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sábado, 16 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15622: Inquérito 'on line' (28): "A tropa fez de mim um homem"?... Nem sim nem não, metade da malta (12 em 24) responde "nim", "nem verdadeiro nem falso"... Inquérito em curso até 5ª feira...



Alcobaça > Motoqueiros > 1965

Foto: © Juvenal Amado (2016). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


Sabugal > "Briosos mancebos inspeccionados em 1968, com saudosismo do passado. Foto tirada no dia da inspecção, no Sabugal, junto ao antigo edifício camarário onde teve lugar a inspecção. É também visível o edifício da antiga prisão"... É um texto de antologia, o que o José Corceiro, natural do Sabugal, aqui escreveu  em 2011 sobre o dia, tão especial, de ir às sortes (*).

Foto (e legenda): © José Corceiro  (2011). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


A. INQUÉRITO DE OPINIÃO: "SIM, A TROPA FEZ DE MIM UM HOMEM"

1. Totalmente verdadeiro > 1 (4%)

2. Verdadeiro  > 6 (25%)

3. Nem verdadeiro nem falso  > 12 (50%)

4. Falso  > 2 (8%)

5. Totalmente falso  > 3 (12%)

6. Não sei responder  > 0 (0%)

Votos apurados >  24  (100,0%)


Dias que restam para votar: 5 | Termina a 21 de janeiro de 2016, 5ª feira, às 10h06


B. Camaradas: o que é que vamos responder aos nossos filhos e netos, se eles nos fizerem a pergunta: "Pai, avô, a tropa fez de ti um  homem?"...  O pretexto é o título do livro do Juvenal Amado ("A tropa vai fazer de ti um homem", Lisboa, Chiado Editora, 2015)  que vai ser lançado em Lisboa (dia 23, sábado) e em Monte Real, na Tabanca do Centro (dia 29, sexta-feira)...

Claro que eles, os nossos filhos e netos,  não vão fazer a pergunta porque uma grande parte deles não sabe o que é isso da tropa... E, muito menos, felizmente, o que é a guerra, a não ser a dos jogos eletrónicos... Hoje já ninguém vai às sortes, nem há  serviço militar obrigatório.

Antes de 1961, antes da guerra do ultramar/guerra colonial, ir às sortes e ficar apurada, era uma honra para qualquer mancebo deste país, a avaliar pelo testemunho de alguns camaradas nossos que já escreveram sobre este assunto, com destaque para o José Corceiro (*).

Não vamos discutir aqui se havia ou não nesse tempo uma "ideologia do marialvismo"... A verdade é que em todas sociedades há "ritos de passagem", ligados ao ciclo de vida... É evidente que tinha um enorme significado no passado, para um "mancebo" (**), a ida à inspeção militar, o apuramento, a recruta, o juramento de bandeira e, em caso de guerra, a partida para a guerra... Havia o mito de que a tropa era uma "fábrica de homens"... Mas este acontecimento (um mancebo ficar apurado para a tropa) também queria significar "emancipar-se", "atingir a maioridade", "libertar-se" do pai-patrão, sair de casa...

O que pensamos, hoje, sobre isso? A pergunta é complexa, pode até provocar algum  incómodo e desconforto, não sendo portanto de resposta fácil (sim ou não)... No inquérito "on line" desta semana,  sobre este tema, já temos 24 respostas... E metade dos respondentes (n=12) optou por responder "Nim", nem sim  nem não, "nem verdadeiro nem falso"...

A resposta, em direto, "on line", deve ser feita no blogue, no canto superior esquerdo, até 5.ª feira, dia 21, às 10h00...
____________

Notas do editor:


(...) Para muitos dos jovens, o dia da inspecção seria também a primeira vez que iriam estrear um fato novo, composto por calças, casaco e colete (terno), pois até ao presente não tinham tido a possibilidades de comprar o tecido e mandá-lo confeccionar no alfaiate da terra, visto ser escasso o suporte económico da família. Era também provável que a partir dessa data, o jovem pudesse começar a amealhar um pezinho de meia, fruto de algum trabalho que executasse com direito a remuneração, jornal ou a passar contrabando, pois até esta altura tudo o que tinha ganho reverteu a favor do agregado familiar. (...)

(...) O cavalo, adereçado com os seus melhores arreios estava pronto e à espera. Ricamente aparelhado. A sela, a cinta, o cabresto, as rédeas e o freio foram diligentemente limpos e engraxados, as fivelas e os estribos foram polidos até ficarem a brilhar, sem esquecer as patas do equídeo que foram aparadas, limadas e convenientemente ferradas, pois há mais de 30 quilómetros para calcorrear, ida e regresso, com o mancebo sempre montado e a espicaçar, e quiçá poderá surgir algum amigo mais íntimo que o queira apadrinhar e arrisque a boleia no lugar da garupa, e o ritmo tem que ser constantemente a trotear. (...)

(**) Do Dicionário Houaiss  da Língua Portuguesa:

"Mancebo", adj./subs., "que ou aquele que está na juventude; jovem, moço"... Etimologia, do latim manceps, mancipis, termo técnico do direito, "o que toma em mão (alguma coisa para dela se tornar o adquirente ou reivindicar-lhe a posse); relacionado com manu, mão.  O mancebo, de mancipiu(m) era aquele que, no tempo da antiguidade clássica,  era agarrado à mão, feito escravo, na guerra, e levado para casa, para os trabalhos agrícolas... Ou ainda manus + cibus, homem que é cevado à mão, escravo,,,  

Mas há outros significados... Veja-se aqui Língua Portuguesa, o blog de Aldo Bizzochi > Mancebo, mancebia, amancebar-se

(...) O que ocorreu de fato é que mancebo derivou de amancebar, e não o contrário. Esse verbo amancebar (...), na verdade, provém por evolução fonética regular do latim emancipare, "emancipar, libertar, deixar de tutelar", que significava, dentre outras coisas, "conceder a um filho poderes civis quando este completasse a maioridade". Portanto, manceps e emancipatus queriam dizer "maior de idade". (No direito civil brasileiro temos o mesmo termo emancipado para designar o indivíduo que atingiu a maioridade ou a quem, sendo menor, a justiça concedeu as prerrogativas de cidadão adulto.) (...)

(***) Último poste da série > 11 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15606: Inquérito 'on line' (27): "Em 2016 prometo enviar mais fotos e/ou textos para o blogue"... Sim, respondem cerca de 20 a 25 num total (magro) de 57 respondentes...

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10520: Palavras fora da boca... (1): "Nem mais um soldado para as colónias"! (José Corceiro / Manuel Joaquim / Manuel Botelho)



Lisboa > Dia 28 de Abril de 1974, ao fim da tarde, na Rua Fontes Pereira de Melo, antes de chegar às Picoas. Começou espontaneamente o pessoal a aglomerar-se, já depois da Rotunda, e enquanto o diabo esfregou o olho, estruturou-se uma manifestação, com muitos militares da Força Aérea, como se pode ver nas linhas da frente com farda azul e boina verde. As palavras de ordem: 'Nem mais um soldado para o ultramar'… 

Foto (e legenda): © José Corceiro (2010). Todos os direitos reservados.



1. O meu velho, Luís Henriques (1920-2012), gostava muito de falar em verso, de fazer rimas, quadras, versos de pé quebrado, citar provérbios populares, contar anedotas, evocar os seus tempos de expedicionário em Cabo Verde ou relembrar os tempos de jogador de futebol, e de treinador de camadas juvenis... Muitas vezes fazia-nos rir, sorrir, pensar... Tenho pena que muita da sua sabedoria popular tenha ido para a cova com ele... Algumas coisas fomos, eu e os seus netos,  registando, filmando, tomando boa nota... 

