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terça-feira, 19 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12313: Memória dos lugares (254): Aquartelamento de Bambadinca, c. 1970 (Fotos de Humberto Reis, CCAÇ 12, 1969/71) (Parte II)... Daqui da ilha de Luanda e enquanto tenho acesso à rede sem fios, mando um abraço madrugador a um bom camarada que também passou pela "cova do lagarto" , e que hoje faz anos, o Mário Miguéis da Silva. (Luís Graça)


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 >  Foto  nº 1 > Vista aérea do aquartelamento e posto administrativo de Bambadinca (que pertencia ao município de Bafatá) > Vista aérea, obtida de helicóptero,

Em primeiro plano o edifício do comando e as instalações de oficiais e sargentos. Bambadinca (em mandinga, "cova do lagarto") ficava numa pequena elevação ou morro, sobranceiro à extensa bolanha (a leste, à direita da imagem) e ao rio Geba (a norte), e de que vê uma nesga, ao fundo do lado esquerdo.

Nesta altura, por volta do 1º trimestre de 1970, Bambadinca albergava mais de 700 militares (incluindo a CCS/BCAÇ 2852, prestes a terminar a sua comissão, mais um companhia de intervenção, a CCAÇ 12, 1 pelotão de morteiros, 1 pel rec daimler, 1 pel caç nat, mais 1 pelotão de intendência (embora este tivesse instalações próprias, junto ao porto fluvial de Bambadinca, na margem esquerda do Rio Geba Estreito).

Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 2 >  Outra vista parcelar do aquartelamento: em primeiro plano, a rede de arame farpado e as valas de proteção ao longo do perímetro do quartel e posto administrativo (que além das instalações do posto, incluia ainda uma estação dos CTT, uma capela, uma escola com alojamento  para a professora, que era cabioverdiana)...

A tabanca de Bambadinca, propriamente dita, ficava entre o aquartelamento e o rio, ou seja, a norte, já fora do perímetro de arame farpado... Além de diversas moranças, incluia pelo menos 3 estabelecimentos comerciais, incluindo a Casa Gouveia, e as lojas do Zé Maria e do Rendeiro.  A sul do aquartleamento, a menos de um quilómetro, havia outra tabanca, reordenada, chamada Bambadincazinho.


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 3 > Na altura estava em contrução, a cargo da empresa TECNIL,  a nova estraada (alcatroada) Xime-Bambadinca, fazendo depois ligação à estrada Bambadinca-Bafatá, que já existia,,, Na imagem acima, vê-se parte das movimentações de terra, necessárias para a terraplanagem... A nova estrada contornava Bambadinca, pelo lado da bolanha (pelo lado leste).



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 >  A foto original, com resolução igual a 1,75 MB, a partir da qual obtivemos as três  imagens, inseridas acima, permitindo um maior detalhe do aquartelamento.

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), que tem seguramente algumas das melhores fotos  aéreas da da zona leste (Bambadinca, Xime, Mansambo, Xitole, Bafatá...) tiradas de helicóptero... São fotos de "slides", digitalizados. Ele tinha na altura uma boa relação com um ou mais dos pilotos da FAP, o que lhe permitiu apanhar algumas boleais e ver a Guiné "by air"... Enfim, um pequeno privilégio que não era para todos... (Re)publciamos hoje mais uma foto de Bambadinca, "by air", tirada de heli AL III, na aproximação ao heliporto, que ficava do aldo direito fa foto. Vd. poste anterior, P12310 (*).



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Nesta outra foto,  tirada de terra, veem-se os trabalhos de construção da nova estrada Xime-Bambadinca que iria fazer a ligação à estrada Bambadinca-Bafatá... A obra estava a cargo da empresa Tecnil para a qual irá trabalhar, uns largos anos depois, o nosso amigo e camarada Rosinha. Nesta imagem, à esquerda vê-se o morro de Bambadinca e uma nesga da messe de oficiais. Do lado direito, era a grande bolanha de Bambadinca ("cova do lagarto", na língua dos mandingas).

Apoveito para, daqui da ilha de Luanda e enquanto acesso à erde sem fios, mandar  um abraço madrugador, a um bom camarada que passou também por Bambadinca, e que hoje faz anos, o  Mário Miguéis da Silva... (LG).


Fotos: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: L.G.]

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Nota do editor: 

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3242: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (45): Um almoço tardio com um engenheiro exterminador


Texto de Mário Beja Santos
ex-Alf Mil,
Comandante do Pel Caç Nat 52,
Missirá e Bambadinca,
1968/70

Fotos (e legendas): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.




Operação Macaréu à vista

Episódio XLV

UM ALMOÇO TARDIO COM UM ENGENHEIRO EXTERMINADOR
Beja Santos

Fotografias amorosas no Bambadincazinho e outras estórias


A Guiné está alagada, todos os cursos de água que passam pela região de Bambadinca transformam-se em lama, recordam-nos o dilúvio permanente, água no solo, nos rios, ribeiras, bolanhas, estradões, picadas, valas. Passámos a noite na missão do sono, assim começou o mês de Julho. Ao nascer do dia, procurei desentorpecer o corpo com um duche, dormitei e a seguir fui buscar Malaquia, a linda noiva de Fodé Dahaba, à tabanca de Bambadinca para tirarmos fotografias destinadas ao seu amor em Lisboa. Fodé Dahaba ainda está no Hospital Militar Principal, adapta-se a uma prótese, ainda cambaleia, pede notícias, quer que eu venha depressa, garante não querer regressar à Guiné sem me ver em Lisboa. Em Bambadinca converso com Jará, a mãe de Malaquia, apareceu engalanada, traz um vestido de cores ciclâmicas, a menina aparece também em indumentária festiva, lá vamos de jeep com o avô Quebá, imponente em traje muçulmano com sabadora azul debruada a ouro. No Bambadincazinho, de onde parti há escassas horas, aguardo um primozinho Dahaba que é almani, tias, sobrinhos, a mãe daquele e daqueloutro, tudo em tons garridos, seguem-se dois rolos de fotografias com grandes poses, há risadas mas também a grande apreensão por esse Fodé ausente há mais de um ano e meio. A todos procuro consolar, prometo a Malaquia escrever ainda hoje a Fodé garantindo que o homem mais bonito do mundo é noivo da bajuda mais linda da Guiné, da Gâmbia, da África Ocidental, de todos os continentes.

Rua de Bambadinca em dias de chuva

No regresso, vou procurar pôr o correio em dia. O mandinga Sana Mané, milícia de Missirá, pede ajuda pecuniária e comunica que houve um ataque de foguetões em Farim. Entra o Pires para informar que vão mais quatro soldados para os Nhabijões conjuntamente com gente da CCS, temos um pelotão reduzido a vinte homens. Não me dá tempo para eu refilar, esta noite voltaremos para a emboscada nocturna, amanhã estaremos na ponte de Udunduma, seguir-se-á uma coluna ao Xitole e pergunta-me em que dia é que passaremos a fazer patrulhas diárias na estrada Xime-Bambadinca. Pelas informações que disponho, seremos vigilantes da Tecnil a partir de 6 e muito provavelmente até ao fim do mês, isto independentemente dos reforços de urgência, as colunas ao Cossé e a Badora, os patrulhamentos nos Nhabijões, a secção que vai a Bafatá buscar correio e os frescos, e o mais que se sabe.

