd. último poste da série em:

1 de Abril de 2010 >
Guiné 63/74 - P6086: Ser solidário (63): Gente feliz... com lágrimas: a Cadi e a sua filha, a Maria Alice do Cantanhez (Pepito / Luís Graça)

domingo, 6 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5414: Os nossos camaradas guineenses (19): Camaradas do Pelundo lêem o Diário da Guiné de Graça de Abreu (António Alberto Alves)

1. Em 13 de Setembro de 2008 recebemos uma mensagem de António Alberto Alves, Sociólogo, a trabalhar numa ONG na Região de Canchungo, Guiné-Bissau.

Na altura demos-lhe a devida resposta através da publicação do Poste 2451*. O que não fizemos foi publicar umas quantas fotografias que nos enviava, de ex-combatentes guineenses, nossos camaradas da zona do Pelundo, a propósito de um encontro que ele próprio promoveu para apresentar o livro do nosso camarada António Graça de Abreu, "Diário da Guiné, Lama, Sangue e Água Pura".

Assumo pessoal e inteiramente a falta que hoje me proponho remediar, isto porque este ano fomos de novo contactados pelo Dr. Alberto Alves, a quem peço desculpa pela aparente desconsideração.

Como infelizmente, nestes dias só se tem falado de camaradas fuzilados (assassinados), cabe-me o prazer de trazer ao vosso conhecimento fotografias de camaradas bem vivos (pelo menos em 2008) que aqui ficam para ver se são reconhecidos por algum tertuliano como companheiros de luta.

Fica também o convite do Dr. Alberto Alves para falarem destes camaradas caso se lembrem deles. Será possível, julgo, contacto através dele com qualquer destes nossos amigos.

CV


2. Mensagem de António Alberto Alves, dirigida ao nosso Blogue em Setembro de 2008:

Caros camaradas da Guiné

O meu nome é António Alberto Alves, sociólogo, e resido em Canchungo, no nordeste da Guiné-Bissau desde Setembro de 2006.
Trabalho para uma ONG portuguesa no âmbito da Cooperação, com o apoio do IPAD Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento, tendo como público-alvo Escolas do Ensino Básico Unificado (da 1.ª à 6.ª classe). O projecto tem como ponto forte a formação e capacitação de directores e subdirectores de Escola, e numa segunda fase pela formação de professores e formalização das funções de bibliotecário. Em complemento, passa pela montagem de Centros de Desenvolvimento Educativo, que em lugares de média dimensão se concretizam em pequenos centros de recursos educativos e bibliotecas abertos à comunidade, e nas pequenas escolas pela colocação de Baús Pedagógicos, contendo um conjunto de material básico, de dicionários gramáticas prontuários de Língua Portuguesa a manuais e materiais didácticos.

O ano passado, numa estadia em Portugal, contactei o vosso blogue, que conheci antes de partir para a Guiné-Bissau. Em Agosto deste ano consegui reunir alguns ex-combatentes guineenses manjacos de Pelundo, para lhes apresentar a obra Diário da Guiné Lama, Sangue e Água Pura de António Graça de Abreu:

Demba Injai da Unidade Batalhão Caçadores 2884, foi Comandante de Pelotão de Milícia, de 1964 e 1974, entre Pelundo e Jolmete

Ioró Jaló n.º 11/64, Unidade 9.ª Companhia de Milícias, 764/64, CCS, Batalhão de Artilharia n.º 6521/72 Pel Mil 225;

Serifo Injai 17/58, 1958-1960, 1964-1974, Comandante de Companhia: Capitão Garciano

Bondon Monteiro soldado n.º 820520/69, Companhia de Caçadores 16 Manjacos, Comandante de Companhia: Capitão Guimarães

Joaquim Gomes Sold Milícia n.º 533/69, B. Artilharia n.º 6521/72, Pelotão de Milícia n.º 225, passou à disponibilidade desde 1 de Janeiro de 1975, Comandante de Companhia: Tenente Baltazar da Costa, Comandante do Batalhão 6521: Campos Ferreira

José Ussumane Injai 1964-1968, Peludo-Jolmete, comandante Pedro André

Mama Samba milícia n.º 011172, 1971-1974; furriel Jarra, alferes Santiago

O filho de Malamine Gomes que foi condutor de Major Fabião

Nesta foto estão os camaradas: Mama Samba, José Ussumane Injai, Demba Injai, Joaquim Gomes e Bondon Monteiro

Guiné-Bissau > Pelundo > Agosto de 2008

Tirei algumas fotografias, que vos envio, e solicito que escrevam, recordem, testemunhem sobre estes homens, no vosso blogue ou através de qualquer outro meio. Estarei em Portugal até final de Setembro e a partir de Outubro novamente em Canchungo, contactável pelo 00 245 6726963. Se quiserem ajudar estes homens, que vivem em condições de dura indigência, poderei servir localmente de apoio.

Agradecendo desde já a vossa atenção, apresento os meus (nossos) melhores cumprimentos
António Alberto Alves
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 18 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2451: O Nosso Livro de Visitas (4): António Alberto Alves, sociólogo, cooperante na região de Canchungo, Caió e Calquisse

Vd. último poste da série de 6 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5413: Os nossos camaradas guineenses (18): A morte do Aliu Sanda Candé (Armandino Alves)

sábado, 14 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5268: Blogues da Nossa Blogosfera (27): Andorinha em Canchungo (António Nababo)



1. O nosso Amigo António Nababo, 44 anos, Sociólogo, enviou-nos um convite em 10 de Outubro de 2009, para visitarmos o seu blogue, com uma dedicatória dita por ele próprio “pela Guiné”, que baptizou como:


Andorinha em Canchungo


Caros amigos,

Nasceu mais um blog: sobre a Guiné-Bissau, Canchungo e a Região de Cacheu.

Andorinha é também um programa na Rádio Comunitária Uler A Baand.

Espreitem, leiam, apropriem-se, aconselhem a amigos... pela GB!

Obrigado
António Nababo



Andorinha pretende abrir asas e voar entre Portugal e Canchungo, entre a Europa e a Região de Cacheu na Guiné-Bissau – promovendo uma ponte entre duas culturas de migrantes...

Andorinha é um programa de promoção de Língua Portuguesa e da Cultura em Língua Portuguesa na Rádio Comunitária Uler A Baand em Canchungo para a Região de Cacheu.

Andorinha será o testemunho de um voluntário português no tchon de Canchungo com olhares sobre a Região de Cacheu.

Andorinha divulgará a Escola e a Educação, a Biblioteca e o Livro da Região de Cacheu.

Andorinha apresentará etnias existentes na Região de Cacheu, nomeadamente amandjaka a sul do rio Cacheu.

Andorinha publicará resenhas e excertos de obras sobre a Região de Cacheu, publicadas na Guiné-Bissau e em Portugal – ou de qualquer outra proveniência.

Andorinha pretende ainda ser um ninho de comunicação e notícias da Região de Cacheu para o Mundo – incluindo os Filhos em Portugal, Espanha, França e Inglaterra.

Venham daí!

Rua d'Além, 15 | 5070-571 Cabêda | Portugal | 00 351 935157323
Missão Católica de Canchungo | Caixa Postal nº 2 | Ao c/ António Alves | 00 245 6726963



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Nota de MR:

Vd. poste anterior desta série, em: