sexta-feira, 6 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18492: Notas de leitura (1055): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (29) (Mário Beja Santos)

Imagem que encontrei no Arquivo Histórico do BNU referentes à documentação da empreitada de dois pavilhões para os trabalhadores do BNU em Bissau


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Novembro de 2017:

Queridos amigos,
É o mais inusitado dos relatórios, este com data de 1940, parece que se trocaram as posições, o gerente de Bissau escreve com a vibração do alto representante do Estado na colónia. Envia para o BNU de Lisboa um documento que supera as 100 páginas, falando das instituições bancárias existentes, das colheitas das obra e do movimento dos portos, da vida económica e financeira dos municípios, vias de comunicação, o preço médio local dos géneros alimentícios, quais as indústrias locais, serviços públicos, transportes, listagens das autoridades, ramos de negócio, estado da Fazenda Pública...
Por vezes mordaz e sardónico, desmistifica a pacificação dos Canhabaques, que ele classifica como farsa, lembra que há agitação para os lados do Gabu, e não contém a sua prosa moralística, isto a propósito do monumento erigido nesse ano de 1940 para glorificar a pacificação dos Canhabaques falando em indignidade e impudor, não escondendo o seu pasmo como não vão parar à cadeia estes ofensores da política de verdade que orientava o país.

Um abraço do
Mário


Ilustração de Bernardo Marques publicada no Anuário da Guiné, edição de 1946, coordenada por Fausto Duarte


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (29)

Beja Santos

Olhando para a documentação disponível no Arquivo Histórico do BNU referente a esta época, salienta-se a existência de um conflito entre os responsáveis do BNU em Bissau e Bolama, o de Bissau tem consciência dos seus poderes, o de Bolama, mesmo ciente da mudança da capital, responde grosseiramente ao funcionário mais categorizado. E temos a guerra, com as suas diferentes flutuações, as colónias francesas ao tempo do governo de Vichy e depois, em 1943 a chegada dos norte-americanos e britânicos em força ao Norte de África. Em 1941, o novo governador é Ricardo Vaz Monteiro, traz como primeira missão proceder à transferência do governo de Bolama para Bissau, seguir-se-á paulatinamente a vinda para a nova capital das outras repartições públicas. É um período atribulado, de carestia, de alta de preços e perda de poder de compra, as reclamações do funcionalismo são incessantes. Recorde-se que já o relatório de 1940 da agência de Bissau apontava para o estado calamitoso da filial de Bolama, com os seus pesados prejuízos anuais, o número de comerciantes minguava, ainda se acreditava em Bolama numa certa reanimação dada pelo transporte aéreo, será sol de pouca dura, a Pan-Am abandonará Bolama em 1945 quando os hidroaviões estiverem ultrapassados. O BNU em Bissau suspirava pela extinção da delegação de Bolama, para evitar mais prejuízos.

Este relatório de 1940 traz uma verdadeira novidade que é uma análise detalhada das instituições bancárias existentes, merece a nossa atenção:

“Desde Janeiro de 1903 em Bolama e em Junho de 1917 em Bissau que se fundou na Guiné o Banco Nacional Ultramarino, única entidade que vem exercendo o comércio bancário.
Não fica mal, hoje, a tanto ano já de distância daquelas para que o mais modesto gerente desta instituição preste, neste seu modesto trabalho, o seu preito de homenagem ao homem que teve a visão plena de estabelecer a indústria bancária portuguesas nas terras do ultramar português, prevendo o futuro enorme que as nossas colónias teriam desde que esse desenvolvimento fosse tão eficaz quanto elas careciam. Referimo-nos a Francisco de Oliveira Chamiço e não esqueço o nome ilustre também de José da Silva Mendes Leal, o estadista que promulgou a Carta de Lei de 16 de Maio de 1864.
É pois, o Banco Nacional Ultramarino o único banco estabelecido na colónia, em Bolama e em Bissau.

A existência da filial de Bolama, há anos já, encontra a sua justificação apenas em funcionar nela a “caixa do tesouro” que será transferida para Bissau logo que aqui passe a funcionar a direcção de serviços de fazenda. Tem sido esta a razão apresentada para não se fechar Bolama. Mas, na realidade, não é razão de peso. Há anos que é na agência de Bissau que entra o grosso das receitas do Estado. Basta dizer-se que, de toda a organização administrativa da colónia, apenas as administrações de Buba, dos Bijagós e a da própria Bolama, ou seja, aquelas que movimentam menos volume de dinheiro, ali fazem os seus depósitos. Os importantíssimos depósitos das administrações, Gabu, Bissau, Cacheu e Mansoa, entram todos em Bissau. E as receitas alfandegárias mais importantes da colónia são cobradas em Bissau, é na agência de Bissau que entram também.
Bissau é a vida da colónia.

Bolama, capital da colónia desde 1879, e que foi adquirida para a coroa portuguesa em 1828, por doação feita pelos gentios Bijagós (Canhabaques) ratificada em 1837, tendo tomado posse dela Honório Barreto, será, hoje, uma múmia recordativa dos tempos passados a que, por amor real, ou por interesse pessoal, ainda estão agarrados alguns velhos fanáticos – sem dúvida respeitáveis – mas cuja opinião pouco vale nem conta já para se evitar que a capital da colónia seja em Bissau.
Até há pouco tem havido quem, conscientemente, tenha feito bastante para que a capital se mantenha em Bolama e só a um ritmo de conta-gotas se têm passado para Bissau os serviços de: Justiça, Obras Públicas, Cadastro, Correios e Telégrafos, Saúde, Agronomia e Veterinária, Marinha e os Aduaneiros. As gentes de Bissau têm visto reduzidos os vastos prejuízos que resultavam de ter que andar constantemente a caminho de Bolama, para tratarem de qualquer assunto oficial, por vezes de mínimo valor”.

Infletindo o escopo das suas considerações, passa a discretear sobre a agricultura, referindo que a “Repartição Técnica dos Serviços Agrícolas, Florestais e Pecuários” pesa enormemente no orçamento da colónia, mas que é uma verba insuficiente para as reais necessidades, contudo demasiada em relação ao benefício que a colónia recebe devido à péssima organização dos serviços. E espraia-se em considerações:

“A Guiné poderia ser um inesgotável reservatório dos seus naturais produtos. Mas não há modernização, são tudo actividades tradicionais, feitas pelos indígenas, estes continuam a ser os únicos agricultores e produtores sem terem a menor assistência de dinheiros, de alfaias, de sementes ou de ensinamentos. Fazem o que se fazia há centenas de anos e como sempre viram fazer.
Como não observamos nenhum fenómeno climatológico que bendizesse ou prejudicasse as culturas; como não ouvimos falar que os indígenas semeassem menos este ano, somos naturalmente levados a pensar que as colheitas de 1940 serão, pouco mais ou menos, o que foram as de 1939.

O único fiel que vem servindo de base ao cômputo da produção é a exportação. Fiel sem confiança porque, para a merecer, a ele se precisa de adicionar o que se consome na própria colónia e o que sai deduzindo-se o que, em contrabando também, entra. Anos há em que as circunstâncias de momento trazem uma invasão de centenas ou mesmo de milhares de toneladas de produtos que em contrabando do ‘chão francês’ vêm a ser acusados na exportação. Na campanha da mancarra de 1940/1941, por motivos resultantes da guerra, é natural que entre muita mancarra francesa, tanto mais que há um certo retraimento nos compradores”. E lança uma farpa: “Em Bissau continua a Casa Gouveia na altura da campanha da mancarra fazendo transferência ilícitas, como sempre tem feito”.