Escrevo à Cristina comunicando que o Queirós já vai a caminho de Lisboa, é prémio governador da Guiné, peço desculpa pelas lembranças pobrezinhas, sou um marido casado de fresco com falta de dinheiro. Nesse aerograma apresento assim o Queirós: “É um Teixeira mais pequeno, é um leal amigo, é destemido, tivesse estudado seria um oficial exemplar”. Refiro que estou a ler uma colectânea de contos sobre vampiros organizada por Roger Vadim, procuro acabar “A Erva Canta” de Doris Lessing, que houve cinema na tabanca, “O Aventureiro de Cincinnati”, com Steve McQueen, Edward G. Robinson e Ann-Margret, um drama à volta do jogo do poker, uma interessante realização de Norman Jewison, que continuam os assaltos nos Nhabijões, para nós é uma situação incompreensível, só de manhã é que a população se vem queixar, não se ouvem gritos, não há tiros nem desacatos, é uma estranhíssima conspiração do silêncio. Termino dizendo que ainda ninguém sabe da minha substituição, vaticina-se que o substituto possa demorar mais um mês ou mesmo dois. Neste aerograma, para não a afligir mais, escondo-lhe que o furriel Ocante vai ser evacuado, que o sargento Cascalheira vai ser operado em Bissau e que o furriel Pires dá sinais de esgotamento. Penso para os meus botões que a situação ideal para esta altura era sermos desterrados para os Nhabijões e aqui ficarmos esquecidos.

Continuadas surpresas com a literatura emprestada por D. Violete

Os nossos encontros lembram os dos espiões. Saio da messe de oficiais com uma resma de papéis debaixo do braço, atravesso placidamente a estrada, avanço para a escola, viro à direita, bato à porta da casa da professora, quando de lá saio trago à mesma porções de papéis, é preciso estar atento para saber que é uma resma de outras preciosidades. Curiosamente, desta feita, venho com papéis magros, jornais amarelecidos, folhas desirmanadas. Tudo me serve para me sentir ocupado neste tempo de marasmo, de desconsolo, os meus vínculos não passam por esta nova unidade mas sim pelos meus soldados e pelo que quero aprender da Guiné. Com o caderninho viajante aberto, escrevo o que me parece útil com a esferográfica Bic.

D. Violete passou-me uma revista chamada Ocidente, lembrou-me a revista Ilustração Portuguesa, fotografias e textos curtos. O número é de 30 de Novembro de 1907 e fala de uma rebelião na Guiné Portuguesa. O autor, depois de insistir na falta de auxílio da metrópole, escreve: “Bissau, batido em 1904, sendo o governador o actual general sr. Vasconcellos e Sá, depois de ali termos sofrido um grande desastre em 1891, não se pensou nunca em o ocupar; depois de tantos sacrifícios e abnegações, ficámos com o domínio efectivo somente na fortaleza”. E mais adiante: “Os indígenas na região de Geba foram sempre considerados os mais submissos e nossos amigos; foram nossos auxiliares na campanha contra o Oio. Foi a região escolhida pelo o governador Biker para implantar o imposto, cobrado pela primeira vez em 1902, sob a designação por imposto de capitação, e no ano seguinte transformado no imposto de palhota actual”. Começo a perceber que esta prosa obedece a uma orientação crítica, sabe-se lá quem pretende insinuar torpezas sobre o governante de Bolama, pondo-se praticamente ao lado de Infali Soncó e denegrindo o régulo do Xime: “Diz-se que o régulo Infali Soncó estava descontente por lhe terem sido tiradas umas armas pertencentes ao Estado, e que aproveitou o pretexto de umas bofetadas aplicadas a um súbdito. Cremos que ele não sentiria menos as bofetadas do que o desgosto de lhe tirarem as armas, porquanto o esbofeteado não foi um súbdito qualquer foi um dos seus judeus, tocador de marimbas. As armas que lhe foram agora tiradas, tinham sido emprestadas por um governador para ele se defender contra as incursões e roubos dos balantas de Enxalé, que confina com o seu território. Ele, autorizado pelo governador, fazia guerra a seu modo, de represálias, queimava povoações, apreendia mulheres, gado, etc, àqueles povos que não queriam saber do nosso domínio nem nos pagam imposto (...). A má vontade da maior parte dos régulos fulas a Abdulai do Xime é já antiga. Desde que Abdulai é régulo do Xime nunca os fulas quiseram reconhecer a sua autoridade e abandonaram o território, tendo pedido desde então um régulo da sua raça. O Xime está despovoado. Tem sido uma teimosia querer impor pela força aos fulas um régulo originário de território francês. Com esta nova guerra vamos levantar inimizades com chefes que sempre têm sido nossos amigos porque se muitos hão-de ser por nós, alguns hão-de ser contra nós...”. Fica-se mesmo a perceber que há uma opinião pública descontente, a crítica publicada no Ocidente é, sem margem para dúvidas, uma chamada de atenção para o Terreiro do Paço. Suspendo as leituras por aqui, tenho ainda outra crítica ao governador Muzanty para examinar e depois quero ler um livro com belas ilustrações, Babel Negra. Fica para depois das emboscadas nocturnas, das colunas e dos patrulhamentos. Talvez amanhã, talvez depois.

O livro de Landerset Simões propõe-se abordar a etnografia, a arte e a cultura da Guiné. Em tudo fica pela rama, mas não deixa de ser curioso. É uma imagem muito própria dos anos 30, com destaque para o exotismo, numa atitude colonial de revelação do indígena com hipóteses de vir a ser civilizado. Aliás, o general Norton de Matos escreve na apresentação: «O autor deste livro é um colonial. Classifico-o de colonial, porque revela no seu trabalho as qualidades essenciais. A vocação que o levou a África, a maneira como se deixou envolver pelo meio estranho em que quis penetrar, sem se deixar dominar por ele, sem perder as qualidades de colono portador e iniciador de uma civilização superior àquela que já encontrara.»
Esta fotografia é de uma impressionante beleza.


O alcatroamento da estrada Xime-Bambadinca

São aproximadamente nove quilómetros a distância que separa o aquartelamento do Xime do destacamento-povoação de Amedalai. Os primeiros dois quilómetros às portas do Xime estão concluídos, desmatou-se amplamente à volta, é um território com extensas bolanhas, o perigo de emboscada é quase improvável (disseram-me mesmo que nunca houve aqui emboscadas). Os construtores da estrada lembraram-se mesmo que vivemos uma guerra, a maquinaria está permanentemente exposta a actos destruidores, tem por isso que recolher a porto seguro, todos os dias. De Amedalai até Ponta Coli há alguns perigos, desmatou-se tudo à volta da estrada, já se prepararam os primeiros dois quilómetros, pelo menos o macadame está pronto a receber o tapete de alcatrão. Os trabalhadores da Tecnil partem ao amanhecer seja do quartel do Xime seja do destacamento de Amedalai. Nós preparamos a segurança, a partir das cinco e meia da manhã, com os primeiros alvores do dia. À frente, um grupo de cinco picadores, depois dois Unimog 404 pejados de trabalhadores, depois as máquinas, das mais potentes às mais ligeiras, nós flanqueamos, as viaturas seguem lentamente, a maquinaria faz-se ouvir, esmagando o saibro da estrada. Nisto levamos uma hora. Só que estamos na época das chuvas, o amanhecer faz-se com alguma neblina, redobram-se as cautelas, depois o dia aquece mesmo sufocando as gargantas e as narinas, é um tempo de estufa, o suor empapa-se às fardas, não pode evaporar. Os desacertos à programação dos trabalhos são pois inesperados, um caudal de chuva atormenta os corpos, o ritmo de trabalho reduz-se, e por vezes é impraticável quando os trabalhadores lançam o cascalho, ele escorre para as bermas e atola as valas abertas a enxada. Quem patrulha procura descortinar o horizonte, felizmente que não tem havido flagelações, levamos à cautela o morteiro 81, os guerrilheiros não se anunciam, isto quando estamos fartos de saber que nunca houve tanta pilhagem como agora nos Nhabijões.

Aquela manhã surgira com sol, direi mesmo que foi uma manhã quente, os operários estiveram em permanente azáfama, as máquinas resfolegaram, o engenheiro e os capatazes circulavam em todas as direcções. Era um engenheiro de trato afável, com mais de trinta anos, um cabo-verdiano com o cabelo quase escorrido, visivelmente bem educado e de bom trato, impunha-se certamente pela sua competência, era visível que não precisava de gritar nem muito menos se impunha a insultar. Aparecia à hora certa, seguia habitualmente a pé, confirmava o que se fizera na véspera, dava instruções aos capatazes durante o percurso, circulava, rectificava, ninguém o contestava. À distância, com um olho no fundo das bolanhas e com o outro a vasculhar quaisquer sinais de intrusão nocturna, sempre obcecado com as minas anti-pessoais, não perdia este espectáculo de autoridade natural.

Ao fim da manhã, parávamos, a comida surgia dos bornais ou dos potes da bianda, que alguém entretanto preparara, quer para militares quer para civis. Nesses instantes, e só nesses instantes, conversava amenamente com o engenheiro Semedo (vamos supor que era esse o seu nome). Viera da Brava até Lisboa, fizera o Técnico com altas classificações, aceitara este contrato com a Tecnil, previa que depois dos bons resultados deste empreendimento o lançassem numa obra de maior envergadura.

Mas naquele dia não tirámos a comida dos bornais. O tempo arrefeceu, o céu começou por se iluminar em tons exagerados de estúdio cinematográfico, e até temi que se estivesse a formar um tornado, mas o que aconteceu é que chegou uma semi-escuridão e depois o ribombar que anunciava o dilúvio. Ele chegou, ensopou em minutos a roupa, era chuva espessa, o saibro fugia, escorria pelas valetas. O engenheiro Semedo avançou para mim, disse-me sem hesitação ou resignação: “Sr. alferes, não podemos continuar, vamos regressar a Amedalai, amanhã também é dia”. Retirámos com a maquinaria, havia Unimogs em Amedalai e sugeri ao engenheiro Semedo: “Proponho que hoje não se coma do bornal, convido-o, vamos até à messe de Bambadinca, tomamos um banho e mudamos de roupa, fazem-se uns bifes ou uns ovos, o vinho fica por minha conta”. O engenheiro Semedo aceitou e regressámos sem que o dilúvio abrandasse. Pelas 15h, tínhamos bife com ovo a cavalo e eu abri uma garrafa de Dão tinto Porta dos Cavaleiros.

Uma insólita proposta de exterminação de inimigos

Comíamos e bebíamos com satisfação, tudo indicava que seríamos novos amigos. Falámos de cineclubes, revelei-lhe que tinha sido sócio de quatro (Imagem, ABC, Universitário e Católico), falámos de ciclos de filmes, como a comédia britânica dos anos 50, Sacha Guitry, Hitchcock, Visconti e De Sica. Depois falámos de livros, houve um momento em que senti que tínhamos mudado de ambiente, eu estava a viver a fundo as minhas saudades. É nisto que se inicia a mais inesperada das conversas sobre a guerra e as soluções que se equacionam, qualquer coisa deste género:

- Sr. alferes, tem consciência que esta guerra ainda não está resolvida por interesses obscuros?

Foi como se tivesse engolido muitos cubos de gelo em segundos, fiquei hirto, quase incapaz de raciocinar. Depois investi, delicadamente.

- Sr. engenheiro, vai perdoar-me mas nós militares não conversamos sobre essas coisas com civis. A guerrilha tem as suas regras, a guerra tem os seus segredos. Desculpe recusar responder-lhe.

- Vamos lá, não se acanhe, estamos a falar sem quaisquer testemunhas, podemos dizer o que nos apetece, aqui nada nos compromete. O que eu estou a dizer-lhe é que há uma solução militar para pôr termo a este conflito com os terroristas. Eles aproveitam-se da vossa incapacidade em lutar com as mesmas armas.

Sentia-me siderado com a evolução da conversa, agora o engenheiro passava-nos um atestado de incapacidade.

- Sr. engenheiro, creio que exagera, lutamos com todos os meios, já deve ter visto que estas obras de construção, o reordenamento, as políticas de saúde e de educação, servem o desenvolvimento, as populações estão a viver melhor.

- Às vezes, penso que as tropas metropolitanas têm medo de avançar, acobardaram-se, querem estar aqui uns meses e irem-se embora. É assim que o terrorismo tem crescido, vocês revelam-se incapazes de ganhar a guerra.

Levantei-me lívido, amaldiçoando aquele convite e aquele Dão Porta dos Cavaleiros saído do meu bolso. O engenheiro revelara-se um grosseiro, uma besta incapaz de perceber que estava em minha casa.

- Se me permite, a conversa foi longe de mais.

- Não foi, o Sr. alferes recusa discutir as soluções militares, elas existem, não volte a cara às realidades.

- Sr. engenheiro, como é que quer resolver uma guerrilha num território destes, com amplas fronteiras de dois Estados que nos são hostis, com populações que vivem no mato e que não querem regressar?

- Sr. alferes, bastavam seis companhias de cabo-verdianos, em meses tínhamos acabado com esta peste.

- Sr. engenheiro, espero que saiba o que é o efectivo de seis companhias, como é que esses seus conterrâneos resolviam a guerra?

