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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7674: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (4): As abelhas (Rui Silva)

1. Mensagem de Rui Silva* (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 24 de Janeiro de 2011:

Caros Luís Graça, Vinhal, Briote, Magalhães Ribeiro e Humberto Reis:

Recebam um grande abraço e doses de energia para manter o Blogue no seu grande nível.

Aqui vai o meu trabalho (Abelhas – IV) na sequência do meu trabalho sobre “Doenças e outros problemas de saúde…”

Até sempre!
Rui Silva


2. Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

DOENÇAS E OUTROS PROBLEMAS DE SAÚDE (ou de integridade física) QUE A CCAÇ 816 TEVE DE ENFRENTAR DURANTE A SUA CAMPANHA NA GUINÉ PORTUGUESA (Bissorã – Olossato – Mansoa 1965/67)

(I) Paludismo (P7012)
(II) Matacanha (P7138)
(III) Formiga “baga-baga” (P7342)
(IV) Abelhas
(V) Lepra
(VI) Doença do sono

Não é minha intenção ao “falar” aqui de doenças e outros problemas de saúde que afligiam os militares da 816 na ex-Guiné Portuguesa imiscuir-me em áreas para as quais não estou habilitado (áreas de Medicina Geral, Medicina Tropical, Biologia, etc.) mas, tão só, contar aquilo, como eu, e enquanto leigo em tais matérias, vi, ajuizei e senti.

Assim:
As 4 primeiras, a Companhia sentiu-as bem na pele (ou no corpo). As 2 últimas (Lepra e Doença do sono), embora as constatássemos - houve mesmo contactos directos de elementos da Companhia com leprosos (foram leprosos transportados às costas, do mato para Olossato nas tais operações de recolha de população acoitada no mato para as povoações com protecção de tropa) –, não houve qualquer caso com o pessoal da Companhia, ou porque estas doenças estavam em fase de erradicação (?), ou porque a higiene e a profilaxia praticadas pela Companhia eram o suficiente para as obstar.


ABELHAS - IV

ABELHAS!!!... era este o grito, o grito de alerta, uma espécie de “passe palavra” em tom aflitivo. Era este o grito que fazia o pessoal da Companhia correr a sete pés e a esquecer todo o mais.
Assustava mais este grito, que o grito”Aí estão eles!” grito que acontecia no milésimo de segundo imediato a um tiro do inimigo.

O inimigo contava muitas vezes com a colaboração deste temível exército natural e assim muitas vezes fazia as emboscadas em sítio em que houvesse um enxame ali perto da passagem da tropa. Um tiro no enxame compacto, na altura da passagem da tropa, iniciava a emboscada e ao mesmo tempo o ataque desenfreado das abelhas a quem andava por ali perto.
Contava-se assim esta habilidade inimiga, pois não me lembro da minha Companhia ter sido vítima deste expediente inimigo. Não terá calhado, certamente.

Mas há histórias para contar sobre abelhas na 816…

Certa vez, vinha a Companhia de regresso ao aquartelamento de Olossato e, como sempre, extenuada, e depois de uma operação muito perto da base de Morés.
A certa altura retomamos um carreiro, já não muito longe do Olossato. O pessoal, em fila indiana, vinha com a atenção redobrada, pois vinha a ver onde o da frente punha os pés para pôr os dele também, pois assim julgava livrar-se ou defender-se melhor das minas anti-pessoais, já que naquela zona havia fama de aparecerem com frequência. Esta atenção obrigava a Companhia a deslocar-se com alguma lentidão. Chegou-se a fazer o levantamento de uma mina.

De repente, e bem perto de mim, atrás, alguém grita: ABELHAS!!!...

Foi como o tiro de pistola numa prova de 100 metros nas Olimpíadas.
Toda a gente enceta uma correria (que me fez lembrar o filme “A Revolta dos Cossacos” onde estes em frente alargada corriam para o inimigo) em direcção ao aquartelamento que já estava perto. Esqueceram-se as minas, os cuidados com emboscadas e… foi, mas, um “ver se te avias”. Nunca se chegou tão rápido ao quartel… e, nem minas nem emboscadas.

Um nativo, ao arrancar num arbusto um ramo para fazer uma rodilha para pôr as granadas de morteiro ou bazooka à cabeça, não reparou que estava ali perto um enxame, daí…

Lembro-me que um pouco depois, já no quartel, vi o “Flector” do morteiro, irreconhecível. As pálpebras de tal modo inchadas e os lábios mais grossos do que os de um nativo, aí bem dotado, a cara toda inchada, se não me dissessem que era o Flector eu julgaria que estava ali um extra-terrestre. Pelo menos um oriental bem inchado.
Mas não passou do susto… e das consequências para o “Flector”. As abelhas, parecia, que faziam pontaria a um e não mais o largavam e julga-se que o ataque tinha um efeito simpatia porque se no caminho da revolta, houvessem mais enxames, estes solidarizavam-se com as que estavam em guerra aumentando assim o efectivo da nuvem assassina.

Houve mais alguns casos com as abelhas (casos pontuais), mas tudo passava algumas horas depois e com tratamento na enfermaria.
Contaram-me, mais tarde, de um caso passado noutra Unidade, que um soldado foi vítima de tal ataque das abelhas, que praticamente o cobriram, e que ele num acto desesperado matou-se com a sua própria G3. Poderá alguém contar isto com mais pormenor?

O Martins (Fur Mil da minha Companhia), também tem uma história para contar, quando foi mordido por grande quantidade de abelhas, quando foi pôr abaixo, julgo com TNT ou qualquer outro explosivo, uma árvore de grande porte, junto ao aquartelamento de Olossato, do lado de Bissorã e perto da Tabanca do Olossato e que vinha servindo de abrigo ao inimigo sempre que este nos vinha “visitar”. O Capitão resolveu nomear um grupo para pôr abaixo aquela árvore pondo assim fim aquele escudo inimigo. Deu-se o estoiro (ouvimos na messe) e passados alguns minutos aparece-me o Martins todo sarapintado, tipo rubéola. “Foram as abelhas”, diz ele em tom desapontado. Estava lá um enxame. Dá-se o rebentamento e logo de seguida, um enxame, que até estava sossegado na árvore, sai ao ataque, e… escolhe o desafortunado Martins.

“Eh pá deves estar cheio de dores”, perguntamos logo. “Não, não me dói”.

As ferroadas eram tantas que acabaram por criar um efeito anestesiante. Terá sido assim? Os leigos diziam que sim.


Um cacho de abelhas.  Foto, reproduzida da Net que pode muito bem ter sido tirada na Guiné. Nem era preciso tocar no cacho, bastava barulho inusitado.


AS ABELHAS


Abelhas (Apis mellifera) são insectos himenópteros (com 2 pares de asas membranosas) que polinizam as plantas, produzem mel … e também picadas mortais.
Há cerca de 20.000 espécies de abelhas no mundo. O seu tamanho varia de 2 mm. a 4 centímetros. Algumas são pretas ou cinzentas, mas há as de cor amarelo brilhante, vermelhas, verdes ou azuis metálicas.


Apis mellifera scutellata (abelha africana ou “assassina”) Esta era a espécie de Apis mellifera que nos consumia na Guiné o corpo e também a alma.

As abelhas africanas (Apis mellifera scutellata) ou “abelhas assassinas”, são originárias do Leste da África e são mais produtivas e muito mais agressivas.
São menores e constroem alvéolos de operárias menores que as abelhas europeias. Sendo assim, suas operárias possuem um ciclo de desenvolvimento precoce (18,5 a 19 dias) em relação às europeias (21 dias), o que lhe confere vantagem na produção e na tolerância aos ácaros.

Possuem, visão mais aguçada, resposta mais rápida e eficaz ao fenómeno de alarme. Os ataques são, geralmente, em massa, persistentes e agressivos, podendo estimular a agressividade de operárias de colmeias vizinhas.

Ao contrário das europeias que armazenam muito alimento, elas convertem o alimento rapidamente em cria, aumentando a população e liberando vários enxames reprodutivos.
Migram facilmente se a competição for alta ou se as condições ambientais não forem favoráveis.
Essas características têm uma variabilidade genética muito grande e são influenciadas por factores ambientais internos e externos.

O ferrão da abelha, que se situa na extremidade posterior do abdómen da abelha fêmea, é um sistema complexo compreendendo uma parte glandular, na qual se produz o veneno, e uma estrutura quitinosa e muscular, que serve par ejecção do veneno e profusão e introdução do ferrão. Apresenta rebarbas na sua superfície que dificultam sua saída, de tal sorte que, após a ferroada, todo o sistema é destacado, permanecendo na vítima. E a abelha morre logo a seguir. Geralmente, a profundidade de inserção é de 2 a 3 milímetros. No local movimentos reflexos de sua estrutura muscular fazem com que o ferrão se introduza cada vez mais.

Na rainha, as farpas do ferrão são menos desenvolvidas que nas operárias e a musculatura ligada ao ferrão é bem forte para que a rainha não o perca após utilizá-lo.


MORFOLOGIA e BIOLOGIA das ABELHAS (Apis mellifera)
(Extraido com a devida vénia do site “sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br”)

Aspectos morfológicos das Abelhas (Apis melllifera)

As abelhas, como os demais insectos, apresentam um esqueleto externo chamado exoesqueleto.
Constituído de quitina, o exoesqueleto fornece proteção para os orgãos internos e sustentação para os músculos, além de proteger o inseto contra a perda de água. O corpo é dividido em três partes: cabeça, tórax e abdómen (fig. 1). A seguir, serão descritas resumidamente cada uma dessas partes, destacando-se aquelas que apresentam maior importância para o desempenho das diversas atividades das abelhas.

Fig. 1 - Aspectos da morfologia externa da Apis mellifera


Cabeça

Na cabeça, estão localizados os olhos -simples e compostos- as antenas, o aparelho bucal (fig. 2) e, internamente, as glândulas.
Os olhos compostos são dois grandes olhos localizados na parte lateral da cabeça. São formados por estruturas menores denominadas omatídeos, cujo numero varia de acordo com a casta, sendo bem mais numerosos nos zangões do que em operárias e rainhas. Possuem função de percepção de luz, cores e movimentos. As abelhas não conseguem perceber a cor vermelha, mas podem perceber ultra-violeta, azul, verde, amarelo e laranja.

Fig. 2- Aspectos da morfologia externa da cabeça da operária de Apis mellifera

Os olhos simples ou ocelos são estruturas menores, em número de três localizadas na região frontal da cabeça formando um triângulo. Não formam imagens. Têm como função detetar a intensidade luminosa.
As antenas, em número de duas, são localizadas na parte frontal mediana da cabeça. Nas antenas encontram-se estruturas para o olfato, tato e audição. O olfacto é realizado por meio das cavidades olfativas, que existem em número bastante superior nos zangões, quando comparados com as operárias e rainhas. Isso se deve à necessidade que os zangões têm de perceber o odor da rainha durante o voo nupcial.

A presença de pêlos sensoriais na cabeça serve para a perceção das correntes de ar e protegem contra a poeira e água.

O aparelho bucal é composto por duas mandíbulas e a língua ou glossa. As mandíbulas são estruturas fortes, utilizadas para cortar e manipular cera, própolis e pólen. Servem também para alimentar as larvas, limpar os favos, retirar abelhas mortas do interior da colmeia e na defesa. A língua é uma peça bastante flexível coberta de pêlos, utilizada na coleta e transferência de alimento, na desidratação do néctar e na evaporação da água quando se torna necessário controlar a temperatura da colmeia.

No interior da cabeça encontram-se as glândulas hipofaringeanas, que têm por função a produção da geleia real, as glândulas salivares que podem estar envolvidas no processamento do alimento e as glândulas mandibulares que estão relacionadas à produção de geleia real e feromônio de alarme (fig. 3).

