segunda-feira, 20 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24156: Notas de leitura (1565): Pidjiquiti, 3 de agosto de 1959: Mais bibliografia disponível (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Julho de 2020:

Queridos amigos,
Escrevi há pouco tempo um artigo dando conta de alguma bibliografia alusiva aos incidentes do Pidjiquiti e o historiador António Duarte Silva recomendou-me referências a outras obras, o que aqui se faz. As dúvidas e as questões em aberto prosseguem. Terá sido Rafael Barbosa o instigador junto de um dos patrões que conduziu a greve? 

O que levou o PAIGC a arvorar-se como responsável encapotado pelos acontecimentos, quando, como é sabido, viveu numa apagada entre 1956 e 1959? Em que medida é que se pode falar de massacre se, como abonam os testemunhos presenciais, e documentos de indiscutível rigor, que referem o descontrole absoluto depois das cenas de pancadaria travadas entre estivadores e forças da ordem? E de acordo com os números lançados por várias proveniências é extremamente difícil, mais de 60 anos depois, vir a encontrar documentos probatórios do número de mortos e feridos, já que não há contabilidade fiável para os mortos e feridos levados pelo Geba.

Um abraço do
Mário



Pidjiquiti, 3 de agosto de 1959: Mais bibliografia disponível

Mário Beja Santos

O meu amigo António Duarte Silva, conceituado historiador da Guiné-Bissau, chamou-me a atenção para a amplitude da bibliografia existente sobre os incidentes do Pidjiquiti, também conhecido por Massacre do Pidjiquiti, há muitos trabalhos repetitivos, casos há em que se urdiu a lenda, se exibem números de mortos e feridos sem qualquer comprovativo, houve aproveitamento dos acontecimentos para o colar ao arranque do PAI (sigla anterior a PAIGC), isto quando Rafael Barbosa insistiu que o líder dos grevistas era membro do Movimento de Libertação da Guiné.

 O autor de "Invenção e Construção da Guiné-Bissau", Almedina, 2010, dá-nos uma impressiva síntese do descontentamento dos homens que faziam o serviço do porto, cargas e descargas, marinheiros do cais, contramestres e cozinheiros. Era o mundo do trabalho que abarcava as embarcações de nove firmas armadoras de diferente calado, estes homens tinham de fazer igualmente o trabalho de estiva. 

“Os salários eram concertados anualmente pelas casas comerciais e a exigência de uma nova melhoria de salários havia sido apresentada em fevereiro, tendo obtido a promessa de estudo de pretensão. A preparação da greve coube aos capitães dos barcos; a exigência de aumento dos salários assentava na dureza das condições de trabalho e no custo da alimentação”.

Em 31 de julho, os trabalhadores constataram que não havia qualquer aumento, considera-se ter havido fracasso nas negociações posteriores com o gerente António Carreira na manhã de 3 de agosto. Os manifestantes, maioritariamente Manjacos, comparecem numa concentração pelas 14 horas, vão devolver os barcos. Interveio o Patrão-Mor da Capitania, tudo falha, o gerente da Casa Gouveia, António Carreira, chama a polícia, um contingente dirigiu-se ao porto, trocam-se palavras e o subchefe da polícia é agredido depois de ter esbofeteado um dos marinheiros que aparecem munidos de remos, paus, barras de ferro e arpões. Seguem-se disparos da PSP e forma-se um piquete que trava o avanço dos manifestantes abrindo fogo: tiros, lançamento de granadas lacrimogéneas e perseguição dos grevistas que fogem em direção ao cais. O padre Henrique Pinto Rema fará publicar no jornal "O Arauto" que houve de 13 a 15 mortos.

Já aqui se fez referência ao relatório confidencial do Comandante da Defesa Marítima que vem publicado no Livro III dos Fuzileiros – "Crónica dos Feitos da Guiné", por Luís Sanches de Bâena, Comissão Cultural da Marinha, 2006. 

Voltando ao trabalho de Duarte Silva, ele refere que os feridos e os cadáveres foram transportados sob vigilância militar para o hospital e a casa mortuária. No dia seguinte, o administrador do concelho de Bissau contatou um dos capitães, Mestre Ocante Benunte, este apresentou-lhe as cinco condições dos grevistas para retomarem o trabalho. Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso publicam os sete telegramas enviados pelo Governador ao Ministro do Ultramar, vem em "Os Anos da Guerra Colonial", Quidnovi, 2010. Encetam-se conversações, fizeram-se novas contratações, depois retomou o trabalho e em 11 de agosto estavam em funcionamento 30 num total de 53 lanchas. 

O historiador Leopoldo Amado é taxativo dizendo que o PAI “não teve, pelo menos diretamente, uma ação ou influências decisivas nas ações que viriam a desembocar em Pidjiquiti”. Como seria de esperar, o descontentamento, a greve dos estivadores, aquela quantidade de mortos e feridos que cada um contabiliza à sua maneira, serão apresentados como um marco histórico, para o PAIGC passava-se da agitação nacionalista à fase superior da luta de libertação nacional.

António Carreira, que antes de ser sócio-gerente da Casa Gouveia tivera outras e variadas andanças (capataz de estradas, aspirante dos correios e telégrafos, aspirante do quadro administrativo, secretário da circunscrição civil e administrador da circunscrição civil, tudo na Guiné entre 1921 e 1954) e que se tornou persona non grata e acusado de autor moral da mortandade declarou em entrevista, passados quase vinte anos, que “os governantes da Guiné-Bissau têm-se manifestado hostis à minha pessoa por razões ligadas aos acontecimentos do Pidjiquiti em 1959, endossando-me a responsabilidade da ocorrência. Ora eu não me sinto com nenhuma responsabilidade direta no caso (…) O que para mim se apresenta curioso é que nunca tivessem apontado para os autores materiais do caso: o comandante militar, o comandante da polícia, e os restantes agentes do governo de então, na altura em que eu era um simples gestor comercial”. 

Para conhecer a obra prolífica de Carreira, recomenda-se a leitura do livro "António Carreira, Etnógrafo e Historiador", por João Lopes Filho, Fundação João Lopes, Cidade da Praia, 2015. Em "As voltas do passado, a guerra colonial e as lutas de libertação", com organização de Miguel Cardina e Bruno Sena Martins, Tinta-da-China, 2018, há um trabalho de Sílvia Roque que praticamente nada mais adianta sobre o que até agora se escreveu. Luís Cabral, antigo Presidente da República, escreveu no seu livro "Crónica da Libertação", Edições Jornal, 1984, que o comportamento de Carreira foi de irredutibilidade, o que desencadeou a greve.