Mas ele era um repentista, um espontâneo, um improvisador, incapaz de repetir, com a mesma precisão e graça, o que acabava de lhe sair da boca... Tudo dependia do contexto, das situações, dos interlocutores, e da disposição e da inspiração de momento... E, claro, fiava-se na sua memória de elefante... Tinha um reportório para dar e vender... Nunca o vi escrever um dito, uma história, um verso... 

Tudo isto vem a propósito de uma quadra que ele gostava muito de citar,   apropriada para prevenir situações de conflito...

Palavras fora da boca,
São pedras fora da mão,
Tu mede bem as palavras,
Tira-as do teu coração.

As palavras às vezes magoam como se fossem pedras. Muito mais do que isso, às vezes chegam a ferir e/ou matar. Matam mesmo!... Ou podem matar!...  Quantas dessas palavras não foram lançadas ao vento como autênticos bumerangues que, não atingindo muitas vezes o alvo, se voltavam, no regresso,  contra o próprio lançador ?... 


"Palavras fora da boca" foram/são, muitas vezes, as nossas "palavras de ordem", de ontem e de hoje, slogans, grafitos, títulos de caixa alta nos jornais e, em menor grau, os nossos comentários, as nossas "bocas" bloguísticas... 

Há palavras incendiárias, há palavras que incendeiam o capim... independentemente da intentação ou da vontade de quem as profere... Veja-se há dias a infelicidade do prof Miguel Oliveira e Silva, presidente do Conselho Nacional da Ética para as Ciências da Vida,  tropeçando no trocadilho racionamento/racionalização dos medicamentos... Temos que saber lidar com elas, as palavras... tal como sabíamos com lidar as minas e armadilhas, as nossas e as do IN no TO da Guiné.  

Palavras fora da boca... é o título de uma nova série, que tem um propósito, se quisermos, didático, pedagógico, preventivo... Não é para alimentar polémicas, desgastantes, fraturantes, inúteis, mas para preveni-las.  Não é para a gente  fazer ajustes de contas com o passado, por opções político-ideológicas do passado, ou por tomadas de posição como cidadãos, nos nossos ainda verdes anos... 

É para apenas a gente refletir serenamente, sorrir se for caso disso,  e aprender eventualmente com os nossos erros, individuais, grupais e coletivos... 

E a primeira dessas "palavras fora da boca" aqui vai: "Nem mais um soldado para as colónias"... (Se calhar alguns de nós, a seguir ao 25 de abril, também gritámos palavras de ordem como estas ou parecidas, esquecendo-nos que continuava haver, nos TO da Guiné, de Angola e de Moçambique, camaradas nossos, combatentes, que ainda faziam a guerra, ou que preparavam a paz, ou que cumpriam o plano de retração das NT, ou que muito simplesmente aguardavam o regresso a casa,  em qualquer dos casos continuando  a arriscar o pelo)... 

São pedaços de prosa que repesquei do nosso blogue:


2. Comentário de Manuel Joaquim, em 5 de junho de 2010, ao poste P6526:

Caro Graça de Abreu

Concordo, totalmente, com o que dizes sobre o chamado "socialismo real", expressão usada para camuflar o termo "comunismo". Criaram-se regimes de terror, as provas são evidentes. Só as não vê quem não quer.


Parece-me, no entanto, que estes comentários não andam por aí mas sim pela "nossa" descolonização.O que me irrita e enoja é o espectáculo dos/das velhas virgens que andam por aí, de hímen reconstruído, a injuriar e a diabolizar a descolonização, a amesquinhar o comportamento militar em combate, a invectivar a "entrega da nossa Pátria aos comunas", a arrotarem "verdades" sobre personagens e situações que, de verdade, só têm as sílabas das palavras ditas.

Não são as vítimas da descolonização que me irritam com as suas queixas furibundas, às vezes injustas, nem sequer aqueles que defendem as asneiras que, politicamente, fizeram quando tiveram de decidir.

Quem me enoja são aqueles que eu vi, logo a partir de Maio/74 (*), com faixas e aos gritos "Nem mais um soldado para as colónias!".

Estas palavras de ordem propagaram-se como fogo em palha seca. Imaginei logo o que iria acontecer: a destruição de todas as hipóteses possíveis de entendimento com o IN, de qualquer energia ainda existente nos nossos combatentes, de qualquer hipótese válida de se formarem contingentes para render tropas no terreno.

Bem recordo alguns, hoje altos expoentes ideológicos de direita, altos cargos políticos, de Lisboa a Bruxelas, altos cargos na comunicação social, a liderarem tais manifestações, quer na rua quer na rádio, na TV, nos jornais.

Hoje vejo-os por aí causticando o modelo descolonizador e, paradoxo, incensados pelas vítimas da descolonização!

Seria muito interessante consultar a imprensa de 1974/75, falada e escrita, e ver como se expressavam sobre este assunto certas "aves raras" que hoje se pavoneiam por aí, "arrotando postas de pescada".
Um abraço 

Manuel Joaquim


3. Excerto de depoimento de Manuel Botelho, artista plástico (Poste P6789)

(...) “Nos últimos anos vi crescer o meu desejo de identificação com os homens da minha geração que há muito tempo embarcaram para Angola, Guiné e Moçambique, escondidos atrás de um camuflado e uma G3. 


"Sei que não fui um deles. Tive a fortuna de estar no último ano do curso de arquitectura quando o 25 de Abril pôs termo ao pesadelo que me ensombrou a adolescência, e já não experimentei a guerra ao vivo e em directo. Mas vivi-a intensamente, numa antecipação obsessiva que durou toda juventude.

"Desde então muito tempo passou, e a minha perspectiva da vida mudou também. A guerra na África portuguesa deixou de me interessar enquanto fenómeno político e passei a prestar uma outra atenção aos que a fizeram. Muitos (a esmagadora maioria), ainda estão vivos; têm sensivelmente a minha idade; estão carecas e cansados como eu. Alguns serão um pouco mais velhos, mas pertencemos todos a um mesmo tempo, a uma mesma condição. 


"E eis-me a viver um estranho paradoxo: eu, que andei pelas ruas a berrar “nem mais um soldado para as colónias”, comecei a ter sentimentos de culpa por não ter partilhado esse tempo de abnegação e sacrifício. E a minha pintura começou a falar das memórias dessa guerra, como em “Escombros de Wiryiamu”, o massacre no norte de Moçambique que escandalizou o mundo e que evoquei através de um soldado (eu, já velho), sob a ameaça de insectos gigantescos e segurando desoladamente uma G3. Foi essa G3 que quis fotografar de seguida. (...)
______________

Nota do editor:

(*) "4 de Maio de 1974 > Militantes do MRPP impedem, pela primeira vez, um embarque de tropas para as colónias. Palavra de ordem: Nem mais um soldado para as colónias!" (Fonte: Centro de Documentação 25 de Abril / Universidade de Coimbra > Cronologia Pulsar da Revolução)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Guiné 63/74 - P9212: O nosso sapatinho de Natal: Põe aqui o teu pezinho, devagar, devagarinho... (2): Mensagens dos nossos camaradas José Carlos Gabriel, Alcides Silva, José Lima da Silva, José Corceiro, António Nobre, Fernando Chapouto, António Paiva e Armando Fonseca

MENSAGENS DE NATAL DOS NOSSOS CAMARADAS

1. Mensagem do nosso camarada José Carlos Gabriel (ex-1.º Cabo Op Cripto da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513, Nhala, 1973/74):

Nesta data festiva não poderia deixar de endereçar os meus votos de UM FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO DE 2012 para todos os camaradas e respetivas famílias.


José Carlos Gabriel
Ex-1º Cabo Op. Cripto
2ª CCAC do BCAC 4513
Nhala 73/74

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2. Mensagem de Alcides Silva, ex-1.º Cabo Estofador na CCS/BART 1913, Catió,1967/69:

Amigos e companheiros de guerra,
Envio o desejo de Bom Natal e Feliz Ano novo para todos os camarigos.