Fig. 3 – Aspecto da anatomia internada operária Apis mellifera


Tórax

No tórax destacam-se os órgãos locomotores – pernas e asas (fig. 1)- e a presença de grande quantidade de pêlos, que possuem importante função na fixação dos grãos de pólen quando as abelhas entram em contacto com as flores.

As abelhas, como os demais insetos, apresentam 3 pares de pernas As pernas posteriores das operárias são adaptadas para o transporte de pólen e resinas. Para isso, possuem cavidades chamadas curvículas, nas quais são depositadas as cargas de pólen ou resinas para serem transportadas até a colmeia. Além da função de locomoção, as pernas auxiliam também na manipulação da cera e própolis, na limpeza das antenas, das asas e do corpo e no agrupamento das abelhas quando formam “cachos”.

As abelhas possuem dois pares de asas de estrutura membranosa que possibilitam o voo a uma velocidade média de 24 Km/h

No tórax, também são encontrados espiráculos, que são órgãos de respiração, o esófago, que é parte do sistema digestivo e glândulas salivares envolvidas no processamento do alimento.


Abdómen

O abdómen é formado por segmentos unidos por membranas bastante flexíveis que facilitam o movimento do mesmo. Nesta parte do corpo, encontram-se órgãos do aparelho digestivo, circulatório, reprodutor, excretor, órgãos de defesa e glândulas produtoras de cera (fig. 3).

No aparelho digestivo, destaca-se o papo ou vesícula nectarífera, que é o órgão responsável pelo transporte de água e néctar e auxilia na formação do mel. O papo possui grande capacidade de expansão e ocupa quase toda a cavidade abdominal quando está cheio. O seu conteúdo pode ser regurgitado pela contração da musculatura.

Existem quatro glândulas produtoras de cera (ceríferas), localizadas na parte ventral do abdómen das abelhas operárias. A cera segregada pelas glândulas se solidifica em contacto com o ar, formando escamas ou placas que são retiradas e manipuladas para a construção dos favos com auxílio das pernas e das mandíbulas.

No final do abdómen, encontra-se o órgão de defesa das abelhas -o ferrão- presentes apenas nas operárias e rainhas. O ferrão é constituído por um estilete usado na perfuração e duas lancetas que possuem farpas que prendem o ferrão na superfície ferroada, dificultando sua retirada. O ferrão é ligado a uma pequena bolsa onde o veneno fica armazenado. Essas estruturas são movidas por músculos que auxiliam a introdução do ferrão e injeção do veneno. As contrações musculares da bolsa de veneno permitem que o veneno continue sendo injectado mesmo depois da saída da abelha. Desse modo, quanto mais depressa o ferrão for removido, menor será a quantidade de veneno injectada. Recomenda-se que o ferrão seja removido pela base, utilizando-se uma lâmina ou a própria unha, evitando-se pressioná-lo com os dedos para não injetar uma maior quantidade de veneno. Como, na maioria das vezes, o ferrão fica preso na superfície picada, quando a abelha tenta voar ou sair do local após a ferroada, ocorre uma rotura de seu abdómen e consequente morte. Na rainha, as farpas do ferrão são menos desenvolvidas que nas operárias e a musculatura ligada ao ferrão é bem forte para que a rainha não o perca após utilizá-lo.

Segue: Lepra - V
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7342: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (3): Formiga baga-baga (Rui Silva)

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7342: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (3): Formiga baga-baga (Rui Silva)

1. Mensagem de Rui Silva* (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 25 de Novembro de 2010:

Caros Luís, Vinhal, Briote e M. Ribeiro:


Recebam um grande abraço, também de amizade e consideração.


Em anexo, e dando continuidade aos postes n.ºs 7012 e 7138, aqui vai o trabalho sobre o 3.º item (a formiga “baga-baga”).


Claro que fica ao vosso critério (sempre por mim bem aceite) o publicar ou não este trabalho.