Depois da carga policial, vários grevistas e simpatizantes nacionalistas foram detidos. A autora escreve que o aumento de salários já teria sido aprovado pela CUF. Também refere que o trabalho forçado, após a II Guerra Mundial, passara a ser substituído pelo trabalho assalariado, baseado em salários muito baixos. A autora não deixa de se enredar na especulação, escrevendo: 

“Os acontecimentos do Pidjiquiti constituíram uma expressão real de uso excessivo de violência sem possibilidade de defesa, com requintes de teatralização desse excesso. São exemplos disso a referência a um comandante militar que teria atirado sobre cada uma das cabeças que se refugiaram no mar ou ao facto de apenas a corajosa reivindicação das mulheres junto do Palácio do Governador ter impedido que os corpos fossem queimados, conseguindo que fossem restituídos às famílias”.

Amílcar Cabral apresentará estes incidentes como um momento de viragem, será uma das consignas de toda a propaganda da guerra de libertação. Durante anos após a independência, os incidentes do Pidjiquiti tiveram um lugar relevante na consolidação do PAIGC enquanto personificação da nação, os anos foram gradualmente apagando das gerações mais jovens a simbólica do Pidjiquiti. E a comunicação também mudou, como mostra Sílvia Roque: 

“Durante as celebrações de 2014, enquanto Domingos Simões Pereira desafiava os guineenses para a criação de um museu em honra e memória de todos os resistentes, o secretário-geral da União Geral dos Trabalhadores da Guiné afirmava que os atrasos nos pagamentos de salários punham em causa a realização dos sonhos dos mártires do Pidjiquiti”

 Confirmava-se a simbologia da desilusão.

"Lutas Laborais nos Primórdios da Guerra Colonial", por Jorge Ribeiro, Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto, 2018, debruça-se sobre o Pidjiquiti, as novidades do texto são mínimas. Associa-se diretamente o conflito laboral com António Carreira, dá-se uma analogia entre Carreira e o Coronel Carlos Gorgulho, responsável pelo massacre de Batepá, em S. Tomé e Príncipe, a 3 de fevereiro de 1953, ambos após estes desmandos horrendos foram retirados para Lisboa. 

O texto refere o avanço da Companhia estacionada no quartel-general armada com Mauser K98, mas quem avança para o cais do Pidjiquiti são os efetivos da PSP, empunhando espingardas LEE ENFIELD 7.7. Perde-se o controlo da situação, segue-se a carga de soldados e polícia.

“Para esta página da história da Guiné foram imprescindíveis a acção e o comportamento do Comandante dos Civilizados, Capitão José Manuel Severiano Teixeira, louvado e condecorado após o 25 de Abril pelos serviços prestados em África; e do governador da colónia, Capitão de Fragata António Peixoto Correia que, no fim da sua comissão na Guiné, foi chamado por Salazar para o cargo de Ministro do Ultramar”.

O autor refere a disparidade dos números indicados por Rafael Barbosa, Amílcar Cabral e Luís Cabral: Rafael diz ter visto e contado 52 corpos retirados das águas do Geba; Amílcar Cabral referiu 24 mortos e 35 feridos; Luís Cabral 24 mortos e 37 feridos graves. Mais tarde, Aristides Pereira e o próprio Luís Cabral atualizaram o número em 52 mortos.


Guiné 61/74 - P24155: Manuscrito(s) (Luís Graça) (217): Provérbios populares sobre a doença, a medicina, a saúde, a vida e a morte: o que podemos aprender com eles ? - Parte IIA: 'Deus Cura os Doentes e o Médico Recebe o Dinheiro"


A velha Universidade de Coimbra, uma das dez mais antigas do mundo. Mas há um provérbio que diz(ia): "Mais vale um ano de tarimba do que dez de Coimbra". E um outro que avisa: Salamanca a uns cura e a outros manca". Mais cáustico, o terceiro denuncia: "Em Valência muitas fraldas,  pouca ciência". 



1. Continuação da publicação de uma série de textos, da autoria do nosso editor Luís Graça, sobre as lições que podemos tirar dos provérbios populares portugueses, nomeadamente sobre a saúde, a doença e os prestadores de cuidados de saúde, mas também a sobre a proteção e a promoção da saúde,  incluindo a vida, o trabalho, o envelhecimento ativo e a "arte de bem morrer"...

Por razões de força maior, ele está temporariamente com menos disponibilidade (física e mental) para editar o blogue, encontrando-se no Norte (Madalena, Vila Nova de Gaia). Conta com os outros coeditores, e nomeamente com o sempre fiel e incansável Carlos Vinhal, para ir mantendo  todos os dias a "montra do blogue"  atualizada e renovada. 

São textos que foi buscar ao seu "baú", a sua antiga página na ENSP/NOVA onde ensinou e investigou, durante quase quatro décadas, ajudando a formar médicos de saúde pública, médicos do trabalho, medicos de  clinica geral e famiiar,  administradores hospitalares, gestores de serviços de saúde, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapêutica, técnicos de higiene e segurança,  educadores e promotores de saúde, engenheiros, mestres, doutores, etc.... A págima foi recuperada pelo Arquivo.pt: Saúde e Trabalho - Luís Graça, (página pessoal e profissional cuja criação remonta a 1999).

Espera-se,  ao menos, que a  leitura destes textos desperte algum interesse e tenha algum  proveito para os nossos leitores, lusófonos... Incluindo os medicos: afinal, e parafraseando um deles, o Abel Salazar (perseguido pelo  Estado Novo) mal vai o médíco que só sabe de medicina...
 LG.


Graça, L. (2000) - Representações Sociais da Saúde, da Doença e dos Praticantes da Arte Médica nos Provérbios em Língua Portuguesa. Parte II : 'Deus Cura os Doentes e o Médico Recebe o Dinheiro'

(Continuação) (*)

3. Estereótipos em Relação aos Médicos e à Medicina

3.1. O "mata-são"

A descrença em relação aos médicos e aos seus meios de diagnóstico e de terapêutica traduz-se em ditos mais ou menos jocosos como "Deus cura os doentes e o médico recebe o dinheiro" (Quadro VI) ou, noutra variante (tendo porventura como objeto o cirurgião), "Deus é que sara e o mestre é que leva a prata".