Um grande abraço para todos e muita saúde.
Alcides Silva

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3. Mensagem de José Lima da Silva (ex-Soldado da CCAÇ 1496/BCAÇ 1876, Bissum, Pirada e Bula, 1966/67):

Com os votos de que tenham Festas felizes e Santo Natal para todos em geral
Um abraço
JLS


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4. Mensagens de José Corceiro (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71)

António Nobre (ex-Fur Mil da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Buba, Nhala e Binar, 1969 e 1970):
e
Fernando Chapouto (ex-Fur Mil da CCAÇ 1426, 1965/67, Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda

Natal Feliz com muita saúde e alegria
Um abraço


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5. Mensagem do nosso camarada António Paiva (ex-Soldado Condutor Auto no HM 241, Bissau, 1968/70):


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6. Mensagem de Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64):

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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 14 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9196: O nosso sapatinho de Natal: Põe aqui o teu pezinho, devagar, devagarinho... (1): Gabriel Gonçalves (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8854: In Memoriam (93): Homenagem do povo de Vale de Espinho aos seus filhos que perderam a vida na Guerra do Ultramar (José Corceiro)


1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 2 de Outubro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, J. Magalhães.
Deixo ao vosso critério publicar, ou não, o texto que envio, assim como as respectivas fotos, que junto em anexo.

Um Abraço
José Corceiro


Homenagem do povo de Vale de Espinho aos filhos que perderam a vida na Guerra do Ultramar

Estimados amigos
Estive no passado mês de Agosto, em Vale de Espinho, Sabugal, minha Terra Natal. A minha sensibilidade enterneceu-se num estranho miscigenado, de satisfação, sofrimento, orgulho e saudade, ao deparar e ser surpreendido, com um singelo memorial erigido pelo povo de Vale de Espinho, a homenagear os dois combatentes, mancebos Valespinhenses, que tombaram e derramaram o seu sangue, em terras de África, onde perderam a vida na Guerra do Ultramar. Foram eles: Francisco Vaz Silva e José Martins Cobrado.

Foto 1 - Memorial, erigido pelo povo, de Vale de Espinho, a homenagear os dois combatentes Valespinhenses que tombaram na Guerra do Ultramar.

O monumento é simples, mas transmite o resumo duma mensagem carregada de respeito e estima. É um memorial constituído por um pedestal de granito, pedra hirta, consistente e nobre, da zona, no qual foram cravadas três lápides de mármore preto, a simbolizar a saudade e o luto, lápides onde foram gravadas letras em baixo relevo, banhadas a ouro, exprimindo o carinho e o reconhecimento dum povo. Foi colocado num espaço público ajardinado, à entrada do Largo das Eiras, em frente do Centro Social Paroquial, da aldeia, junto ao café do “Freu”. Os meus dois conterrâneos, que tombaram em combate, tinham praticamente a minha idade e deixaram-nos no auge da sua mocidade, no ano de 1969.

Fiquei agradado e muito agradecido, ao Sr. Presidente da Junta da Freguesia, de Vale de Espinho, José Faixa, por ter tido a humanidade e a lembrança de honrar e recordar os dois jovens, filhos da povoação, que tão novos perderam a vida a lutar, numa guerra injusta, no solo do Ultramar. Guerra indevida, para mim, porque os nossos estadistas e governantes não souberam interpretar e respeitar o sopro dos ventos, que há muito se faziam sentir, através de sinais e acontecimentos explícitos, que exigiam mudanças históricas, mas não foram devidamente ajuizados para evitar que a guerra se desencadeasse…

Eu escrevi, no dia 1 de Junho, de 1969, em Bissau, nos meus apontamentos diários onde anotei, quando tinha somente dois dias de Guiné, mais ou menos o seguinte: “...Sou por natureza bucólico, encanta-me o campo, a paisagem a floresta, e admirou-me o percurso que medeia entre o DGA e Bissau, de aspecto árido e tórrido, a contrastar com o arvoredo frondoso e acolhedor da bolanha, onde umas mulheres lavavam a roupa…. Foi muito agradável ver as lavadeiras, algumas completamente nuas e sem ruborescerem perante os “mirones” presentes. De entre elas, sobressaiu uma, mais atrevida e desinibida, que ao ver o nosso olhar maroto carregado de intenção maliciosa e aveludado de desejo concupiscente, dirigiu-se a um dos meus amigos em termos críticos e desafiantes, gesticulando e prenunciando palavras provocadoras...

Para o meu íntimo, estes momentos a que venho assistindo, já são reveladores do fosso cultural existente entre nativos e metropolitanos. Começam-me a aliciar a idiossincrasia e a genuidade do povo guinéu, despido de formalismos e preconceitos; para mim este modo de vida, é pureza, conduta simples e natural, é como um ode da natureza a louvar a criação do homem… Assim se inicia mais um despertar em mim! Por um lado a intuição, por outro o raciocínio, começo a ficar sobressaltado e a entender que aqui há outra cultura, outra forma de ser e estar na vida, eles, os nativos, estão no seu habitat. Temos o dever de os respeitar, pois nós estamos desintegrados, eu sou invasor!...”

O primeiro mancebo da minha terra, Vale de Espinho, que tombou em combate, no Ultramar, Francisco Vaz Silva, era meu tio, irmão da minha querida e saudosa mãe. Além de tio, foi amigo e companheiro de infância, nas nossas brincadeiras de meninice, pois éramos praticamente da mesma idade e frequentámos a mesma turma escolar.

Foto 2 - Sepultura, no cemitério de Vale de Espinho, onde jazem os restos mortais de Francisco Vaz Silva.

Recorte com a notícia que saiu na imprensa regional, quando se realizou o funeral do meu tio.

O meu tio, juntamente com outros amigos, como era frequente na época, 1965, com apenas 18 anos, foi “a salto” para terras de França, à procura de melhor qualidade de vida e porque não dizê-lo, também para se alhear da Guerra do Ultramar… Estava profissionalmente bem integrado na sociedade do país que o acolheu, onde era estimado e valorizado, quer no trabalho que executava, quer nas relações inter-sociais com os amigos de convivência, e tinha sempre presente os meus avós, para os quais enviava com regularidade dinheiro. Mas um grito interior agitava-lhe as entranhas, e ouvia a voz bradante do chamamento da Pátria amada, que clamava pelos seus ditosos filhos e, com 21 anos, regressou voluntariamente à terra que o viu nascer, carregado de animosidade e cheio de esperança, desejava calar o grito que lhe invadia a alma e o impulsionava de regresso às origens… O bramido das Raízes!…

Foto 3 - Da esquerda para a direita: (eu) José Corceiro, Filipe Neto, José Manuel Pedro e meu tio Francisco Vaz Silva. Quando a foto foi tirada, tínhamos de idade 13, 14 anos.

Na companhia do meu e seu grande amigo, também emigrado, José Manuel Pedro, regressaram os dois ao seu País Natal e apresentaram-se de seguida no Regimento Militar, da área de residência, para se disponibilizarem a cumprir o dever de cidadania e serem integrados no serviço militar, para servir a Pátria. Tiraram a recruta, no Batalhão de Caçadores 6, em Castelo Branco, finda a qual foram logo mobilizados, pelo RC 4, para Angola, integrados na CCav 2431/BCav 2854 colocado em Zala. Após curta estadia em Angola, ainda com 21 anos de idade, o dia 4 de Fevereiro, de 1969, tombava em combate, Francisco Vaz Silva, na presença do seu grande e inseparável amigo, José Manuel Pedro.

