terça-feira, 9 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4485: Memória dos lugares (29): Beli e Madina do Boé, CCAÇ 1589, 1966/68 (Armandino Alves)


Caro amigo Luís Graça,

Na apresentação do Poste 4468, dava como anos de intervenção da minha Companhia na Guiné, 1968/70, quando na verdade é 1966/68.

Não me admiro do lapso, pois, pelo que tenho lido, parece que todos os camaradas que estiveram lá nestes anos, 1966/68, já morreram. Eu já estive quase, mas cá me vou aguentando.

Quanto ao tempo que passei na Guiné não é muito o que tenho para contar. Logo a seguir ao desembarque, em 5 de Outubro de 1966 e depois de me apresentar na minha Companhia estacionada em Stª Luzia (600), fomos fazer uma incursão para os lados de Nhacra.

Depois de muito andar e nem sequer o IN cheirar, quando chegámos ao local onde as viaturas nos deviam ir recolher, deparámos com um Unimog que tinha caído do pontão de troncos ao rio que, felizmente, nessa altura do ano, só levava água que nos dava pelo peito.

Ora toda a gente foi para dentro do rio incluindo o Cmdt da Companhia e, à força de braços, lá conseguimos recolocar o “bicho” na estrada.

Depois seguimos para o aquartelamento de Nhacra, que estava sobre o comando do Capitão Carlos Fabião. Era um dos oficiais de que se falava nessa altura pois, quando era atacado pelo IN, ia às tabancas que circundavam o quartel e, se não lhe dissessem de onde tinha vindo o IN, ele, ou os seus oficiais, não tinham problemas em disparar sobre o pessoal, para eles falarem.
Se era para o ar ou para as pessoas, é que eu não sei.

Ali descansamos uns dias tendo voltado a Bissau.

Passados mais uns dias fomos destacados para fazer segurança a uma coluna que ia partir do Batalhão de Engenharia, com destino a Mansoa. Quando a coluna arrancou em marcha lenta pela estrada, que levava a Mansoa, uma das viaturas da frente avariou.

Num dos Unimogs da coluna seguiam vários colegas da companhia, indo dois deles sentados no banco atrás e levando como habitualmente o taipal deitado para baixo, prontos para saltarem para o chão o mais rapidamente possível, em caso de ataque do IN. Só que tiveram azar, pois o veículo que seguia atrás, era um auto-tanque de água e, como o condutor ia a conversar com o Alferes sentado a seu lado, quando deu fé da paragem, devido ao veículo avariado, travou a fundo, mas o balanço da água impulsionou-o para a frente e, este por sua vez, foi bater nas traseiras do Unimog.

Disto resultou que um dos soldados ficasse logo sem uma das pernas e, outro soldado, ficou com as pernas partidas, sendo de imediato evacuados para o HM 231, em Bissau. O primeiro depois de socorrido, foi evacuado para o Hospital da Estrela, em Lisboa, e nunca mais soube nada dele. O segundo voltou, passado algum tempo, à Companhia.

Passados uns meses, em Fá Mandinga, apareceu um Médico que vinha fazer a avaliação do estado físico deste último soldado. Como o nosso Furrel Enfermeiro tinha saído da Companhia, por ter sido castigado, tive de ser eu a confirmar o veredicto do Médico, que me disse que o ia passar para os serviços auxiliares do exército.

Foi então que eu disse, para o médico, que isso era o mesmo que o mandar passar a operacional, obrigando-o a participar em todas as operações que houvessem na Companhia. Ele perguntou-me porquê. E eu expliquei-lhe, que eu tinha sido apurado para os Serviços Auxiliares do Exército, e ali estava a fazer a mesma coisa, que os outros camaradas-de-armas faziam nas operações.

Ele ripostou logo, que não podia ser, e eu disse-lhe para dizer isso ao meu Capitão. Foi o que ele fez e, por esse motivo, nunca mais fui escalado para fazer patrulhas sequer.

De pouco me valeu, pois eu fui para Béli e a restante Companhia para Madina.

Felizmente que Béli só foi atacada 4 vezes (era atacada de 3 em 3 meses), e só numa delas com forte intensidade de tiroteio de armas ligeiras.

Não sei como era o caminho para a fronteira, mas não devia ser bom, pois nunca ouvimos armas pesadas.

Sabíamos que o PAIGC tinha um acampamento muito perto, pois de madrugada víamos o helicóptero deles. Além de silencioso só lhe víamos a luz que ele projectava para o solo onde ia aterrar. Nunca o vimos de dia.

Mas como eles não se metiam connosco, nós também não nos metíamos com eles.

O pior de Béli era a época das chuvas, pois durante esse tempo nenhuma DO lá aterrava e, quando os mantimentos acabavam, tínhamos que “improvisar” alimentos.

Fora disso nem me queixo muito.

Um abraço para todos do,

Armandino Alves
Ex 1º Cabo Enf da CCaç 1589 (1966/68)
__________

Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P4484: Fauna & flora (20): Histórias de grandes serpentes: da jibóia de 7 metros (Paulo Raposo) ao irã-cego (Clara Amante)


Guiné > Região do Oio > Mansoa > 1968 > O Alf Mil Raposo, de óculos escuros, com o Furriel Ribas, à sua esquerda, e alguns soldados, observando uma jibóia morta pelas NT... "De sete metros!"...

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados




1. Havia jibóias na Guiné, no nosso tempo ? Assunto controverso, avaliar pelos comentários que já suscitou o poste do Miguel Pessoa (*). Pelo menos, não voavam, isso garante o nosso piloto, mas que se atravessavam no caminho dos bissalanquenses da BA 12, isso garante-nos a também strelada sargento pára-quedista Giselda Antunes Pessoa... 

O Paulo Raposo, por sua vez, conta-nos que matou uma, medonha, com sete metros de comprimento... O Mário Fitas também viu serpentes gigantes lá para os lados de Cufar... A Clara Amante, que viveu na Guiné, em criança, fala-nos com magia do irã-cego... E muitos de nós têm histórias de cobras, pequenas e grandes, venenosas e não venenosas, para contar...Com tudo isto, vamos aumentando o bestiário da Guiné... (LG)



Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 763 (1965/66), Os Lassas > "Foto que me foi concedida pelo Manuel Brita, condutor das Fox, e que esteve em Cufar no tempo do António Graça de Abreu" [1973/74].
Foto (e legenda): © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.


1. Mansoa: Baptismo de fogo

por Paulo Raposo

Excerto de um livro, policopiado, do nosso camarada de Montemor-O-Novo, Paulo Raposo (ex-Alf Mil Inf, com a especialidade de Minas e Armadilhas, da CCAÇ 2405, pertencente ao BCAÇ 2852, Galomaro e Dulombi (1968/70).