Aos olhos do homem comum, a razão de ser e de existir dos médicos é a doença que, por seu turno, representa, para eles, um verdadeiro "celeiro" ou um "bornal" (ou ainda "gamela", uma imagem típica do mundo rural, significando, neste contexto, fonte de rendimento, de enriquecimento - muitas vezes ilícito - e de saciedade).

O vil metal intromete-se subrepticiamente na relação terapêutica, ao insinuar-se que:
  • "A desgraça de uns é a fortuna de outros";
  • "De São Martinho ao Natal, o médico e o boticário enchem o bornal";
  • "Mostarda na horta, médico à porta";
  • "Quando o doente escapa, foi Deus que o salvou; e quando morre, foi o médico que o matou";
  • "Quando os doentes bradam os médicos ganham".

Daí o aviso aos incautos, para que não se metam nem com o homem de leis (o advogado) nem com o praticante da arte médica (o "mata-são#):
  • "Deus te guarde do parrafo de legista, do infra de canonista, et-caetera de escrivão e de recipe de mata-são".
A incerteza quanto ao diagnóstico e ao prognóstico dos médicos (e, portanto, a falta de confiança na medicina, no passado) está ilustrada em ditos como "Emenda de jogador e prognóstico de médico serão o que for" ou "Hipócrates diz que sim, Galeno diz que não" (Quadro VI), muito embora se trate de dois provérbios de raiz mais erudita do que popular.
Hipócrates  (460-377 a.C.) como Galeno (129-199 d.C.)
f oram, praticamente até ao Século XVIII, o alfa e o omega da arte de curar.

A propósito, refira-se que tanto Hipócrates como Galeno foram as duas grandes autoridades do conhecimento médico que herdámos da Antiguidade Clássica e para cuja preservação e divulgação até à Renascença muito contribuíram os arabistas (judeus, árabes e persas que traduziram os originais gregos para árabe e para latim).

Daí a referência, por ex., a Avicena (980-1037): "Avicena e Galeno trazem a minha casa o bem alheio". Recorde-se que o seu Cânone da medicina (ou inventário geral das doenças do ser humano) foi um dos tratados que marcaram o ensino e a prática médicas até muito para lá da Renascença.

A experiência da negligência médica e do erro clínico ('efeitos adversos', como se diz hoje), por seu turno, é documentada através de ditos,  espirituosos uns, sarcásticos outros, que ainda hoje nos chocam pela sua crueza (Quadro VI):
  • "Com o que sara o fígado, enferma o braço";
  • "Erros médicos a terra os cobre" ou, noutra versão, "O médico e o calceteiro cobrem os erros com terra";
  • "Guarde-nos Deus do físico esperimentador (sic) e de asno ornejador";
  • "O bom médico é o do terceiro dia";
  • "O melhor médico é o que se procura e se não encontra";
  • "Pior é ter mau médico que estar enfermo";
  • "Salamanca a uns sara e a outros manca";
  • "Se tens físico teu amigo manda-o a casa do teu inimigo".
Salamanca era famosa, no Século XVI, pela sua escola médica, sendo muito procurada por estudantes portugueses (Lemos, 1991; Mira, 1947). Nela se formaram (ou doutoraram) nada menos do que dois dos nossos três maiores médicos até ao Século XVIII, todos aliás de origem hebraica e obrigados a refugiarem-se no estrangeiro por causa da Inquisição: referimo-nos a Amato Lusitano (1511-1568) e a Ribeiro Sanches (1699-1782).

Em todo o caso, era fraca a reputação da universidade, aos olhos da gente comum (Quadro VI):
  • "Mais vale experiência que ciência";
  • "Mais vale um ano de tarimba do que dez de Coimbra";
  • "Mais vale um burro vivo do que um doutor morto";
  • "Médicos de Valência: grandes fraldas, pouca ciência".
O médico (ou físico, mais tarde facultativo) faz parte, de resto, da vasta galeria das figuras vicentinas. Gil Vicente devia conhecer bem o meio profissional da medicina a ponto de escrever um Auto dos Físicos (1524) onde caustica a classe médica da época por causa da sua linguagem esotérica e da sua crença na astrologia. Como também conhecia o Hospital Real de Todos os Santos onde seria representado, pela primeira vez, o Auto da Barca do Inferno (1517), perante a Rainha Dona Leonor, sua protectora.

A sátira à medicina é, aliás, um tema recorrente na literatura europeia da época (por ex., Molière e Boileau, em França) como até na própria pintura. Na cidade holandesa de Leiden, no museu de Boerhaave (o professor de quem o nosso Ribeiro Sanches foi um dilecto discípulo), o visitante tem a oportunidade de observar um espantoso painel dum pintor holandês anónimo do Séc. XVII, The four guises of the physician (Os quatro rostos  do médicos). 

Visto pelos olhos do doente (um burguês rico) e da sua família, o médico vai assumindo a forma de diferentes personagens (ou rostos):
  • No momento de aflição, ele é o salvador, representado pela figura de Cristo (1) , enquanto examina um boião com as águas (urina), rodeado pelos seus assistentes e tendo aos pés uma panóplia de instrumentos cirúrgicos;
  • Após a recuperação do doente, o médico transforma-se primeiro em anjo (2) para surgir depois sob a forma de um vulgar ser humano (3);
  • Por fim, no último quadro, o doente acaba por morrer: enquanto a sua alma se liberta do corpo, o médico, em primeiro plano, regressa para reclamar os seus honorários, desta vez vestido de diabo (4) (Graça, 1996)


Quadro VI — Provérbios e outros lugares comuns da língua portuguesa sobre o médico, a medicina e a ciência

Objeto

Provérbio

Anato-mia/ Corpo

  • "Anda em capa de letrado muito asno disfarçado"

  • "Antes burro vivo que doutor morto" (Séc. XVIII)

  • "Com dinheiro, língua e latim, vai-se do mundo até ao fim"

  • "Com latim, rocim e florim andarás mandarim"

  • "De livro fechado não sai letrado"

  • "Discípulo, com cuidado, e mestre, bem pago"

  • "Doutor da mula ruça"

  • "Em casa do letrado tanto se paga de pé como sentado"

  • "Mais vale experiência que ciência"

  • "Mais vale um ano de tarimba que dez de Coimbra"

  • "Mais vale um burro vivo do que um doutor morto"

  • "Mascarado de doutor anda por aí muito burro zurrador"