Entende o gerente dar agora um quadro das obras públicas, fala da ponte-cais de Bolama e da ponte-cais de Bissau, neste caso é minucioso:

“A ponte-cais de Bissau já começou a cair aos bocados, principalmente no lado sudoeste da testa. Já nem lhe é permitido o acesso de veículos e não permite a atracação de vapores. Tinha duas escadas laterais, de acesso, do mar ao piso de trânsito. Uma delas caiu quando se procedia a um desembarque de passageiros de um escaler e só a um mero acaso se ficou devendo não ter resultado uma desgraça. A outra escada, já partida, também ameaça cair. A velhíssima ponte-cais do Pidjiquiti, em Bissau, está arruinada. Parte do paredão a Este já caiu há anos. Deste cais, resto de um velho fortim colocado fora do recinto das antigas fortificações, já se dizia e escrevia em 1852 que estava abatido e rachado e que pouco tardava para que não caísse. Pois é este velho cais que em 1940 está abatido e a ameaçar cair, tudo quanto serve para o serviço geral de passageiros e de carga e descarga. Para o movimento de passageiros, uma escada velha, gasta e escorregadia, de difícil acesso nas marés baixas e uma parede de uns metros de comprimento e de uns 50 centímetros de altura, por onde se faz o vai-vém de pretos e brancos dando lugar, por vezes, a cenas de cabeça fraca e a vertigens. De admirar é que não se tenha registado algum desastre. Mesmo esta parede, durante longos meses, ostentou um enorme e profundo buraco, mesmo no meio do pavimento de trânsito. Em boa hora Sua Excelência o Governador Viegas intimou os subordinados de Bissau a fazerem uma espontânea manifestação de simpatia que ia até à entrega das chaves da cidade. À pressa, tapou-se então o enorme buraco para se evitar acidentes e para que o povo da cidade não assistisse à cómica cena de ver o seu governador a passar o buraco a quatro pés para vir receber o avantajado taco de madeira que fazia de chave de Bissau. Triste citação é esta que nos envergonha tanto a estrangeiros como a nós próprios. Como podem carregar-se e descarregar-se, num cais sem espaço nem condições, os milhares e milhares de toneladas de importação e exportação geral da colónia e muitas dessas toneladas têm que passaram em tal cais? Não só muitíssimo e acanhado espaço mas ainda a localização contribuiu para as tão grandes dificuldades do tráfego. Na maré cheia, ainda se vão safando as lanchas, mas logo que esta baixe ficam estas totalmente a seco, não se podendo portanto movimentar nem dar lugar à carga ou descarga de outras. Assim, perde-se muito tempo e muitíssimo dinheiro”.

Depois deste olhar cáustico sobre o porto de Bissau, comenta a situação geral. Começa por dizer que a situação é lamentável em todos os outros ‘portos’ e recorda que se fala em rios da colónia que não são mais do que braços de mar. E diz o seguinte: “Tirando Binta, onde os barcos atracam a uma ou duas pontes de cibes que os particulares construíram, e Farim, regra-geral os barcos encostam-se e encalham-se no lodaçal imundo e profundo, numa aberta do tarrafal das margens, e há então um caminho indígena que é tratado como a ‘estrada de acesso ao porto”!
Nada mostra a ação do Estado. Tudo trabalho do particular. Mas quem se servir do “porto” que fez tem que pagar portagem ao Estado como se fosse um castigo por se servir de semelhante porto. E enumera a legislação respeitante a este imposto de portagem, diplomas de 1924, 1933 e 1939.

Quanto a movimento dos portos, refere que não há elementos publicados e os que passa a citar foram-lhe cedidos, a título particular, pelo capitão dos portos. Por motivos da guerra, está reduzida a navegação, deixaram de vir os navios nórdicos que carregavam mancarra para os respetivos países.

Tece novos comentários ao estado das infraestruturas: as obras há tanto tempo prometidas para a construção da ponte do Ensalmá; a ponte do Corubal, há pouco tempo inaugurada, e com o nome de Ponte General Carmona, tinha caído e não se abstém de dizer que a sua construção fora um ato verdadeiramente criminoso, um particular, dono de uma serração no Xitole construíra uma jangada à sua custa e pusera-a à disposição do Estado. Sempre cortante nas suas observações comenta a tal propósito: “Mas o Estado não compra a corda necessária e a jangada vai funcionando puxada por lianas amarradas umas às outras, numa inconsciente falta de noção do perigo, e este é tanto que, da única vez que fomos forçados a aproveitar tal jangada estivemos de um dia para o outro à espera que se arranjasse um momento em que se pudesse atravessar sem haver perigo. E meses são passados e tudo assim continua”. Parece haver perigos por toda a parte. Referindo-se ao local denominado Barro, estrada de Bissorã para a fronteira com o Casamansa, atravessa-se o rio de Farim numa jangada que faz prever muitos riscos, e diz: “A passagem nas vazantes é perigosa e o rio é muito fundo dando passagem no local a navios de cinco mil toneladas. Talvez por assim ser, é costume utilizar nesta jangada corda velha que já oferece perigo nas outras”. Fala na jangada de Bafatá, na jangada do rio Contubo, na projetada ponte do Cumeré, informa que na estrada Bissorã-Canchungo foi bem reparada a ponte e diz que é ali que se situa Braia, lugar histórico onde foram trucidados pelos Balantas, uns 39 homens de cavalaria, mais o seu valente comandante.

Volta-se agora para o transporte aéreo, esclarece que têm continuado os trabalhos no aeroporto de Bolama onde fazem escala os “Clippers” da Pan-Am, que fazem as carreiras postais e de passageiros entre Lisboa e a América, mais dizendo que também se projeta uma nova linha que irá da América do Sul à África do Sul e que iria utilizar o aeroporto de Bolama. Estavam suspensas as carreiras da “Elders Colonial Airways”. No aeroporto de Bolama foi construído um edifício destinado a observatório, constava que tinha muitos defeitos. Já estavam em funcionamento no aeroporto as transmissões radiotelegráficas e em acabamento a montagem das radiogoniométricas. É minucioso no que ao aeroporto diz respeito: que os serviços meteorológicos estão a funcionar; que no porto marítimo foram montadas duas bóias para amaração dos hidroaviões; que estão montados indicadores de vento mas que no aeroporto terrestre faltam instalações para os serviços alfandegários, de correios e saúde, faltando ainda aperfeiçoar as terraplanagens das pistas e iluminar e sinalizar estas.
E continua com o seguinte discurso:

“Têm melhorado um pouco as comunicações telegráficas da colónia e esta estaria hoje bem servida se o estalar da guerra, em 1939, não tivesse interrompido a montagem da estação radioemissora de Bissau. Bissau tem uma estação de onda média, para serviço interno da colónia e tem uma estação de onda curta, apenas com a potência de um quilovátio mas que liga a colónia com a metrópole. Bolama tem uma estação de ondas longas e médias e uma pequena estação de onda curtas. Pelo interior da colónia apenas existe um pequeno posto telegráfico da ilha de Bubaque. Os serviços telegráficos e telefónicos são precisamente os mesmos que existiam há anos e apenas se estendeu mais uma linha, a de Buba a Catió, em 1940”.

(Continua)
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Notas do editor

Poste anterior de30 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18469: Notas de leitura (1053): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (28) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 2 de abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18477: Notas de leitura (1054): Colóquio Internacional "Bolama Caminho Longe" (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18491: Manuscrito(s) (Luís Graça) (141): Soneto para ti, Joana, ao km 40 da tua autoestrada da vida


Soneto para ti, Joana,
ao km 40 

da tua autoestrada da vida


[foto à esquerda: Joana Graça, psicóloga, ilustradora e artista plástico, além de  contadora de estórias de se lhe tirar o chapéu; página do Facebook aqui]





Feita em julho de setenta e sete,
Para em plena primavera nasceres,
Tinhas olhos de amêndoa do Tibete,
E ordem para cresceres e viveres.

Joana, entras agora nos entas,
Troço da estrada da serenidade,
Parabéns, e vê lá se te aguentas
Até p’lo menos aos cem de idade.

Visto o teu filme em retrospectiva,
P’la fada Oriana foste fadada,

Mulher irrequieta mas criativa.

Filha querida e sempre bem amada,Não te falte a saúde e o talento
Para viver a vida a cem por cento.