- Nós, ao contrário de vocês, matávamos sem hesitar esses pretos de m... Entrávamos nessas barracas onde eles vivem e matávamos tudo, acredite, velhos e crianças ninguém escapava. Só se resolve o terror com um terror ainda mais violento. Há séculos que vimos de Cabo Verde para aqui, eles são indígenas e não passam disso. Portugal tem que saber escolher.

Invadido pela náusea, pretextei afazeres, o almoço acabou em silêncio. Continuei a ver o engenheiro Semedo todos os dias, ele fez bem em não ter voltado a falar-me dos seus planos de extermínio. Mas naquele dia perdi definitivamente a inocência: havia um conflito racial mal dissimulado, tão ou mais explosivo que aquele que separava os que se acobertavam com a bandeira portuguesa e os que dela se queriam libertar.

As últimas ilusões sobre o conflito racial vou perdê-las em breve, quando chegar o meu “periquito”.

Uma semana a ler Mauriac e Agatha Christie

Há muito tempo que não lia François Mauriac e fopi muito bom ler “O Fim da Noite”. Teresa Desqueyroux é uma mulher que veio da província onde terá cometido uma tentativa de assassínio do marido, instalou-se em Paris, tem saúde débil, vive numa quase completo isolamento. O estilo de Mauriac apoia-se nas análises, nos monólogos, nas sensações e mas imagens. Teresa vai receber a visita de filha e durante algum tempo ela fica liberta das suas amargas recordações. Maria, no entanto, vem pedir ajuda à mãe, não está segura dos sentimentos do seu noivo, Jorge. Teresa interfere, o noivo da filha declara-se à mãe. Teresa envolve-se em novas lutas e novas renúncias, arquitecta estratégias para a reconciliação entre Maria e Jorge. Chega a voltar à província, reencontra o marido e procura selar o casamento da filha. Teresa está cansada de tudo, anseia pela o fim, a noite é o fim da vida. Percebo agora porque é que dizem que Mauriac é um génio, como é que as suas narrativas são insuperáveis na ordem da escrita.





Tradução de Cabral do Nascimento, capa de Fernando de Azevedo, Editorial Estúdios Cor, 1957. É uma das obras-primas François Mauriac. No prefácio, ele escreve: "Não quis fazer de O Fim da Noite a continuação de Teresa Desqueyroux, mas sim o retrato de uma mulher no declínio e que eu já descrevera no tempo da sua mocidade criminosa". Esta Teresa é uma mulher neuraesténica, isolada, muito doente, que revê a filha que a vai visitar a Paris, pedir-lhe conselho sobre a sua relação amorosa. Esta visita vai detonar a retoma de relações com a família da província, incluíndo o marido, Bernardo. Mas as personagens princípais são de facto Teresa, a filha Maria e Jorge, o seu namorado. Jorge pensa ter-se apaixonado por Teresa, nem tudo vai acabar bem, excepto para a precipitação do fim da noite de Teresa. A arquitectura literária de Mauriac é sublime, eu ainda não sabia que ele estava fadado a passar ao nível dos clássicos da literatura francesa, e mesmo mundial.

“Os Crimes do ABC”, de Agatha Christie, é um outro pequeno clássico do seu génio. O capitão Hastings, velho amigo de Hercule Poirot, está de volta e acompanha o talentoso investigador belga num dos seus casos mais surpreendentes. Alguém manda cartas a Poirot indicando local e dia de um acontecimento misterioso que a polícia não desvendará, assinando ABC. Haverá vários crimes, todos eles insolúveis, não se encontra razão de ser para aqueles crimes, até que um pobre alienado se entrega à polícia, confessando-se culpado. Poirot revela a maquinação que está por detrás, é um dos mais surpreendentes grandes finais de Agatha Christie, uma hábil utilização da árvore que se oculta na floresta.






N.º 167 da Colecção Vampiro, tradução de Mascarenhas Barreto, belíssima capa de Lima de Freitas. É obra de referência obrigatória, quando se fala na criadora de Hercule Poirot. Estamos em 1935, o capitão Hastings voltou da América do Sul, descobre que Poirot pinta o cabelo e bigode. Começam a chegar as mensagens assinadas por ABC, em Andover haverá o primeiro crime (Alice Ascher), outros ocorrerão. Irá aparecer o Inspector Japp, velho companheiro de Poirot em investigações criminais. Crimes insolúveis, parece. Até que um dia Alexander Bonaparte Cust se entrega à polícia. Então, Poirot desvenda uma maquinação surpreendente do cérebro diabolicamente inteligente que empurrava ABC para a pesquisa dos polícias. Livro imperdível, pelo menos para os aficionados do policial.


Em breve, vai chegar Nelson Wahnon Reis. Mal sabe o meu substituto o drama que o acompanha, a angústia que me veio trazer. Iremos percorrer juntos toda a zona de intervenção, irei partir para Bissau em grande desassossego. E um dia parto no Carvalho Araújo, será uma viagem de doze dias, passando por Cabo Verde e São Miguel. Com algumas peripécias dignas de uma comissão onde elas estiveram sempre presentes.
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Nota de CV

Vd. último poste da série de 19 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3218: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (44): Em Bissau, no julgamento de Quebá Sissé

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2540: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (20): A morte de Uam Sambu, na Missão do Sono, em Bambadincazinho

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Tabancas de Bambadincazinho onde estava instalada a Missão do Sono. Estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole. Foto do Luís Moreira (ex-alf mil da CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/71; BENG, Bissau, 1971; será gravemente na explosão de uma mina anticarro, em 13 de Janeiro de 1971, em Nhabijões, no mesmo sítio onde duas horas depois rebentaria outra mina que atingiu a viatura onde ia um Gr de Combate da CCAÇ 12, e onde seguia o editor do blogue) (1).

Foto: Luís Moreira (2005). Direitos reservados.

Cópia do poema escritoi por beja Santos, na morte do Uam Sambu: "O pseudopoema foi escrito logo a seguir à morte de Uam, penso que a 2 de Janeiro.Vim para Bissau a 12, reescreviu-o e enviei-o à Cristina, tal como se pode ver, cheio de dor.Estou doente, mas comecei a dormir melhor.Digo à Cristina que estou ansioso por a ver,suspeito que será em Fevereiro,não será assim. Saio de Bissau, e com o Pel Caç Nat 52 vamos para a operação Topázio Valioso" (BS).

Foto: © Beja Santos (2007). Direitos reservados.

Texto do Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), remetido em 13 de dezembro de 2007:

Luís, tal como prometido, aqui tens mais um episódio esta semana. Seguem amanhã as capas dos livros. Se tivesses uma fotografia com a missão do sono do Bambadincazinho era o ideal. Creio que tens uma fotografia da vossa passagem de ano, na messe de sargentos. E, como sempre, temos a espelunca da ponte de Udunduma. Para a semana volto a interrogar o Queta e o Pires. Faltam-me cartas e as que tenho falam mais no casório do que nas coisas da guerra (vou casar por procuração no inicio de Fevereiro). Recebe um abraço do Mário.