  • "Moça que casa com bacharel não tem quartel"

  • "Não provam bem as senhoras que se metem a doutoras"

  • "O saber não ocupa lugar"

  • "Quem ler leia para saber; quem souber saiba para obrar"

  • "Um burro carregados de livros é doutor"

Físico/ Médico

  • "A crença dos médicos que falta nos sãos sobeja nos doentes"

  • "A desgraça de uns é a fortuna de outros"

  • "A despeito dos médicos viveremos até morrer"

  • "A doença é o celeiro do médico"

  • "À falta de médico não morre o doente"

  • "Ao médico, ao letrado e ao abade falar verdade" (Séc. XVII)

  • "A médico, confessor e letrado nunca enganes"

  • "Aos trinta anos quem não é tolo é médico"

  • "De médico e de louco todo mundo tem um pouco"

  • "De médico, engenheiro e louco todos temos um pouco"

  • "De poeta, médico e louco cada um tem um pouco"

  • "Deus, assim como dá a doença, dá o médico"

  • "Deus cura os doentes e o médico recebe o dinheiro"

  • "Deus é que cura e o médico leva o dinheiro"

  • "Deus te guarde do parrafo de legista, do infra de canonista, et-caetera de escrivão e de recipe de mata-são"

  • "Do São Martinho ao Natal, o médico e o boticário enchem o bornal"

  • "É médico ou pregador de dúzias"

  • "Emenda de jogador e prognóstico de médico serão o que for"

  • "Enfermo paciente faz o médico cruel"

  • "Erros de físicos a terra os cobre"

  • "Erros de médicos a terra os cobre"

  • "Guarde-nos Deus do físico esperimentador e de asno ornejador" (Séc. XVI)

  • "Médico novo e puta velha, todos gostam de experimentar"

  • "Médico velho, advogado novo"

  • "Médico velho, cirurgião novo, boticário coxo"

  • "Médicos de Valência: grandes fraldas, pouca ciência"

  • "Mostarda na horta, médico à porta"

  • "Não há melhor médico do que o fiel amigo"

  • "Nem com cada mal ao médico, nem com cada trampa ao letrado"

  • "O bom médico é o do terceiro dia"

  • "O médico deve ser prudente, o enfermo paciente e o criado diligente"

  • "O médico e o calceteiro cobrem os erros com terra"

  • "O médico é o pai da crença"

  • "O médico quando é pago por ricos é considerado criado; quando recebe dos pobres, é ladrão"

  • "O melhor médico é o que menos fala e mais observa"

  • "O melhor médico é o que se procura e se não encontra"

  • "O melhor médico é, por vezes, o pior doente"

  • "Pior é ter mau médico que estar enfermo"

  • "Por causa do fedor ninguém vai ao doutor"

  • "Quando é de morte o mal, não há médico para curar tal"

  • "Quando o doente diz ai, o físico diz dai"

  • "Quando o doente diz ai, o médico diz dai"

  • "Quando o doente escapa, foi Deus que o salvou;  e quando morre, foi o médico que o matou"

  • "Quando o médico é piedoso é o doente perigoso"

  • "Quando os doentes bradam os médicos ganham"

  • "Quanto mais médicos, mais moléstias"

  • "Quem sempre traz má cor não é médico nem doutor"

  • "Se tens físico teu amigo, manda-o a casa do teu inimigo"

  • "Serigaita sã não precisa médico"

  • "Tratem-nos à moderna, que eles morrem à antiga"

  • "Um médico cura, dois empatam, três matam"

Medi-

cina

  • "A vida é curta e a arte é longa" (1);

  • "Avicena e Galeno trazem a minha casa o bem alheio" (Séc. XVII)

  • "Com o que cura o fígado adoece a bolsa"

  • "Com o que Pedro sara Sancho adoece"

  • "Com o que sara o fígado, enferma o braço" (Séc. XVII)

  • "Doença bem tratada poucas vezes é demorada"

  • "Hipócrates diz que sim, Galeno diz que não"

  • "Mais matou a ceia que sarou Avicena"

  • "Mais matou o céu que sarou Avicena"

  • "Mal com mal se cura"

  • "Mastigar marmelada para os tísicos"

  • "O bom remédio amarga na boca"

  • "Quem tem doença abra a bolsa e tenha paciência"

  • "Salamanca a uns sara a outros manca"

  • "Saúde o come que não boca grande"


(1) Aforismo hipocrático: referência à arte de curar arte de curar


Os próprios médicos satirizavam certas práticas e crenças dominantes , como por exemplo o uso e o abuso da uroscopia (exame das águas ou urina), ainda largamente difundida entre nós em meados do Séc. XVII a avaliar por este trecho, em verso e em castelhano, de Domingos Pereira Bracamonte (1606-1658), médico de Amarante, que acusa os "medicastros [ médicos charlatães ] urináuticos" (sic) de enganar os pobres doentes:

(...) porque desenganara

Tanta rustica gente que enganada

Piensa que en la urina está cifrada

De Esculápio la sciencia

Y en un canuto solo


Oraculos de Apolo

Y sin mas relacion de su dolencia

Por bien poco dinero

Quiere que sea el medico echicero

Culpa de medicastros urinauticos

Que hipocritas seran, mas no hippocraticos

Bracamonte (1642)
 



3.2. "Médico velho, cirurgião novo, boticário coxo

Em traços físicos e simbólicos, o médico é descrito como "velho", enquanto o cirurgião é "novo" e o boticário, "coxo". Mas mesmo que a medicina seja inútil ("Ciência é loucura se o bom siso a não cura"), o médico sempre é um letrado, o único aliás com formação universitária (...e "ao letrado não o tenhas enganado").

É claro que o prestígio do médico está mais relacionado com a idade e os longos anos de estudo ("Aos trinta anos quem não é tolo é médico") do que com o saber livresco ("Quem ler leia para saber; quem souber saiba para obrar") e com a frequência da universidade ( "Mais vale um ano de tarimba que dez de Coimbra" ) (Quadro VI).

No Séc. XIV bastava saber ler e escrever e pouco mais para se ter acesso à Universidade:

Com três anos de aproveitamento, era-se bacharel; o bacharelato (do latim bacalaureatus, "coroado de louros com bago") era, pois, o primeiro grau académico;

Com mais dois ou quatro, conforme os cursos, era-se licenciado, detentor de licentia docendi ubique, ou seja, licenciatura reconhecida em toda a cristandade;

Só ao fim de muitos anos - já na casa dos trinta, no caso da Teologia -, é que se atingia o cume da pirâmide do saber, o grau de doutor ou mestre, não sendo muito clara a distinção entre um e outro título académico (O termo original magister dá lugar a doutor).