O funeral do meu tio realizou-se, em Vale de Espinho, o dia 23 de Junho, de 1969, passados quatro meses e meio após a sua morte, já eu tinha sido mobilizado para o Ultramar e estava na Guiné.

Foto 4 - O nome do meu tio, na Venera Nacional, entre a extensa lista dos Combatentes que tombaram na Guerra do Ultramar, cujas placas estão junto do Monumento Nacional aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa.

Foto 5 - Monumento Nacional aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa.

O José Manuel Pedro, após o regresso do Ultramar, iniciou o namoro com uma prima minha e acabaram por contrair matrimónio. Constituíram e organizaram bem a vida, com sucesso e desafogo e dessa união, nasceram duas filhas. Mas a vida às vezes é madrasta, e reserva-nos traiçoeiras surpresas e tragédias. O casal, meu amigo e parente, ofereceu há cerca de dez ou onze anos um carro e um apartamento à filha mais velha, que vivia em Viseu, onde trabalhava e estava a tirar o mestrado. Na passagem do ano, quando se dirigia sozinha para uma festa de amigos, a filha perdeu a vida num acidente, em Viseu, ao volante do carro que conduzia.

Mas a tragédia e o sofrimento não terminaram por aqui e, passado pouco mais de meio ano, após se ter dado o acidente que vitimou a filha querida, eis quando também é roubada a vida à outra amada e já única filha, com 16 ou 17 anos de idade! Ficaram estes pais, num desespero arrepiante, de causar dó e piedade, mergulhados numa vida vazia, a abarrotar de dor, angustia, desmotivação, saudade, recordações de tantos sonhos idealizados e não concretizados! Foi tudo num ápice, e afundaram-se vidas até então bem estruturadas, deixando o casal num turbilhão de incertezas existenciais, em que a vida se transformou num vácuo desabitado, em que o pendor da balança do infortúnio ficou a pesar só, num só sentido… em declive, com o peso do luto doloroso e insuportável, no prato da desesperança!

Um abraço e boa saúde para todos
José Corceiro
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 28 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8832: Filhos do vento (6): Os que ficaram por Canjadude (José Corceiro)

Vd. último poste da série de 8 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8750: In Memoriam (92): Homenagem às Grandes Mulheres, as nossas Enfermeiras Pára-quedistas que nos deixaram (Rosa Serra, ex-Enf.ª Pára-quedista / António Almeida, Fur Mil em Angola / Teresa Almeida, Liga dos Combatentes)

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8832: Filhos do vento (6): Os que ficaram por Canjadude (José Corceiro)

1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 26 de Setembro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, E. Magalhães
Deixo à vossa decisão a publicação, ou não, do texto que segue, assim como a colocação das fotos, que vão em anexo.

Um Abraço
José Corceiro


“FILHOS DO VENTO” QUE FICARAM POR CANJADUDE

Caros amigos
As Guerras são sempre sujas. Deixam o seu rasto de sangue, miséria, sofrimento e seres humanos estropiados… Há quem defenda que a Guerra é necessária!...

Em Canjadude, que eu tivesse conhecimento, sem inteireza total, existiam duas crianças “Filhos do Vento”, (presumo filhos de metropolitanos) que eram bem identificadas pela falta de pigmentação, melanina, na pele e pelos traços faciais.

Canjadude, além de Companhia Independente, era um caso com muita singularidade, no contexto operacional militar da Guiné. A CCAÇ 5, sediada em Canjadude, era composta, em Janeiro de 1970, por 52 metropolitanos e cerca de 220 militares africanos, de todas as etnias da Guiné e poucos, ou talvez nenhum, fosse natural da Tabanca de Canjadude onde estavam a habitar. Todos os metropolitanos, excluindo o 1.º Sargento, eram jovens, incluindo o Capitão que comandou a Companhia a partir de Maio, de 1970. Foi o Capitão do quadro do Exército português, que atingiu a patente com menos idade. Quando foi para Canjadude, com 23 anos, já tinha cumprido serviço militar em Angola.

Militares africanos a dormir no Aquartelamento, que estava separado da Tabanca por arame farpado, eram só dois, porque não tinham no local as mulheres. Todos os outros, alguns tinham mais que uma mulher, viviam na Tabanca, misturados com os civis. O número de militares, sobretudo africanos, foi aumentando progressivamente ao longo dos tempos. Entre os militares africanos, só um, o 1.º cabo Saldanha era mestiço, cabo-verdiano, que estudou em Bissau.

A população civil de Canjadude era de etnia Mandinga, e a dominância dos militares era de etnia Fula, que por princípios culturais e territoriais alimentavam um ódio de morte, uma etnia contra a outra, mas por razões de circunstâncias de necessidades, toleravam-se a viver porta com porta.

Ora, nesta amálgama de massa humana, onde não existiam só necessidades alimentares, havia quem satisfizesse as suas carências aproveitando as oportunidades que surgiam, sobretudo quando os pelotões pernoitavam no mato. Em matéria de adultério, por aquilo que se dizia, observei, intui e registei, os militares da CCAÇ 5, nativos, não se respeitavam muito uns aos outros. Sempre que pelotões saíam para o mato, os que ficavam no Aquartelamento, numa atitude de vingança revezavam-se, tentando desforrar-se na mulher daquele que o tinha desrespeitado… Confusões houve em que algumas podiam ter degenerado em tragédia!

Às vezes, pelotões que estavam no mato, por questões operacionais diversas, regressavam antecipadamente ao Aquartelamento, já a noite ia longa. Nestes casos havia sempre quem fosse surpreendido a meter a foice em ceara alheia, algumas vezes envolveu metropolitanos. A situação tomou outra dimensão, preocupação, e cautela, quando num regresso imprevisto do mato, um militar nativo surpreendeu no interior da sua tabanca, o seu comandante de pelotão, que por azar ou sorte, por razões de saúde não saiu nessa operação. O ousado sentindo-se ameaçado de morte, envolveu-se em luta, com quem reclamava honra, que para suavizar a ofensa aceitou receber dinheiro desembolsado pelo atrevido. O ofendido exibia orgulhosamente um galão que arrancou do ombro do seu superior. A partir deste episódio, sempre que havia regressos do mato imprevistos, durante a noite, e que eram comunicados ao operador de transmissões, além da informação dada às sentinelas, havia alerta sonoro para avisar os prevaricadores.

Talvez em Canjadude não houvesse mais “Filhos do Vento” além destes dois porque a ideia com que fiquei, intuição, é que se utilizava muito o preservativo, não tanto como preocupação de método anticoncepcional, mas mais como preventivo venéreo, pois houve alguns casos de gonorreia entre os metropolitanos. A ideia que fluía, nas conversas de caserna, é que os lesados se tinham prevenido usando a bisnaga do gel uretral, disponível no posto de enfermagem, mas que não garantiu protecção eficaz.

Não é de desprezar a eventualidade de aparentemente parecer ser, “Filho do Vento” (filhos de metropolitanos), e na realidade não o ser, pois podiam ser filhos gerados por homens mestiços existentes na Guiné.

Meninos da Tabanca de Canjadude

Civis de Canjadude

No ser humano, cada célula somática contém 46 cromossomas, mas as células germinativas é óbvio que só contém 23. No homem, o processo de formação de espermatozóides, espermatogénese, durante a divisão celular, meiose, produz células germinativas, com 23 cromossomas, em que uns espermatozóides têm o cromossoma y e outros o x. Na mulher, a formação do óvulo, ovogénese, durante a divisão celular, meiose, desenvolve células germinativas com 23 cromossomas, em que todos os óvulos contêm o cromossoma x.

Quando se dá a fecundação do óvulo, pelo espermatozóide, e se emparelham cada um dos 23 cromossomas homólogos, provenientes das duas células germinativas, os cromossomas homólogos são iguais em tamanho, excepto o x quando se emparelha com o y em que este é menor.