Operação Macaréu à vista > Episódio XX

A MORTE DE UAM SAMBU

por Beja Santos

(i) Aquela tumultuosa noite de passagem de ano

Um pouco antes do lusco-fusco, o Setúbal levou-nos para a Missão do Sono, no Bambadincazinho, partíamos para uma emboscada visando proteger Bambadinca a partir da estrada de Mansambo, fazia parte do plano defensivo do quartel. O transporte por Unimog era obrigatório por causa das munições, pois caso houvesse flagelação das gentes de Galo Corubal, Bambadinca não podia ripostar na nossa direcção, seríamos nós a reagir ao fogo inimigo.

A velha Missão do Sono resistia de pé e ainda em bom estado, era uma daquelas construções coloniais típicas, rebocada de branco, bem telhada, paredes arejadas e com uma varanda simpática com tijolos, cuidadosamente cimentada. Em torno do edifício, a malta da engenharia com a tropa do batalhão fizeram um largo U que era uma barricada de bidões cheios de terra, com uma leve cobertura de cimento.

Era aí que passávamos a noite, duas sentinelas em permanência, não era recomendável pernoitar dentro da missão, uma simples roquetada podia fazer uma mortandade, abrigávamo-nos junto dos bidões, os cunhetes de granadas de bazuca e morteiro num espaço central, bem como os cunhetes de balas e o telefone de campanha. Pelas 6 da tarde, estávamos todos instalados, havia cantis e rações de combate, atendendo que se tratava de uma estadia de doze horas.

Há muito pouco a contar sobre estas noites de emboscada. Até ao anoitecer, estávamos entretidos a ver a população chegar e a partir de Bambadinca, havia gente a viver na região de Água Verde, mas também em Iero Nhapa, Aliu Jai, Sare Nhado e Queroane. Depois, crescia o silêncio total pontuado pelo piar das aves e o restolhar dos animais. À distância de dois quilómetros, talvez um pouco mais, os holofotes no quartel referenciavam com clareza a estrada para Mansambo. Mas a mata fechada era imponente, era dali que procurávamos ouvir os sons de uma intempestiva flagelação.

Inactivos, aproveitávamos para conversar em voz baixa: quem estava doente, quem queria ir de férias, com mais discrição alguém perguntava ao alferes se este podia adiantar duzentos ou trezentos escudos, seguiam-se as explicações intermináveis, a cerimónia de um choro, uma mãe muito doente, um paizinho no hospital, a compra de um rádio, dar dinheiro ao irmãozinho que ia para Bolama, há sempre argumentos de toda a ordem para pedir dinheiro emprestado ou adiantado. Depois, chegava a modorra, lá nos aconchegávamos na friagem da noite, levávamos mantas e adormecíamos aos três e quatro, o Domingos umas vezes, outras o Queirós, outras o Benjamim, outras o Barbosa, iam chamar de duas em duas horas os novos sentinelas. Quem podia dormia, os outros procuravam dar repouso ao corpo, recordavam quem os esperava em Portugal, o que fazer depois do fim da guerra. E assim chegávamos ao amanhecer.

Só que naquela noite tudo aconteceu às avessas, por capricho do destino. Do Xime primeiro, do outro lado do Geba, depois, começou um medonho foguetório quando precisamente se deu a passagem de ano. No caso do Xime era horrível de se ver, o céu rasgado pelas descargas do fogo das espingardas metralhadoras, das saídas de morteiro e bazuca, mas havia o incompreensível silêncio do inimigo que não se apresentava.

Irei escrever à Cristina:

“Era meia noite e estava eu em ânsias, impressionado com o potencial de fogo, supondo que aquela flagelação arrasaria o quartel. Liguei para Bambadinca (maior deste chama maior desse, proponho ir auxiliar força atacada, escuto, e depois de um longo silêncio com o ruído de fundo do costume, o maior daquele avisou-me que eram tiros de festa, devia haver ali uma boa bebedeira, que o maior deste não se preocupasse). Quando nos preparávamos para descansar, foi a vez do fogo de Mansambo, desta vez nem usei o telefone de campanha, não chegaram instruções de Bambadinca. A partir das 2 da manhã, demos por finda a preocupação com o tiroteio dos outros, a sua exuberância de reveillon na floresta. E depois da tempestade veio a bonança. Mal sabia eu que estava no princípio dos meus azares”.

O Setúbal já nos tinha avisado que viria o Xabregas ao amanhecer, eu que não estivesse preocupado. Assim que clareou, todos de pé, arrumadas as mantas, satisfeitas as necessidades mais prementes nas redondezas, esperámos a tiritar a aproximação dos faróis do Unimog, procurando desentorpecer os músculos. Assim foi naquele amanhecer de 1 de Janeiro de 1970. O Xabregas trouxe um burrinho, o que significava dez militares sentados, 20 a pé. Dez não, um outro saltava para o lado do condutor, mais um outro encavalitava-se junto do alferes. Uam Sambu senta-se ao pé de mim e diz a Quebá Sissé:
- Sobe Doutor, dá cá a mão! - Vejo o riso feliz e sempre aberto de Quebá Sissé, segue-se o estrondo inusitado de uma rajada de G3, procuro levantar-me, oiço gritos de aflição, imprecações, um coro desorientado de protestos, e é nisto que Uam me cai nos braços enterrando-me no assento:
- Alferes, estou morto!”

Com Uam no meu colo, vejo o seu peito esburacado, os lábios num esgar de dor, o olhar a esmorecer, o sangue passa para a minha farda em abundância. O burrinho corre em poucos minutos nas mãos expeditas do Xabregas até à enfermaria. Vou a correr tirar da cama o Vidal Saraiva que se debruça atarantado sobre Uam com o peito tracejado por diferentes perfurações. Cá fora, desenrola-se uma outra tragédia, há quem ameace o Doutor, ouve-se a palavra assassino, ouvem-se as expressões impensadas do costume. Ora, tinha sido o mais estúpido dos acidentes, o malogrado Doutor ao subir metera o dedo no gatilho e fulminara Uam, o Doutor era a alma mais pacífica do 52, ninguém lhe conhecia azedume, aguentara estoicamente todos os comentários ao seu trabalho de cozinheiro. Percebendo que era necessário pôr termo àquela ira dementada, disse ao Domingos:
- Não quero aqui ninguém, tudo para a tabanca, tu desces imediatamente com eles e explicas que foi um acidente, quem tocar no Doutor tramo-lhe a vida.

Dita a bazófia, acerquei-me da marquesa onde o Vidal Saraiva me avisou:
- Só por milagre se salva, tem os órgãos vitais atingidos, veja o sangue aos cantos da boca, pulmões e rins têm lesões que presumo serem irreversíveis. Vamos ver como é que ele se aguenta até Bissau.

A DO chegou rapidamente e lá fomos todos a acompanhar o moribundo até à pista de aviação, Binta, a mulher do Uam, gritava o seu desespero, o Pel Caç Nat 52 assistia ao transporte de Uam num silêncio total, estarrecido. Dispersámos, o Vidal Saraiva era o mais acabrunhado entre nós.