Extractos de: Raposo, P. E. L. (1997) - O meu testemunho e visão da guerra de África.[Montemor-o-Novo, Herdade da Ameira]. Documento policopiado. Dezembro de 1997 (**)

O sacrifício era muito. Vou contar uns episódios dos muitos que por lá passàmos:
Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 763 (1965/66), Os Lassas > "Da esquerda para a direita: Soldado que não recordo o nome, de camuflado o Fur Mil Enf Juvenal, o Fernando que nos acompanhou desde Bissau, Mário Fitas, Fur Mil Op Esp, e Olindo, apontador de bazuca da minha secção".
Foto (e legenda): © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.
O sacrifício era muito. Vou contar uns episódios dos muitos que por lá passamos:


(i) Após a nossa chegada a Mansoa, foi-nos distribuído o material de guerra. Já armados, fomos para uma bolanha, nome que se dava a um grande charco de água, que enchia com a chuva.

Esta bolanha ficava para além de uma companhia de balantas, que fazia a protecção do nosso quartel. Naquela zona de Mansoa, sair fora do arame farpado tinha riscos.Este exercício tinha como objectivo habituarmo-nos a estar debaixo de fogo. Deita-se um grupo de combate, e por cima deste, faz-se fogo. Aconteceu que logo no primeiro exercício, quando estava o primeiro grupo de combate deitado, há um disparo que sai mais baixo e vai ferir em ambas as pernas um soldado. Depressa foi chamada uma viatura, para o levar rapidamente para o Hospital. Para aquele rapaz, a comissão terminou ali.

Este acidente foi muito desmoralizante para os restantes e mais nenhum outro exercício foi feito. Perguntei-me nessa altura como iria sair dali.

(ii) Um belo dia o meu grupo de combate estava encarregue de levar e proteger os homens que iam limpar do capim uma faixa grande de ambos os lados da estrada. Assim evitávamos que tivessemos emboscadas coladas à picada.Dirigimo-nos para o local de trabalho em duas viaturas. Parámos precisamente no sítio aonde tínhamos terminado o trabalho no dia anterior, ou seja ainda na zona já descapinada.

Quando parámos, saltaram do capim alguns elementos IN para a estrada. Fizemos fogo, eles fugiram e não responderam. Se tivéssemos parado 50 metros mais à frente, tínhamos caído na emboscada.

Recuperados da emoção, os homens começaram o seu trabalho e eu dirijo-me para um tronco de árvore, que estava caído, para me sentar. Ao aproximar-me do tronco, este mexe-se. Era uma jibóia, com sete metros de comprido. Enfiei-lhe um carregador em cima e ela continuava bem viva.

O Cabo enfermeiro Luís agarra num tronco de um ramo verde, e, pondo-se à frente dela, bate-lhe continuamente na cabeça, até a cobra se ver perdida.Uma vez perdida, morde-se a ela própria, para não se humilhar à mão do enfermeiro Luís. (...)


2. O irã-cego
por Clara Amante


Amante da Rosa > "Meu Cabo Verde. História e Estórias. Minhas raízes, família e recordações. A Guiné. Pensamentos e Imagens. Sem ordem cronológica". Um blogue no feminino. Carla. Cabo Verde. Ilha de Santiago. Praia... A Carla é filha do nosso amigo e camarada Manuel Amante, membro da nossa Tabanca Grande.... Já aqui transcrevemos um poste, desse blogue, em que se falava de nós, do nosso blogue (***) . Infelizmente, o blogue Amante da Rosa deixou de estar activo, embora continue em linha... Tomo a liberdade de recuperar uma belíssima história ali publicada, com recordações de infância da Guiné (****).

Acordou alagada da sesta… maldita humidade. Abriu os olhos ainda tempo de ver o Irã que deslizava, entre uma trave e outra, no tecto do quarto, para desaparecer no escuro da telha enegrecida. Em que buraco se metia? Lembrou-se…

“- Matem a cobra!
- Não. Senhora…
- Mata a cobra… Anselmo?! Há uma cobra no tecto da casa!
- Senhora é o guardião… não.
- Guardião…?
- Sim, Senhora, guarda a casa.
- Anselmo… É uma cobra branca.
- Não… É Irã Cego… é poderoso e vai protegê-la a si e aos meninos.”


A humidade… nem sabia se estava acordada. Nunca a tinha visto assim… Gorda e branca. Ela… O Guardião. O Irã Cego. A cobra albina que vivia no telhado da casa. Foi regressando devagar daquela letargia do sono. Como foi que vim parar neste fim de mundo? O mato, os bichos, o raio das cobras e o bucho cheio ano sim ano… Não, nada de lástimas! Calor… parece que o diabo se entretêm a chupar ar. Ai Guiné! Ai Mindelo... Irã Cego… as minhas crianças aqui em baixo deste tecto. Ninguém num raio de quilómetros e ele que se mete no mato dias a fio. Deve estar nalguma tabanka. Um banho... preciso de um banho. Mãe… e tu que nunca mais chegas. O Nhelas, lá para o Sul sem conseguir fugir - do contrato da roça.

Nando, embarcado sabe-se lá onde. Os meus irmãos espalhados em tudo o que é fim de mundo. A onça… é preciso ver se os meninos estão cá dentro… a onça que quase leva o Canelito. Bendito cachorro... e ele ainda a gritar pelo pobre do bicho... sozinho em frente da casa. Isto é o fim do mundo. Irã… que me vale Deus aqui. Irã Cego! O guardião da casa que engole os ovos das galinhas é quem nos protege. E a minha terra lá tão longe. O vento… que falta faz o vento, Mãe. Banho… aquele banho semanal que nos davas com a água que trazias de casa d’inglês. Anselmo… é preciso ir ao poço... A onça que deve andar à caça… E ele que não chega metido nesse mato sem ninguém. Como foi… ah… Dava tudo para sentir aquele cheiro de colónia inglesa do Nana... Cheiro nauseabundo com que ele chega… Meu Nana… como fui acabar tudo com ele. Lembranças não levam a nada e o que foi foi… deve ser do calor, estás a enlouquecer, Vinda. Valha-me a cobra para nos proteger e…
- Dona Vinda…? - o chamado urgente sacudiu-a.
- Sim, Anselmo...
- É o Irã... Irã Cego fugiu para o mato.
- ...
- Senhora… não é bom.

[Revisão / fixação de texto: L.G.] (*****)________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 7 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4477: FAP (29): Encontros imprevistos (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

(**) Vd. poste de 8 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXXIII: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (6); Mansoa, baptismo de fogo

(***) Vd. poste de 27 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1787: Embaixador Manuel Amante (Cabo Verde): Por esse Rio Geba acima...