Com uma lagrimazinha ao canto do olho,
os teus pais, que são ternos mas não eternos…
Alice e Luís

Alfragide, 6 de abril de 2018, 10h30

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Guiné 61/74 - P18490: Parabéns a você (1414): Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp da CART 3492, do Pel Caç Nat 52 e da CCAÇ 15 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor

Último poste da série de 4 de abril de 2018 Guiné 61/74 - P18482: Parabéns a você (1413): Agostinho Gaspar, ex-1.º Cabo Mec Auto do BCAÇ 4612/72 (Guiné, 1972/74); António Dias, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2406 (Guiné, 1968/70); Hernâni Acácio Figueiredo, ex-Alf Mil TRMS do BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70) e José Eduardo Reis Oliveira, ex-Fur Mil Enf da CCAÇ 675 (Guiné, 1963/65)

quinta-feira, 5 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18489: Tabanca Grande (461): Fernando Tabanez Ribeiro, ex-2.º Tenente da Reserva Naval (LFG "Lira" e "Cassiopeia", CTIG, 1972/73), 770.º tertuliano do nosso Blogue

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano Fernando Tabanez Ribeiro, ex-2.º Tenente da Reserva Naval (LFGs "Lira" e "Cassiopeia",  CTIG, 1972/73), com data de 4 de Abril de 2018:

Prezado Luís Graça,

Sempre que alguém se candidata a uma qualquer comunidade, faz sentido dar-se a conhecer aos futuros camaradas, bem como as razões de tal decisão. É o que me proponho fazer nas poucas linhas que se seguem, para não ser maçador.

Sou natural de Coimbra e tenho 71 anos (colheita de 1946). Fui para a Guiné em 1947 e obrigado a retornar ao torrão natal com 3 anos de idade, atacado pelas febres. Regressado à Guiné em 1952 para frequentar a 1.ª Classe em Teixeira Pinto (Canchungo), passei no ano seguinte a Bolama onde acabei por concluir a escola primária e o 1.º ano liceal em 1957, (o exame de admissão ao Liceu, fi-lo no Instituto Liceal Honório Barreto em Bissau). Meu pai era professor e minha mãe professora interina, por não possuir o Curso do Magistério.

Voltei à Metrópole, a fim de completar o Liceu em Coimbra e concluir o Curso de Eng.ª Química (IST) em Lisboa (1971).


Fernando Tabanez Ribeiro, "hoje"

Por ironia do destino, eis-me mobilizado para a Guiné em Comissão de Serviço Militar, como Sub-Tenente da Reserva Naval da Classe de Marinha (1972) e depois 2.º Tenente (1973), tendo exercido as funções de Oficial Imediato das LFG (Lancha de Fiscalização Grande) “Lira” e “Cassiopeia”. Estes navios faziam a vigilância dos rios Cacheu, Geba, Rio Grande de Buba, Tombali, Cumbijã e Cacine, das águas territoriais e davam ainda apoio, por vezes, a operações especiais de fuzileiros e comandos.


O 2.º Tenente da Reserva Naval Fernando Tabanez Ribeiro

Revi Bolama, mas nada era como dantes, há dezasseis anos atrás, em plena paz colonial. Os funcionários públicos e os comerciantes europeus tinham, debandado para Bissau e para a Metrópole e praticamente só se viam militares. O edificado da cidade permanecia o mesmo, aparentando alguns vestígios de degradação, mas nada comparado com o que veio a acontecer após a Independência… a ruína total... ou quase.

Devolvido à vida civil em finais de 1973 desenvolvi a minha actividade profissional como engenheiro na área da indústria alimentar, com funções técnicas, de consultoria e de gestão em Portugal e na R. P. Angola.

Já depois de aposentado, decidi recordar os meus velhos tempos, passados em Bolama, no livro “Guiné-Bolama. História e memórias” da Âncora editora, publicado no passado mês de Fevereiro, em que procurei descrever a cidade e a vivência da respectiva comunidade colonial local na década de 1950 quando, ainda há bem pouco, havia deixado de ser a capital da Província, em favor de Bissau (1941).

Fi-lo, sempre com a preocupação de dar ao leitor uma perspectiva do quadro histórico global da Guiné, desde os Descobrimentos até ao advento da Independência. O livro suscitou alguma divergência de pontos de vista entre Mário Beja Santos e eu, que os “camaradas da Tabanca” poderão avaliar, a partir das respectivas “notas de leitura” do Blogue. Devo dizer, que esta foi a razão próxima que me levou a solicitar a minha adesão ao Blogue, embora tal intenção estivesse presente no meu espírito, desde há algum tempo. O Blogue representa na verdade, um contributo inestimável para a História da Guiné e da Guerra do Ultramar.

E por hoje é tudo.

Para o Luís Graça e para todos os camaradas, vai um abraço do
Fernando Tabanez Ribeiro

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2. Nota de editor:

Sobre o livro "Guiné-Bolama História e Memórias"

Sinopse:

Considero muitíssimo interessante e em conformidade com o que se acaba de dizer a abordagem histórica feita sobre a escravatura na área do Golfo da Guiné… Igualmente interessantes são as abordagens históricas das cidades fortificadas e da Liga Guineense, a «Pacificação» de Teixeira Pinto ou a do desenvolvimento da África Ocidental Francesa em contraponto com o da Guiné Portuguesa. É completamente inédito o capítulo que se dedica às autoridades, funcionalismo e serviços com indicação expressa de nomes e actividades, origens académicas, raciais e religiosas, correlacionando até elementos de então com os que hoje estão presentes em diversos locais e funções. O mesmo tratamento é feito para o comércio e os comerciantes e outros moradores indiferenciados. São dados de uma enorme valia para a história política, económica e social da Guiné naquele período e que até agora não vi publicados por ninguém, entrando naquele conceito do próprio Autor de que "há sempre alguém que se interessa pelas histórias que os outros livros não contam".

Sobre o Autor
Fernando Tabanez Ribeiro:

Fernando Tabanez Ribeiro nasceu em Coimbra a 11 de Junho de 1946. Viajou para a Guiné Portuguesa ainda na primeira infância, onde fez a escola primária e o antigo primeiro ciclo dos Liceus na modalidade de ensino particular, em Teixeira Pinto (Canchungo) e Bolama. Voltou à Metrópole para concluir o ensino secundário em Coimbra e seguidamente, o curso de Engenharia Química (1971) do Instituto Superior Técnico em Lisboa. O conhecimento da sociedade na Guiné e particularmente em Bolama, nestes dois períodos marcantes da sua vida, em criança e na fase adulta, analisado à luz da nossa histórica presença naquele território, está na origem deste livro.
Regressado à Metrópole em 1973, desempenhou a sua actividade profissional na área da indústria alimentar como engenheiro, consultor e gestor, em Portugal e na R. P. Angola, encontrando-se hoje aposentado.

Detalhes do Produto:

SBN: 9789727806355
Edição ou reimpressão: 02-2018
Editor: Âncora Editora
Idioma: Português
Dimensões: 165 x 230 x 15 mm
Encadernação: Capa mole
Páginas: 224
Tipo de Produto: Livro
Coleção: Programa Fim do Império
Classificação Temática: Livros em Português > História > História da África

[Com a devida vénia a WOOK]

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3. Comentário do editor:

Caro Fernando Tabanez Ribeiro, está apresentado à tertúlia, com o número de inscrição 770.
Escusado será dizer que é muito bem-vindo a "bordo". A Marinha será o Ramo das Forças Armadas menos representado no Blogue, mas podemos dizer sem equívoco que são poucos mas bons.

Para os infantes, mais ainda para aqueles que como eu estiveram longe dos rios sinuosos e perigosos da Guiné, as peripécias com a Marinha, sejam ocorrências dentro de uma qualquer frágil embarcação, como era a maioria das que cruzavam aqueles rios, seja as em terra, vividas pelos bravos Fuzileiros, são lidas e sorvidas à custa do imaginário. Se na Guiné o terreno, mais ou menos seco, não facilitava a vida a ninguém, navegar naqueles rios, sempre a pensar nas marés para não ficar em seco, também era complicado.

Vamos ficar na expectativa das suas memórias da Guiné, sejam do tempo de menino ou de oficial da Marinha.

Abraço do camarada e amigo
Carlos Vinhal


LFG Cassiopeia


LFG Lira

Fotos: Com a devida vénia a Reserva Naval As 10 LFG Classe "Argos" na Guerra do Ultramar e ao nosso camarada Manuel Lema Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18483: Tabanca Grande (460): Gina Marques, nossa grã-tabanqueira nº 769... E não era sem tempo... A Gina foi o anjo da guarda, a enfermeira, a mulher extraordinária e corajosa, que deixou tudo (incluindo o emprego) para trazer à alegria da vida o seu homem., o António Fernando R. Marques, ex-fur mil da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71)... Um caso de (e)terno amor

Guiné 61/74 - P18488: (Ex)citações (335): a crítica "agridoce" de Mário Beja Santos ao meu livro "Guiné-Bolama, história e memórias" (Fernando Tabanez Ribeiro)


Fernando Tabanez Ribeiro [, foto que nos enviou o autor, e que será proximammete apresentado como membro da nossa Tabanca Grande, nº 770]


Capa do livro de Fernando Tabanez Ribeiro, "Guiné-Bolama, história e memórias" (Lisboa: Âncora Editora, 2018, 224 pp.)