É no momento da fecundação que se define o sexo do novo ser, consoante o espermatozóide fecundante seja portador do cromossoma x, que emparelha com o x do óvulo, originando um ser feminino que é xx. Quando o espermatozóide fecundo é portador do cromossoma y, que emparelha com o cromossoma x do óvulo, origina-se o sexo masculino que é xy. No acto da concepção o sexo do gerado, depende sempre do espermatozóide. No acto da ejaculação libertam-se muitos milhões de células germinativas, umas portadoras de cromossoma x e outras y. No acto da fecundação, entre muitos processos iniciados, há o emparelhamento dos cromossomas homólogos, e acontece como que uma fusão dos genes correspondentes, nos pares de cromossomas, em que cada gene tem bem definida a característica que vai transmitir, evidenciando-se a do gene dominante em detrimento do recessivo. Grosso modo, genes são as unidades em que estão divididos os cromossomas e que contém as informações genéticas de cada ser, características de hereditariedade.

Ora, existe num dos 23 cromossomas de cada progenitor, um gene que vai determinar, segundo a cadeia sequencial do ácido nucléico, a quantidade de pigmentação, melanina, que existe na pele de cada ser. Cada traço que nos caracteriza está mapeado num gene, e o conjunto destes forma o genoma humano.

Cada gene encerra em si uma miscigenação variada, obra de muitas fusões nas relações inter-raciais.
Por vezes ao fazermos juízos somos traídos, atendendo somente à simples observação…

Um abraço e boa saúde
José Corceiro
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 3 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8730: Parabéns a você (311): Agradecimento à tertúlia de José Corceiro, ex-1º Cabo TRMS da CCaç 5 - Gatos Pretos (Canjadude, 1969/71)

Vd. último poste da série de 26 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8824: Filhos do vento (5): A família do falecido Dauda, protegido do saudoso Cap Zé Neto (CART 1613, Guileje, 1967/68)...

sábado, 3 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8730: Parabéns a você (311): Agradecimento à tertúlia de José Corceiro, ex-1º Cabo TRMS da CCaç 5 - Gatos Pretos (Canjadude, 1969/71)

1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 2 de Setembro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, J. Magalhães.
Desde Março, p.p., que não tem sido nada profícua a minha actividade no Blogue, embora o visite com regularidade, sinto, com mágoa, que há um débito da minha parte, que a seu tempo desejo saldar…

Estou a enviar estas simples palavras, para manifestar o regozijo que senti, por me terem vindo a felicitar no dia dos meus anos. Quero pois agradecer a todos essa manifestação de carinho... Bem-haja e muita saúde!

Deixo ao vosso critério a publicação, ou não, do texto que segue, assim como a inclusão das fotos, que vão em anexo, onde acharem apropriado.

Um Abraço
José Corceiro

Ex-militares de Transmissões, que cumpriram serviço militar em Canjadude. Tive a honra de os juntar no almoço-convívio, nos Três Pinheiros.


Agradecimento Pelas Felicitações no Dia do Meu Aniversário

Estimados Amigos, regressei ontem de férias (31-08) e ao abrir a página da Tabanca Grande fiquei completamente subjugado por uma onda de consolação emocional, que me provocou algum constrangimento. Há emoções que assarapantam o homem, embora este seja por primazia racional, mas, no acto de tomar uma decisão é quase sempre a emoção/sentimento que se sobrepõe ao racional. Vem isto a propósito do gesto de manifestação de carinho e lembrança, que os editores e Tertulianos do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné tiveram para comigo, ao não esquecer o dia do meu aniversário e virem a terreiro parabenizar-me e desejar felicidade. Embora ache que não sou merecedor desta deferência, é sempre muito reanimante e consolante, constatar que a nossa pessoa está presente nos bons sentimentos dos nossos semelhantes… É uma prova de que não somos esquecidos.

Porventura, sentir-me-ei embaraçado porque reconheço que não terei administrado equilibrada/racionalmente a emoção de dar continuidade à série “Casos de Azar e Sorte”, (na guerra) tarefa que assumi levar em frente e me comprometi perante vós a escrever algum artigo! A matéria que tenho em potencial não é escassa, mas não me tem sobrado tempo para articular a ideia e enviar mais trabalho, pois tenho andado embrenhado noutras contendas e projectos, deixando-me dominar pelas emoções… Mas a seu tempo continuarei com a série!

A circunstância do momento não é para eloquências e não devo deixar-me desviar do rumo da razão desta emoção, que quero que seja de gratidão, agradecimento e estima, e que contribua para consolidar a empatia que partilho convosco…

Desejo manifestar a minha gratidão para com o Luís Graça, que como pai fundador, em bela hora teve a ideia luminosa de gerar um filho, (Blogue) que tem sido acarinhado e alimentado por todos nós, onde por vezes se fomentam momentos de redobradas e ambíguas emoções, que nos obrigam a desentorpecer os dedos das mãos, ao exercitarem-se a teclar as letras, frenética e desembaraçadamente, para articular as frases que dão corpo às ideias, que são elaboradas nos neurónios e que circulam através das sinapses, entre os centros cerebrais da emoção e do racional, processando argumentações, lembranças e decisões, que são sinónimo de que não estamos a cair no imobilismo. Gratidão também, para com os incansáveis e sempre amistosos editores, que não se poupam a trabalho abnegado, timbrando-o de empenho e observação, para que cada artigo recebido seja editado na perfeição, reflexo da devoção aplicada com mestria e afeição …

Agradecimento ao Miguel Pessoa, “Cartoonista” de apurada sensibilidade, que elaborou com toque brilhante, um postal com fotos minhas, extraídas de distintos postes. Agradeço ainda, ao José Martins, que conheci há 42 anos, no dia 13 de Junho de 1969, nas “Termas de Canjadude” (Guiné). Reencontrámo-nos passados 41 anos após a separação, e serviu essa ocasião, aliada à permanente disponibilidade do “Zé”, para estabelecer um elo de ligação gerador dum florescimento de continuados encontros, com amigos do passado.

Enfatizo a estima que tenho para cada um dos membros do Bloge, que são a razão e motivação desta gratidão e agradecimento. Para todos vós, o meu humilde obrigado por se terem lembrado de mim no dia do meu Aniversário. A todos desejo muita saúde e mando um abraço emocionado! Brindo à continuidade do Blogue e à união de todos nós.

Um abraço
José Corceiro
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 28 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8711: Parabéns a você (309): António Barbosa, ex-Fur Mil Cav, Pel Rec Panhard 1106 (Bula, 1966/68) e José Corceiro, ex-1º Cabo TRMS da CCaç 5 - Gatos Pretos (Canjadude, 1969/71)

Vd. último poste da série de 1 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8715: Parabéns a você (310): Manuel Joaquim, ex-Fur Mil da CCAÇ 1419 (Guiné, 1965/67)

domingo, 28 de agosto de 2011

Guiné 63/74 - P8711: Parabéns a você (309): António Marques Barbosa, ex-Fur Mil Cav, Pel Rec Panhard 1106 (Bula, 1966/68) e José Corceiro, ex-1º Cabo TRMS da CCaç 5 - Gatos Pretos (Canjadude, 1969/71)

Hoje, os nosso votos de feliz aniversário são a dobrar. Por ordem de antiguidade (não seja esta o posto mais honrado e respeitado entre nós), cumprem mais um festejo os nossos camaradas: António Barbosa, que foi Fur Mil Cav no Pel Rec Panhard 1106 (Bula, 1966/68) e José Corceiro, que foi 1.º Cabo TRMS da CCaç 5 - Gatos Pretos (Canjadude, 1969/71)

1. Ao António Barbosa oferecemos este “maravilhoso” poster da autoria dos (des)ajeitados, mas bem-intencionados editores:

2. Ao José Corceiro, mais sortalhão nesta ocasião, dois murais fabulosos da autoria dos nossos hiper-artistas privados, não remunerados mas devidamente identificados: José Martins e Miguel Pessoa.