Vd. também 28 de Maio de 2007> Guiné 63/74 - P1789: Blogues que nos citam (2): Amante da Rosa ou a Geração das Flores da Revolução de Bissau

(****) Vd. poste de 14 de Novembro de 2006 > O despertar de uma sesta, no fim do mundo dos anos 50, visto num quadro de Paulo Rego (Clara Amante)


(*****) Vd. último poste desta série > 16 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4038: Fauna & flora (19): Também os babuínos dizem Nós na pidi paz, ka misti guerra (Joana Silva)

Vd. também poste de 25 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3793: Fauna & flora (16): Relações amistosas com o Macaco-cão na zona de Cufar (Mário Fitas)

Escreve o L.G., em comentário ao poste do Miguel Pessoa:

(....) Há uma diferença (até no comprimento) entre a jibóia (nome científico, Boa constrictor) e a pitão, jibóia africana ou irã cego (na Guiné-Bissau) (nome científico, Python sebae)... Esta última, sim, é a maior cobra da África subsahariana. Quando adulta, pode atingir os 6 metros e ultrapassar os 100 quilos de peso... Habita a floresta-galeria, as matas e só ocasionalmente a savana. A sua dieta é constituída por aves, pequenos roedores e ainda mamíferos de média dimensão. Pode viver trinta anos e não está em risco de desaparecer.

Já a jibóia p.d. (que está no nosso imaginário, pela pomada jibóia e não só...) é centro e sulamericana.Boa constrictor deve o seu nome à forma como mata as suas vítimas, por constrição, sufocando a presa, técnica usada pelas cobras não venenosas.Contrariamente a muitos mitos populares, é pacífica e fugidia, evita sempre o contacto com animais de grande porte, incluindo o homem... Em média anda nos três metros...É sobretudo caçadora nocturna, alimentando-se de roedores e aves...

Por sua vez, o nosso amigo Nelson Herbert, hoje cidadão norte-americana, mas born in Bissau, acrescenta o seguinte:


(...) Tem razão o Luís Graça. O familiar mais próximo da jiboia sul americana, na Guiné é o Irã Cego. De criança,sempre ouvi dizer que o unico Ser que esse tal de Irã Cego de facto temia, imaginem!, eram aItálicos formigas...(qual quê: formiguinhas). Aquelas típicas da Guiné, conhecidas pela sincronização das dolorosas dentadas e a acrobática posição de pino. Melhor, aquelas que mordem a vítima, de pernas pro ar ! Curioso, né ! Mas existe uma explicação lógica ! É que engolida uma ave, um réptil ou atéum cabrito (a lenda fala de bois), o bicharoco necessita de algumas espaçosas horas para a digestão da presa...tanta é a languidez ...

É pois nesses momentos que o bicho, ele mesmo, torna-se presa fácil das formigas. Aliás, não é por acaso que na Guiné, em tudo que seja , terreno por excelência de pastagens, por perto existe sempre um "morro de baga baga"...não vá pois o Irã Cego tecer das suas !

Ainda relativamente a esse bicharoco, baptizado de Irã Cego, por conseguinte, à luz de algumas crenças e crendices, nossas ( guineenses), um animal outrora venerado, senão temido, Amílcar Cabral faz referência, em alguns dos seus escritos, às dificuldades enfrentadas no início da guerrilha, no aliciamento de alguns guerrilheiros para operações, que tivessem por cenário...qualquer mata cerrada, tida por santuario dos Irãs Cegos. Cabral mobiliza esse exemplo, para exemplificar o quanto o obscurantismo poderia em certa medida comprometer o avanço da guerrilha nas matas da Guiné. (...)


segunda-feira, 8 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4483: O mundo é pequeno e a nossa Tabanca... é grande (11): Macau: A. Graça Abreu com José Martins, ex-Cap CCAÇ 16 (Bachile, 1971)


China > Macau > Ruínas da Igreja de São Paulo, uma das 27 maravilhas do mundo, de origem portuguesa
Fonte: Wikipédia (2009). Copyleft
1. O nosso Camarada Jorge Picado em 13 de Maio de 2009, enviou o seguinte e-mail ao Luís Graça, sob o título: Reencontro telefónico com o Cmdt. da CCaç. 16:

Luís,

Acabo de falar com o José Martins.

Era de facto o Cap da CCaç 16 e terminou essa comissão uns meses depois de eu ter regressado ao Continente.
É espantoso, pois disse-me que me reconheceu logo que viu a foto no Blogue e daí o ter procurado nas listas o meu contacto telefónico, mas foi parar à Costa Nova.
Falou-me nos nomes da maioria dos Oficiais do CAOP 1.
Possivelmente o Graça de Abreu já não o terá de facto encontrado.
Lê sempre o Blogue. Por isso já sabia do comentário e quando acabou de falar comigo disse que ia tentar ligar para o Abreu.
Também é casado com uma chinesa, médica se percebi bem e vive em Macau.
Era Miliciano e seguiu a carreira, sendo do CPC do Rui Alexandrino que o deve conhecer.

Antes do CPC fez a 1.ª comissão em Angola e depois dessa, na Guiné, voltou a ir outra vez para Angola.

É portanto Tenente Coronel se bem entendi, mas já está reformado, depois de ter ido para Macau onde esteve em algo de Segurança.

Perguntei-lhe se não tinha endereço da Net, com o intuito de o "aliciar" para o Blogue, mas respondeu-me que não está familiarizado com a "máquina".

Talvez o Graça de Abreu consiga saber mais.

Abraço,

Jorge Picado

2. No mesmo dia, Luís Graça respondeu ao Jorge Picado, com o mesmo título: Reencontro telefónico com o Cmdt da CCaç 16:

António,

Aqui tens... a resposta do outro lado do mundo.

Amazing,

Luís

3. Ao que o António Graça de Abreu, em 05 de Junho de 2009, também via e-mail, ripostou ao Luís Graça, Cc ao Jorge Picado, com o título: Encontro com o Cmdt. da CCaç. 16:
Voltei ontem de Macau.
Estive lá com o José Martins, Cap da CCaç 16, no Bachile.
Graças ao blogue fui encontrar em Macau um nosso camarada da Guiné (há 23 anos em Macau!), com mais mil estórias para contar.
O Martins lê o blogue mas creio que não sabe como aderir como “tertuliano”.
Está reformado e comprou agora uma casa na ilha de Hainan, no sul da China, perto do Vietname, e vai para lá passar largas temporadas.
Estive quase 15 dias em Macau e almoçámos e jantámos umas cinco ou seis vezes.
O Martins esteve também na apresentação do meu novo livro, a minha tradução dos Poemas de Han Shan (séc. VIII) no auditório da Livraria Portuguesa, em Macau.
Foi um gosto enorme ter conhecido o José Martins, camarada da Guiné.
Luís, vê as maravilhas que o teu blogue provoca.
Um abraço,
António Graça de Abreu
__________

Notas de M.R.:

Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P4482: O Nosso IV Encontro Nacional, Ortigosa, Monte Real, 20 de Junho de 2009 (6): As inscrições terminam a 15 de Junho (A Organização)

Distribuição dos participantes no IV Encontro, por região (local de residência)... Os mouros, até ao momento, levam uma alguma vantagem (n=44) contra os morcões (n=31)... Os lusitanos do centro são o fiel da balança (n=20)... É claro que o critério étnico é enganador: há mouros a morar no norte, e morcões que emigraram para o sul... Feitas as contas, Na Quinta do Paul, só há o verde e o azul...