1. Sobre o autor, Fernando Tabanez Ribeiro:

(i) nasceu em Coimbra a 11 de Junho de 1946;

(ii) viajou para a Guiné Portuguesa ainda na primeira infância, onde fez a escola primária e o antigo primeiro ciclo dos Liceus na modalidade de ensino particular, em Teixeira Pinto (Canchungo) e Bolama;

(iii) voltou à Metrópole para concluir o ensino secundário em Coimbra e seguidamente, o curso de Engenharia Química (1971) do Instituto Superior Técnico em Lisboa;

(iv) cumpriu o serviço militar na Armada entre 1971 e 1973, tendo sido mobilizado para a Guiné como oficial imediato de uma Lancha de Fiscalização Grande (LFG), navio patrulha das águas territoriais e dos principais rios da Província, durante a guerra colonial;

(v) o conhecimento da sociedade na Guiné e particularmente em Bolama, nestes dois períodos marcantes da sua vida, em criança e na fase adulta, analisado à luz da nossa histórica presença naquele território, está na origem deste livro;

(vi) regressado à Metrópole em 1973, desempenhou a sua actividade profissional na área da indústria alimentar como engenheiro, consultor e gestor, em Portugal e na R. P. Angola, encontrando-se hoje aposentado.

Fonte: Adapt. de Âncora Editora


2.  Mensagem do nosso leitor e camarada Fernando Tabanez Ribeiro, com data de 29 de março último:

Prezado Professor Luis Graça , editor do Blogue LG & Camaradas:

Dirijo-me a si deste modo, já que em breve formalizarei a minha inscrição no V/ Blogue, um ambicioso projecto que constitui hoje precioso acervo de documentação para a História da Guiné e da Guerra do Ultramar.

Apresento-me: sou o Fernando Tabanez Ribeiro, ex-militar miliciano da Armada em comissão de serviço na Guiné (1971/73) com o posto de 2º Ten. da Reserva Naval (Classe de Marinha) e autor do livro "Guiné-Bolama. História e memórias", da Âncora editora, recentemente vindo a público(26 Fev. 2018).

Digo-lhe ao que venho: o meu livro foi objecto de recensão por Mário Beja Santos nas colunas do V/ Blogue (Parte 1 em 15 Março seguida de Parte 2 em 26 Março), o que me leva a solicitar a divulgação do texto (em Anexo) no mesmo espaço. É o meu contraditório e,  de algum modo, uma crítica à crítica de MBS.

Antecipadamente grato pela V/ atenção envio cordiais saudações

Fernando Tabanez Ribeiro

3. "Guiné – Bolama, história e memórias" e a crítica de M. Beja Santos

por Fernando Tabanez Ribeiro

Li com muita atenção a análise crítica (Parte 1 e 2 do Blogue) de Mário Beja Santos [, MBS,]  do meu livro Guiné-Bolama (*), o que à partida, vindo de quem vem, me deixa lisonjeado, para mais, quando nos diz que leu atentamente tudo e por duas vezes. E mais satisfeito fico, ao constatar que o “Guiné-Bolama” justifica a pormenorizado exame de três páginas que dele faz MBS. Se o livro o não merecesse, certamente não perderia tempo com ele. Só por isso, o livro algum mérito terá.

A critica de MBS é “agridoce”, porventura mais acre do que doce, mas não me surpreende, pois tenho a noção de que, alguns dos factos e temas abordados, podem ser discutíveis e até mesmo objecto de alguma polémica. E ainda bem que assim é.

Comecemos pelo lado “doce” do mail introdutório à sua crítica, quando refere a “ternura e o saudosismo” da minha descrição e a compara com Fernanda de Castro, nome grande das nossas letras. Concordo em que este aspecto saudosista seja comum a ambos, o que muito me honra. No entanto, a minha vivência e da Mariazinha em África foram forçosamente diferentes, dadas as mudanças operadas na sociedade colonial, desde os anos vinte até aos anos cinquenta do meu tempo. A paisagem, no que se refere à “exotismo e à sedução”, continuaria a ter o mesmo efeito aos olhos do europeu, mas em relação ao “desconhecido” já não e ao paternalismo muito menos, porque entretanto muita coisa se passou na Guiné. Essa mudança tem a ver com Velez Caroço, Sarmento Rodrigues e principalmente ...trinta anos de aceleração do tempo histórico.

Há uma enorme diferença de grau quanto ao paternalismo das nossas visões, a dela e a minha. Apesar do longo caminho para a integração social que ainda faltava percorrer, a verdade é que a relação entre o patrão europeu e os criados indígenas (que continuavam a existir no meu tempo), não era a mesma e na escola, entre professores e alunos e de condiscípulos entre si, também não. Mas, no essencial estou de acordo com MBS neste ponto e havendo acordo, não há polémica.

Passemos agora ao lado acre da crítica propriamente dita, quando MBS começa por se interrogar (referindo-se a mim): “ ...a que público,em que sala de conversa ele se põe para falar de uma História da Guiné aos solavancos, glosando descrições já referenciadas em inúmeras obras, tudo contado até à
exaustão, tudo documentado e conhecido? Não se consegue entender.” E questiona-se sobre a razão porque “não relevei documentação científica recente acerca do que era a Guiné quando lá chegaram os portugueses, da literatura de viagens e das janelas para a presença portuguesa na Senegâmbia
no séc XVI, a exemplo do historiador guineense Carlos Lopes e José Silva Horta e Eduardo Costa Dias que constituem um património da historiografia luso-guineense de valor incalculável”, … e “não compreende a minha preocupação em voltar ao assunto da escravatura”. No entender de MBS, a descrição que faço do ciclo da escravatura é “consabida até à exaustão”, nada nos ensina de novo, rematando com Vitorino Magalhães Godinho [, VMG,], onde o essencial está dito e explicado.

A isto, eu limito-me a dizer: Valha-me Deus! É sabido que se escreveram milhares de livros e textos sobre História de Portugal, os quais necessariamente se reportam aos mesmos factos (não há outros). É óbvio que a esmagadora maioria destes autores se repetem de algum modo, na medida em que nos contam a mesma coisa de forma mais ou menos interessante, consoante o talento de cada um e a respectiva interpretação dos factos. Mas, basicamente dizem-nos o mesmo ou parecido. É certo que há autores inovadores, embora poucos, a começar por Fernão Lopes, a que todos os outros recorrem se querem falar acerca da crise de 1383-85 e a acabar modernamente, como muito bem diz MBS, em Magalhães Godinho, o “Papa” da economia e sociologia dos Descobrimentos e da Colonização, igualmente uma referência, pelo novo tipo da abordagem que faz da Expansão.

Quanto à Guiné, também André Álvares de Almada, António Carreira e Teixeira da Mota, além de outros em aspectos mais pontuais, são inovadores. São por isso fontes do conhecimento histórico. Mas haverá sempre muito para dizer, quanto mais não seja para efeitos de divulgação ou enquadramento de realidades sociais que se pretendem explicar, como modestamente pretende ser o “Guiné-Bolama”.

Tomemos como exemplo, o que MBS escreve no seu excelente trabalho, de parceria com Francisco Henriques da Silva, intitulado “Da Guiné portuguesa à Guiné-Bissau – Um Roteiro” (principalmente na sua 1ª parte dedicada à História da Guiné e tratada com grande pormenor), em que é tudo (ou quase), mais ou menos “consabido”, consoante o grau de conhecimentos dos respectivos leitores. Devo confessar que o li com muito agrado e que lá aprendi muita coisa que desconhecia ( por ignorância minha e não porque seja novidade o que lá vem descrito), embora não me tenha socorrido dele para o meu trabalho. 