No limiar do Séc. XVIII, a um médico, "para chegar a curar" - no dizer do Doutor Frei Manuel de Azevedo (c. 1600-1672) (cit. por Pina, 1938.21) - seriam necessários "treze anos de estudo, com três ou mais exames muy apertados", assim discriminados:
  • "Quatro anos para bem saber o Latim, delle o examinam para depois entrar na Filosofia, nesta gasta ao menos tres annos, fazendo no discurso delles diversos actos de Conclusões";
  • "No fim o examinarão com todo o aperto, & achando-o habil, lhe dão grau de bacharel em Filosofia" (No total, sete anos de ensino preparatório, dando acesso à Faculdade de Medcina);
  • Com este [ bacharelato ] entra a aprender medicina, nella cursa quatro anos, & nelles com diversos actos de Conclusões, que defende";
  • "No fim de todo este tempo o examinarão apertadissimamente todos os Medicos Doutores da Universidade";
  • Uma vez aprovado, fazia o equivalente ao actual internato geral hospitalar, "onde aprenderia as enfermidades e os pulsos durante dois anos" (Ou sejam, seis anos de ensino pré e pós-graduado de medicina) (Itálicos meus).
Em resumo, aos 23 ou 24 anos era-se médico, o que para a época era já uma idade provecta (se consideramos a baixa esperança média de vida, à nascença, dos portugueses).. Daí também o natural despeito dos físicos em relação aos cirurgiões:

"Como poderà hum Cyrurgião, que mal sabe ler, & escrever, com hum ano, ou pouco mais, que assistio no hospital, aprendendo só a curar feridas e chagas, como poderá curar enfermidade alguma" ?, pergunta Manuel de Azevedo (Itálicos meus).

Já na altura, o diagnóstico do doente (o "conhecimento do pulso") era um acto médico por excelência:

"Em toda a medicina não ha cousa mais dificultosa, que o conhecimento do pulso. E ha tanta ignorância popular, que aos barbeiros, & cristaleiras se dão os pulsos, para lhos tomarem & lhes dizerem se tem febre grande, ou pequena", comenta Azevedo (cit. por Pina, 1938. 22).

"E peyor he, que se dous Medicos disserem ao enfermo, que não tem febre, & vier o barbeiro, ou a crystaleira [ que ministrava clisteres ] a dizer que a tem, lhe dão mãyor credito, que aos ditos Medicos".

De qualquer modo, qual era o sentido de provérbios como "Aos trinta anos quem não é tolo é médico" ou "Médico velho, cirurgião novo, boticário coxo"?

Numa amostra de 15 médicos portugueses que viveram entre 1501 e 1859, e para os quais dispomos de informação biográfica, apurámos os seguintes dados que, no mínimo, são curiosos e podem revelar algumas tendências sobre o desenvolvimento histórico do ensino e do exercício da medicina em Portugal (Quadro VII):

Neste período os médicos viviam em média 66,3 anos (Mínimo: 50; máximo: 83), seguramente mais tempo do que a esperança média de vida da população portuguesa;

Acabavam o curso de medicina aos 24,3 anos (Mínimo: 18; máximo: 29);

No período compreendido entre 1523 e 1717, antes portanto da reforma pombalina da Universidade de Coimbra (1772), a idade média de conclusão do curso de medicina seria mais baixa , andando nos 22,7 anos (Mínimo: 18; máximo:26) (n=8);
  • Depois da reforma pombalina, e no período entre 1787 e 1814, a formação dos médicos terminava por volta dos 26 anos (em média) (n=7);
  • Um terço, pelo menos, dos médicos da amostra era de origem cristã-nova e teve problemas com a inquisição (entre eles, estão os nossos médicos mais notáveis do Ancien Régime como, por exemplo, Zacuto Lusitano, Jacob Castro Sarmento ou Sanches Ribeiro);
  • Quatro dos 15 médicos estudaram em Espanha (nomeadamente em Salamanca).
  • Pelo menos até à Renascença, os físicos eram classificados no grupo social, especificamente urbano, dos que "usa(va)m dalgumas artes aprovadas e mesteres" (D.Duarte, O Leal Conselheiro).
  • Os mesteres ou artesãos também eram conhecidos como oficiais mecânicos, distintos todavia dos homens de artes aprovadas que já exerciam claramente uma actividade liberal (caso do jurista e do médico).
Uns e outros pertenciam ao terceiro estado (o povo), donde pouco a pouco se começam a destacar, com a criação e a expansão da universidade, os letrados, bacharéis ou doutores:
  • "Ao médico, ao letrado e ao abade falar verdade";
  • "Com dinheiro, língua e latim, vai-se do mundo até ao fim"
  • "De livro fechado não sai letrado";
  • "Discípulo, com cuidado, e mestre, bem pago";
  • "Em casa do letrado tanto se paga de pé como sentado";
O termo físico, por que eram conhecidos os médicos na Idade Média (em inglês physician, que aparece entre 1175 e 1225), tem, a ver com o facto da medicina, a partir do Séc. IX, ter passado a ser considerada pelas escolas monásticas uma arte liberal (a oitava), a seguir à gramática, a retórica e a dialéctica (que formavam o trivium) e da aritmética, da geometria, da música e da astronomia (que constituíam o quadrivium).

A medicina, integrada na Física, passou a ser ensinada no âmbito do quadrivium.

O papel da universidade, depois da reforma joanina de 1537, era sobretudo o de formar gente que iria depois engrossar as fileiras da burocracia régia, e gerir os negócios do reino e do império. Por outro lado, começava a tornar-se evidente a importância que já era então atribuída à instituição universitária como forma de ascensão social. Daí a maior procura do direito:
  • Mais de 87 % do total das matrículas, neste período de 1573 a 1771 respeitam aos cursos jurídicos (cânones e leis);
  • Contra apenas 6,8% de medicina e 5,3% de teologia (Graça, 1996).
D. Francisco de Lemos que teve um papel importante na reforma da universidade de Coimbra e foi seu reitor, antes e depois de 1772, dava aliás conta do pouco prestígio social que ainda então tinha a Faculdade de Medicina, ao escrever, em 1777, que era "pouco frequentada por quem tem meios de preparar-se para outros destinos mais bem reputados no conceito dos Povos, e pela maior parte abandonada a estudantes mizeraveis e pobres" (Lemos, 1777, cit. por Pina, 1937.7, itálicos meus).