Para que ninguém se tresmalhe, e qualquer morcão possa reconhecer (e ser reconhecido por) um mouro, o strelado do Miguel Pessoa fez uns cartanitos à manêra, que já devem ser chegado à caixa do correio electrónico de cada inscrito... Há pelo menos 24 participantes, membros ou não da nossa Tabanca Grande, que estão emparelhados... Ou, por outras palavras, vamos ter outras tantas bajudas... (LG)



IV ENCONTRO NACIONAL DA TERTÚLIA DO BLOGUE LUÍS GRAÇA & CAMARADAS DA GUINÉ, DIA 20 DE JUNHO DE 2009, QUINTA DO PAÚL, ORTIGOSA, MONTE REAL, LEIRIA

A Operação Ortigosa 2009, em termos de inscrições, está na fase final.

Vamos relembrar neste poste o mais importante do Encontro.


(i) Comecemos pela Ementa (que nem só de memórias, histórias e emoções vive o homem...)

APERITIVOS/ENTRADAS

Martinis; Porto sêco; Moscatel;
Vinho Tinto; Vinho Branco;
Vinho Verde; Vinho Rosé;
Aguas; Refrigerantes; Cervejas;
Espumante Natural

Mimos de Bacalhau;
Rissois;
Croquetes;
Chamussas;
Moelas de frango campestre;
Tacho de Entrecosto regional c/ Castanhas;
Espetadinhas de Morcela e chouriço
Grelhados à Camponês
Leitão assado à Bairrada
Presunto fatiado c/nacos de frutas;
Fritada à moda da região;
Azeitonas
Queijos de várias regiões de Portugal
Paios de Lamego
Pãezinhos Regionias; Pão integral; Broa; Pãezinhos c/ frutos secos
Miniaturas de Pastelaria

AGORA À MESA

SOPA
Sopa de Legumes ou...

CARNE
Assado de Novilho com molho do assado e cogumelos frescos

SOBREMESAS
Cabaz c/6 Doces Tradicionais
Frutas Laminadas

BEBIDAS
Vinhos DOC/Vinho Verde em Buffet
Águas
Refrigerantes
Café c/bombom
Centro de Miniaturas

LANCHE
Caldo Verde
Frutas Laminadas
Pastelaria Variada
Mesa de Queijos
Franguinhos churrasco
Picanha Churrasco
Fritas/Saladas
Presunto Laminado
Pãezinhos Regionais/Broa


(ii) Preço do Almoço

Com o Lanche incluído é de 30,50 €uros

(iii) Dormida(s)

Para quem optar por ficar em Monte Real para o outro dia, os preços são: 35 e 45 €uros, respectivamente para single e duplo, na Pensão Santa Rita.

(iv) Local do Encontro e como chegar

Local do Encontro

Quinta do Paúl, Ortigosa, Estrada Nacional 109, entre Monte Real e Leiria.

Coordenadas Geográficas: 39º 50' 27" Norte - 8º 50' 24" Oeste.


Quinta do Paúl, Actividades TurísticasMail: info@quintadopaul.com
TEL 244 613 438 - FAX 244 613 703 - Telemovel 917 210 432
Sítio na Net: http://www.quintadopaul.com/

Como chegar

Para quem vai do Sul pela A8, continuar pela A17 e abandonar a auto-estrada na saída para Monte Real. Chegados à rotunda da EN 109 virar à esquerda em direcção a Leiria. Passados 2 a 3 Km encontra a Quinta do Paúl.

Para quem vai do Norte, circular na A1 até à saída para Albergaria, aceder à A25 em direcção a Aveiro, entrar na A17 para Leiria, seguir até encontrar a saída para Monte Real, ou seja, desde que se entra na A1, nunca se sai da auto-estrada. Chegando à rotunda da EN 109, virar à esquerda em direção a Leiria. Passados os 2 a 3 Km aparce a Quinta do Paul.

(v) Eis o quadro de honra com os nomes dos 95 magníficos, inscritos até ao momento, de A a V:

Abel Rei e Maria Elisete (Marinha Grande)
Agostinho Carreira Gaspar (Leiria)
Álvaro Basto e Fernanda (Leça do Balio / Matosinhos)
Amadu Bailo Djaló (Lisboa)
António Fernando R. Marques e esposa (Cascais)
António Graça de Abreu (Cascais)
António J. Pereira da Costa e Isabel (Mem Martins / Sintra)
António M. Sucena Rodrigues (Oliveira do Hospital)
António Martins de Matos (Lisboa)
António Paiva (Lisboa)
António Pimentel (Porto)
António Santos e Graciela (Loures)
Artur Soares (Figueira da Foz)
Belarmino Sardinha e Antonieta (Odivelas)
Benjamim Durães (Palmela)
Carlos Marques Santos (Coimbra)
Carlos Silva e Germana (Lisboa)
Carlos Valentim e Margarida (Proença-a-Nova)
Carlos Vinhal e Dina (Leça da Palmeira / Matosinhos)
Constantino Neves e Judite (Almada)
Coutinho e Lima (Lisboa)
David Guimarães e Lígia (Espinho)
Delfim Rodrigues (Coimbra)
Eduardo Magalhães Ribeiro e Fernanda (Porto)
Fernando Calado (Lisboa)
Fernando Franco e Margarida (Amadora)
Fernando Gouveia (Porto)
Fernando Oliveira e Maria Manuela (Porto)
Henrique Matos (Olhão)
Hernâni Acácio Figueiredo (Ovar)
Idálio Reis (Cantanhede)
Jaime Machado e Maria de Fátima (Lavra / Matosinhos)
João Carlos Silva (Almada)
João Lourenço (Figueira da Foz)
João Seabra (Lisboa)
Joaquim Mexia Alves (Monte Real / Leiria)
Jorge Cabral (Lisboa)
Jorge Canhão (Oeiras)
Jorge Picado (Ílhavo)
José Brás (Montemor-o-Novo)
José Carlos Neves (Leça da Palmeira / Matosinhos)
José Casimiro Carvalho e Ana (Maia)
José Eduardo Alves e Maria da Conceição (Leça da Palmeira / Matosinhos)
José Fernando Almeida e Suzel (Óbidos)
José Manuel Lopes e Luísa (Régua)
José Manuel M. Dinis (Cascais)
José Marcelino Martins e Maria Manuela (Odivelas)
José Pedro Neves e Ana Maria (Lisboa)
José Zeferino (Loures)
Juvenal Amado (Fátima)
Luís Graça e Alice Carneiro (Alfragide / Amadora)
Luís R. Moreira (Lisboa)
Luís Rainha (Figueira da Foz)
Manuel Amaro (Amadora)
Manuel António Rodrigues (Mortágua)
Manuel Augusto Reis (Aveiro)
Miguel e Giselda Pessoa (Lisboa)
Pedro Lauret (Lisboa)
Raul Albino e Rolina (Vila Nova de Azeitão / Setúbal)
Ribeiro Agostinho e Elisabete (Leça da Palmeira / Matosinhos)
Rui Alexandrino Ferreira (Viseu)
Santos Oliveira (V. N. de Gaia)
Semião Ferreira (Monte Real)
Valentim Oliveira e Maria (Viseu)
Vasco da Gama (Figueira da Foz)
Vasco Ferreira e Margarida (V. N. de Gaia)
Victor Barata (Vouzela)
Virgínio Briote (Lisboa)