Rui Silva


2. Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

DOENÇAS E OUTROS PROBLEMAS DE SAÚDE (ou de integridade física) QUE A CCAÇ 816 TEVE DE ENFRENTAR DURANTE A SUA CAMPANHA NA GUINÉ PORTUGUESA (Bissorã – Olossato – Mansoa 1965/67)

(I) Paludismo (P7012)
(II) Matacanha (P7138)
(III) Formiga “baga-baga”
(IV) Abelhas
(V) Lepra
(VI) Doença do sono


Não é minha intenção ao “falar” aqui de doenças e outros problemas de saúde que afligiam os militares da 816 na ex-Guiné Portuguesa, imiscuir-me em áreas para as quais não estou habilitado (áreas de Medicina Geral, Medicina Tropical, Biologia, etc.) mas, tão só, contar aquilo, como eu, e enquanto leigo em tais matérias, vi, ajuizei e senti.

Assim:

As quatro primeiras, a Companhia sentiu-as bem na pele (ou no corpo). As duas últimas (Lepra e Doença do sono), embora as constatássemos – houve mesmo contactos directos de elementos da Companhia com leprosos (foram leprosos transportados às costas, do mato para Olossato nas tais operações de recolha de população acoitada no mato para as povoações com protecção de tropa) –, não houve qualquer caso com o pessoal da Companhia, ou porque estas doenças estavam em fase de erradicação (?), ou porque a higiene e a profilaxia praticadas pela Companhia eram o suficiente para as obstar.


FORMIGA BAGA-BAGA - III

Julgo que a descrição exacta é:

BAGA-BAGA: - Montículo de terra endurecida que abriga uma comunidade de térmitas (Cupim). Pode atingir até cerca de 8 metros de altura.

TÉRMITAS (Cupim): espécie de formiga esbranquiçada e de contornos e cabeça avermelhados que vive numa comunidade, aos milhares, uma comunidade organizada com Rei, Rainha, operárias e soldados, e que constrói o baga-baga com a secreção de saliva misturada principalmente com pó de terra fazendo daquela obra de engenharia (arejamento, climatização e arrumação) o seu habitáculo.

Isto porque havia quem dissesse que a formiga baga-baga é que deu o nome ao montículo e outros que diziam que o baga-baga (montículo daquela formiga) é que deu nome à formiga.

Aconteceu então, numa operação de golpe-de-mão à casa-de-mato inimiga de Biambe, o meu primeiro encontro com estas “más companhias” e quando já tinha algumas semanas de Guiné e de mato.
Dá-se uma emboscada aquando do regresso, o que já se contava e como era habitual, e então valha-nos, mais uma vez, um baga-baga.

“Entretido” aos tiros, só depois me apercebi das alfinetadas que estava a levar nas mãos e braços, e já pelas pernas acima.”Mas o que é isto?” Qual é a minha surpresa, vejo umas formigas avermelhadas a ferrarem-me por todo o lado.

Comecei a sacudi-las sem por a cabeça fora do baga-baga, isto é fora de uma eventual boa pontaria inimiga. À sacudidela elas não saíam e então, verifiquei, para desespero meu, que elas estavam encastradas na minha carne. Com o empenho que elas actuavam parecia que até faziam o pino. Só puxando-as é que elas saíam, sem que no entanto a cabeça deixasse de ficar agarrada através de uns tentáculos enterrados. Lembrei-me das abelhas - nas abelhas o abdómen fica ligado ao ferrão - nestas ficam, não um ferrão, mas umas pinças (ou cornos) com a cabeça agarrada.

Os baga-bagas eram os nossos abrigos predilectos. Ainda bem que existiam. Parecia que tinham sido feitos para aquele tipo de guerra – a guerra de guerrilha. Altos, espessos quanto baste, duros como cimento, e a espaços mais ou menos regulares. Em qualquer operação no mato, principalmente em zona laranjo/vermelha, era constante um olhar prévio em redor para ver onde havia um baga-baga que nos acudisse.

Havia zonas em que existiam mais, julgo que em terrenos mais secos. Nas bolanhas não havia. Certamente que a água das chuvas e das marés que as inundavam, não propiciavam tais obras de engenharia. Ali para os lados de Biambi, Maqué, Iracunda, Morés, Cansambo, etc. aqueles montículos eram mesmo aos montes.