Na época, o estatuto social do estudante de Coimbra media-se pelo número de criados e de cavalos (ou mulas) ao seu serviço. O estatuto social e económico do médico estava ainda longe de ser elevado, o que é bem patente no ditado que diz :

"O médico quando é pago por ricos é considerado criado; quando recebe dos pobres, é ladrão".

Por fim, o médico é homem: com uma nuance mais burguesa do que fradesca, é conveniente lembrar que "não provam bem as senhoras que se metem a doutoras".

De facto, a universidade (criada entre nós em 1289) era interdita às mulheres, de tal modo que será preciso esperar mais de 600 anos (!) até que apareça a primeira mulher portuguesa diplomada em medicina (Amélia Cardia dos Santos Costa, em 1891, não ainda pela Universidade mas pela Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, que fora criada em 1836).

A arte de curar era, pois, predominantemente masculina, pelo menos nas principais cidades do reino. Quanto aos médicos, letrados e aprovados, esses eram exclusivamente homens. O mesmo se passava com os cirurgiões (Quadro VIII, próximo poste) e os barbeiros-sangradores.

Sabe-se, entretanto, muito pouco sobre a assistência prestada às populações dos campos (e, em particular, às mulheres camponesas). Nos sítios mais recônditos, elas não tinham outra alternativa senão recorrer a bruxas, curandeiras, mezinheiras, parteiras ou aparadeiras, comadres ou simples curiosas, da aldeia ou das redondezas (Joaquim, 1983).

Há toda uma medicina tradicional, de raiz popular, de que as mulheres se tornaram as fiéis depositárias e que exerceram, com algum proveito mas não sem riscos, já que na época era bem pesada a mão da justiça do rei e da Igreja.

Nos arquivos das chancelarias régias, de D. Manuel I a D. Filipe III, há curiosos documentos sobre a prática da arte de curar por parte de mulheres. Reis (1996) identificou uma dúzia de mulheres que exerciam, para todos os efeitos, a medicina, embora sem autorização legal.

O conteúdo dessas cartas régias é muito interessante, para quem quiser conhecer a terminologia nosológica da época, e sobretudo perceber melhor a jurisprudência relativa ao exercício das "artes médicas" e ao seu controlo por parte do poder régio e da própria corporação médica.

Na maior parte dos casos (12) trata-se de concessão de licenças para praticar a cirurgia (5) ou para tratar do mal das boubas (sífilis) (2), do mal da raiva (1), da doidice (1) e de outras enfermidades (2).

Numa dessas cartas, com data de 18 de Setembro de 1611, o rei Filipe II concede licença a Ana Marques, residente em Ceira, no termo de Coimbra, para "no dito concelho de Seira e seus arredores, não sendo para a parte de Coimbra nem onde haja fisico letrado ou examinado" [ poder ] tratar de certas enfermidades com alguns remédios que ela aprendera e sabia", depois de tais remédios bem como a requerente terem sido examinados pelo físico-mor, Doutor Baltasar de Azeredo, catedrático de prima jubilado na Universidade de Coimbra". Além da restrição territorial, a requerente não podia "entermeter-se em mais coisa alguma nem ordenar de beberagens nem outras mezinhas sob pena de se proceder contra ela" (cit. por Reis, 1996).



Quadro VII - Idade de conclusão do curso de medicina, segundo uma amostra dos médicos portugueses do Séc. XVI ao Séc. XIX (n=15)


Nome do médico

Período de vida

Idade em que se formou

Antes da Reforma Pombalina  da Universidade  (entre 1523 e 1717)

Abraão Zacuto Lusitano1575-1642De origem hebraica, fez estudos de filosofia no Colégio das Artes, em Coimbra, e medicina em Espanha, onde se doutorou aos 21 anos pela Universidade de Siguenza. Morreu em Amsterdão. Era neto do grande Abraão Zacuto (1450-1525), médico e astrónomo no tempo de D. João II e D. Manuel II.
Amato Lusitano1511-1568João Rodrigues Castelo Branco, mais conhecido por Amatus Lusitanus, licenciou-se em Salamanca por volta de 1529 (com 18 anos). De origem hebraica, refugiou-se em Antuérpia  em 1533 ou 1534. Terá morrido de peste.
Ambrósio Nunes1529-1611Filho de um físico-mor do Reino, terminou o curso em Coimbra em 1555 (portanto, com 26 anos). Foi professor em Salamanca. Lente de "vacações" (1555), é autor de Enarrationum in priores Aphorismorum Hippocratis cum paraphrasi in Comentaria Galeni tomus prior (Coimbra,  1601).
António Ribeiro Sanches1699-1782Oriundo de família de cristãos-novos, de Penamacor, estudou filosofia e medicina em Coimbra, entre 1716 e 1719. Aos 25 anos obtinha o grau de doutor em medicina por Salamanca. Em 1726 saiu definitivamente do país.
Francisco da Fonseca Henriques1665-1731Também conhecido pelo Dr. Mirandela, terminou o curso de medicina em Coimbra, com 19 anos  (1684), depois de estudar as primeiras letras na sua terra natal (Mirandela). É autor do Aquilógio Medicinal (1726), considerado o primeiro trabalho sistemático sobre a riqueza hidrológico do Reino.
Garcia de Ortac.1501-1568Filho de cristão-novo, natural de Castelo de Vide, frequentou as universidades de Salamanca e de Alcalá de Henares, por volta de 1515-1523 (Ter-se-á, portanto, licenciado em medicina aos 22 ou 23 anos). Só em 1526 obteve autorização do físico-mor para exercer medicina.
João Marques Correia1671-1745Estudou Humanidades e Filosofia em Évora e Medicina em Coimbra onde recebeu o grau de mestre em Artes (1692) e se formou-se em 1696 (com 25 anos).É autor do Tratado Physiologico médico-physico e anatómico da circulação do sangue.
Jacob de Castro Sarmento1691-1762Depois de obter o grau de mestre em Artes na Universidade de Évora (1710), estudou medicina em Coimbra. Conclui o curso em 1717 (com 26 anos). Cristão-novo, fixou residência em Londres em 1721 e aí morreu.