(vi) Inscrições:

- O prazo para as inscrições termina no próximo dia 15, 2ª feira (inclusive).

- No acto da inscrição devem indicar o nome da(o) acompanhante, se for o caso.

- Se quiserem pernoitar em Monte Real, terão que fazer menção para que o Mexia Alves possa fazer a respectiva reserva.

- Devem também dizer de onde se deslocam (ou onde residem).

- O nosso camarada Miguel Pessoa enviará, em ficheiro, a cada inscrito, um cartão que deverão imprimir, para usar no Encontro.


Estamos quase a atingir a meta dos 100, mas podemos vir a ultrapassá-la.

Um abraço
Até ao dia 20

A Comissão Organizadora,

Carlos Vinhal
Joaquim Mexia Alves
Luís Graça
Miguel Pessoa
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 17 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4365: O Nosso IV Encontro Nacional, Ortigosa, Monte Real, 20 de Junho de 2009 (5): As inscrições continuam a bom ritmo (A Organização)

Guiné 63/74 - P4481: Os bu...rakos em que vivemos (12): Cafal Balanta contribui para o desenvolvimento nacional (Manuel Maia)

1. Mensagem da Manuel Maia (*), ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74, com data de 7 de Junho de 2009:

Caro Carlos,
Com o pedido de colocação logo que possível, claro está, na secção de Bu...rakos, segue o texto anexo onde tentarei colocar a fotografia .
Agradecia que me informasses se recebeste com a dita (continuo desajeitado a este nível).


Um Bu...rako para tapar o buraco do desenvolvimento

Manuel Maia no seu bu...rako de Cafal Balanta

Depois dum breefing de apresentação formal à nata de arquitectos portugueses, onde nomes como Siza Vieira, Alcino Soutinho, Tomáz Taveira e tantos outros tomaram assento, a palavra (e até aquela pinga de Borba que guardava religiosamente para um destes eventos – definitivamente, gosto desta palavra, tem estatuto, tem... boa leitura como a pinga tinha boa bebida...) enchendo de adjectivação elogiosa o fautor destas linhas, um arquitecto naif de gosto requintado (as palavras são deles...), foi com inusitado prazer que ouvi da boca do nosso Primeiro, ele também um conceituado homem do risco com obra feita, nessa bela cidade da Guarda, onde ressaltam as cortes dum traço enérgico, seguro, insinuante, só ao alcance de grandes mestres, um rasgado elogio sobre o design, o aproveitamento dos materiais, o seu enquadramento no resto da paisagem, e ainda a decoração dum estilo informal para quem não dispunha de tempo face aos seus afazeres profissionais...

Severiano, o Ministro da Defesa, guinéu como sabemos, exultou face ao quadro exposto, e claro a tradicional maquete de esferovite (de qualidade superior à que o Frank Gary fez para o Santana Lopes, relativa ao Parque Mayer e onde abichou um milhãozito...) o pormenor soberbo (Ministro dixit) das clarabóias que lhe emprestam uma luminosidade fabulosa evidenciada do lado direito da foto.

Evidentemente que pedimos desculpa pelo ar um pouco desarrumado da Câmara mas isso deveu-se à inoportuna doença da engomadeira...

Os presentes (tudo gente fina, atrever-me-ia mesmo a chamar-lhes a nata deste belo recanto tão cantado por poetas avoengos) denotando uma educação rafinée, ignorou a nossa preocupada explicação não fazendo nota de... devo dizer-vos que nada recebi nem tão pouco pensei fazê-lo, mas... ó Maia, tem paciência pá, tens de pereceber que deste modo até parece mal, tens de te cobrar pelo teu serviço... (aquelas tretas do costume...) mas como sou homem de ideias fixas e não queria ter depois à perna o Fernando brincalhão, meu ex-colega de liceu, e hoje Ministro das Finanças, que não enjeitaria a oportunidade para se vingar da alcunha que lhe pusemos na altura, mantive-me firme como uma rocha e fiz mais este sacrificiozito pelo país...

Entretanto, o próprio Presidente da República, que como sabemos, por inerência de funções é em ultima instância o Chefe Supremo das Forças Armadas (há quem goste de pronunciar ármádas, mas ele há gostos p´ra tudo...), ao que me disseram esteve largo tempo à conversa com o Severiano para pensarem na introdução de casernas pequenas deste tipo, para albergarem uma meia dúzia de soldados ao invés daqueles inestéticos armazéns pejados de camas do tipo hospitalar encavalitadas - salvo seja - umas nas outras...

Ora assim sendo, cá voltaremos a ter mais um desígnio nacional cumprido, ou seja, o da criação de postos de trabalho.

Vai ser uma lufa-lufa para as bandas da empresa onde aquele rapaz, Jorge Coelho, é manda-chuva, com intermináveis filas de desempregados a preencherem ficha para tomarem parte nesses trabalhos de feitura de novos quartéis, que tanta falta fazem agora para estas guerras de alecrim e manjerona... (que até já à porta desta nossa Tabanca bateram...)

A ser verdade, será provável uma remodelação geral nas ditas Forças Armadas, que a acrescentar ao regime de self-service, implementando restaurants em vez de cantinas, com serviço à la carte servido em porcelana Vista Alegre, apoiando dessa forma a indústria nacional, ao invés do prato único em disco de alumínio, como era apanágio no nosso tempo, e acabando também, definitivamente, a chamada marmita, (que ainda se usou na campanha de África) por obsoleta e inestética...

Como vêem, uma pequena coisa pode despoletar uma bolha (não a do jogo em que estão a pensar que essa é assim mais ou menos proibida, embora vá funcionando com alguma regularidade), mas sim uma bolha de desenvolvimento que aportará postos de trabalho, criação de riqueza (enfim, já sabeis a restante terminologia...)