À tarde fomos trabalhar para Galomaro, levámos coisas a Madina Bonco, depois Bafatá, à noite voltámos à missão do sono. Escrevi à Cristina:

“Pelas 10 da noite desse 1 de Janeiro, o Reis telefonou da ponte de Udunduma dizendo que tinha um soldado gravemente ferido. Lá fomos e trouxemos um apontador de morteiro que estava com uma mão escavacada pelos impactos de uma morteirada. Logo a seguir foi a nossa vez de voltarmos para a ponte”.

Era assim esta nossa guerra sem feitos épicos, só mágoas e canseira. No dia seguinte, chegou-nos a notícia de Bissau: Uam finou-se no bloco operatório.

(ii) As minhas recordações de Uam

Quando cheguei a Missirá, no início de Agosto de 1968, Uam tinha sido evacuado na véspera, com o peito estilhaçado, em resultado de ter tocado nos fios de uma armadilha. Só o conheci em Abril de 1969, quando regressou totalmente restabelecido. Escrevi dele no meu caderninho de viagem, convencido que dominava a prosa poética: “É um azeite de palma com ceptro de maracujá, enfeitado com bicos de periquitos no seu guarda de corpo”.

Vinha do Morés, sabia rir devagar, possuía um andar elegante, o seu comportamento militar era o de um herói. Conhecera ferimentos graves em duas emboscadas. Os seus estilhaços formavam nódulos no peito, e por isso ele ia a Bambadinca extrair insólitos pedaços de ferro e aço que deixava o médico pasmado. Era um prazer passar, nas noites de Missirá, um pouco na sua companhia quando eu o visitava no reforço. Ouvi-lhe contar narrativas guerreiras mansoanques, eu ficava deslumbrado. Ao fim da tarde, ele despia o camuflado, adornava-se de amuletos e fetiches punha um manto com as cores de Navarra, lembrava-me um Zulu.

Numa das minhas conversas com Lânsana, perguntei-lhe se os mansoanques eram islamizados. O padre de Missirá respondeu-me que os mansoanques eram totemistas, acreditavam nos elementos da natureza, nas pilhas de fogo, nos símbolos aquáticos, eram gente sem deus. Quando fomos destacados para Bambadinca, o estado de saúde do Uam tinha-se agravado, já não podia fazer operações, tal a sua fragilidade.

Talvez o tenente Pinheiro tenha razão, eu estou a amalucar, quando o helicóptero o leva para Bissau e Binta Sambu arranca os cabelos, transida com o arame farpado profundo, eu inventei uma lenda. Que um anjo lhe acobertara a nudez e que o dia se estava a avermelhar num calor de tornados e febres. Que Uam corria velozmente para o céu onde foi recebido em festa e que o Uam se torcionava ao som de um batuque trepidante. Ele fumava um canhoto (cachimbo), para mim ele tinha morrido de olhos abertos, lembrava-me do que me tinha dito Mamadu Camará de uma emboscada que o 52 sofrera em Canturé, em 1967, ele em cima de um Unimog, de pé, reagiu à emboscada, estava em dia fasto, nenhuma bala lhe roubou a vida.

No meu quarto, escrevo poema para Uam Sambu, uma coisa sem importância que vou mandar num aerograma para a Cristina:

Canhoto chupado, preto mansoanque, manto
de Navarra, um gamo antigo.

Nascera na hora de batuque, acima do Oio,
tabanca era Sambu.
No peito, traços de estilhaços, mas estilhaços
O níquel da vida...


E digo à Cristina que estou doente, incapaz de resumir em meia dúzia de linhas tudo o que me vai na alma. E termino: “Desejo ardentemente o nosso encontro, começar a fazer-te feliz.”


Copia da obra Casa Grande e Senzala, do brasileiro Gilberto Freyre (1900-1987). Edição: Livros do Brasil, Lisboa. "Esta obra,tal como Sobrados e Mucambos,entusiasmou-muito: estava finalmente a confrontar-me com um colono retratado a corpo inteiro, o que era impossível na Guiné. Curiosamente, voltei a ler este livro quando fiz História do Brasil" (BS).
Foto: © Beja Santos (2007). Direitos reservados.


(iii) As minhas recordações do Xabregas

Chamava-se Mário Dias Perdigão e quando o voltei a ver, no fim dos anos 80, trabalhava na Trevauto, na rua de Arroios, em Lisboa. Eu representava o Ministério do Ambiente no Conselho de Prevenção do Tabagismo, que funcionava num serviço do Ministério da Saúde, ali perto. Um dia, olho para o balcão de atendimento da Trevauto, o rosto daquele homem que escrevia atentamente num livro de encomendas, era-me familiar. Entrei, apontámos um dedo um ao outro e houve gritaria no reencontro. Deu-me o seu cartão, queria que eu fosse a sua casa. Todos os meses se repetia o ritual, eram uns minutos de recordações de Bambadinca e arredores.
- Oh meu alferes, lembra-se quando fomos ao Xitole e a GMC rebentou os pneus debaixo de uma mina? Os sapadores vieram, não havia novidade, mudámos os pneus, lá seguimos para o Xitole e para o Saltinho... Oh meu alferes, e se aquele gajo que matou o outro no dia 1 de Janeiro [de 1970] tem enfiado uma rajada em nós? As coisas que vivemos, meu alferes!.

Até que um dia passei por ali e não vi o Xabregas no balcão, o que me surpreendeu já que poucos meses antes o tinha encontrado uma noite no Café Império, e ficara aprazada uma nova visita com almoço, depois de uma das minhas reuniões do Conselho de Prevenção do Tabagismo. Dirigi-me a um outro colega e pedi para falar com o Xabregas:
-O senhor não sabe? O Mário Perdigão morreu com cancro, no fim foi quase fulminante. Não o avisaram?.

Saí cá para fora, apatetado. O Xabregas era um dos meus telefones para o passado, nunca aceitamos estas separações sem um grito de revolta. Limpei os olhos humedecidos, continuei a caminhar, mas mais lentamente, a refazer-me da perda.


(iv) Leituras, entre Bambadinca e Bissau

No inicio do ano, numa operação no Xitole, a Navalha Polida fez-se um prisioneiro em Satecuta (3). Dias depois, ambos algemados, partiremos para Bissau, ele para ser interrogado, eu para fazer tratamento às minhas insónias. Até lá, foi o penar do costume: colunas, Nhabijões, reabastecimentos de emergência, ponte de Udunduma. O Cherno procurava lançar a lenda que eu era um guerreiro imortal, mostrando a minha camisa perfurada pelas balas que tinham atingido Uam. Creio que uma conversa em privado falando-lhe na sorte e no destino não o convenceu. Até hoje.


Capa do romance policial de Elleru Queen, A Porta do meio. Lisboa: Livros do Brasil, s/d. Colecção Vampiro.