Aquela dor aguda e penetrante em cada ferroada passava no entanto alguns segundos depois. Perguntei-me porquê elas aparecerem naquele baga-baga e não em muitos outros onde me tinha protegido em situações embaraçosas como aquela. Disseram-me, depois, que aquelas formigas constroem o baga-baga mas que depois o abandonam, julga-se quando já não têm condições de habitabilidade, ou acaba aquela geração, ou ainda por predadores e parasitas mais fortes. Seja como for, verifiquei que grande parte dos baga-bagas não tinham aquelas formigas, afinal as legítimas proprietárias, mas sim eram habitados agora por toda a espécie de insectos: grandes, pequenos, com asas, sem asas, aranhas, moscas, moscões, etc., etc. Parasitagem,  afinal.

Apesar das dezenas de ferroadas que se levava, e as marcas eram bem visíveis, o que era certo, pelo que me apercebesse, não havia doença ou alergia subsequente. Afinal aquele Cupim que não gostava que usássemos a sua casa, ainda que para defesa do toutiço, teria uma história bem curiosa do que é uma comunidade, ainda que a nível de pequenos insectos, em que há uma entreajuda impressionante, que constrói com uma preciosa engenharia de habitabilidade e sustentabilidade um território, em que tem as suas operárias, os seus soldados defensores de todo o reino, um rei e uma rainha, esta a fecundar a um ritmo impressionante (cerca de 1000 ovos por dia) aumentando continuamente a prole, qual fábrica de trabalho em série. Afinal aquele torrão de terra, e que jeito dava muitas vezes, tinha muito que contar sobre a mãe natureza. Escondia uma comunidade laboriosa unida e homogénea em que cada um tinha uma missão religiosa a cumprir. Afinal uma lição para muitos…

Havia também por lá umas formigas pretas,  de grande cabeça e com um comprimento de 1 centímetro ou mais, não faltando quem se queixasse delas; embora também as visse por perto não me lembro de ser mordido por elas, já dos Cupins…

Ao clicar no ícone seguinte, pode-se ver um pequeno filme do Youtube  que mostra umas formigas pretas a dominarem os Cupins. No entanto não me parece que sejam as formigas pretas de que a malta se queixava.

Ainda através do ícone se pode ver um outro filme (Cidade das formigas) onde se pode ver que,  ao despejar cimento no estado de líquido pelas aberturas do formigueiro, aquele percorre todo o labirinto e uma vez solidificado mostra todo o habitáculo das formigas. De algum modo, embora ressalvando as proporções, o cupinzeiro (baga-baga) que víamos na Guiné, tem uma arquitectura semelhante.


Numa certa altura do ano, já no Olossato e julgo que tinha a ver com o tempo das chuvas, reparamos a páginas tantas, e já de noite, que as lâmpadas da iluminação à volta do quartel, alimentadas pelo gerador eléctrico, estavam rodeadas de milhares de insectos voadores. Logo também invadiram a nossa messe rodeando as lâmpadas ali acesas. Uma coisa nunca vista. Logo apagamos as luzes e os insectos voadores desapareceram, para num ápice voltarem a rodear as lâmpadas logo estas reacendidas, em voos frenéticos e repetidos em direção à origem da luz.

Chegamos a apagar a iluminação e a incendiar papeis julgando que as formigas se queimavam, desaparecendo assim, mas, qual o nosso espanto, as formigas envolveram as chamas. Aproximavam-se da chama para logo se afastarem ligeiramente (devido ao grande calor, suponho) para logo fazerem nova investida. O calor só era problema quando elas se queimavam (?). Uma coisa impressionante. Mas eles insistiam, insistiam sempre, ao encontro da luz.

Ao ler a história dos Cupins e sabendo que estes numa fase da sua metamorfose possuem asas (ver na figura abaixo, Como funcionam os Cupins-Ciclo de vida) em que o Cupim passa por uma fase da sua vida em que tem asas e a que se dá o nome de Alado) admito que esses vastos enxames em volta de tudo que fosse luz seriam os Cupins na fase de alados. De uma formiga tratava-se certamente. Mas, de tipos de formigas e outros insectos, cobras e passarada na Guiné haviam aos montes.