Quem diria, à la longue que aquele meu (e dos colegas de apartamento, que não quero os louros só para mim...) projecto poderia redundar, a modos que, factor primordial de desenvolvimento do país.

Se porventura algum dos camaradas tabanqueiros puder informar das démarches nécèssaires para registar patentes, agradecemos.

Agora, posto isto, digam-me francamente:

- Haverá algum bu...rako mais bu...rako que este?

Venha de lá o prémio...

Um abraço para ti, extensivo a toda a Tabanca
Manuel Maia

Guiné > Região de Tombali > Cantanhez > Cafal Balanta > Destacamento da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 (1972/74)

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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 3 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4456: Blogpoesia (48): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (V Parte): III Dinastia (Filipina)

Vd. último poste da série de 18 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4369: Os bu...rakos em que vivemos (11): Banjara City, capital do Oio (Fernando Chapouto, CCaç 1426, 1965/66)

Guiné 63/74 - P4480: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (3): Partida para a Guiné

1. Mensagem de José Câmara (*), ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73, com data de 6 de Junho de 2009:

Assunto: Memórias e histórias minhas (**)

Olá Carlos,
Junto encontrarás mais um pouco da história. Como sempre, para bem do blog, faz com ela o que muito bem entenderes.

Daqui do outro lado do oceano, um abraço amigo
José Câmara


Partida para a Guiné

Ali, em frente dos meus olhos, estava o n/m Angra do Heroísmo. Muitas vezes o vira ao largo da cidade da Horta. Em desafio ao povo faialense nunca amarrara à doca. Entrar nele só mesmo aqueles que fizeram viagem. E era isso que eu ía fazer: uma viagem que não tinha requisitado. Tal como todos os outros militares que iriam encher os seus camarotes e porões.

O Angra do Heroísmo, no Cais de Alcantra, em Lisboa, espera que os seus porões se encham de militares com destino à Guiné

Foto: © Juvenal Afonso (2009). Direitos reservados.


Da vistoria ao navio fiquei com uma sensação amarga que, ainda hoje, perdura: a visão dos porões preparados para cargas de toda a espécie, e que agora serviriam para o transporte de carga humana. Tinham sido limpos, mas continuavam mal cheirosos e a ventilação era paupérrima. Aqueles porões iriam servir de camarata a tropas que dariam o melhor de si mesmas nas matas e bolanhas da Guiné.

Nos Açores, vezes sem conta, tinha visto as vacas serem embarcadas e arrumadas nos porões dos barcos que, ao tempo, demandavam as terras açorianas. Agora, em plena Lisboa, apercebia-me que os nossos soldados iriam ter idêntico tratamento, e serem, assim, reduzidos à condição animalesca.

A bestialidade e baixeza de instintos das chefias militares e dos responsáveis pela governação no Portugal de então, estavam ali, na visão daqueles porões. Muito baixo tinham descido no conceito e respeito pela pessoa, pelo militar, pelo cidadão e pelo mártir da Pátria. A prova estava ali. Para ser vista e sentida pelos cerca de seiscentos militares que faziam parte daquela viagem. Uma situação que foi vivida e sentida por muitos outros, antes e depois de nós.

Pelas 8:00 horas da manhã, do dia 21 de Janeiro de 1971, começaram a chegar as primeiras tropas. Sem desfiles e sem discursos de ocasião o embarque foi acontecendo. Pouca gente a observar este embarque. Sem grandes despediadas. Compreensível. A maioria do contingente militar era formado por açorianos e madeirenses. Aqui e ali um outro lenço abanava. Pelos militares continentais que faziam parte dessas Companhias e pelos militares de um Pelotão de Artilharia. Um grupo de cães e respectivos tratadores também faziam parte do contingente.

Cerca das 13:00 o navio começou a afastar-se da doca. Aos poucos foi descendo o Tejo, rumo ao Atlântico, cujas águas encapeladas provocadas pelo tempo invernoso que então se fazia sentir, deixava antever uma viagem pouco agradável. Como se isso fosse possível naquelas circunstáncias. Para trás ficava a linda Lisboa. Por todos um aceno de esperança. Para alguns o seu último adeus!

O silêncio entre os militares era tão cortante como o frio que então se fazia sentir, aqui e ali quebrado pelas rajadas do vento forte que fazia, e pelo navio a cortar as águas do estuário do Tejo. Cada um embrenhado nos seus pensamentos.

O dia tinha sido longo e a noite já ía avançada. As emoções tinham sido muitas. Restava-me mais uma: o dia da minha partida para a Guiné coincidia com o dia de aniversário natalício de minha mãe. No meu pensamento e no meu coração dei-lhe os parabéns.

Naquele momento a escuridão da noite era a luz do vazio que me ia na alma.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4424: (Ex)citações (30): O meu pai só aprendeu as letras que o trabalho lhe ensinou (José da Câmara)

(**) Vd. último poste da série de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4421: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (2): O IAO em Santa Margarida

Guiné 63/74 - P4479: História da CCAÇ 2679 (19): O adeus a Piche (José Manuel M. Dinis)

1. José Manuel M. Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, em 4 de Junho de 2009 enviou-nos o 19.º episódio da História da sua Unidade.


O adeus a Piche

No regresso a Piche encontrámos o Alferes Lopes, rendição individual com destino ao Foxtrot, em substituição do Guerra. A primeira impressão revelou um individúo humilde, nervoso, fraca figura. O conhecimento seguinte foi o de um jovem com formação seminarista e recém-casado. Nas conversas denunciava nervosismo e receios, que a falta de voz mais acentuava. O pessoal vinha com larachas sobre o novo alferes, comentando o aspecto e o comportamento, estabelecendo as diferenças, inevitavelmente, com o Eduardo Guerra, mas logo lhes chamei a atenção, que fossem respeitadores e não se armassem em espertos, feitos veteranos, pois também já os vira acagaçados. A relativa veterania, uma ou outra mina detectada, as flagelações sofridas e o relativo àvontade que tínhamos atingido, não eram uma mais-valia de destaque.

Quando saímos para o mato, perguntei ao Alferes onde queria colocar-se. Perguntou a minha opinião e dei-lha, que se mantivesse perto de mim. Achei que se ele quisesse trocar alguma impressão, seria melhor andarmos perto um do outro. Chovia, e a capa desmesurada acentuava-lhe a pequena estatura.

No mato quase não falara, mas no aquartelamento manifestava a grande apreensão e o azar por ter ido dar à Guiné. Procurava desabafar. Bem, desse azar queixam-se milhares, devo ter respondido para não alimentar queixumes.

Entretanto, em Piche a vida prosseguia com eventos. Foi inaugurada a piscina, ou melhor, no dia aprazado para a inauguração, não foi possível por falta de água, mas o problema foi resolvido e o evento terá acontecido pouco depois. Refiro-me assim, pois não tive ocasião de ir a banhos, na medida em que estava quase a partir para férias e mantive actividade operacional intensa. Mas participei na futebolada de inauguração prévia do campo de futebol de salão.

