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domingo, 11 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6718: Memória dos lugares (92): Contuboel e o meu amigo Braima Sissé (Eduardo Costa Dias)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Contuboel > 16 de Dezembro de 2009 > O João Graça, médico e músico, posando ao lado do dignitário  Braima Sissé. Por cima deste, a foto emodulrada de Fodé Irama Sissé, um importante letrado e membro da confraria quadriyya [, islamismo sunita, seguido pela maior parte dos mandingas da Guiné; tem o seu centro de influência em Jabicunda, a sul de Contuboel; a oputra confraria, tidjanya, é seguida pela maior parte dos fulas]. O Braima Sissé foi apresentado ao João Graça como sendo um estudioso corânico, filho de uma importante personalidade da região, amigo dos portugueses na época colonial [, presume-se que fosse o próprio Fodé Irama Sissé].

Foto: © João Graça (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do nosso amigo Eduardo Costa Dias, professor e investigador do ISCTE:

Luís:

Hoje estive no teu blog... e encontrei esta foto tirado pelo teu filho em Contuboel (*). Foi um choque. Não resisti: mando-vos duas fotografias do meu amigo Braima Sissé. Uma de 1992 tirada por mim, outra tirada por alguém em 1975 ou 1976.

Na mais antiga está ao centro o mesmo senhor cuja fotografia foi captada pelo teu filho: Fodé Irama Sissé, um importante letrado e membro da confraria quadriyya. Nesta mesma fotografia Braima está à direita de chapéu vermelho, atrás de Fodé Irama está o meu amigo Sissau Sissé (já falecido) e "vestido à civil" Malan Sissé que foi quem em Bissau me mostrou a fotografia e me deixou tirar fotografia da fotografia. Entre Malan e Braima está Arafan Conte, aluno de Irama. Conheci toda esta gente.

Já agora o teu filho tem mais destas fotografias - de Contuboel, claro?!!

Um grande abraço

Eduardo

Braima Sissé. 1992. Autor da foto: ECD 

Foto: Eduardo Costa Dias (2010). Direitos reservados



Fotografia de fotografia, de autor desconhecido, datada provavelmente de 1975/76. Cópia: Cortesia de Eduardo Costa Dias (2010).

 Legenda: Ao centro, Fodé Irama Sissé.  O Braima Sissé está à direita,  de chapéu vermelho; atrás de Fodé Irama,  está Sissau Sissé (já falecido) e, "vestido à civil",  Malan Sissé que foi quem em Bissau me mostrou a fotografia e me deixou tirar fotografia da fotografia. Entre Malan e Braima está Arafan Conte, aluno de Irama. (ECD).

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Nota de L.G.: 



sábado, 8 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6341: Antropologia (18): Elogio ao nosso blogue em comunicação sobre Régulos, almamis e mouros durante a guerra colonial, do Prof Eduardo Costa Dias

 Cortesia do amigo e colega Eduardo Costa Dias, grande especialista da cultura e da história da Guiné-Bissau, professor de Estudos Africanos, Departamento de Sociologia, Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) (foto à direita, Bissau, 2008).


1. Resumo de uma comunicação científica, em francês [, com a respectiva tradução, em português, ] do nosso amigo Eduardo Costa Dias, professor e investigador no ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, e em que se faz uma elogiosa referência ao nosso blogue.


Colonial auxiliaries or advocates of colonial subjects? A comparative view on chiefs and ‘traditional rule’ during the colonial period

Régulos, Almamis et Mouros pendant la guerre coloniale dans l’ex- ‐Guinée portugaise: à chacun son rôle, ses convenances et ses fidélités 


Eduardo Costa Dias
ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa


L’avènement de la guerre coloniale, en 1963, dans l’ex- ‐Guinée portugaise non seulement a profondément transformé le modus vivendi des populations africaines et européennes, comme, un peu partout, a basculé les relations tissues entre les autorités traditionnelles et l’administration coloniale.

En effet, les autorités traditionnelles ont été confrontées, en plus de l’exigence de « faire vite » allégeance à un des deux belligérants, avec le besoin de composer presque inopinément avec de nouveaux interlocuteurs coloniaux. Plus la guerre s’étendait à de nouvelles zones du territoire guinéen et les combats regagnaient d’intensité, davantage, localement, les commandants militaires remplaçaient de facto et de jure, comme interlocuteurs des autorités traditionnelles, les administrateurs civils (administradores de circunscrição, chefes de posto, etc.). Dans plusieurs sens, pendant la guerre coloniale, dans la majeure partie du territoire, « l’ (vraie) autorité portugaise » était l’armée.

Dans l’étude de cas qu’adosse cette communication – le cas des autorités mandingues et, surtout, peuls des cercles administratifs de Bafatá et de Nova Lamego (Gabú) – , toutefois, plus que le renforcement « rayonnant » ou la rupture brutale de la très ancienne collusion stratégique entre les chefs musulmans et l’État colonial, on a assisté principalement à la multiplication, en nombre et en « qualités », des interlocuteurs locaux des autorités portugaises et, naturellement, à une plus grande diversité des prises de position des dignitaires politiques e religieux mandingues et peuls.

Un almami ou un mouro (marabout) n’avait nécessairement, par rapport aux autorités portugaises ou au PAIGC, le même positionnement que « son » régulo, même si celui- ‐ci, en plus de musulman et mandingue/peul comme lui, était son frère. Au contraire, parfois, il y’ avait même grands avantages en aménager des positions différentes dans une même famille, tabanca (village) ou zawiya (délégation locale d’une confrérie); dans des situations complexes comme celles vécues pendant la guerre coloniale pour beaucoup de peuls et mandingues de Bafatá et du Gabú, la bonne utilisation de la réinterprétation ouest- ‐africaine de l’institut du muwalat – « accommodation sur réserve avec l’infidèle »/ « acceptation d’un compromis provisoire avec l’infidèle » - presque le prescrivait!

Dans l’essentiel, l’information travaillée pour cette communication a été obtenue à partir des entrevues faites dans les années 1990 et 2000 à des dignitaires musulmans des régions de Bafatá et du Gabú, de la compulsation de documentation dans des archives portugaises (AHM, AHU, ANTT) et de la lecture systématique d’un blog d’anciens combattants portugais dans l’ex-Guinée portugaise.

Le blog « Luis Graça & Camaradas da Guiné », en plus de sa « mission » fondatrice, est actuellement, malgré le caractère « témoin personnel » de la plupart des posts, un important répertoire des activités des militaires portugais en Guinée, entre 1963 et 1974.





Guiné- Bissau > Região de Bafatá > Contuboel > 16 de Dezembro de 2009 > O almami local...  Foto do médico e músico João Graça, membro da nossa Tabanca Grande.

Foto:  © João Graça (2009). Direitos reservados





2. Tradução de L.G.:


Auxiliares coloniais ou advogados dos súbditos coloniais ? Uma análise comparativa dos chefes e do sistema de autoridade tradicional durante o período colonial  [Título em inglês]


Régulos, Almamis e Mouros durante a guerra colonial na ex-Guiné-Português: a cada um a sua função, sua conveniência e sua lealdade

Eduardo Costa Dias
ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa

O advento da guerra colonial em 1963, na ex-Guiné Portuguesa, não só mudou o modus vivendi das populações africanas e europeias, como, um pouco por toda parte, mexeu com as relações mantidas entre as autoridades tradicionais e a administração colonial.

Com efeito, as autoridades tradicionais,  para além da exigência de rapidamente se posicionarem ao lado de uma das duas partes beligerantes, foram confrontadas com a necessidade de lidar, quase inesperadamente, com novos interlocutoers coloniais.

Quanto mais a guerra se estendia a novas zonas do território guineense e os combates aumentavam de intensidade, mais, a nível local, os comandantes militares se substituíam, de facto e de direito, aos administradores civis (administradores de circunscrição, chefes de posto, etc.) como interlocutores das autoridades tradicionais.

Em diversos sentidos, durante a guerra colonial, na maior parte do território, “a (verdadeira) autoridade portuguesa ", foi o exército.

No estudo de caso a que se reporta esta comunicação - o caso das autoridades mandingas e, sobretudo, fulas, dos círculos administrativos de Bafatá e de Nova Lamego (Gabu), no entanto, mais do que o reforço “fulminante” ou a ruptura brutal da velha coligação estratégica entre os chefes muçulmanos e o e Estado colonial, assistiu-se principalmente à multiplicação, em número e em "qualidades", dos interlocutores locais das autoridades portuguesas e, naturalmente, a uma maior diversidade das tomadas de posição dos dignitários políticos e religiosos mandingas e fulas.

Um almami ou mouro (marabú) não tinha, necessariamente, em relação às autoridades portuguesas ou ao PAIGC, a mesma posição que o “seu” régulo, mesmo se este, para além de ser muçulmano e mandingo / fula como ele, fosse seu irmão.

Pelo contrário, às vezes, havia mesmo grandes benefícios em tomar posições diferentes numa mesma família, tabanca (aldeia) ou zawiya (delegação local duma confraria); em situações complexas, como aquelas vividas durante a guerra colonial por muitos dos fulas e mandingas de Bafatá e do Gabu, o uso adequado da reinterpretação oeste-africana do instituto da muwalat – "acomodação, sob reserva, com o infiel” / “aceitação de uma compromisso provisório com os infiéis” –  que obrigava a isso!

No essencial, a informação tratada nesta comunicação foi obtida a partir de entrevistas realizadas nos anos de 1990 e 2000 a dignitários muçulmanos das regiões de Bafatá e Gabu, da consulta de documentação em arquivos portugueses (AHM, AHU, ANTT) e da leitura sistemática de um blogue de antigos combatentes portugueses na ex-Guiné Portuguesa.

O blogue "Luis Graça  & Camaradas da Guiné ", para além da sua “missão" fundadora, é hoje, apesar do carácter de “ testemunho pessoal" da maior parte dos postes,  um importante repertório das actividades dos militares portugueses atividades, na Guiné, entre 1963 e 1974.

terça-feira, 10 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4006: (Ex)citações (20): Nino Vieira, carismático, calculista, vingativo, violento, solitário (Eduardo Costa Dias)

1. Excertos de uma peça jornalística que gostei de ler, da autoria de Ana Dias Cordeiro > Nino Vieira: Combatente exemplar, ditador temido, Presidente sozinho. Público 4/3/2009.

Destaco aqui as opiniões (qualificadas), recolhidas pela jornalista, junto do meu amigo e colega Eduardo Costa Dias, grande especialista da cultura e da história da Guiné-Bissau, professor de Estudos Africanos, Departamento sde Sociologia, Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) (foto à esquerda, Bissau, 2008).

Ele prometeu-me há dias um artigo para o blogue com a sua leitura socioantropológica da morte (física e simbólica) do Nino Vieira. Os camaradas e amigos da Guiné ficar-lhe-ão gratos. Até lá, fica aqui uma pequena amostra (*) do seu pensamento sobre um homem que ele conheceu pessoalmente...

O Prof Doutor Eduardo Costa Dias vai regularmente à Guiné-Bissau. Apresentou uma comunicação ao Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008), subordinada ao título "Papel e influência das dinâmicas sócio-religiosas e políticas nos movimentos de libertação nacional na África Ocidental: o caso da Guiné-Bissau". (**)

O homem que vai hoje a enterrar a Bissau, oito dias depois de ter sido brutalmente assassinado em sua casa, foi combatente, do outro lado da barricada, numa guerra onde estivemos envolvidos... Não foi um combatente qualquer. Foi um grande combatente. Foi objectivamente um inimigo que os tugas, apesar de tudo, aprenderam a respeitar. É também o último dos históricos comandantes do PAIGC... Com ele, há um grande capítulo da guerra colonial que se vira ou que se arruma, mal ou bem... Penso que mal: com ele (e com Tagme Na Waie) morrem também memórias privilegiadas de uma época, que não chegaram a ser recolhidas, tratadas e socializadas... Nenhum homem devia morrer sem primeiro passar o seu testemunho, sem escrever ou ditar as suas memórias... (LG)

(Bold, da responsabilidade do editor. L.G.)


(…) Foi alvo de verdadeiras tentativas de golpe de Estado, mas também fabricou algumas, para ter apoio em momentos de fragilidade. "Como todos os chefes guerrilheiros míticos, Nino escapou várias vezes à morte. Foi um chefe guerrilheiro que teve a morte sempre presente e foi esse espírito que levou para a governação", diz Eduardo Costa Dias, professor de Estudos Africanos do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), em Lisboa.

Entre os guerrilheiros era visto como um chefe corajoso, mas ao mesmo tempo muito temido, porque traiçoeiro. "Continuou a jogar com o carisma que tinha de guerrilheiro junto de outros guerrilheiros", acrescenta Eduardo Costa Dias. Mas esse carisma foi-se desvanecendo. Terminou os seus dias praticamente sozinho. Manteve a confiança de alguns antigos guerrilheiros fora das Forças Armadas, de um pequeno núcleo dentro do PAIGC de que foi líder, e junto de alguns régulos. Mas mesmo nas eleições de Novembro do ano passado associou-se ao PRID, um partido novo que apenas elegeu três deputados numa Assembleia em que o PAIGC de Carlos Gomes Júnior obteve maioria absoluta. À derrota militar de 1999 seguiu-se a derrota política.

Quando em 2005 voltou ao país e foi eleito nas presidenciais, o seu regresso chegou a ser remotamente imaginado como uma tentativa de redenção e as suas palavras como um genuíno gesto de reconciliação com inimigos de um passado conturbado e violento. Mas Nino não escolheu redimir-se.

"Além de calculista, Nino Vieira era extremamente vingativo", continua Costa Dias, para quem o ex-Presidente regressou sobretudo para vingar o seu passado, o seu derrube pela junta militar.

(…) Quem vive na violência morre na violência, sugeriram algumas figuras, como o ex-Presidente português Mário Soares. O professor universitário Eduardo Costa Dias diz que Nino Vieira ilustra na perfeição esse conceito. E acrescenta: "Além de violento, Nino não era amigo de ninguém." Nos últimos dias, provavelmente, tinha como única e eterna companheira a mulher, Isabel Romano Vieira, de uma família ligada à administração colonial e irmã do cônsul-geral da Guiné em Portugal. Foi poupada pelo comando que matou o Presidente.

Para Costa Dias, "a fragilidade de Nino Vieira veio dar um novo papel, de conselheira, a Isabel Vieira, que contudo teve sempre um papel importante". E que esteve com Nino até ao fim.


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Notas de L.G.:

(*) Vd. 7 de Março de 2009 >
Guiné 63/74 - P3993: (Ex)citações (20): Órfãos de guerra: Rogério Soares, aos dois anos, em Nhabijões (Gabriel Gonçalves, CCAÇ 12)

(**) Nota curricular,constante da página do
Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008):

(i) Professor de Sociologia e de Estudos Africanos coordenador científico dos Programas de Mestrado e de Doutoramento em Estudos Africanos do ISCTE e professor visitante no Institut d’Études Politiques (Sciences Po-Paris) e na Université de Laval (Canada).

(ii) Tem desenvolvido investigações sobre as relações entre o Estado e as Autoridades Tradicionais, o “Islão Politico” e o ensino muçulmano na África Ocidental, em especial na região senegambiana (Gâmbia, Guiné-Bissau, Senegal).

(iii) Autor de vários trabalhos sobre problemáticas sociais e politicas contemporâneas da Guiné-Bissau, prepara actualmente a publicação de um livro sobre a islamização do antigo Kaabú e tem no prelo uma recolha de artigos publicados e inéditos sobre a politica colonial nas regiões islamizadas da antiga Guiné Portuguesa (1880-1930).

(v) Título da comunicação > Papel e influência das dinâmicas sócio-religiosas e políticas nos movimentos de libertação nacional na África Ocidental: o caso da Guiné-Bissau

(vi) Sinopse da comunicação

O assunto desta comunicação tem directamente a ver com as diferenças de peso, de dinâmica e de tempo de intervenção que muçulmanos e seguidores das religiões ditas tradicionais tiveram no movimento de libertação nacional liderado pelo PAIGC na Guiné-Bissau.

Trata-se, do meu ponto de vista, de um tema de grande importância para a compreensão, por exemplo, das razões sócio-politicas e político-religiosas da, globalmente, menor presença dos muçulmanos durante todo o período da luta de libertação, nas fileiras da guerrilha.

Com efeito, embora muitos muçulmanos tivessem, a título individual, integrado a guerrilha e alguns nela desempenhado papéis político-militares de relevo, durante a luta de libertação, a larga maioria dos membros do establishment muçulmano guineense (dirigentes das vários ramos guineenses da confraria qadriyya e da tijâniyya, imãs, letrados, régulos, etc.) teve um papel pouco colaborante com o PAIGC e muitos mesmo de assumido colaboracionismo com o poder colonial.

Nesta comunicação procurarei, descrevendo o quadro sócio-religioso da Guiné-Bissau e enumerando alguns dos acontecimentos mais marcantes das relações tecidas, antes e durante a luta de libertação, pelos dignitários muçulmanos guineenses com o poder colonial, questionar globalmente o papel dos vários grupos religiosos não cristãos durante a luta de libertação nacional e, numa dimensão mais precisa, aduzir elementos para a compreensão das razões da manifesta hostilidade por parte da maioria do establishment muçulmano guineense para com a luta de libertação.

Na minha opinião, as razões desta hostilidade não se radicam, no fundamental, na eventual incompatibilidade entre o Islão e o ideário filosófico-político proclamado pelo PAIGC ou na simples discordância sobre os métodos seguidos por este movimento na luta pela independência da Guiné-Bissau, mas sim em questões fundadas na política de alianças com o Estado seguida pelos dignitários político-religiosos muçulmanos guineenses e de um modo geral pelos dos países vizinhos desde os anos 1880-1890. Entroncam, na política dita do muwalat (“acomodação sob reserva”/”coabitação” com o Estado) encetada pelos dignitários muçulmanos no 3º quartel do século XIX em toda a África Ocidental e que, como o atestam, no caso guineense, a antiga “tradição” de aliança com o Estado colonial, a oposição do establishment muçulmano à luta de libertação e a “reentrada” na área do poder de muitos dignitários passado pouco tempo sobre a independência da Guiné-Bissau, transitou, nos seus contornos fundamentais, da situação colonial para a pós-colonial.

Cabral, fino conhecedor do xadrez social e político-religioso da Guiné-Bissau, tinha, bem antes do início da luta de libertação, consciência da tendência “estrutural” do establishment muçulmano para acomodar-se ao “poder do momento” qualquer que ele seja! Disse-o nos seus escritos, teve-a em atenção no delinear da estratégia de mobilização das populações para a Luta.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3628: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (5): O sentido de uma sondagem (Joaquim Mexia Alves / Luís Graça)





Academia Militar > Aquartelamento da Amadora > Auditório > 13 de Dezembro de 2008 > Sessão de apresentação do livro do Cor Art Ref, Coutinho e Lima, A Retirada de Guileje: A Verdade dos Factos [ Linda-A-Velha: DG Editor, 2008, 469 pp, € 20 (*); pedidos do livro, directamente ao autor (**) ] > Diversos membros da nossa tertúlia (ou Tabanca Grande, como preferem uns, e outros não) deslocaram-se à Amadora, para assistir a este acto público. Entre eles, o Xico Allen (de Vila Nova de Gaia) e o Vasco da Gama (da Figueira da Foz) (terceira foto a contar de cima). Ou ainda o João Rocha (do Porto) ou o Nuno Rubim (do Seixal), aqui em conversa com o Xico Allen (segunda foto a contar de cima). Tudo isto num belo auditório de uma escola que formou muitos dos oficiais que nos comandaram, no TO da Guiné militar, escola essa guardada, não por imperiais leões de pedra, mas por velhos obuses da I Primeira Mundial, as peças 11.4cm T.R. m/ 917, mais conhecidas na gíria dos artilheiros por Bonifácios (primeira foto a contar de cima).
Nos postes anteriores esqueci-me de mencionar outras pessoas com quem estive a falar, por uma razão ou outra: (i) o nosso tertuliano Cor António Pereira da Costa (o único que ainda está no activo, sendo director da biblioteca do Exército, em Coimbra; falámos muito rapidamente sobre as últimas diligências relativas ao caso do António Batista, o morto-vivo do Quirafo); (ii) o jornalista Joaquim Furtado (que está a fazer investigações sobre a morte dos 3 majores no chão manjaco, e que se mostrou particularmente interessado no dossiê, organizado pelo nosso camarada Afonso M.F. Sousa)... Também cumprimentei e conheci pessoalmente o Eduardo Dâmaso. Reencontrei igualmente um antigo colega da DGCI - Direcção Geral das Contribuições e Impostos, o Torres, que afinal também passou por Guileje , no tempo do Cap Corvacho (CART 1613, 1967/68)...Convidei-o a integrar a nossa Tabanca Grande. Tive igualmente o prazer de estar por uns breves minutos com o Prof Eduardo Costa Dias, do ISCTE, um grande especialçista da Guiné-Bissau onde vai regularmente... Acabo de receber hoje um mail dele, que diz o seguinte:
"Como vais? Ontem acabamos por não nos despedirmos. Luis: achas que conseguirias meter na noticia que certamente farás no blog acerca do lançamento do livro, a informação de que vários homens grandes de Guiledge, sabendo do lançamento do livro, fizeram questão de enviar mensagens gravadas ao Coutinho e Lima e que essas mensagens foram entregues ao Coronel?"... Fica dada a notícia. Infelizmente, não tenho fotos de toda a gente...

Fotos: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados.


1. Mensagem de Joaquim Mexia Alves:

Caros Luís, Virgínio e Carlos

Embora a pergunta da sondagem [º 10, a decorrer de 12 a 18 de Dezembro] seja para mim muito perceptível, julgo que a mesma não está bem elaborada e poderá induzir em erro.

O discordo poderá muito bem estar a ser utilizado como apoio a uma decisão, de que afinal se quer discordar. E a inversa, claro.

Abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves

2. Resposta de Luís Graça:

Joaquim: É sempre complicado... A questão tem de ser clara, concisa e precisa... Agora já não posso mudar (a não ser anulando a sondagem)... Vou acrescentar uma nota, do tipo:

A questão é: Discordas ou concordas com a seguinte afirmação: "A posição de Guileje era tão defensável como a de Guidaje ou Gadamael [e não Gandembel, como por lapso ficou escrito...], pelo que a decisão de retirar em 22 de Maio de 1973 foi um erro".

Eu sei que mesmo assim é discutível: Posso achar que a posição era defensável e mesmo assim apoiar a decisão de retirar... O que o Coutinho e Lima procura demonstrar, apoiado em factos e documentos, é que a posição de Guileje tornara-se indefensável na noite de 21 de Maio de 1973 e que para poder continuar a defender a missão (a protecção de civis e militares ao cuidado do COP 5) só lhe restava retirar para Gadamael...

Este é o tipo de decisão clássico, em que o decisor está perante um dilema, não tem mais alternativas... Ou foge ou luta ("flight or fight"), ou retira ou resiste... Repara que a retirada podia ter-se transformado numa tragédia... Mas o mesmo podia ter acontecido caso o decisor optasse por ficar e resistir: sem comunicações, sem água, sem munições, sem reforços, sem apoio aéreo, com os abrigos superlotados (3 vezes mais do que a sua capacidade prevista)...

O PAIGC estava em condições de tomar o quartel, provocar muitas baixas mortais e aprisionar os militares (c. 200) e a população (c. 500)... A humilhação para o exército português teria sido muito maior; o PAIGC iria usar a conquista de Guileje (não o quartel mas os seus defensores) para efeitos de propaganda interna e externa...Uma coisa é conquistar um quartel vazio, outra é aprisionar (ou matar) 700 homens, mulheres e crianças, civis e militares...

Este é o raciocínio do nosso coronel, um homem que foi condenado antes de ser julgado. Mais: um homem solitário, sem apoios, nem à esquerda (MFA) nem à direita... Preso durante um ano, com redução do vencimento a metade, foram os seus amigos, em Bissau e em Lisboa, que se quotizaram (5 mil escudos / cada) para contratar os serviços de um bom advogado (João Palma Carlos)... Quatro advogados que cumpriam o serviço militar em Bissau, como oficiais milicianos, foram impedidos de o defender...

É importante ler o livro, para depois poder tomar posição...

De qualquer modo, eu não quero que a sondagem se transforme em acção de julgamento do comportamento do Coutinho e Lima, que é nosso camarada, membro da nossa Tabanca Grande... Não quero que os nossos leitores tomem uma decisão emocional, mas tão apenas que votem, apreciando os factos...

Obrigado pelo teu interesse e cuidado... Tive pena de não te ver no sábado... Temos que começar a pensar no IV Encontro... Um abraço.


3. Resposta de Joaquim Alves:

Caro Luís

Não me passa pela cabeça fazer um "julgamento" do Coutinho e Lima e nem sequer tornar ainda mais dificil a sua vida ou a sua memória.

A verdade é que também não fui eu ou tu, ou qualquer outro, que decidiu fazer um livro para defender a sua posição.

Quando decidimos tomar uma posição pública, como ele decidiu tomar em relação a este assunto, fica-se sujeito à opinião dos outros.

Claro está que este assunto terá sempre pelo menos duas opiniões distintas: os que concordam com a decisão e os que não concordam.

Mas mesmo entre uns e outros as razões para o apoio ou a rejeição podem ser diversas, razões que podem envolver a política e razões da política, razões sentimentais, razões de nacionalismo exarcebado, razões de simpatia, e tantas mais que não têm fim.

E, meu caro Luis, é uma discussão que não tem fim, porque não há nada que prove que poderia acontecer isto ou aquilo.

Verdade é que, tanto Gadamael, como Guidaje, apesar de cercadas e até por mais tempo e com mais baixas, resistiram e ganharam essa guerra "especifica".

E a dúvida sempre restará, ou seja, será que com um novo comandante, e tropas especiais Guileje não teria destino igual aos outros? Não se serviu de qualquer modo o PAIGC do abandono do Guilege para declarar a guerra ganha?

São assuntos muito delicados e que nos tocam ainda de um modo, quer queiramos quer não, apaixonado e eu, meu caro Luis, sofro um pouco disso, da emoção à flor da pele.

Terei todo o cuidado nas coisas que eventualmente possa escrever sobre o assunto.

Julgo que ficou mais esclarecida agora a pergunta da sondagem.

Abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves

__________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série > 15 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3627: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (4): Apresentação do livro, 5ª F, 18, na Casa da Guiné-Bissau em Coimbra

(**) Para aquisição do livro, contactar o Cor Art Ref Alexandre Coutinho e Lima

Rua Tomás Figueiredo, nº. 2 - 2º. Esq.

1500 – 599 LISBOA

Telefone: 217608243

Telemóvel: 917931226

Email: icoutinholima@gmail.com