Considero por outro lado que o “Roteiro” e o “Guiné-Bolama”, se dirigem a leitores com interesses diferentes, o primeiro para iniciados que queiram aprofundar o seu conhecimento global sobre a Guiné e o segundo de carácter mais superficial e numa perspectiva especialmente direccionada para
Bolama. Já agora, aproveito para me penitenciar pelo facto de, no meu livro, ter referido o “Roteiro” apenas na Bibliografia, sem uma palavra especial no miolo do texto, como de facto merecia.

Não sou historiador, nem sociólogo, tão pouco escritor, o que não me coíbe de ter opinião.E foi porque entendi que a minha vivência na Guiné e particularmente em Bolama durante a derradeira fase da época colonial deveria ser partilhada com os outros, que decidi escrevê-la, tanto mais que o desconhecimento do cidadão comum em relação à Guiné é enorme, o que é compreensível.  E o que sabem sobre a Guiné, confina-se normalmente à Guerra Colonial de que há ainda memórias vivas e pouco mais. O meu propósito limitou-se a transmitir ao leitor comum alguma coisa do que sei, e não a especialistas (a esses nada tenho para ensinar), exceptuando a descrição à lupa que faço de Bolama e da pequena comunidade colonial bolamense da década de 1950 que poderá, essa sim, ter algum interesse como contribuição sociológica confinada à micro-história e se perderia, não fosse este registo.

Aqui,  MBS é parco em encómios, limitando-se a referir a “ternura com que falo da rapaziada”.

Correndo o risco de me repetir, direi que a minha proposta foi apenas e tão somente, a de traçar um bosquejo histórico do que foi a Guiné Portuguesa, como apareceu e evoluíu ao longo do tempo, para a partir daí, dotar o leitor do enquadramento indispensável à compreensão do que foi, representou e como entrou em declínio Bolama, uma criação sui generis da nossa colonização, ao fim e ao cabo, o objectivo central a que me proponho. E nas palavras de um crítico que muito prezo, fi-lo “ ... sem renegar o passado da Guiné Portuguesa e pondo o dedo nas feridas coloniais, nas da transição e nas actuais ...”

É ainda nesta perspeciva de abordagem genérica do quadro histórico da Guiné que eu justifico a omissão dos nomes de Carlos Lopes, Silva Horta e Costa Dias, investigadores de referência de primeira linha no âmbito das “sociedades pré-coloniais da Senegâmbia e das trocas civilizacionais ocorridas com a presença portuguesa no séc. XVI”, como muito bem refere MBS. Trata-se de estudos claramente do domínio de especialistas e investigadores e que se situam para além do nível de divulgação, como é o caso de “Guiné-Bolama”.

E aqui, volto a lembrar uma vez mais, que o meu objectivo central é Bolama.

Se já em relação a outros temas estruturantes, MBS considera que me alonguei de mais, então se entrasse em linha de conta com todos estes aspectos... nem daqui a dois anos acabaria de escrever o livro.De qualquer modo aqui fica o mea culpa pelo facto de não ter citado estes autores, ao menos na Bibliografia, a qual, enferma ainda de outras lacunas (reconheço).

Do exposto, espero que MBS tenha ficado com uma ideia de qual é a “sala de conversa em que me situo” e por conseguinte qual é o “público” a que me dirijo (não é a ele com certeza, que é um especialista).

Outro ponto: Discorrer sobre a escravatura como tema fulcral do quadro histórico da Guiné colonial parece-me inevitável, ou não fosse este período a principal razão de ser da nossa presença na Guiné ao longo de três séculos e meio, ou seja, muito mais de metade de um total de cinco séculos, desde os
Descobrimentos até à Independência. Aqui, para além de ser criticado pelo tema “consabido até à exaustão”, também o sou por ter, pretensamente, “desassombrado” o esclavagismo português face ao de outras potências europeias. Uma tal asserção só pode ter a ver com o facto de eu ter enfatizado
a justificação do nosso pioneirismo nesse campo, no que teria sido entendido como uma defesa do nosso esclavagismo, ou por ter analisado o sistema com os óculos da época em que isso aconteceu e não pelos critérios de hoje, ou por ter associado ao negócio os irmãos étnicos dessas vítimas, realçando a sua coparticipação no tráfico a par dos negreiros ou ainda porque importa condenar,
avant tout, o colonialismo português, independentemente dos contextos em que se insere.

É certo que MBS também não rejeita a minha análise, antes se limita a referir que tudo foi dito e explicado por VMG, sendo por isso redundante voltar a falar nisso, “remexendo em matéria consabida” como ele diz. Eu não penso assim e entendo que é, e continua a ser, um dever imperativo insistir na cabal e correcta clarificação desta questão central, até porque desse modo, estou também a defender o meu país. Alexandre Sousa Pinto no Prefácio do “Guiné-Bolama” está em sintonia com isto, o que me faz sentir confortável. Não sou inocente, na medida em que há autores (MBS pensa que são “fantasmas” mas eu afirmo-lhe que eles existem e não são poucos), que continuam a iludir muita gente com informação tendenciosa, ou ideologicamente retorcida a ponto de subverter a verdade e que estão apostados em classificar o nosso colonialismo, incluindo a vertente esclavagista, como sendo o pior de todos, ou dos piores. 

Penso que são benvindas todas as contribuições no sentido de valorizar a análise do tema com verdade, imparcialidade e distanciamento a fim de pôr termo a tais equívocos. Daí a minha intransigência nesse ponto, bem explícita desde logo na dedicatória do meu trabalho, quando afirmo: Dedico este livro a Bolama, à Guiné Portuguesa e ao meu país. Não incluo MBS neste rol, mas que a sua posição de omitir o tema, alegando que “Há dezenas de anos que está tudo dito sobre o assunto”, não ajuda muito, lá isso é verdade.

MBS considera ainda que a minha narrativa do quadro histórico da Guiné, é feita “aos solavancos”e aqui terá alguma razão; eu próprio me apercebi disso, obrigando-me a reformular o texto por forma a minimizar o defeito. Isso decorre da minha tentativa de conciliação da abordagem temática (mais clara e elucidativa) de certos assuntos, sem perder o fio cronológico dos acontecimentos, igualmente importante. O discurso ganha em clareza mas admito que tenha custos (os tais “solavancos”).

A 2ª Parte da recensão nada nos traz de novo. Que é matéria mais que conhecida, o não envolvimento da PIDE no assassinato de Amílcar Cabral e o papel de Sekou Touré, as várias hipóteses goradas visando a Independência da Guiné, assim como a triste sucessão de golpes, confrontações, a luta pelo
poder, a venalidade, etc, que continuam a marcar o quotidiano do cidadão comum desde a Independência até hoje, a justificar o desencanto dos guineenses, dando exemplos de vários autores e trabalhos onde tudo isso vem explicado.

Eu por mim, continuo a achar que faz sentido a abordagem destes assuntos, ainda que a traços largos, para assim fechar o quadro histórico da realidade em que se insere Bolama, tanto mais que o faço por palavras minhas.Falei da Guiné antes de Bolama e voltei a falar dela depois da Bolama “moribunda” que antecede a Independência, procurando caracterizar a Guiné nos seus aspectos mais conspícuos. 

Faz ainda um reparo, nomeadamente a falta de rigor quando digo que AC teria sido expulso por Melo e Alvim. É um aspecto que pouco afecta a narrativa do curso dos acontecimentos mas, o rigor acima de tudo e terá razão MBS, pois não duvido da credibilidade das suas fontes.

MBS termina com ainda com dois reparos à melhor obra que, do meu ponto de vista se produziu até hoje sobre a História da Guiné (1879-1926) de Armando Tavares da Silva [ATS]. Acontece que, precisamente à hora de concluir este meu arrazoado, acabo de tomar conhecimento dos esclarecimentos dados pelo professor ATS sobre este assunto...e mais não digo. (**)

A “decepção” de MBS acerca do meu livro “Guiné-Bolama” é precisamente a mesma que para mim representou a sua recensão.