"Percebo como Ellery Queen passou de moda. Eram tramas de perspicácia, ajustes de contas densamente elaborados, por vezes ao arrepio da informação sumária que se fornecia ao leitor. Aqui, é inteiramente impossível supor-se que um pássaro possa fugir com uma metade de tesoura e fazer recair as suspeitas sobre uma inocente. Uma boa capa de cândido da Costa Pinto, tradução de Wilson Velloso, revisão de Baptista de Carvalho". (BS).

Foto: © Beja Santos (2007). Direitos reservados.


Não é possível ler na ponte de Udunduma depois de anoitecer, mas até lá desforro-me. Primeiro um Ellery Queen original, com os seus crimes da mente, bem elaborados, vinganças que acabam no caixão. Desta feita, a famosa escritora Karen Leith, meio americana, meio japonesa, aparece morta no seu gabinete de trabalho, cá fora estivera sempre a filha do Dr. MacClure, o noivo de Karen e prestigiadíssimo médico, não há outro acesso possível que a porta sempre vigiada. Todos as suspeitas recaem sobre Eva McClure. Ellery, detective por acidente, vai descobrir na sua investigação diferentes ajustes de contas do passado remoto, descobre que Karen obrigava a irmã a escrever as obras primas que passavam por ser dela, que houvera um hara-kiri, que um pássaro levara a arma, que o Dr. MacClure preparara a frio uma tenebrosa vingança. Uma porta do meio, entre o gabinete da vitima e o sótão era a chave do mistério. A Porta do Meio é uma obra digna da Colecção Vampiro e das construções cerebrais de Ellery Queen.

Prato de substância da semana foi Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, um estudo monumental sobre a origem da família brasileira no colonialismo português. E, de facto, estão ali elementos que mostram ao colonizador e a sua obra: o carácter português, entre o fatalismo e os rompantes do heroísmo, a sua capacidade de adaptação, a nova agricultura escravocrata e o nascimento de uma sociedade colonial e patriarcal. Os brancos na casa grande e os negros na senzala, a vida dura, a construção de um equilíbrio feito de antagonismos: na economia e na cultura, com europeus e indígenas, no mundo agrícola e na extracção mineira, com os jesuítas e os fazendeiros, os bandeirantes e os senhores do engenho, os bacharéis e os analfabetos. Nascia um modo novo com mestiços e filhos naturais, o cristianismo lírico à portuguesa, uma hospitalidade única no mundo. É uma leitura estimulante, vou levar Gilberto Freyre e a Casa Grande de Romarigães, de Aquilino Ribeiro para Bissau.

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Notas dos editores:

(1) Vd. postes de:

18 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXXVII: O meu Natal de 1969 em Bambadincazinho (Luís Graça)

23 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCV: 1 morto e 6 feridos graves aos 20 meses (CCAÇ 12, Janeiro de 1971)

" (...) O dia 13 [de Janeiro de 1971] seria uma data fatídica para as NT, e em especial para a CCAÇ 12 cujos quadros metropolitanos estavam prestes a terminar a sua comissão de serviço em terras da Guiné. Eis o filme dos acontecimentos (...)"


(2 Vd. post de 8 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2513: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (19): O Natal de 1969 em Bambadinca e na Ponte do Rio Udunduma

(3) Vd. poste de 7 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXII: Assalto ao destacamento IN de Seco Braima, na margem direita do Rio Corubal (Janeiro de 1970, CCAÇ 12, CAÇ 2404, CART 2413) (Luís Graça)

(...) "Em 2, às 5h00, dava-se início à Op Navalha Polida para uma batida à região de Galo Corubal-Satecuta-Seco Braima, e em que participaram 3 Gr Comb da CCAÇ 12 (Dest A), além de forças da CCÇ 2404 (Dest B) e CART 2413 (Dest C), [estas duas últimas sediadas, respectivamente, em Mansambo e Xitole].
No dia seguinte, às 3h30, os Dest B e C iniciaram o movimento em direcção a Satecuta. E uma hora mais tarde o Dest A começou a deslocar-se para a região de Seco Braima, tendo ouvido por volta das 7h00 ruídos do pilão e vozes humanas.

Dirigindo-se imediatamente nessa direcção, o Dest A [CCAÇ 12] teve de cambar um curso de água, utilizando uma ponte submersível feita de troncos de cibe, deixando então de ouvir as vozes por se encontrar numa baixa.

Entretanto, o 4º Gr Comb ficava emboscado junto ao ponto de cambança. Continuada a progressão ao longo da margem, ouviram-se de novo vozes. Feita a aproximação de maneira cautelosa, verificou-se que havia ali um destacamento avançado do IN que deveria constituir o dispositivo de segurança próxima da tabanca de Seco Braima.

Como era impossível qualquer manobra de envolvimento sem ser detectado, devido ao capim e à vegetação arbustiva, o Comandante do Dest A deu ordem para que os homens da frente fizessem um assalto imediato. O acampamento foi atacado à granada de mão, tendo-se ouvido gritos lancinantes de dor.

Apesar de surpreendido, o IN reagiu rapidamente com armas automáticas, ao mesmo tempo que retirava, levando dois corpos de arrasto (no terreno havia sinais de arrastamento de 2 corpos através do capim e vestígios de sangue).

Concentrando o fogo na direcção da retirada do IN, os 2 Gr Comb (1º e 2º ) do Dest A tomaram o acampamento que era constituído por 5 casas de mato. Feita a batida a zona, encontrou-se o seguinte material:

5 granadas de RPG-2,
1 carregador de Metralhadora Ligeira Degtyarev,
2 lâminas 18 cartuchos,
além de vários utensílios e um balaio cheio de arroz.

Entretanto, já os Dest B e C tinham atingido o acampamento de Satecuta, de resto abandonado. Porém, devido aos rebentamentos que se ouviam da direcção de Seco Braima, alguns elementos IN, de passagem em Satecuta, foram alertados e na fuga seriam interceptados pelo Dest C [CART 2413] que abriu fogo sobre eles. 0 IN reagiu da vários pontos da mata. Na perseguição as NT fizeram um prisioneiro que ficara para trás, ferido.

Quase simultaneamente os 2 Gr Comb do Dest A em Seco Braima começariam a ser flagelados com canhão s/r e mort 82, instalados na margem esquerda do Rio Corubal, em frente de Ponta Jai. Foi entretanto pedido apoio aéreo e dada ordem de retirada pelo PCV. Enquanto os bombardeiros T 6 martelavam as posições do IN, as NT retiraram mas ordenadamente.

Os 3 Dest encontraram-se na estrada por volta das 13h00, tendo o Dest C seguido para o Xitole e os Dest B e A para Mansambo em coluna apeada (até à Ponte dos Fulas e ponte do Rio Bissari, respectivamente).