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Nota de MR:

terça-feira, 19 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8569: Fotos à procura de... uma legenda (2): Carlos Miguel (Fininho), e Carlos Alberto Maravilhas Soares, do Comando de Agrupamento nº 1980 (Bafatá, 1967/68): Álbum de Amaro Oliveira António



Foto nº 1 - O ex-Fur Mil Carlos Miguel (Fininho), de pé, ao lado do 1º cabo Amaro Oliveira António, sentado, no Comando de Agrupamento nº 1980 (Bafatá, 1967/68)...




Foto nº 2 - "Homenagem ao Carlos Alberto Maravilhas Soares (guarda redes, já falecido) do Comando de Agrupamento nº 1980" [Bafatá, 1967/68]...

Fotos: © Amaro Oliveira António 2011). Todos os direitos reservados.


1. As fotos são do nosso leitor (e camarada de armas) Amaro Oliveira António (AOA), que pertenceu ao Comando de Agrupamento nº 1980 (1967/68), e onde trabalhou com o Alf Mil Ribeiro e com o Fur Mil Carlos Miguel...

São de fraca qualidade, mas merecem uma legenda... Foram enviadas no princípio do ano corrente... Com estas escassas legendas (*)... Aguardavam uma oportunidade para saírem no nosso blogue... Não temos mais informações sobre o nosso camarada Amaro Oliveira Amaro (AOA), que não pertence, formalmente, à nossa Tabanca Grande...(Fica aqui o convite para, doravante, se juntar ao nosso blogue, sentando-se debaixo do nosso secular, frondoso, fraterno, mágico, encantatório poilão, que abriga os nossos irãs, tanto os bons como os maus...).

Sobre o Carlos Miguel (actor de teatro popularmente conhecido como Fininho, que se retirou no final dos anos 90 para Salvaterra de Magos, depois de ter sido diagnosticado um cancro nas cordas vocais, obrigando-o a  abandonar a sua carreira no teatro de revista e na televisão), já aqui fizemos pelo menos duas referências (**)... Numa delas, o nosso camarada José Corceiro lançava, há um ano atrás,  um apelo para se recuperar fotografias do Carlos Miguel, do seu tempo de Guiné (1968/69), estando em curso a elaboração de um livro biográfico sobre o actor (que se popularizou sobretudo  com o Programa de televisão "Um dois três", da RTP1,  que teve várias séries, entre 1984 e 1998,  com o apresentador Carlos Cruz mas também com o António Sala; entre os actores cómicos que por lá passaram, conta-se o Carlos Miguel, o Raul Solnado e a Marina Mota):

(...) Tinha dois álbuns com fotografias da sua passagem pela Guerra, que guardava carinhosamente, mas já há uns anos que lhe desapareceram durante uma mudança de residência, pelo que neste momento não tem uma única foto desse período da sua vida.

Na Guiné esteve em Canjadude nos Gatos Pretos [, CCA 5,], mas também esteve algum tempo em Nova Lamego, em Bafatá, em Bissau e mais outros locais que visitou, que não pode precisar (...)
.

O nosso camarada Fernando Gouveia, ex-Alf Mil do Comando de Agrupamento nº 2957 (Bafatá, 1968/70) ainda o conheceu, em Bafatá. Tal como o ex-Fur Mil do BENG 447, José Manuel Fresta de Carvalho (**).

Sobre o falecido Carlos Alberto Maravilhas Soares, também não temos qualquer informação adicional.

Sobre o COM AGR 1980, 1967/68, temos a seguinte nota do nosso colaborador permanente José Martins:

(i) Mobilizado no Regimento de Artilharia Ligeira nº 1, em Lisboa;

(ii) Desembarcou em Bissau em 6 de Fevereiro de 1967;

(iii) Deslocou-se para Bafatá, aí  assumindo o comando e coordenação dos batalhões instalados nos sectores de Bafatá, Nova Lamego e Bambadinca em 7 de Fevereiro de 1967;

(iv) Foi rendido em 18 de Novembro de 1968 pelo Comando de Agrupamento nº 2957, recolhendo a Bissau e regressando à metrópole em 19 de Novembro de 1968.

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Notas do editor:

(*) Vd. poste anterior desta série > 17 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8565: Fotos à procura de... uma legenda (1): Álbum de Torcato Mendonça (CART 2339, Mansambo, 1968/69)

(**) Vd. postes de:

2 de Junho de 2010 >Guiné 63/74 - P6521: Em busca de... (135): Carlos Miguel (Fininho), ex-Fur Mil da CCAÇ 5, procura fotos suas do tempo de Guiné: Canjadude, Nova Lamego, Bafatá, Bissau (José Corceiro)

29 de Março de 2011 Guiné 63/74 - P8012: O Nosso Livro de Visitas (110): João Manuel Fresta de Carvalho, ex-Fur Mil Engenharia, que esteve 4 meses em Bambadinca e a maior parte do tempo no Saltinho, cujo aquartelamento ajudou a construir, ao tempo da CCAÇ 2406 (1968/70)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7737: A Guerra Colonial e a extinção da tradições portuguesas: o dia de 'ir às sortes' na minha terra, Sabugal (José Corceiro)

1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 5 de Fevereiro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, E. Magalhães.
Atendendo ao facto de terem passado 50 anos desde o início da Guerra Colonial, recordei-me hoje, duma consequência nefasta, que esse trágico acontecimento que foi a guerra, teve no acelerar a morte duma tradição na minha terra, que com tanta intensidade era vivida pelo povo da minha aldeia, Vale de Espinho - Sabugal.

Deixo ao vosso critério a publicação.

Um abraço
José Corceiro


A GUERRA COLONIAL E A EXTINÇÃO DE TRADIÇÕES PORTUGUESAS

O assalto à Prisão de Luanda ocorreu no dia 4 de Fevereiro de 1961, data que marcou o início da Guerra Colonial, ou do Ultramar, como se queira apelidar, sendo que para mim é a Guerra onde eu andei.

A Guerra Colonial tirou a vida a milhares e milhares de pessoas, deixando outras tantas estropiadas até ao fim dos seus dias. O fenómeno da Guerra foi também um factor influente que contribuiu para desvanecer algumas tradições e costumes, que estavam enraizados na cultura do povo português.

Tanto quanto me lembro desde a minha meninice, que na minha aldeia, Vale de Espinho – Sabugal, o dia da inspecção militar ou sortes era um dia festivo para toda a povoação, mas com proeminente destaque para os mancebos naturais da aldeia, que completassem nesse ano o 20.º aniversário, pois a festa era deles. Nos anos 1950 e princípios de 1960, na minha aldeia, o grupo de rapazes que iam anualmente a dar o nome para a tropa ultrapassavam sempre as duas dezenas, ou bem mais, e era raríssimo que quando chegasse o dia das sortes algum deles faltasse. O dia da inspecção revestia-se dum certo ritual, tradicional típico, que continha valor e particularidades para um estudo etnográfico.

Os preparativos para o esperado dia iniciavam-se com algum tempo de antecedência, pois era determinante que no dia da festa tudo corresse de feição. Sempre foram perceptíveis ao longo dos anos, explícitos laivos de ciúme, meio encapotado é certo, mas que levava alguns dos ex-inspeccionados a vangloriar-se ao dizer que a festa deles tinha sido a melhor. Ora, este espírito de geração competitiva, impulsionava a rapaziada a um apego de brio viril, que os empenhava em melhorar a sua festa em comparação com as dos anos anteriores.