Fernando Tabanez Ribeiro
_____________

Notas do editor:

(*) Vd.postes de:


26 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18460: Notas de leitura (1052): “Guiné-Bolama, História e Memórias”, por Fernando Tabanez Ribeiro; Âncora Editora, 2018 (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18487: (D)o outro lado do combate (24): estudo sociodemográfico: o caso do bigrupo do cmdt Quintino Gomes (1946-1972) (Jorge Araújo)



Foto nº 1 > Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Xime > Estrada Xime-Bambadinca > Ponta Coli  22 de Abril de 1972 > Local do combate com o bigrupo do PAIGC, comandado por Mário Mendes (1943-1972). A cor vermelha indica as posições dos elementos do bigrupo. A linha azul refere a distribuição das NT, após o início da emboscada dirigida às duas viaturas em que nos fazíamos transportar.


Foto nº 2 > Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Imagem da progressão de uma força da CCAÇ 12, a 3 Gr Comb. (do camarada Luís Graça), no subsector do Xime, na época das chuvas. Foto do ex-fur mil at inf Arlindo Roda, com a devida vénia. Poste P10209.


Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 
(Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do blogue desde março de 2018



GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE > UM NOVO OLHAR SOCIODEMOGRÁFICO DE UM BIGRUPO > O CASO DO BIGRUPO DO CMDT QUINTINO GOMES (1946-1972) 

1. INTRODUÇÃO


Em Dezembro de 2016 apresentei no fórum da «Tabanca Grande» – P16865 – aquele que foi considerado o primeiro estudo sociodemográfico de um bigrupo de guerrilheiros, com o título «Mário Mendes (1943-1972) - O último Cmdt do PAIGC a morrer no Xime».

A vontade, o interesse e a motivação para a realização deste estudo, nascera há quatro décadas e meia atrás, naquele já longínquo «22 de Abril de 1972», sábado, e que no mesmo dia, mas do ano seguinte (1973), correspondeu ao Domingo de Páscoa. E a principal razão estava ligada ao meu "baptismo de fogo", e ao do meu Gr Comb (o 4.º) da CART 3494, episódio dramático ocorrido no lugar designado por «Ponta Coli», na estrada Xime-Bambadinca, local onde diariamente cada um dos 3 Gr Comb, em regime de rotação, desempenhava a missão de garantir a segurança a pessoas e bens, civis e militares, em trânsito de ou para Bissau, por via marítima.

Aí aconteceu o primeiro grande combate da CART 3494, em que estiveram frente a frente, a uma distância de escassas dezenas de metros, um efectivo de 20 operacionais, mais 2 condutores e o picador Malan Quité [NT], e um bigrupo reforçado do PAIGC, superior a cinquenta unidades que, agindo de surpresa como seria espectável, e habitual, nos procurou aniquilar. Alguns dias depois, soube-se que tinha sido o bigrupo do Cmdt Mário Mendes. [Vd, foto nº 1, acima].

Desse combate resultaram dezassete feridos, entre graves e menos graves, e um morto, o meu/nosso camarada furriel Manuel Rocha Bento (1950-1972), natural da Ponte de Sor, a nossa única baixa em combate. Eu saí ileso, o mesmo acontecendo aos condutores das duas viaturas e mais dois operacionais do meu Gr Comb.

Do outro lado, ainda não consegui apurar as consequências de tamanha ousadia.

Quatro semanas após ter organizado e comandado aquela emboscada na «Ponta Coli», voltaríamos a estar com Mário Mendes e o seu grupo, em novo frente a frente, desta feita na Ponta Varela (zona mítica do Xime), em 25 de Maio de 1972, 5.ª feira, quando este se preparava para realizar nova "aventura". Aí Mário Mendes viria a morrer, por intervenção de elementos da CCAÇ 12 (ex-CCAÇ 2590) [, vd.foto nº 2 , acima], na acção «Gaspar 5», em que participaram seis Gr Comb [três da CART 3494 e três da CCAÇ 12], tendo-lhe sido capturada a sua Kalashnicov, bem como três carregadores da mesma e documentos que davam conta do calendário das "acções" a desenvolver naquela zona pelo seu bigrupo. [vidé P12232 + P9698].

Foi a partir desse(s) palco(s) do TO, onde se praticava o "jogo da sobrevivência", durante o qual se fazia apelo à superação permanente, ou transcendência, individual e grupal, que no meu processo cognitivo emergiram um certo número de questões/ interrogações, por exemplo:

"Quantos e quem eram aqueles que tinham estado à minha/nossa frente, e se puseram em fuga passados 15/20 minutos? Quais os seus nomes? Onde nasceram? Que idade tinham? Há quantos anos andavam naquela vida? Como viviam e de que se alimentavam?... Ou seja, alguns enigmas da guerra."

Algumas das respostas consegui obter, justamente, naquele primeiro estudo.

Hoje, passados quinze meses após a realização desse primeiro trabalho, volto de novo ao fórum para apresentar/partilhar um segundo estudo, concretizando, deste modo, uma promessa que formulei a mim mesmo de o fazer logo que encontrasse uma amostra semelhante à do primeiro. E isso aconteceu… e ainda bem!

Assim, utilizando a mesma metodologia do primeiro caso, este novo estudo tem como universo o bigrupo do Cmdt Quintino [Amisson] Gomes (1946-1972), morto em combate, em Fevereiro de 1972, nos arredores de Empada, região de Quínara, ao tempo da CCAÇ 3373, "Os Catedráticos de Empada", ou seja, três meses antes do Cmdt Mário Mendes (1943-1972).



2. QUINTINO [AMISSON] GOMES, CMDT DE BIGRUPO EM ACÇÃO NA REGIÃO DE QUÍNARA


O presente estudo sociodemográfico sobre o bigrupo do Cmdt Quintino Gomes nasce por ramificação da investigação que tenho vindo a realizar a propósito do "relatório relacionado com as operações militares na Frente Sul", acções efectuadas na região de Quinara e de Tombali, durante o último trimestre de 1969, uma vez que nele é referido o seu nome.

Soube que Quintino Gomes era Cmdt do bigrupo do PAIGC e que actuava no Sector de Cubisseco de Baixo, tendo por missão, até meados de 1969, controlar a estrada de Nhala, que passa em Uana, antigo quartel das NT, em direcção a Mampatá.

Quintino Gomes nasceu em 1946 [desconhece-se o dia e o mês], na vila de Empada, na região de Quinara. Era casado. Em 1962 aderiu ao PAIGC, com 15/16 anos, como aconteceu com muitos outros, de que é exemplo o caso de Mário Mendes, desde quando deu início à sua actividade na guerrilha. Era Cmdt de bigrupo, pelo menos desde 1966, ano que foram elaboradas pelo organismo de Inspecção e Coordenação do Conselho de Guerra as listas [mapas] das FARP referentes à constituição dos bigrupos existentes em cada Frente, conforme demonstra o exemplo abaixo, onde consta o nome de Quintino Gomes e de mais trinta e três elementos.

Como reforço do acima exposto, no "Relatório da Comissão de Inspecção das FARP para a Frente Sul e Leste", datado de 21 de Maio de 1969, e assinado por Pedro Ramos, consta que, após reunião de 9-3-69 (Bigrupo de Quintino Amisson Gomes e de Pana Djata), "este bigrupo que se encontra estacionado a uns quilómetros do antigo quartel inimigo [NT] de nome Uana (Tabanca) tem como missão de controlar a estrada de Nhala, que passa em Uana em direcção a Mampatá. Na primeira formação do bigrupo, este perdeu uma AK[-47]. A última operação efectuada foi em 15-2-69 no aquartelamento de Nhala. O último contacto com o Comando do sector foi em Janeiro de 1969. Com o Comando da Frente nunca tiveram contactos no lugar de estacionamento. A última reunião do Comissário Político do bigrupo com os combatentes teve lugar no dia 28-2-69. O comandante do sector, o camarada Iafal Camará, declarou que tem reunido com os combatentes sempre no fim de cada mês".




Citação: (1969 [05-21]), "Relatório da Comissão de Inspecção das FARP para a Frente Sul e Leste", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/ fms_dc_40080 (2018-3-15) (p. 12/37; com a devida vénia à Fundação Mário / Casa Comum / Arquivo Amílcar Cabral)).