Em resultado da acção das NT, o IN teve 2 mortos prováveis e vários feridos confirmados, além dum capturado" (...).

domingo, 18 de dezembro de 2005

Guiné 63/74 - P368: O meu Natal de 1969 em Bambadincazinha (Luís Graça)


Guiné > Bambadinca > 1970 > Tabancas de Bambadincazinha onde estava instalada a Missão do Sono. Estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole.

© Luís Moreira (2005)(ex-alf mil da CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/71; BENG, Bissau, 1971).


Este texto foi um dos primeiros aqui publicados no nosso blogue: 7 de Dezembro de 2004 > Guiné 69/71 - IV: Um Natal Tropical.

Nessa data ainda não havia tertúlia (que se começou a partir de finais de Maio de 2005), pelo que muitos dos nossos amigos e camaradas não o devem ter lido. Nesse texto (que tem de ser lido à luz da época, já que é tirado do meu diário...), relembro o que se passava nas vésperas de Natal e Ano Novo num sector como o de Bambadinca, onde a nossa companhia (CCAÇ 12, independente e de intervenção) tinha sido colocada.

O meu primeiro Natal passado na Guiné - tinha chegado em finais de Maio, eu, o Humberto, o Levezinho, o Fernandes e os restantes camaradas tugas da CCAÇ 2590, mais tarde rebaptizada CCAÇ 12 e integrada na "nova força africana" - terá sido igual ao de tantos outros de camaradas, de milhares de camaradas, emboscados ou enfiados nas suas tocas em aquartelamentos com abrigos subterrâneos, muitos deles (Mansambo ou Guileje, por exemplo). Talvez mais triste por ser o primeiro passado num cenário de guerra, e numa guerra na qual eu procurava ser um "resistente passivo"...

1. Excertos de: História da Companhia de Caçadores 12 (CCAÇ 2590): Guiné 1969/71. Bambadinca: CCAÇ 12. 1971. Cap. II. 19-21.

Bamdabinca, Dezembro de 1969:

(...) a 24, 2 Gr Comb [grupos de combate] da CCAÇ 12, em cooperação com a autoridade administrativa de Bambadinca [onde estava aquartelada a companhia], levam a efeito uma rusga (com cerco) à tabanca de Mero [aldeia balanta, junto ao Rio Geba]. Apesar de alguns indícios suspeitos, não foram detectados elementos IN [inimigo].

Para efeitos de controlo populacional, completou-se e actualizou-se o recenseamento dos habitantes de Mero (Op Acção Guilotina)[nome de código da operação]. Nas duas semanas anteriores, o IN tinha desencadeado várias acções de intimidação contra as populações de Canxicame, Nhabijão Bedinca e Bissaque, a última das quais levada a efeito por um grupo enquadrado por brancos que retirou para a região de Bucol, cambando o RGeba [atravesando o Rio Geba de canoa, para norte].

Por outro lado, prevendo-se a possibilidade o IN atacar os aquartelamentos das NT [nossas tropas] durante a quadra festiva do Natal e Ano Novo, foi reforçado o dispositivo de defesa de Bambadinca. Assim, além da emboscada diária até às 1 a 3 horas da noite, a nível de secção reforçada num raio de 3 a 5 km (segurança próxima), passou a ser destacado 1 Gr Comb para Bambadincazinha (em fase de reordenamento), todas as noites até às 6h da manhã, constituindo uma força de intervenção com a missão de fazer malograr o eventual ataque ao aquartelamento e/ou às tabancas da periferia, actuando pela manobra e pelo fogo sobre as prováveis linhas de infiltração e locais de instalação das bases de fogo do IN, ou no mínimo detê-lo e repeli-lo pelo fogo (1).

A 26 [de Dezembro de 1969], forças da CART 2520 [companhia de artilharia], reforçadas por um 1 Gr Comb da CCAÇ 12 realizam um patrulhamento ofensivo na região do Xime, Madina Colhido, Chacali, Colicumbel e Amedalai, sem detectacterm vestígios do IN (Op Faca Húmida).

A 30, Sua Excia. o Comandante Chefe [General António de Spínola]visita Bambadinca para apresentar cumprimentos de Ano Novo a todos os oficiais, sargentos e praças do CMD e CCS/BCAÇ 2852 [comando e companhia de comando e serviços do Batalhão de Artilharia 2852], e sub-unidades adidas [a CCAÇ 12 incluída].


2. Excertos do Diário de um tuga:

Bambadinca, 24/25 de Dezembro de 1969:

Natal nos trópicos! Não consigo imaginá-lo sem aquela ambiência mágica que me vem do fundo da memória. É que do cristianismo terei apenas captado o sentido encantatório do Natal e a sua antítese, que é o universo maniqueísta da Paixão. Mas decididamente não vou fazer flash-back. Cortei o cordão umbilical a frio e da infância resta-me apenas a sensação do salto mortal. Há, porém, certas imagens poéticas, recalcadas no subconsciente ou guardadas no baú da memória, que hoje vêm ao de cima. Por um qualquer automatismo. Ou talvez por ser Natal algures, far from the Vietnam, longe da Guiné, e eu passar esta noite emboscado. O que não tem nada de insólito: é uma actividade de rotina.

Mas é terrivelmnete cruel a solidão deste tempo em que os homens se esperam uns aos outros nas encruzilhadas da morte, os dentes cerrados e as armas aperradas, em contraste com o bando alegre de crianças cabo-verdianas que, não longe daqui, da Missão do Sono (uma estrutura sanitária, agora militarizada, transformada em local de emboscada!), entoam alegres cânticos do Natal crioulo ao som do batuque pagão.

No aquartelamento, de que vejo as luzes ao fundo, ninguém se desejou boas festas porque também ninguém tem sentido de humor. Nem por isso deixou de celebrar-se a Consoada da nossa terra: um pretexto para se comer (o tradicional prato de bacalhau com batatas e grelhos.. desidratados) e sobretudo para se beber (muito).

- Hoji, festa di brancu, noite di Natal, manga di sabe! - lembra-me um dos meus soldados africanos, enquanto ao longe a artilharia do Xime e de Massambo faz fogo de reconhecimento.

E eu fiquei a pensar neste tempo de silêncio, de cobardia e de cumplicidade. Mas também de raiva. Como o Manuel Alegre, eu gostaria de poder dizer neste dia, todos os dias: "Mesmo na noite mais triste / Em tempo de servidão / Há sempre alguém que resiste / Há sempre alguém que diz não".

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(1) O Grupo de Combate ficava instalado na famosa Missão do Sono (uma estrutura sanitária, criada no âmbito do Programa de Luta contra a Doença do Sono, e na altura desactivada, presumo que em consequência da guerra). Era um edifício térreo, de tijolo de adobe, rachas de cibe e telhado de zinco (ou de colmo ?, já não me recordo). A nossa posição era mais do que conhecida pela população e pelos elementos simpatizantes do PAIGC que havia em Bambadincazinha e em Bambadinca. Em caso de ataque ao aquartelamento de Bambadinca (sede de batalhão), eramos um alvo fácil. Uma ou duas roquetadas punham-nos a todos fora de combate.