Fonte: www.mundoestranho.abril.com.br

- Montanha viva

- Ninho é cheio de túneis, tem andares embaixo da terra e pode durar oitenta anos.

CONSTRUÇÃO FIRME
O tamanho do cupinzeiro depende da população da colónia, mas, em média, atinge 60cm de altura. Ele é feito de terra, areia, saliva e excrementos dos próprios cupins. A construção é tão sólida na parte externa que alguns cupinzeiros se mantêm por até 80 anos!


LABIRINTO INTERNO
Por fora, um cupinzeiro do tipo montículo parece um monte de terra ressecada, sem vida. Dentro, porém, ele tem vários túneis e câmaras interligados por onde circulam milhões de cupins. As câmaras têm diversos usos, de depósito de alimento a berçário para ovos.


EM CAMADAS
O cupinzeiro é erguido por compartimentos e ganha “andar por andar”. O ninho cresce tanto para cima como para baixo da terra – cerca de 25% do tamanho total do cupinzeiro pode ser subterrâneo -. Os andares mais novos são mais húmidos e não tão sólidos.


CAMAROTE VIP
Entre as milhares de câmaras, uma se destaca: a câmara real. Nela vivem a rainha e o rei da colónia, responsáveis pela fundação do ninho e pela multiplicação dos cupins. O casal real vive, em média, de 15 a 20 anos e pode ser substituído por outros pares secundários.


ENTRADA VIGIADA
O acesso ao ninho é feito por túneis subterrãneos que desembocam no solo. É por eles que os cupins operários saem para colectar comida. Nessas missões, são protegidos de inimigos, como formigas e vêspas, pelos cupins soldados que fazem uma “escolta”.


Um estudo da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, indica que os verdadeiros reis da savana africana não são os leões, mas sim os cupins. Segundo o pesquisador Robert Pringle, a rede de colónias criadas pelas colónias do insecto influencia mais a população de animais que os grandes predadores ou os gigantes da região, como os elefantes e as girafas. As informações são da Agência Fapesp.

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Segundo a pesquisa, a acção do cupim contribui enormemente para a produtividade do solo, que acaba por estimular a produção vegetal e, por consequência, animal. Os cientistas afirmam que a distribuição dos cupinzeiros por uma área maior maximiza a produtividade de todo o ecossistema.

“Não são os predadores carismáticos – como leões e leopardos – que exercem os maiores controles em populações. Em muitos aspectos, são os pequenos personagens que controlam o cenário. No caso da savana, aparentemente os cupins têm uma tremenda influência e são fundamentais para o funcionamento do ecossistema”, diz Robert Pringle.

Os pesquisadores estudaram cupinzeiros na região do Quénia Central. Eles observaram que essas estruturas tinham cerca de 10m de diâmetro, com distâncias entre 60 e 100m entre eles. Cada um abriga milhões de insectos e muitas vezes são centenários. Os cientistas se surpreenderam ao observar um grande número de lagartos próximos aos cupinzeiros, o que levou à quantificação da produtividade ecológica da área. Eles chegaram à conclusão que cada comunidade de insectos dava suporte a densas agregações de flora e de fauna. As plantas cresciam mais rapidamente quando próximas a essas estruturas e as populações de animais, assim como a taxa de reprodução, eram menores quando ficavam longe dos cupinzeiros.

Imagens feitas por satélite confirmaram as observações. Segundo os pesquisadores, essas imagens mostravam que cada cupinzeiro ficava no meio de uma “explosão de produtividade floral”. Além disso, essas “explosões” parecem divididas organizadamente, com cada uma como se fosse uma casa em um tabuleiro de xadrez.


Os cientistas pretendem agora estudar qual é exactamente a contribuição dos cupins a essa produtividade. Eles acreditam que os insectos – que muitas vezes são vistos como pragas na agricultura – distribuem nutrientes, como fósforo e nitrogênio, que beneficiam a fertilidade do solo.

Segue: Abelhas - IV
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 17 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7138: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (2): Matacanha (Rui Silva)