Ainda no que concerne ao Cmdt Quintino Gomes, o "Relatório sobre o Sector de Cubisseco de Baixo", elaborado por José [Eduardo] Araújo (1933-1992), datado de 10 de Dezembro de 1971 e enviado a Amílcar Cabral (1924-1973), refere que […] "Tive uma impressão muito boa do camarada Quintino Gomes, comandante do sector, que tem rara "particularidade" de nunca ter visto o Secretário-Geral, facto que lamenta. Da opinião de toda a gente trata-se de um bom camarada. Escreve razoavelmente, o que significa que tem algum grau de instrução primária [3.ª classe]".




Citação: (1971), "Relatório sobre o Sector de Cubisseco de Baixo", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40043 (2018-3-15) (p. 11/23; com a devida vénia).


Dois meses depois deste relatório, em [?] Fevereiro de 1972, Quintino Gomes morreria em combate na vila que o viu nascer – Empada.

Em 25 de Fevereiro de 1972, em carta enviada a Marga, nome de guerra de  "Nino" Vieira (1939-2009), em resposta às suas missivas de 11 de Janeiro e 15 de Fevereiro [1972], Amílcar Cabral (1924-1973) lamenta a morte do Cmdt Quintino Gomes nos seguintes termos: […] "Mas os camaradas têm que ter muito cuidado nos ataques, para não acontecer o que se passou em Empada no último ataque [que teria sido antes de 15Fev'72]. Lamento muito a perda do camarada Quintino Gomes que era dos nossos melhores combatentes e quadros do Partido. Discutiremos na próxima reunião da Direcção a tua proposta para que seja considerado herói".





Citação: (1972), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net /11002/fms_dc_34493 (2018-3-8)


Entretanto, no passado domingo, 4 de Março de 2018, numa feliz coincidência para a conclusão deste trabalho, o jornal  Correio da Manhã publica uma entrevista com um camarada (não identificado, mas certamente o da foto abaixo) da CCAÇ 3373, "Catedráticos" (Empada, Mai'71 a Mai'72), conduzida pela jornalista Fernanda Cachão.



No contexto desta narrativa, e como elemento de validação da data da morte do Cmdt Quintino Gomes, citamos a seguinte passagem: […] "Foi no mês de Fevereiro desse ano [1972], tínhamos feito uma operação em que apreendemos muito material de guerra – e feito também mortos e feridos -, e tal como à ida regressámos já de noite. Fomos atacados por canhões sem recuo e foguetões ["GRAD"]. Tínhamos chegado ao aquartelamento em Empada, e foi terrível". […]


Em função deste depoimento, não me é difícil aceitá-lo como elemento factual relacionado com o episódio da morte do Cmdt Quintino Gomes. Será que esta é também a opinião do fórum do jornal Correio da Manhã ?





Imagem do camarada [não identificado] da CCAÇ 3373 (Empada e Bissau, 1971/73), entrevistado pela jornalista Fernanda Cachão, do Correio da Manhã, e publicada em 4.3.2018, em http://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/uma-mina-levou-a-perna-ao-furriel-rente-ao-joelho? ref=HP_Ticker CMAoMinuto, com a devida vénia.






3. RESULTADOS DO ESTUDO

A partir dos dados contidos na lista acima [mapa], que consideramos como os casos da investigação ou a "amostra de conveniência", procura-se compreender melhor quem estava do outro lado do combate. Com este propósito, procedemos à organização de alguns desses dados referentes a cada um dos sujeitos constituintes do "bigrupo de Quintino Gomes", sobre os quais pretendemos retirar conclusões.

Para o efeito, esses dados foram agrupados quantitativamente e apresentados em quadros estatísticos de frequências (caracterização da amostra por idade: a de nascimento e a de adesão ao Partido) e de quadros de variáveis categóricas em relação aos restantes elementos (ano de adesão ao PAIGC e idade e anos de experiência cumulativas ao longo do conflito).





Quadro 1 – distribuição de frequências em relação ao ano de nascimento dos elementos do bigrupo de Quintino Gomes (n-34)


Da análise ao quadro 1, verifica-se que os anos de nascimento com maior percentagem são dois: 1941 e 1945 (14.7%) com 5 casos cada, seguido de 1947 (11.8%), com 4 casos, e 1934, 1942 e 1944 (8.9%), em terceiro, com 3 casos cada.

Quando analisado por períodos, verifica-se que o maior número de casos (n-16) estão os nascidos entre 1943 e 1947 (47.1%) (grupo central), entre 1933 e 1942 (n-13= 38.2%) (grupo dos mais velhos), e entre 1948 e 1952 (n-5=14.7%) (grupo dos mais novos).




Quadro 2 – distribuição de frequências em relação à idade de adesão ao PAIGC dos elementos do bigrupo de Quintino Gomes (n-34)


Da análise ao quadro 2, verifica-se que a idade com maior percentagem de adesão ao Partido é 16 anos, com 7 casos (20.6%), seguida dos 17 e 21 anos, com 4 casos cada (11.8%). As idades de 18, 19, 22 e 23, com 3 casos cada, valem no seu conjunto 35.2%.

Quando analisada a adesão ao Partido por períodos, verifica-se que o maior número de casos (n-14) estão entre as idades de 14 e 17 anos (41.2%) (mais novos), seguido pelos grupos de idade média, entre os 18 e 21 anos, e idade superior, entre os 22 e 30 anos (mais velhos), com 10 casos cada (29.4%).

Analisada a adesão ao Partido entre os 18 e 23 anos, os valores apontam para uma maioria relativa com 16 casos (47.1%), seguida por 14 casos nas idades inferiores (41.2%) e somente quatro casos nas idades superiores (11.7%).




Quadro 3 – distribuição de frequências em relação ao ano de adesão ao PAIGC dos elementos do bigrupo de Quintino Gomes (n-34)



Da análise ao quadro 3, verifica-se que o ano onde se registou maior adesão ao PAIGC foi 1963 com 11 casos (32.4%), seguido de 1962, com 10 casos (um dos quais Quintino Gomes) (29.4%). O ano de 1964 foi o terceiro com 7 casos (20.6%)

Quando analisada a partir da soma dos dois primeiros anos (1962 + 1963), anos de preparação e início do conflito, a percentagem sobe para 61.8% (n-21).



Quadro 4 – distribuição de frequências em relação à idade verificada ao longo do conflito, contados após a adesão individual ao PAIGC, no caso dos elementos do bigrupo de Quintino Gomes (n-34)


Da análise ao quadro 4, e partindo da hipótese meramente académica de que o bigrupo se manteve constante ao longo do conflito, pelo menos até Fevereiro de 1972, data da presumível morte de Quintino Gomes, este teria, então, vinte e cinco/seis anos [sombreado castanho]. Os restantes elementos teriam a idade referida na linha [sombreado verde] do ano de 1972.




Quadro 5 – distribuição de frequências em relação ao número de anos de experiência na guerrilha ao longo do conflito, contados após a adesão ao PAIGC, no caso dos elementos do bigrupo de Quintino Gomes (n-34).

Da análise ao quadro 5, e partindo da hipótese meramente académica apresentada no quadro anterior, Quintino Gomes teria, no mínimo, nove anos de experiência na guerrilha [sombreado castanho], bem como de outros nove combatentes. Os restantes elementos teriam os anos de experiência referidos na linha [sombreado verde] do ano de 1972.




Quadro 6 – Elementos sociodemográficos de comparação entre os sujeitos do estudo – Quintino Gomes (n-34) e Mário Mendes (n-38) – a partir das variáveis categóricas em análise, para efeito da elaboração de conclusões.


4. CONCLUSÕES


Partindo da análise aos resultados apurados, apresentados nos quadros acima, procedemos à elaboração de um último quadro (o 6.º), este comparativo entre os dois comandantes de bigrupos, considerados como os "casos" da investigação (Quintino Gomes e Mário Mendes).