Para muitos dos jovens, o dia da inspecção seria também a primeira vez que iriam estrear um fato novo, composto por calças, casaco e colete (terno), pois até ao presente não tinham tido a possibilidades de comprar o tecido e mandá-lo confeccionar no alfaiate da terra, visto ser escasso o suporte económico da família. Era também provável que a partir dessa data, o jovem pudesse começar a amealhar um pezinho de meia, fruto de algum trabalho que executasse com direito a remuneração, jornal ou a passar contrabando, pois até esta altura tudo o que tinha ganho reverteu a favor do agregado familiar.

Quando o esperado dia chegava, nada podia falhar.
O fato estava à espera de ser vestido…

Os foguetes já tinham sido comprados e entregues ao mestre-de-cerimónias, que os utilizava conforme a mensagem que queria anunciar, lançando-os para estoirar no ar. A primeira mensagem é logo cedinho, às 05h00, a lembrar que é preciso deixar a cama e levantar, para aqueles que nela se deitaram, nessa noite, porque alguns fizeram directa. Pois têm que se apressar, ainda há um percurso longo de 16 quilómetros que é preciso trilhar, sempre a cavalgar, até chegar ao Sabugal, concelho da freguesia, onde tem lugar a inspecção.

Foto 1 - Briosos mancebos inspeccionados em 1968, com saudosismo do passado. Foto tirada no dia da inspecção, no Sabugal, junto ao antigo edifício camarário onde teve lugar a inspecção. É também visível o edifício da antiga prisão.

O cavalo, adereçado com os seus melhores arreios estava pronto e à espera. Ricamente aparelhado. A sela, a cinta, o cabresto, as rédeas e o freio foram diligentemente limpos e engraxados, as fivelas e os estribos foram polidos até ficarem a brilhar, sem esquecer as patas do equídeo que foram aparadas, limadas e convenientemente ferradas, pois há mais de 30 quilómetros para calcorrear, ida e regresso, com o mancebo sempre montado e a espicaçar, e quiçá poderá surgir algum amigo mais íntimo que o queira apadrinhar e arrisque a boleia no lugar da garupa, e o ritmo tem que ser constantemente a trotear.

O acordeonista foi atempadamente contratado, personagem aglutinadora e imprescindível, que nunca pode faltar esperando-se sempre dele alguma novidade musical, para excitar o bailarico e a festa abrilhantar.

Os vitelos ou cabritos, cuja quantidade depende do número de mancebos e seus convidados, foram antecipadamente encomendados ao açougueiro, e já estão prontos e preparados com algum tempero à espera para se dar início ao apetecido assado, realizado sempre em local aprazível, junto à margem do rio Côa e por tradição no sítio do Freixial.

Foto 2 - Largo das Eiras, no centro da aldeia de Vale de Espinho. Nas redondezas não havia outra povoação que tivesse um largo tão grande, embora já tenha sido roubado pelas construções da estrada, escola, lar de idosos, junta de freguesia etc.

Por volta do meio-dia o povo aguardava impacientemente, no Largo das Eiras, a chegada do mensageiro, que se antecipava ao regresso dos mancebos. O arauto açoitando o seu cavalo incutia-lhe celeridade, para se adiantar e mais rápido chegar para a notícia poder dar, metia-se por atalhos e veredas para o caminho encurtar, e lá chegava ele ofegante à freguesia onde revelava, com voz de pregão, os nomes dos mancebos que ficaram livres e os que foram apurados para o serviço militar. Quando se ouvia o nome dum mancebo que ficou apurado era sempre um momento de regozijo, algazarra geral, com aplausos, acompanhados de vivas e parabenização à família, contrastando com o comportamento da multidão, que ao ouvir o nome do mancebo que ficou livre, reagia com tristeza e constrangimento, sobretudo os seus parentes.

Mais uma largada de foguetes, anunciavam que a comitiva dos heróis estava prestes a chegar. A multidão eufórica, que não tinha arredado pé do Largo das Eiras, estava curiosa e queria ver ao vivo a chegada dos briosos mancebos. Uns ostentavam com orgulho e altivez na lapela do casaco a insígnia, fita verde, que os declarava aptos para o serviço militar. Esta distinção podia ser um trampolim para uma vida melhor, com mais possibilidades para um emprego, quiçá Polícia, Guarda-Fiscal ou Republicana, ou Exército, ou alguma Repartição Estatal. A fita vermelha era colocada nos inaptos, e notava-se neles um ar de acanhamento, quase vergonha, por suportar na lapela o estigma que os remetia para a exclusão de prestar serviço militar, era como que o apontarem-lhes que eram débeis, ou tinham uma deficiência física, e isso não era tranquilizante para o seu ego.

Depois de dadas as boas-vindas, procedia-se a mais uma largada de foguetes, a convidar toda a povoação para que houvesse união e acompanhassem festivamente os mancebos, que iriam desfilar montados nos seus cavalos, ao som da concertina, pelas ruas da procissão. Findo esse percurso, duma maneira geral, toda a juventude se dirigia para o local onde os esperava o assado, já devidamente confeccionado.

Foto 3 - Tirada em 1968, no Freixial, junto ao rio Côa, durante o assado, onde estão a meia dezena de mancebos que foram nesse dia à inspecção, juntamente com juventude convidada e onde não podia faltar o meu professor da 4.ª cCasse, Zé André, que está de pé no canto direito da foto, com camisa preta.

Manjar ansiosamente esperado, a desejada carne grelhada era um pitéu divinal. A carne é seleccionada, excelentemente grelhada com apuro na brasa, bastante condimentada com um molho assaz apimentado, comida acompanhada de batata bem apaladada acabada de tirar da terra e assada na borralheira, tudo regado convenientemente com molho, iguaria que provoca no mais prudente dos mortais anseios que o incitam a deixar-se seduzir, e a exagerar no beber a boa pinga, que inebria qualquer convidado fazendo-o esquecer as amarguras do dia-a-dia, até surgir um comensal mais inspirado, que se encoraja e ousa desafiar a qualquer um para uma salutar desgarrada… e a partir daqui tudo incita a que a folia seja inflamada!

E toda a tarde era passada em farra agitada, sempre regada de boa pinga em ambiente de animado bailarico, onde não era permitido a nenhuma moça recusar dançar com qualquer que fosse o mancebo dos inspeccionados, uma recusa dessas, era interpretada como ofensa familiar.

Com o surgir da guerra nos anos 1961/1962, a juventude da minha terra abandona a aldeia, em massa, e vai a salto para o estrangeiro. O número dos mancebos que anualmente iam a dar o nome para a tropa caiu das duas ou três dezenas que eram habituais, para menos de meia dúzia.

Foto 4 - Castelo Branco, Dezembro de 1968.

O início da Guerra Colonial praticamente acabou com a tradição festiva do dia da inspecção. Provocou uma reviravolta de 180 graus no valor do conceito de apto e inapto para o serviço militar. É surpreendente, que no espaço de dois ou três anos o conceito de opinião que se tinha da selecção de apto, que era considerado o boníssimo, se tenha invertido o valor, e o apto passou a ser o maligno, pois a partir do início da guerra o que se valoriza, no querer dos familiares e mancebos, é que fiquem inaptos para o serviço militar, a condição de inapto passou a ser o óptimo! São os dinamismos sociais da adaptação dos interesses!