Terá sido iniciativa do Drácula? Ou do Major, Segundo Comandante, esse praticante de desportos? Ambas as obras foram executadas pelo pessoal do BArt e desejo que tenham proporcionado bons momentos de descontração e camaradagem.

Nesta foto, distinguem-se em baixo: de tronco nú, o Zé Rocha, no 5.º lugar o Nogueira, e a antecedê-lo, parece-me o Águas. Em pé, do lado direito, Dinis e Costa.


Férias

E aconteceu. Com cinco meses de comissão, antes que fosse tarde, parti para Bissau. Instalei-me no Grande Hotel. Dirigi-me à delegação da companhia aérea para levantar o bilhete. E deambulei durante dois dias, à civil.

O hotel, o melhor de Bissau, tinha um preço aproximado do praticado pelo Tivoli, em Lisboa, pouco mais de duzentos escudos, o que achei fantástico. E eram tão diferentes, se eram! Lá, no calor abafado dos trópicos, não havia ar condicionado. Suspensas do tecto, as ventoínhas redemoinhavam na tentativa de refrescar corpos e almas. Com algum insucesso. No quarto, modestíssimo e de parca dimensão, havia outra ventoínha de pé alto, com diferentes velocidades, luxo dos luxos, que fustigava o corpo para amenizar a canícula e impedia a entrada de mosquitos. Qualquer papel voava. Parecia o Guincho em dia de vento.

A arquitectura reflectia um estilo colonial de meados do século, uma disposição periférica em quadrado, por onde se distrubuíam, a recepção os quartos e a sala de refeições. À frente, ladeando a entrada sob a cobertura, havia duas varandas que lhe marcavam a imagem da fachada principal. No espaço interior do quadrado em pátio, situavam-se as casas de banho, a cozinha, a lavandaria e dependências. Não havia casas de banho privativas. Em redor do edíficio, de rés-do-chão, um jardim relvado, com arbustos e árvores tropicais, constituía uma bonita moldura. Boa nota era para o serviço de bar nas varandas-esplanadas, onde as coronelas poisavam durante as tardes..

A primeira saída em Bissau surpreendeu-me pela minha reacção à observação de mulheres brancas, em geral jovens, as mulheres dos militares. Logo às primeiras, dei comigo a parar diante de um casal de braço dado, a olhar para a senhora como um patarata.

Fui a uma loja comprar uma camisa, e também me surpreendi à vista das Lacoste, um avanço da civilização burguesa a dois passos do fim do mundo. E regalei-me a comer peixe e marisco nas esplanadas da cidade, ornadas de acácias, acentuadas com as cores verde e vermelho. Nas montras de estabelecimentos como o Pintosinho e Tau Fiksad, olhei os produtos da civilização que respondiam às solicitações dos endinheirados militares. Militares que andavam por todo o lado, e que faziam alardes nas esplanadas, de que a 5.ª Rep era o símbolo máximo. Na cidade molengava-se. Os pretos, de mão dada, com todos os vagares do mundo, já não me chocavam como da primeira vez que os vi, que me pareciam mariconsos. As pretas cirandavam com vistosas vestes, todas garridas de colorido, ora carregavam filhos e compras para casa, ora corriam para diferentes destinos, ou bamboleavam-se em grupos de duas ou três, num linguajar cheio de interjeições e risos. No geral, parava-se, falava-se, e o tempo ia passando devagarinho.

Ao fim da tarde, antes do jantar no hotel, serviço de travessa a possibilitar todos os excessos, sentava-me na esplanada, junto das coronelas, umas notoriamente fúteis, outras mais resguardadas de comprtamento, bonitas ou feias, mas diferentes do que era usual ver-se nas mulheres do puto. Enquanto me deliciava com um cinta preta em aguada Perrier fresquinha, apreciava-as.

À noite fui a um bar de alguma nomeada, quase ou exclusivamente frequentado pela tropa, A Meta, atraído por uma pista de mini-carros de comando elétrico. Num espaço folgado, acumulavam-se matulões que conversavam e emborcavam bebidas frescas, como que a compensar a actividade sudorífera. Abafava-se. Sentei-me numa mesa onde estava um gajo conhecido. Pedi um Monks com gêlo, (dez paus). Depressa descobri um divertido espectáculo: o serviço era garantido por uma corpolenta preta, rapariga bem disposta e afável, e à medida que se deslocava por entre as mesas, era ver mãos de um lado e outro a poisarem-lhe na imensa bunda. Bamboleando-se, imperturbável, ia servindo aqui e ali, acorrendo aos chamamentos familiares dos estranhos faunos que lhe percorriam as coxas. Estranhos?

Viajei com um Sargento e um Furriel do esquadrão de Bafatá. O Sargento, que tirava do bolso um volumoso molho de notas, pagava sucessivos whiskies para termos a esbelta hospedeira junto de nós.

À minha espera as pessoas queridas. Depois da alegria de reencontrar a namorada, a família e os amigos, ou o que restava do grupo de amigos, já que na generalidade estávamos dispersos pelos caminhos da tropa, nos primeiros dias, acordava e, antes de qualquer compromisso, dava um passeio pela localidade, observava alterações urbanas, novas lojas em substituição de algumas a que me habituara desde menino, reparava em novos modelos de automóveis, num relativo bem estar geral que se evidenciava em pouco tempo, nas alterações da moda feminina, um sem número de diferenças. Nem se pressentia que a nação estivesse em guerra.

Um dos meus desejos foi comer uma sardinhada no António da Mata, uma tasca de justa nomeada.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4409: História da CCAÇ 2679 (18): Deslocação a Bajocunda (José Manuel M. Dinis)

Guiné 63/74 – P4478: Iniciativas da ADFA em Lisboa (3): Almoço/Convívio do pessoal da BA 12 (Pilotos, Mecânicos e Enf Pára-quedistas (Luís Nabais)

1. Promovendo uma das iniciativas da ADFA (Associação dos Deficientes da Forças Armadas), recebemos esta mensagem do nosso camarada Luís Nabais, ex-Alf Mil da CCS/BCAÇ 2885, Mansoa 1969/71, com data de 6 de Junho de 2009:

Caros Eduardo e Carlos,

Como vos havia já dito e vocês tão amavelmente haviam publicado, quando esta ideia era ainda era apenas uma intenção, gostaria de vos pedir agora a publicação, no blogue, do almoço/convívio do pessoal da BA 12 (Pilotos, Mecânicos e Enfermeiras Pára-quedistas) que, enfim, conseguimos agendar.

Este evento está já publicitado, também, no blogue da malta da BA 12 e, definitivamente, terá lugar no próximo dia 27 de Junho, na sede da ADFA.