Depois da Reforma Pombalina da Universidade (entre 1787 e 1814)

António de Almeida1767-1839Nascido em Coimbra, matriculou-se no curso de medicina em 1787, que conclui com 24 anos (1791). Foi médico do partido da Câmara de Penafiel.
Francisco Inácio dos Santos Cruz1787-1859Matriculou-se em 1804 em Filosofia e no 1º ano de Matemática, da Universidade de Coimbra, como preparatório do curso de Medicina que terminou em 1814 (com 26 anos).
Francisco Xavier de Almeida Pimenta1775-1839Terminou o curso de medicina de Coimbra em 1799 (com 24 anos).Foi deputado às cortes em 1820 e zeloso propagandista da vacina.
Joaquim Xavier da Silva1778-1835Estudou medicina em Coimbra, onde se doutorou com 26 anos (1804). Publicou um tratado de higiene militar.
Jorge Gaspar de Oliveira Roldão1783-1833Estudou em Coimbra. Recebeu o grau de bacharel em 1808 e formou-se no ano seguinte (com 26 anos). Médico de província.
José Lino dos Santos Coutinho1784-1836Nascido no Brasil, concluiu o curso de Medicina de Coimbra em 1813 (com 29 anos). Foi político e professor na Escola de Medicina da Baía.
José Pinheiro de Freitas Soares1769-1831Frequentou, em Coimbra, as Faculdades de Filosofia e de Medicina. Formou-se na primeira em 1793  (com  24 anos) e na segunda em 1797 (com 28 anos). Autor do Tratado de Polícia Médica.

Fonte: Adapt. de Lemos (1991) e Mira (1947) (entre outros)

Bibliografia a publicar no fim desta série temática

(Continua)
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Nota do editor:

domingo, 19 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24154: Os nossos seres, saberes e lazeres (562): Os meus livros. Ao todo, quinze (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico)

1. Em mensagem do dia 17 de Março de 2023, o nosso camarada Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887 (Canquelifá e Bigene, 1966/68), enviou-nos uma listagem dos seus livros publicados, cujos temas vão desde a Medicina à poesia, passando pelo Conto e pela pintura.
Felizmente o nosso blogue tem já muitas publicações dos seus trabalhos de pintura, normalmente ilustrando os seus apreciados poemas. Alguns dos livros mais antigos estão há muito esgotados.


Os meus livros.
Ao todo, quinze. Falta o primeiro, escrito há largos anos, do qual tenho um exemplar, mas não sei onde pára. Era um livro de cardiologia, com o título "Cirurgia geral no doente cardíaco".

Por ordem cronológica:


1 - Cirurgia geral no doente cardíaco.
2 - ESTA ÁGUA QUE AQUI VEM DAR (Poemas e pintura)
3 - VEM COMIGO COMER AMENDOIM (Contos e poemas)
4 - PALAVRAS E CORES (pintura e poemas)
5 - ADÃO CRUZ - Tempo, Sonho e Razão (Pintura e texto).
6 - ADÃO CRUZ - Hora a hora rente ao tempo (Pintura e texto).
7 - ADÃO CRUZ - Um gesto de silêncio (Pintura e poemas).
8 - Poemas do lusco-fusco (Poemas).
9 - Poemas do ser e não ser (poemas).
10 - Poemas estoricônticos (Poemas).
11 - VAI O RIO NO ESTUÁRIO - Poemas de braços abertos (Poemas).
12 - VAI O RIO NO ESTUÀRIO - Cores de braços abertos (Pintura e texto).
13 - CENAS DO PARAÍSO (Contos).
14 - CONTOS DO SER E NÃO SER (Contos).
15 - Entre as mãos e o sonho (Poemas).
Adão Cruz
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE MARÇO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24152: Os nossos seres, saberes e lazeres (561): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (94): Da bela Tavira a uma exposição sobre a Ordem de Cristo em Castro Marim, com José Cutileiro em pano de fundo (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P24153: As nossas geografias emocionais (2): Bambadinca, zona leste, região de Bafatá, sector L1 - Parte I: Fotos de Humberto Reis (ex-fur mil op esp, CCAÇ 2590/CCAÇ 12, 1969/71)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá  > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca (vd. mapa da região)... 

A foto original, com resolução superior a 2,3 MB, decomposta em vários quadrantes (fotos parcelares de 1 a 5), permitiu-nos  um maior detalhe do aquartelamento. Aceitam-se melhorias e correções.


Foto nº 1


Foto nº 2 


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 6

Esta reconstituição feita, de memória, apoiada em documentação fotográfica, nomeadamente por Humberto Reis, Luís Graça, Gabriel Gonçalves e Arlindo Roda (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), bem como por outros camaradas do nosso tempo (Benjamim Durães, CCS/BART 2917, 1970/72; José Carlos Lopes, CCS/BCAÇ 2852, 1968/70; Mário Beja Santos, Pel Caç Nat 52; Jorge Cabral, Pel Caç Nat 63, 1969/71... e ainda  com base noutros elementos informativos publicados no blogue.

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Legenda:

(1) Do lado esquerdo da imagem, para oeste, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste);

(2) Uma nesga da placa, em cimento,  heliporto;

(3) O campo de futebol (3),  entre o arame farpado (24) e pista de aviação; 

(4) A CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (julho de 1969n / março de 1971) começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento literalmente roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole; 

(5/6/7/8/9/10) Conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão  [, no nosso tempo apanhámos dois, o BCAÇ 2852, 1968/70, e o BART 2917, 1970/72] (5) e as instalações (dormitóriso) de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9); apesar segregação sócio-espacial que vigorava então, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (10); do lado direito do bar e messe de sargentos, vê-se uma fiada de bidões cheios de areia, que serviam de protecção para a saída para as valas (22);

(22/24/27) Do lado direito, ao fundo, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá; o aquartelamento de Bambadinca situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste) que lhe dava uma aparência de fortaleza inexpugnável, vista do lado da bolanha (ou, seja, de leste para oeste); são visíveis as valas de protecção (22), abertas (... também pela CCAÇ 12, companhia de intervenção duramente explorada pelo comando dos dois batalhões...)  ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24); a luz eléctrica era produzida por gerador que deve estar algures por aí,  nas imagens, perto da antena de transmissões (27);

(23/25/26) Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o espaldão da metralhadora pesada Browning, 12.7 (25)... (Em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses  14).

(3/11/12) A caserna (ou uma das casernas) das praças da CCS (11) ficava  junto ao campo de futebol (3);   o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler deveria ficar instalado no edifício (12), que se situava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U. 