Da análise ao quadro supra concluímos:

(i) a diferença de idade entre ambos era de 3 anos, sendo Quintino Gomes o mais novo, nascido em 1946;

(ii) nasceram em locais diferentes, separados por dois rios importantes da Guiné: o Rio Geba e o Rio Grande de Buba; Mário Mendes mais a Norte (Região do Oio - Frente Norte); Quintino Gomes, mais a sul (Região de Quinara - Frente Sul);

(iii) ambos aderiram ao PAIGC no mesmo ano (1962): Quintino Gomes, com 15/16 anos, e Mário Mendes, com 18/19 anos; morreram em combate dez anos depois, também no mesmo ano (1972), com uma diferença de três meses entre si; cada um deles teria, aproximadamente, o mesmo tempo de experiência como combatente;

(iv) quanto às lideranças: Quintino Gomes foi Cmdt de um grupo de guerrilheiros com média de idades mais alta (28.1/34, em 1972), quando comparada com a do grupo do Cmdt Mário Mendes (27.9/38, em 1972);

(v) quanto às idades: a maioria dos elementos do grupo de Quintino Gomes eram mais velhos que ele (n-20=58.8%) em comparação com os mais novos (n-9=26.5%); por outro lado, a maioria dos elementos do grupo de Mário Mendes eram mais novos que ele (n-22=57.9%), enquanto os mais velhos eram metade dos mais novos (n-11=28.9%).

Caso surja outra oportunidade de investigação semelhante, prometo realizá-la e partilhar no fórum os seus resultados.

À vossa consideração.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

26MAR2018.
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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18448: (D)outro lado do combate (23): "Plano de operações na Frente Sul" (Out-dez 1969) > Ataque a Bolama em 3 de novembro de 1969 - II (e última) Parte (Jorge Araújo)

Guiné 61/74 - P18486: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXVi: Gabu, set 67 / fev 68, gozando as delícias da "tabanca do Morteiros", alcunha do alf mil Azevedo, cmdt do Pel Mort 1191, alentejano de Évora


Foto nº 2 >  1968


Foto nº 3  > Janeiro de 1968


Foto nº 4 >  26 de dezembro de 1967


Foto nº 5 >  Janeiro de 1968 


Foto nº 6 > Janeiro de 1968


Foto nº 7 > 21 de janeiro de 1968


Foto nº 7A > 21 de janeiro de 1968


Foto nº 8 > 21 de janeiro de 1968


Foto nº 9 > 21 de janeiro dwe 1968



Foto nº 10 > Janeiro de 1968


Foto nº 11 > Janeiro de 1968


Foto nº 12 > Fevereiro de 1968

Foto nº 13 > Dezembro de 1967.


Foto nº 1 > Setembro de 1967

Guiné > Região de Gabu  > Nova Lmago  >  CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69).



Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69), e que vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado [, foto atual à direita]. (*)


Guiné 1967/69 - Álbum de Temas > T033 – A Tabanca do Morteiros

I - Anotações e Introdução ao tema:


A – História do Sector L3 – Nova Lamego – Parte I:

INTRODUÇÃO:

Vou dar início à história do meu batalhão no sector L3 de Nova Lamego.

Para isso vou servir-me, porque já não preciso de escrever mais nada, dumas páginas do meu livro – não editado – onde já desde 2010 contava esta fase da minha história.

O teor e a forma de escrever e exprimir-me pode parecer estranho, mas isto passa-se em vários meses e até anos – 2010 a 2015 -, e em cada momento a nossa vida muda e também o humor e a forma de encarar tudo isto.

Vou mandar as fotos que já recolhi da minha vivência em Nova Lamego com o comandante do Pelotão de Morteiros 1191, que esteve em Nova Lamego entre abril de 1967 e março de 1969, às ordens do BCAÇ 1933 e depois do BCAV 1915].

O alf mil Azevedo   tinha uma casa e uma vida independente de todos os outros. Fiz uma boa amizade, com este alentejano, vindo de Évora, no centro do Alentejo. Fui-me deliciando com os seus petiscos que ele próprio fazia na sua casa, a que passei a chamar sempre de a Tabanca do Morteiros’ e era para lá que ia quando me era possível, pois não faltava nada lá na sua Tabanca. Ele era independente e acho que nunca saiu de Nova Lamego, pelo menos nos 5 meses que lá passei.


B - Fotos do tema T033 – Imagens da Tabanca do Morteiros no Gabu:

Legendas e numeradas de f1 a f13

F01 – Este era o edifício em pedra e cimento, sede de comando do Pelotão de Morteiros 1200, comandado pelo Alferes Miliciano Azevedo. Ele aparece na foto, na porta de entrada e comigo nas cavalitas, eu era uma pena nas mãos daquele homem. Esta primeira foto data do mês de Setembro, quer dizer que ao fim de menos de uma semana eu já tinha ali um amigo. Ele também precisava de mim, dada a minha função, ele já estava lá quando chegamos e sabia do antecedente que dependia muito de eu lhe facilitar a vida, ou não.

F02 – As fotos não estão por ordem cronológica, por isso esta já é de data bastante posterior. Por ali se vê que não falta nada em termos de condição de vida, cozinha, cama , mesa e roupa lavada, um rapaz negro como criado, ar condicionado – entenda-se ventoinhas – frigorifico, arca, estereofonia, só faltava mesmo era a TV e um Telemóvel última geração. Na foto está o Azevedo, eu ao lado, e também o Furriel Rocha, o tal algarvio que já falei que foi ali cair de paraquedas, e não queria outra vida, pois não fazia nada. A foto data já dos inícios de 1968.

F03 – Uma foto a descansar sobre uma rede que também ele lá tinha, para dormir a sesta. Era uma forma de passar os tempos livres. Datada também de Janeiro de 1968.

F04 – Numa sala com todas as comodidades, os roncos pendurados nas paredes, cartazes de férias, não falta nada. Eu estou mais uma vez de Oficial de Dia, e pelos vistos devo ter escorregado pois tenho um penso no braço, de certeza nem me lembro de que foi aquilo. Só sei que estamos no dia 26 de Dezembro de 1967, um dia depois do Natal de 67. A cabeça já está toda rapada, pois foi por indicação dele, que andava sempre careca, e fiz isso depois de uma praga de piolhos que apanhei e assim acabei com tudo de uma só vez.

F05 – Uma brincadeira à entrada da Tabanca do Morteiros. Não sei se ele não me deixava entrar? Janeiro de 68.

F06 – Fumando o meu cigarro, à entrada da Tabanca do Morteiros. Eu fumava não por vício, mas por prazer da boca, nunca travei o fumo, por isso mais tarde optei pelos puros – os charutos Cubanos, foram mais de 15 anos, mas nunca me viciei e assim hoje não fumo. Data de Janeiro 68.

F07 – Fui dar uma volta pelas ruas na Bicicleta do Azevedo, junto à sua residência oficial, ele tinha boas instalações naquela terra que havia alguma coisa que se aproveitava, pelo menos o clima era mais quente mas mais seco. Data 21Jan68.

F08 – Na comezaina na Tabanca do Morteiros, em camisola interior o nosso ten SGE Albertino Godinho, Chefe da Secretaria, e o homem do confiança do nosso comandante. Veja-se os olhos do miúdo empregado, a olhar para os pratos. Será fome ou apetite? 21 de janeiro de 68.

F09 – Nós os dois num repasto na hora do almoço, ainda fardado, acho que me lembro que eram uns ovos escalfados com chouriça, acompanhado de cerveja. Aquilo era um restaurante 5 estrelas e uma Michelin. Nova Lamego,  21 jan 68

F10 – Na mesma Tabanca, o nosso médico ten Carlos Parreira Pinto Cortez, e sua esposa, sempre presente em toda a nossa estadia em Nova Lamego. Havia condições para isso. Também eram convidados para a Tabanca. Eles estão a arregalar os olhos por me verem a beber, não sei, mas pelos risos deve ser isso. Nova Lamego,  jan 68.

F11 – Na mesma Tabanca, agora também com o Furriel Rocha – cuidado com o enorme membro dele,  nunca o vi nem tive curiosidade, mas ele nunca andou de calção curto, teria medo de a ‘coisa’ sair fora do calção? Lá estava eu deitado a dormir a sesta, com música de fundo, mas sempre de olho alerta. Nova Lamego, jan 68.

F12 – O Alferes Azevedo com o seu boné, à porta da sua Tabanca, e eu a conduzir o seu Jeep, pois ele tinha direito a essa Mordomia – Era ‘El Comandante’! -. Também tive umas lições de condição neste jipe. Nova Lamego,  fev 68

F13– No jipe do Morteiros, na porta da sua Tabanca, ainda no ano de 1967. Andava a dar as primeiras lições no seu jipe.  Nova Lamego,  dez 67.

Em, 05-03-2018

Virgílio Teixeira

«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BATCAÇ1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».
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Nota do editor: