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terça-feira, 25 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4860: Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar (org. José Martins) (VII): Estadia em Contuboel e Dunane (OUT-DEZ 1965)

Continuação do Diário de Guerra, de Cristovão de Aguiar (VII)

Contuboel, 12 de Outubro de 1965

O meu Grupo de Combate vai dentro em breve para o destacamento de Dunane, quartel de campanha rodeado de arame farpado, sem qualquer tabanca (a que aí existia foi incendiada pelas nossas tropas, e a população que não morreu, fugiu para outros chãos) - fica então Dunane entre Piche e Can­quelifá, onde existem duas companhias, uma em cada uma dessas localidades, que por aquelas bandas a guerra é mesmo a doer. Vamos então render um outro Grupo de Combate, o do João Cortesão Casimiro, da nossa companhia, que, por estes dias mais próximos, conclui um mês de estada naquele que é considerado um dos piores desta­camentos daquela zona, sem as mínimas condições para se viver como gente: água bi­chenta, instalações em abrigos feitos de bidões de gasolina cheios de pedregulhos, o tecto coberto de troncos e por um oleado, e tudo isto rodeado de mata e de silêncio e guerrilheiros. Esta zona militar abrange, além das unidades já mencionadas, Nova La­mego, Bruntuma e Madina do Boé, onde, aí, nem se atre­vem as nossas tropas a meter o nariz fora dos abrigos de cimento armado, recebendo os ví­veres e o correio através de helicóptero, que lança os sacos das alturas e desapega-se logo para lugar mais se­guro... Em Dunane não há população, só meia dúzia de milícias indígenas. Com cerca de trinta homens, ao fim de pouco tempo não há solidão que re­sista. Só é preciso é que não falte vinho nem correio, porque assim o soldado acomoda-se com mais facili­dade...


Contuboel, 15 de Outubro de 1965

Recebi um rádio do comandante do batalhão acantonado em Bafatá, ao qual pertencemos, anunciando a rendição do pelotão de Dunane para o dia 18. Temos de sair às primeiras horas da manhã. E vinham tambémvárias instruções sobre o mate­rial a levar, não esquecendo os sacos de areia nas cabi­nas dos Unimogs por causa de surpresas de­sagradáveis, que vamos atravessar zonas perigosas e algumas quase terra-de-ninguém, além das rações de combate para a via­gem, que deve demorar as suas quatro horas, com paragem em Nova Lamego e Pi­che... Reuni os homens do meu pelotão e transmiti-lhes todas as ordens que achei con­venientes quando à nossa futura partida (só não lhes revelei nem o dia nem a hora), or­dens que são para se cumprir à risca, sem a mínima discussão. E avisei-os que come­cem, desde já, a preparar os seus sacos de campanha, porque nunca se sabia quando largávamos para Dunane, a fim de render os nossos camaradas.


Dunane, 19 de Outubro de 1965

Após uma viagem atribulada e cansativa, chegá­mos por fim ao nosso destino. E eis-me aqui, diante de mim, nu, andrajoso, suplicante, a alma enregelada e crucificada na cruz destes dias sem nome. Nos olhos, uma forna­lha de fúria e uma fome antiga não sei em que víscera, essa fome de séculos que é já grito milenário de todas as bocas em mim. Eis-me, pois, aqui, disparando bombas de palavras ao concentrado silêncio da noite. Eis-me aqui, tentando pescar estrelas no poço aberto do firmamento. Eis-me aqui, indefeso e nu, interrogando não sei que morto que vive numa parte de mim... Em frente de mim, nu e com o frio de todos os pólos, interrogo-me como se fosse réu e juiz ao mesmo tempo. E as palavras que ouço vêm da minha voz antiga, saída do mais fundo de mim, carregada de pedras e de car­dos, que grita e se contorce, morre e ressuscita, e continuo, indefeso e nu, aqui em frente de mim...


Dunane, 21 de Outubro de 1965

CRISTAIS DE DOR

Cristais de dor na noite tenebrosa,
Ferindo o silêncio duro e magnético;
Nenhum gesto de luz, leve, carinhosa,
Calando na noite o grito profético.

Em bandos descem pássaros estranhos,
Trazem recados no bico agoirento;
Muito ao longe nos currais os rebanhos
Tremem e choram lágrimas de vento.

Nas palhotas sem luz sonhos vencidos,
Crianças sem estrelas nos olhos caídos,
E pão de tristeza em bocas de fome.

Silêncio, dor, tristeza, solidão,
Tudo o que tem quem vive nesta prisão,
E um número no lugar do próprio nome.


Dunane, 3 de Novembro de 1965

MORTOS-VIVOS

Somos os mortos-vivos duma geração
Tran­cada nos aposentos do medo.
Se ousamos outra voz no coro duma canção,
Dão-nos nova alma e este degredo.

Se puderes olha em frente de olhos repousados,
Ar­reda o medo da mente ferida.
E teus dias serão plenos, serenados
E a vida será um salmo de vida...


Dunane, 6 de Novembro de 1965

ANSIEDADE

Conto os dias pelos dedos
Um a um sem fa­lhar.
Triste de quem tem segredos
E não tem a quem contar...

Parti triste e triste estou
Longe de ti nesta terra,
Onde o Sol se apagou
Sob negras nuvens de guerra.

Se a dor que no peito sinto
Tivesse boca e contasse
Tudo o que peno (não minto)
Talvez ninguém acreditasse...


Dunane, 10 de Novembro de 1965

PRIMEIRA CANÇÃO DO MAR

A minha voz vem do mar,
Meus cabelos de espuma são,
É no cais que vou cantar
As penas do cora­ção.

As coitas do coração
Ai, coimas de amargura.
Diz-me lá tu, ó canção,
Que é da velha ternura
Do mar da minha infância
E porquê vida tão dura,
Este viver sempre em ânsia?

Tatuaram-me no braço
Uma âncora de esperança...
Ai, e no peito um cansaço
Já do tempo de criança...

O mar embalou meu berço
- Velha canção de embalar
E assim rimei meu verso
Com a triste voz do mar.

O mar indicou-me o mundo
Nas rotas das caravelas...
Foram-se os sonhos ao fundo,
Rotas ficaram as velas.


Dunane, 15 de Novembro de 1965

SEGUNDA CANÇÃO DO MAR

Nas ondas do mar salgado
Escrevi o meu destino
Assim tracei o meu fado
Desde o tempo de me­nino.

Fez-se o mar meu amigo
Desde os tempos de outra idade:
- Quando não está comigo,
Chora triste de saudade...

Tantas vezes boiei morto
Na crista das ondas bravas,
Mesmo à vista dum porto
Onde, amor, me esperavas...


Dunane, 18 de Novembro de 1965

UM BARCO NA NOITE

Na noite subversiva havia um barco
Anco­rado no cais.
O céu era o reflexo de um charco
E de outras sombras mais

Súbito acordou uma luz
Nos olhos adormecidos...
Uma candeia que conduz
A vitória aos vencidos.

Todo o Universo se encheu de asas
E de itinerários...
Trancámos as portas de nossas casas
Nós, os revolucionários...

Tudo por fim rolou na lem­brança
Na noite subversiva
O barco ancorado partia para França
E nós ali à deriva...

Só nos ficou o sonho e a esperança,
E o barco ancorado partiu para França...


Dunane, 23 de Novembro de 1965

- Estou com o meu pelotão há mais de um mês neste destacamento de Piche. Antiga tabanca balanta, destruída pelas nossas tropas há já al­gum tempo, é agora um aquartelamento destinado a um pelotão das nossas tropas e a uma secção de milícias indígenas. Estamos em solidão absoluta e com falta de víve­res. À noite, entretém-se o pes­soal com o espectáculo deslum­brante dos incêndios das tabancas atacadas pelos guerrilheiros e cujas chamas se vêem ao longe lam­bendo o horizonte cir­cular que deste cabeço onde se situa o aquartelamento se abarca. Nem dentro do perímetro do arame far­pado se pode an­dar à von­tade.


Contuboel, 1 de Dezembro de 1965

- Chegou o novo capitão para comandar a com­panhia. O primeiro, o que foi ferido na tal operação simulada, com o intui­to de trei­nar os homens para a dureza da guerra, nunca mais ninguém lhe pôs a vista em cima. In­formou-me há dias o nosso primeiro Mota que ele tinha sido transferido para uma re­parti­ção do Quar­tel General, em Bissau, após ter estado em prolongada con­vales­cença na metrópole. O guarda-costas, esse, foi para a Alemanha para lhe porem uma prótese nos cotos das pernas. Nesta vida da tropa são tão efémeros os senti­mentos.


Contuboel, 25 de Dezembro de 1965

OUTRO TEMPO

Tempo loiro, maduro,
Nas mãos o Universo.
Sentia-me seguro
Como a rima num verso...

Depois veio o frio
Das noites de Inverno.
E pensava (agora sorrio)
Nas penas do inferno.

- Já rezaste, rica cara?
Perguntava uma velha tia.
Dizia que já terminara
E tinha a alma em dia...
__________

Notas de CV:

Cristóvão de Aguiar foi Alf Mil da CCAÇ 800, Contuboel, 1965/67

Vd. último poste da série de 19 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4838: Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar (org. José Martins) (VI): Estadia em Contuboel e férias na Metrópole (27MAI65 a 29SET65)

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3515: Memórias literárias da Guerra Colonial (10): Cristóvão de Aguiar na Biblioteca-Museu República, 5ª Feira, às 19h

Título: Braço Tatuado - Retalhos da Guerra Colonial, 2ª ed Editora: Dom Quixote, Lisboa Colecção: Autores de Língua Portuguesa Ano de edição: 2008 Preço com IVA: 12,00 € 

 A Conferência de Cristóvão Aguiar, com a apresentação do seu livro Braço tatuado – retalhos da guerra colonial realiza-se às 19h00 da próxima 5ª feira, 27 de Novembro, na Biblioteca-Museu República e Resistência / Espaço Grandella, Lisboa. 

Este evento, que se integra num ciclo de conferências sobre as "Memórias Literárias da Guerra Colonial", esteve inicialmente previsto para 30 de Outubro, não se tendo realizado por doença do escritor. 

 Sobre o escritor e o seu livro, vd. Blogue Podium Scriptae > Braço Tatuado Blogue Podium Scriptae > Guiné O blogue é apresentado nesttes termos: "Charlas de literatura, oficiais e oficiosas, sobre o Escritor Cristóvão de Aguiar. Justiça, Arte e Cultura em geral, sendo certo que o conteúdo deste blogue é da inteira responsabilidade do cidadão José Manuel de Aguiar".


Blogue Podium Scriptae, de José Manuel de Aguiar. Em entrevista ao Correio da Manhã, Revista Domingo, de 9 de Março de 2008, Cristóvão de Aguiar faz declarações perturbadoras e eventualmente polémicas:

  (...) O episódio do espancamento e morte do guia é real? [Pergunta o jornalista, Isabel Ramos] 

  Sim. Em cada operação havia sempre um guia indígena que normalmente não sobrevivia. Na minha companhia o capitão matava o guia no fim da operação. E mandava dizer para o Quartel Geral que o guia tinha tentado fugir. 

  Mas no livro são três soldados que matam o guia, um dos quais lhe chama, a si, terrorista... 

  Eu dei-lhe uma bofetada e ele chamou-me terrorista e olhe que chamar terrorista [a um oficial] num teatro de guerra como a Guiné podia ser muito grave. Ele, realmente, depois de ter morto o guia, disse-me que era a maneira de pagar-me a bofetada que lhe tinha dado. 

  E o episódio das crianças ?

É verdadeiro, mas eu não assisti. Dois guerrilheiros foram capturados com a família. Mataram o homem e a mulher. Os filhos ficaram a aguardar novas ordens. Não mataram as crianças a frio. Trataram-nas bem, como se, realmente, quisessem adoptá-las, trazê-las para a Metrópole, e no fim degolaram-nas. 

  (...) Pensou alguma vez que ia morrer na Guiné ? 

  Os três primeiros meses são cruciais. É quando se enfrenta o espectro da morte, mesmo se ñão tiver acções de fogo. Pensa-se: 'Será hoje ? Será amanhã?' . Depois a pessoa deixa de se importar, tanto lhe faz. Cinco ou seis meses antes de acabar a comissão o medo volta. No fim pensa-se: 'Já que cheguei até aqui, quero voltar à minha terra'. (...) 

 No romance, os militares pertencem a um CCAÇ 666 (que nunca existiu, no TO da Guiné). O nosso camarada José Martins, entretanto, conseguiu com o seu olho clínico identificar, a partir da leitura do livro (e da consulta do 8º Volume, Tomo II da CECA, Fichas História das Unidades, Guiné, pag. 342), a subunidade a que pertenceu o Alf Mil Luís Cristóvão Dias de Aguiar, e que era a CCAÇ 800 (Contuboel, 1965/67):


 Unidade Mobilizadora: RI 15 – Tomar. A subunidade foi formada com data de 1 de Janeiro de 1965, conforme Ordem de Serviço nº 2 de 4 de Janeiro de 1965 do Regimento de Infantaria 15 de Tomar. Destinava-se, inicialmente, ao arquipélago de Cabo Verde, tendo a partida prevista para a data de 13 de Abril de 1965. 

 Comandante: Capitão Inf Carlos Alberto Gonçalves da Costa, sustituído em Setembro de 1965 pelo Capitão Miliciano de Cavalaria António Tavares Martins (que tinha vindo da CCav 489/Bcav 490. 

Nota do editor vb). Constituíam o quadro de Oficiais subalternos os Alferes Milicianos: João Belchurrinho Baptista, Luís Cristóvão Dias Aguiar, João Faria Cortesão Casimiro e João Baptista Alves.

Partida: Embarque em 17 de Abril de 1965; desembarque em 23 de Abril de 1965; Regresso: Embarque em 20 de Janeiro de 1967 (...). A CCAÇ 800 actuou sobretudo no subsector de Contuboel, a nordeste de Bafatá.

 __________ 

  Notas de vb: 

 1. Postes relacionados em:




 2. Cristóvão de Aguiar nasceu na ilha de São Miguel em 1940. Frequentou Filologia Germânica, em Coimbra, curso que interrompeu para tirar o Curso de Oficiais Milicianos (COM). 

 Em 1965 partiu para a Guiné, deixando publicado o livro de poemas, Mãos Vazias. Regressado em 1967, concluiu o curso, leccionou em Leiria e regressou a Coimbra para apresentar a sua tese de licenciatura, O Puritanismo e a Letra Escarlate

 Foi redactor da revista Vértice e colaborador, depois do 25 de Abril, da Emissora Nacional com a rubrica "Revista da Imprensa Regional" e leitor de Língua Inglesa na Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade de Coimbra (FCT/UC). 

 A experiência da guerra forneceu-lhe material para um livro, incluído inicialmente em Ciclone de Setembro (1985), de que era uma das partes, e autonomizado mais tarde com o título O Braço Tatuado (1990) e que reeditou em nova versão.

 Da sua obra, por diversas vezes premiada destacamos: Raiz Comovida I - A Semente e a Seiva (1978), Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa, Relação de Bordo I - Diário ou nem Tanto ou talvez Muito Mais (1964-1988), Grande Prémio de Literatura Biográfica da APE/CMP, Raiz Comovida: Trilogia Romanesca (2003), Trasfega - Casos e Contos (2003), Prémio Literário Miguel Torga/Cidade de Coimbra e Nova Relação de Bordo - Diário ou nem Tanto ou talvez Muito Mais (2004) e Marilha (2005), os quatro últimos publicados na Dom Quixote. 

 Em Setembro de 2001 foi agraciado pelo presidente da República com o grau de Comendador da Ordem Infante Dom Henrique. Texto extraído das Publicações D. Quixote . Com a devida vénia.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3363: Memórias literárias da Guerra Colonial (9): Braço Tatuado, de Cristóvão de Aguiar (José Martins)

  

Braço Tatuado: Conferência de Cristóvão de Aguiar, a realizar na Biblioteca-Museu República e Resistência / Espaço Grandella, na próxima 5ª feira, 30 de Outubro de 2008, às 19h00.
__________


Foi um acaso que me trouxe ao conhecimento o livro Braço Tatuado, quando, em 14 de Fevereiro de 2008, navegava na Net em busca de uma outra publicação. Tudo ficou decidido nesse momento. Pouco tempo depois era retirado da estante da Livraria Bertrand no Loures-Shoping, o livro que, quase de imediato, comecei a ler.

Título: Braço Tatuado - Retalhos da Guerra Colonial 
Editora: Dom Quixote, Lisboa
Páginas: 136 
Colecção: Autores de Língua Portugues 
Edição: 2008 
Preço com IVA: 12,00 €

Na capa, no texto biográfico, é referida uma passagem por Leiria, como professor. Ora foi nessa cidade que nasci e iniciei os meus estudos. Brinquei e passeei no Jardim Público, bebi água na Fonte Grande, tomei café no Arcádia, comi Brisas do Lis… Bons tempos, de jovem e estudante. 

No livro é relatada uma passagem por Nova Lamego (Gabú Sara), onde também estive como elemento da Companhia dos Gatos Pretos [CCaç 5], que mais tarde, em Agosto de 1968, rumou a Canjadude onde permaneceu até à sua extinção, em Agosto de 1974. 

Esta companhia era herdeira da 3ª Companhia de Caçadores Indígenas, e teve o seu quartel no local onde, com a criação do Sector Leste, ficou instalada a sede do Batalhão. No meu livro, não editado, que intitulei de Refrega, há algumas impressões pessoais e relatos sobre estas duas localidades terra.

Na leitura do livro de Cristóvão Aguiar, estranhei o número “666”, que, como diz o autor, está em Apocalipse (13,18). Nos elementos de que dispunha e que de imediato consultei, esse número não pertence a nenhuma das unidades que serviram na Guiné.

Consultando o 8º Volume – Tomo II da CECA – Fichas História das Unidades – Guiné (página 342) e com base nas datas constantes do texto, assim como dos locais onde se desenrolaram as acções, foi fácil localizar a “Companhia nº 666” [texto em negrito]. Mas não me contentei com hipóteses. No dia 26/02/08, desloquei-me ao Arquivo Histórico Militar, em Lisboa, e pude ler e tomar notas (caixa nº 70 – 2ª Divisão/4ª Secção), com a calma que o pouco tempo de que dispunha me permitiu, da história da “666” [texto em itálico].

Companhia de Caçadores nº 800 
Unidade Mobilizadora: RI 15 – Tomar 

A subunidade foi formada com data de 1 de Janeiro de 1965, conforme Ordem de Serviço nº 2 de 4 de Janeiro de 1965 do Regimento de Infantaria 15 de Tomar. Destinava-se, inicialmente, ao arquipélago de Cabo Verde, tendo a partida prevista para a data de 13 de Abril de 1965. 

Comandante: Capitão Inf Carlos Alberto Gonçalves da Costa, sustituído em Setembro de 1965 pelo Capitão Miliciano de Cavalaria António Tavares Martins (que tinha vindo da CCav 489/Bcav 490. 

Nota do editor vb). Constituíam o quadro de Oficiais subalternos os Alferes Milicianos: 
João Belchurrinho Baptista,
Luís Cristóvão Dias Aguiar,
 João Faria Cortesão Casimiro 
e João Baptista Alves Partida: 

Embarque em 17 de Abril de 1965; desembarque em 23 de Abril de 1965 Regresso: Embarque em 20 de Janeiro de 1967. 

Alterado o destino, a subunidade partiu do cais de Alcântara, em Lisboa, a bordo do N/M Mafalda, desembarcando em Bissau em 23 de Abril de 1967. 

Síntese da Actividade Operacional 

Foi-lhe inicialmente atribuída a missão de subunidade de intervenção e reserva do Comando-Chefe, tendo colaborado com a unidade de guarnição de Bissau na segurança e protecção das instalações e das populações da área e tomado parte em operações na região de Jugudul e Olom, de 10 a 24 de Maio de 1965, em reforço do BArt 645. 

Maio de 1965: Dia 17 – Operação na região de Olom; Dia 21 - Operação Perdigueiro – Durante uma patrulha de combate na área de Encheia, sob o comando do Capitão de Infantaria Gonçalves da Costa, este foi ferido no tórax e pescoço com estilhaços de uma granada de mão, assim como os soldados José Francisco Pereira da Silva (nº 3788/64) e Custódio José Caetano (nº 54/64 da CArt 732). 

Em 28 de Maio de 1965, como subunidade de reserva do Comando-Chefe, foi colocada em Contuboel em reforço do BCav 757, em substituição da CCaç 702, com vista à execução de patrulhamentos, reconhecimentos, protecção e segurança das populações da área, guarnecendo com um pelotão a povoação de Sonaco. 

A partir de 15 de Julho de 1965, cedeu ainda um pelotão ao BCav 705, o qual passou a guarnecer a povoação de Dunane, onde se manteve até 1 de Abril de 1966.

Maio de 1965, Dia 23 – Partida de Bissau para Contuboel; Dia 29 – Chegada a Contuboel Junho de 1965; Dia 27 – Operação Jagudi.

 Julho de 1965, Dia 08 - Partida de 1 Grupo de Combate para Dunane. 

Agosto de 1965, Dia 10 - Operação Onça 

Em 22 de Novembro de 1965, deixou de ser subunidade de intervenção do sector e assumiu a responsabilidade do subsector de Contuboel, então criado na zona de acção do BCav 757, mantendo um pelotão do antecedente destacado em Sonaco, até 1 de Novembro de 1966 e destacando outros pelotões para guarnecer as povoações de Sara Bacar, a partir de 10Maio de 1966 e de Sumbundo, a partir de 3 de Novembro de 19 de 66. 

Novembro de 1965, Dia 23 - A Companhia deixou a intervenção às ordens do Comando-Chefe. 

Dezembro de 1965, Dia 17 - Operação Zig-zag.

Fevereiro de 1966, Dia 26- Operação Jota. 

Março de 1966, Dia 11 - Operação Jota II.

Abril de 1966, Dia 04 – A Companhia deixou um grupo de combate em Dunane e passou a ocupar o destacamento de Sare Bacar; Dia 16 - Operação Jota III.

Maio de 1966, Dia 07- Operação Intriga. Dia 10 - Operação Ibis. Dia 25 - Operação Ianque, Dia 29 - Destaca um grupo de combate para reforçar o sector de Piche.

Junho de 1966, Dia 04 - Cessa o reforço ao sector de Piche. Dia 06 - Operação Isco. Dia 15 - Operação Ivan. Dia 21 - Operação Intervenção. Dia 30 - Operação Interesse.

 Julho de 1966, Dia 07 - Operação Insurrecto Dia 21 – Inauguração da ponte de Contuboel sobre o rio Geba Dia 27 – Operação Intelecto.

Agosto de 1966, Dia 03 – Operação Imune. Dia 11 – Operação Intemerato, Dia 23 – Operação Japão 

Setembro de 1966, Dia 05 – Operação Interlúdio. Dia 22 – Operação Intervalo.

 Outubro de 1966, Dia 09 – Operação Intimação. Dia 16 – Operação Impar. Dia 21 – Operação Introito.

 Novembro de 1966, Dia 02 – 1 grupo de combate ocupou a tabanca de Sumbundo, atacada pelo IN no dia anterior. Dia 17 – Operação Istambul. Dia 30 – Chegada, de Contuboel, da CCaç 1588, que veio reforçar o sector.

Dezembro de 1966, Dia 19 – O IN flagelou com metralhadoras e espingardas automáticas, pistolas e granadas de mão, uma força de CCaç 802, que dava protecção aos trabalhos agrículas na bolanha entre Sumbundo e Ualicunda, causando 1 ferido à população.

Janeiro de 1967, Dia 02 – Chegada a Contuboel da Secção de Quarteis da CCaç 1500, que os rendeu no sector. Em 9 de Janeiro de 1967, foi rendida no subsector de Contuboel pela CCaç 1500, recolhendo em 14 de Janeiro de 1967 a Bissau, a fim de aguardar o embarque.

A Companhia de Caçadores teve duas baixas por ferimentos em combate, o Capitão Gonçalves da Costa e o Soldado Pereira da Silva. Dos seus militares foram louvados 1 Oficial, 1 Sargento, 6 Furrieis, 9 Cabos e 16 Soldados, tendo os louvores sido atribuídos pelo Comandante da CCaç 800, do BCav 757, BCav 705 e Agrupamento 24. 

No final da leitura do livro Braço Tatuado ficou-me na memória a frase atribuída, na página 20( 1ª edição na D. Quixote) ao homem grande de Jabicunda, quando, o Alferes Miliciano de Infantaria Arquelau de Mendonça, insistia para ser tratado por alferes: “…alfero é um, alferes é manga deles, nosso alfero...”

Na realidade, e para mim, o Cristóvão Aguiar é alfero, é um óptimo contador de histórias que, com base numa unidade, acaba por englobar as estórias que fazem parte da história de um povo. J

José Martins 

Fur Mil Trms Inf Companhia de Caçadores nº 5, Gatos Pretos CTIGuiné/Nova Lamego e Canjadude 02/06/1968 a 02/06/1970 

__________

Notas de vb:

1. Postes relacionados em

25 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2582: Notas de leitura (9): Cristóvão Aguiar, um escritor marcado pela guerra colonial (Beja Santos)

25 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2580: Notas de leitura (8): Braço Tatuado-Retalhos da Guerra Colonial, de Cristóvão Aguiar (Victor Dores / Amaro Rodrigues)

2. Cristóvão de Aguiar nasceu na ilha de São Miguel em 1940. Frequentou Filologia Germânica, em Coimbra, curso que interrompeu para tirar o Curso de Oficiais Milicianos (COM).

Em 1965 partiu para a Guiné, deixando publicado o livro de poemas, Mãos Vazias. Regressado em 1967, concluiu o curso, leccionou em Leiria e regressou a Coimbra para apresentar a sua tese de licenciatura, O Puritanismo e a Letra Escarlate.

Foi redactor da revista Vértice e colaborador, depois do 25 de Abril, da Emissora Nacional com a rubrica "Revista da Imprensa Regional" e leitor de Língua Inglesa na Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade de Coimbra.

A experiência da guerra forneceu-lhe material para um livro, incluído inicialmente em Ciclone de Setembro (1985), de que era uma das partes, e autonomizado mais tarde com o título O Braço Tatuado (1990) e que reeditou em nova versão.

Da sua obra, por diversas vezes premiada destacamos: 

Raiz Comovida I - A Semente e a Seiva (1978), Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa, 

Relação de Bordo I - Diário ou nem Tanto ou talvez Muito Mais (1964-1988), Grande Prémio de Literatura Biográfica da APE/CMP, 

Raiz Comovida: Trilogia Romanesca (2003), Trasfega - Casos e Contos (2003), Prémio Literário Miguel Torga/Cidade de Coimbra;

 e Nova Relação de Bordo - Diário ou nem Tanto ou talvez Muito Mais (2004) e Marilha (2005), os quatro últimos publicados na Dom Quixote.

Em Setembro de 2001 foi agraciado pelo presidente da República com o grau de Comendador da Ordem Infante Dom Henrique.

Texto extraído das Publicações D. Quixote. Com a devida vénia.