Continuaram-se a comprar vitelos, cabritos e até porcos inteiros, para satisfazer a gula dos falsos profetas que só anunciavam desgraça e tinham bem estudada a arte da mentira, pois aos crédulos muito prometiam, mas nada faziam. Convenciam os inocentes que lhes livravam os filhos da guerra, e alguns caíram na ratoeira, mas cedo se convenceram que nada lhes tinha sido feito. E lá vinham a terreiro os profetas com argumentações abonatórias, utilizando desculpas esfarrapadas…

PS: - Significado do termo “Sortes” aqui utilizado, que creio estar certo, pela ideia que me ficou segundo aquilo que ouvi noutros tempos:

Antigamente, devido ao grande número de jovens que se apresentavam à inspecção, eram muitos os que ficavam aptos, e para os aptos não havia lugar para todos no serviço militar. Para solucionar o excesso dos já seleccionados, procedia-se a um sorteio aleatório entre os que tinham ficado aptos, para assim se apurar aos que cabia a sorte de cumprir o serviço militar.

Um abraço e boa saúde, para todos.
José Corceiro
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 26 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7678: Casos de azar e sorte (1): Camarada ferido pelo impacto de granada que não explodiu (José Corceiro)

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7678: Casos de azar e sorte (1): Camarada ferido pelo impacto de granada que não explodiu (José Corceiro)

1. Mensagem de José Corceiro (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 24 de Janeiro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, E. Magalhães.
Envio este texto onde relato um episódio passado na Guiné que na altura me apiedou, que publicarão caso entendam que tem algum interesse para o blogue.
Quanto à foto que eu na época tirei, onde são visíveis os ferimentos provocados na pessoa, a mim não me choca, mas pode ferir sugestibilidades mais sensíveis de alguns. Sendo assim, publicar a foto pode não ser a opção mais curial, deixo à vossa sensibilidade a decisão de fazer o que acharem mais adequado.

Um abraço
José Corceiro


Foto 1 - Corceiro, no Hospital de Bissau, à volta com as suas escritas.


CASOS DE AZAR E SORTE (1)

Camarada ferido pelo impacto de uma granada que não explodiu

Creio não estar a errar, se afirmar que já todos nós, ao longo das nossas vidas, nos confrontámos e fomos surpreendidos por acontecimentos que se nos perspectivaram estarem a tanger e ameaçar entrar na fronteira do incrível, deixando-nos a meditar com alguma perplexidade, porque à luz duma interpretação racional tivemos dificuldade em os ajuizar numa explicação lógica que nos tranquilizasse o ego, ou que serenasse a crença de outros, para os quais essas circunstâncias poderão ter a grandeza de mistério!

Eu ao longo da minha existência tenho sido bafejado por muitos e variados casos, a raiar o limite do fenomenal, algumas vezes como espectador, outras como sujeito interveniente. O meu carácter é de compleição reservada, pois não sou pessoa de manifestar exaltação exacerbada e irreflectida, perante os acontecimentos extraordinários que tenho testemunhado e vivido, durante o percurso da minha vida. Direi que é raro expandir-me em manifestações efusivas ou admiração de entusiasmo desmedido, de forma a empolgar exageradamente os acontecimentos menos explicáveis, mas com potencial espectável que ocorram e nos quais eu possa estar envolvido, pois aceito pacificamente a “lei da probabilidade” que diz:

- Tudo aquilo que é susceptível de acontecer mais cedo ou mais tarde acontece!

Posto isto, perante os casos que se me afiguram como enigmáticos, mas com o mínimo de virtualidade provável para que sucedam, mantenho uma postura de euforia contida dominada pelo racional, visto reconhecer que há por vezes coincidências resultantes de acontecimentos concomitantes que conduzem a estes “fenómenos” menos vulgares que ocorrem, e eu admito-os como casos passíveis de acontecer!

Redigi este intróito com a finalidade de enquadrar a narração de alguns episódios que vivi na Guerra da Guiné, durante o período que lá permaneci e que a seguir vou tentar descrever. São meia dúzia de casos que teimam em permanecer mais lúcidos e vivos no meu consciente e que vou partilhar convosco, dividindo o envio em partes.

Foto 2 - Corceiro, sentado de frente lado esquerdo. Refeitório do Hospital de Bissau, Não recordo os nomes dos outros camaradas.


1.º CASO - O dia nove de Dezembro de 2010, foi editado o P7409 cujo título é: - A Granada de Morteiro que Veio Jantar. O Autor é o nosso estimado camarada, Alberto Branquinho.

Nesse poste eu deixei o seguinte comentário:

- “Não tenho a certeza que seja o mesmo caso, que o Torcato refere sobre o acidente da granada de morteiro que se alojou na coxa dum ser humano sem explodir!

Eu, durante um internamento que tive no Hospital de Bissau, foi-me permitido, por pessoa conhecida, atendendo ao inédito acontecimento, tirar umas fotos que guardo da coxa dum adulto, com os ferimentos provocados por uma granada que não deflagrou. Segundo me disseram na altura, a pessoa em questão estava na sua tabanca deitada, quando foi surpreendida com a granada que se alojou na coxa.”


Foto 3 - Tirada por mim no Hospital de Bissau. Os ferimentos da foto foram causados por uma granada que não explodiu.
(Clicar para ampliar a imagem)

Porque creio que haverá desfasamento temporal entre o acontecimento que o Torcato referiu no comentário ao P7409 e isto que eu vi e que fotografei a parte da pessoa, com ferimentos provocados por uma granada disparada que ao cair atingiu a coxa dum ser humano e não rebentou, como na altura me foi dito, afigurasse-me provável que não sejam o mesmo caso, pois entendo não haver similaridade entre os dois.

Julgo que os traumatismos visíveis na foto são de etimologia perfurocontundentes, ou seja, que poderão ser as contusões provocadas pelo impacto da granada, que ao atingir a coxa rasgou os tecidos musculares e destruiu algumas partes ósseas. As lesões parecem-me ser muito extensas para a contundência causada pelo objecto em análise, ainda que a profundidade seja a espectável que provocaria o projéctil. Pois temos que levar em linha de conta, que a contusão dependerá sempre de N factores, como seja a direcção da força que provocou os danos, outros obstáculos já ultrapassados pelo engenho, a aceleração ou desaceleração da velocidade do objecto e a posição do corpo atingido, ou seja o alvo!

Disseram-me na altura e a foto confirma-o, que não tinha sido afectado nenhum órgão vital, mas é bem visível que ficou muito lesada a complexidade dos ligamentos iliofemorais, assim como o conjunto dos diversos músculos existentes na zona do ferimento, que são muitos, tais como os glúteos, os gémeos, os adutores, o periforme, o obturador etc. Ficaram dilacerados vasos e nervos da região afectada. Foram destruídos o colo e a cabeça do fémur, assim como a cápsula coxofemoral, até a crista ilíaca foi atingida.

Mas, que foi uma coincidência de azar e sorte, lá isso foi; atendendo a similitude dos efeitos provocados por esta causa, em relações a outras que aconteceram com perigosidade idêntica noutras ocasiões.

O ter-se ficado com vida por a granada não ter rebentado, foi um factor de sorte; o estar a descansar em casa e ser atingido pelo projéctil, que causou ferimentos que provavelmente desencadearão um processo que levará à amputação da perna, isto foi um factor de azar!

Não soube como evoluiu clinicamente o caso.

Junto envio foto que na época eu tirei, no Hospital de Bissau.

Foto 4 - Granada que caiu sem explodir, dentro do Aquartelamento de Canjadude, durante uma flagelação desencadeada pelo inimigo.

Foto 5 - Míssil disparado pelo inimigo que não explodiu ao cair. Espetou-se junto ao bloco do edifício, caserna, secretaria, refeitório, armazém e cozinha, de Canjadude. Se tivesse rebentado, estas estruturas iam todas pelos ares. São visíveis estragos na cobertura da cozinha, devido a outro rebentamento!

Foto 6 - Baioa, em Canjadude, junto do míssil que não explodiu ao cair.

Um abraço
José Corceiro
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(*) Vd. poste de 19 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7471: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande (2010) (9): Como vejo o Natal (José Corceiro)