(13/14/28) Mais à direita, situava-se a capela (13) e a secretaria da CCAÇ 12 (14);  por detrás ficava o refeitório das praças (28);

(15/16/17) Em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).

(18/19/20)   Uma arruamenmto ao meio (no sentido sul-norte)  dividia o aquartelamento em duas partes (oeste e leste);  tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais da unidades e subunidades que  haviam  passado por Bambadinca (18), a escola primária antiga (incluindo a casa da senhora professora, Dona Violete, que era caboverdiana) (19) e depósito da água (de que se vê apenas uma nesga) (21).

(29, fora da foto) ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto, e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do alf mil op esp Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12).

Esta reconstituição feita, de memória, apoiada em documentação fotográfica, nomeadamente por Humberto Reis, Luís Graça, Gabriel Gonçalves e Arlindo Roda (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), bem como por outros camaradas do nosso tempo (Benjamim Durães, CCS/BART 2917, 1970/72; José Carlos Lopes, CCS/BCAÇ 2852, 1968/70; Mário Beja Santos, Pel Caç Nat 52; Jorge Cabral, Pel Caç Nat 63, 1969/71... e ainda  com base noutros elementos informativos publicados no blogue.

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), a quem mando, da ilha de Luanda, um abraço fraterno, bem como aos meus queridos coeditores que vão aguentar o barco esta semana. Vim no mesmo avião da TAP com o António Duarte, economista, formador bancário, que esteve na CCAÇ 12, em Bambadinca,  depois de mim, em 1973/74. Falámos um bom  e agradaável bocado no aeroporto. Por cá, tudo calmo.  (LG). 

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: L.G.]


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Outra vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido noroeste-sudeste. Em primeiro plano, a pista de aviação, o perímetro em L de arame farpado, o campo de futebol, a antena das transmissões...


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá   Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Vista aérea da tabanca de Bambadinca, tirada no sentido sul-norte. Em primeiro plano, a saída (lado leste) do aquartelamento, ligando à estrada (alcatroada) Bambadinca-Bafatá. Ao fundo, o  Rio Gebà Estreito. São visíveis as instalações do Pelotão de Intendência, à esquerda, na margem esquerda do rio. 

 
Guiné > Zona Leste > Região de Bafatã  > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Entrada principal aquartelamento,  pelo lado leste (sentido Bafatá)


Guiné >   Guiné > Zona Leste > Região de Bafatã  > Sector L1 (Bambadinca)  > Estrada Mansambo-Xitole > 1970 > Coluna logística de Bambadinca ao Xitole com a participação da CCAÇ 12. Alguns meses depois da grande desmatação das orlas da estrada, feitas por ocasião das Op Cabeça Rapada, o matagal continuava medonho, engolino a picada... 

Fotos do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 

Guiné > Zona Leste > Região de Bafatã  > Sector L1 > Bambadinca > 1971 >  Capa da brochura com a história da CCAÇ 12, desenhada pelo fur mil at inf António Levezinho. O Sector L1 tinha sede em Bambadinca.  Havia ainda mais três subsectores: Xime, Mansambo e Xitole. A oeste e a sul, o Sector L1 era delimitado pela margem direita do  rio Corubal, e a norte pelo rio Geba Estreito.  O porto fluvial do Xime e a estrada Xime - Bambinca passaram a ser, sobretudo a partir de 1969,  a principal via de entrada na Zona Leste (região de Bafatá e região de Gabu). Bambadinca (em mandinga, a "cova do lagarto") era posto administrativo (pertencente à circunscrição / concelho de Bafatá). Em 1969 estava ligada a Bafatá (30 km) por estrada asfaltada. Do porto fluvial do Xime a Bambadinca era uma dúzia de quilómetros.  Havia um reordenamento (Bambadincazinho, a oeste do quartel e posto administrativo) e uma tabanca (a norte e a leste). A povoação tinha escola, posto dos CTT, capela, posto sanitário, missão do sono (desativada), dois ou três estabelecimentos comercais, uma missão católica... Nunca foi atacada ou flagelada no nosso tempo (CCAÇ 12, julho de 1969/março de 1971).  Tinha cerca de 400 homens em armas  (além da CCAÇ 12, 170 militares, tinha uma CCS, um Pel Rec Daimler, um  Pel Mort, um  Pel Caç Nat e um PINT, Pelotão de Intendência,  fora do quartel, no porto fluvial).

Infografia. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné  (2005)


1. Esta série é dedicada à(s) "Memória(s) dos lugares"... Logo no princípio do nosso blogue, tínhamos, na badana (ou coluna estática) do lado esquerdo uma listagem (com links) de lugares por onde passámos, documentados com fotografias e infografias... 

Ia já em 24 topónimos, mas faltavam muitos mais... Começámos a sua recuperação com o topónimo Bafatá, segue-se agora Bambadinca.

As imagens estavam originalment6e  alojadas na minha página pessoal, Saúde e Trabalho - Luís Graça, no servidor da ENSP/NOVA. Foi descontinuada, em 2022, com o redesenho da página oficial da instituição. Estou agora a recuperá-la através das capturas feitas pelo Arquivo.pt, bem como dos ficheiros originais. É uma tarefa morosa e ingrata...

Luís Graça  > Subsídios para a história da guerra colonial  >  Guiné  > Antologia, preservada pelo Arquivo.pt

E vou aproveitar para refrescar e atualizar os nossos álbuns fotográficos, por topónimos da Guiné (se não todos, pelo menos os principais). Afinal, trata-se de não perder as nossas "geografias emocionais". Muitas das fotos que vamos publicando estão dispersas. São de diferentes autores e anos... É agora a altura de as tentar reunir.

Vamos continuar com o topónimo Bambadinca  (que tem no nosso blogue 670 referèncias).  Vamos fazer uma seleção por amostragem, tendo também em conta a qualidade das imagens...  Ou vamos publicando fotos por autores e anos... Um dos grandes fotógrafos de Bambadinca é o nosso histórico Humberto Reis, "cartógrafo-mor" do nosso blogue, ex-fur mil op esp, CCAÇ 2590 / CC12 (1969/71).
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Nota do editor:

Último poste da série > 10 de março de 2023 > Guiné 61/74 - P24134: As nossas geografias emocionais (1): Bafatá - Parte I: Fotos de Humberto Reis (ex-fur mil op esp, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71): viagem de 1966