Será uma homenagem, onde recordaremos todos aqueles que não conseguimos, nem queremos esquecer.

Alguns fazem questão de cá estar deslocando-se de bem longe, em cadeiras de rodas e, outros, ainda, comparecerão com as suas próteses, mas não querem deixar passar em branco esta homenagem.

São DFA’s, que querem dizer também: EU ESTOU PRESENTE!

As esposas podem e devem participar também.

A cada uma das pessoas inscritas, além da festa e do convívio, será entregue uma medalha comemorativa do evento.

O preço será de 20 €!

NOTAS:
Aquando da publicação do texto inicial, fomos questionados sobre a eventual presença, ou não, nesta confraternização, das “nossas” enfermeiras Paraquedistas!

Estamos à espera que, entre todos os “tertulianos”, muitos as conheçam e as contactem. Peçam-lhes, por favor, para elas marcarem a sua indispensável e tão desejada presença também.

ATENÇÃO: INSCREVAM-SE JÁ… SÓ DISPOMOS DE 15O LUGARES (o espaço não dá para mais).

Localização e estacionamento há e vocês conhecem.

Agradecendo a publicação desta convocatória, bem hajam e um abraço,

Luís Nabais
(Sócio efectivo da ADFA, nº 9724)

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Notas de M.R.:

As inscrições podem ser feitas directamente para aquele blogue (especialistasdaba12@gmail.com) ou para a ADFA, ao cuidado da Dª Conceição Valente, nº Tel-217 512 600. Já agora, a ADFA localiza-se entre a Av Padre Cruz e Av Rainha D.Leonor, no Lumiar. Perto tem o Instituto Ricardo Jorge, e é perto do Estádio do Sporting, parecendo não haver problemas de estacionamento.

domingo, 7 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4477: FAP (29): Encontros imprevistos (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)


Carlos, Luís,

Aqui vai mais um texto ligeirinho para o blogue, como eu gosto de fazer.

Um deste dias, com mais tempo, tentarei explicar porque é que raramente aparecem textos detalhados das missões efectuadas pelo pessoal da Força Aérea, mas isso fica para outra vez.

Abraço,

Miguel Pessoa



ENCONTROS IMPREVISTOS


Texto e desenho de Miguel Pessoa


Numa guerra que se pautou muitas vezes por actos bélicos de grande intensidade nos confrontos que opuseram as nossas tropas aos elementos do PAIGC, testemunhados nos relatos publicados neste blog, parecia estranha a existência em alguns locais da Guiné de um ambiente de "paz podre" ou, talvez melhor, "paz consentida", em que os dois beligerantes pareciam travar os seus instintos guerreiros, antes permitindo aos que ali viviam uma existência relativamente pacífica, em que a guerra parecia por vezes passar ao lado.

A Força Aérea habituou-se a evitar ataques em zonas consideradas tabus (por exemplo, o Como), não sendo mesmo autorizadas acções contra essas zonas.

Do lado contrário, podemos incluir a capital da província, Bissau, em que, salvo um ou outro caso, se vivia um ambiente de uma certa tranquilidade e serenidade, que contrastava com a atmosfera tensa e inquieta existente na maioria dos nossos aquartelamentos, e com o risco que representavam as deslocações entre eles.

Essa calma podia ser transportada até à Base Aérea nº12, em Bissalanca, que nos dois últimos anos da nossa presença no território nunca sofreu qualquer ataque, bem como ao percurso entre a Base e a cidade, que se considerava relativamente seguro.

Nunca consegui perceber como, num conflito que vivia essencialmente de emboscadas e ataques imprevistos às nossas forças, nunca se lembrou o IN de atacar a carrinha VW (vulgo TP9) que diariamente transportava as tripulações (pilotos e enfermeiras pára-quedistas) entre a Base e Bissau.

Assim, era regra ver a carrinha chegar à BA12, vinda de Bissau, pelas 06H00, transportando o pessoal de alerta, regressando a Bissau e entrando novamente na Base às 08H00 com os tripulantes que iniciavam a actividade normal.

À tarde, pelas 18H00, repetia-se a rotina da manhã com transporte dos tripulantes que moravam em Bissau, podendo a carrinha fazer ainda mais um transporte do pessoal que, por motivos de serviço, chegava mais tarde das suas missões.

Com a facilidade em escolher o timing certo, torna-se claro que havia grandes possibilidades de êxito de uma acção do IN contra esse transporte: uma simples bazucada poderia diminuir num repente a operacionalidade da Força Aérea no território em 15 ou 20% da sua capacidade, acrescido dos efeitos psicológicos negativos que daí adviriam.
O facto é que essa hipótese nunca se concretizou, embora às vezes comentássemos essa possibilidade.

Um dia em que uma evacuação se prolongou até mais tarde, houve necessidade de se efectuar um transporte extra da enfermeira envolvida nessa missão.

Passado um tempo razoável, começou a haver alguma preocupação sobre o que teria acontecido ao transporte, pois nem a enfermeira Giselda tinha chegado a Bissau, nem o condutor tinha regressado ainda com a carrinha à Base. Temeu-se que tivesse havido um acidente ou uma acção do IN contra a carrinha, mas logo o ambiente se desanuviou com a chegada do condutor e da enfermeira, transportando uma jibóia de bom porte, garantidamente morta, dado o estado em que apresentava a cabeça.

Esclarecida a situação, soube-se que no percurso para Bissau, ainda relativamente próximo da Base, o condutor tinha deparado com uma jibóia bem constituída que atravessava pachorrentamente a estrada por onde seguiam. Travou para evitar o obstáculo mas acabou por passar por cima dela, o que foi bem visível nos ressaltos dentro do carro...


Decidiu então o condutor manobrar a carrinha de modo a colocar o rodado em cima da jibóia, prendendo-lhe os movimentos e evitando que ela tentasse um ataque contra eles. Sendo um tipo decidido, saiu do carro e, como o animal se contorcesse para se libertar, sacando da chave de cruzeta das rodas desfechou-lhe uns golpes na cabeça, no que foi ajudado pela enfermeira, tão decidida como ele, entretanto munida de uma barra de desmontar os pneus, empenhando-se os dois em acabar com o sofrimento do animal.

Foi então que regressaram à Base, onde deixaram a cobra a cargo do Oficial de Dia às Operações, tendo finalmente demandado Bissau para ali deixar a enfermeira em casa.

Não sei se no relatório do Oficial de Dia constou algo sobre esse incidente envolvendo a jibóia, mas soou-me que algum dos presentes na unidade lhe aproveitou a pele ("sopraram-me" que tinha sido o Oficial de Dia...).

A carrinha continuou a circular até ao fim do conflito, transportando os tripulantes sem mais encontros imprevistos. Quanto à jibóia, provavelmente poderá andar a circular ainda por aí, nos sapatos ou mala de alguém... 

Miguel Pessoa
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Nota de M.R.: