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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6826: Efemérides (49): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (2) (Leopoldo Amado)

Os graves acontecimentos do Pindjiguiti em 3 de Agosto de 1959 

II parte do texto do Leopoldo Amado, historiador guineense e membro da nossa tertúlia (publicado igualmente no blogue Lamparam II, em post de 21 de Fevereiro de 2006):

Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - II Parte (*)

A independência do Gana (1957) e as perspectivas da independência da Guiné Conakry e do Senegal (1958 e 1959) rapidamente transformaram a predisposição latente de luta pela independência dos guineenses num entusiasmo difuso, alimentado pela expectativa imediatista duma iminente libertação pacífica da Guiné, à semelhança do que ocorrera com os territórios africanos vizinhos.

Coincidentemente, e sob o impulso de elementos directamente doutrinados por Amílcar Cabral, registou-se em 1957 uma primeira grande greve dos trabalhadores no cais de Pindjiguiti em Bissau (12), apesar de que é a independência da República da Guiné que iria doravante funcionar como o ponto de partida e o leitmotiv para um amplo movimento para a independência.

Chega-se assim aos inícios da década de 50 do século XX com um nacionalismo guineense já mais amadurecido, pois, nesse período, para além de toda a carga histórica e cultural que comportou a resistência à ocupação colonial, este nacionalismo começou a ser directa ou indirectamente influenciada pela evolução política no Senegal e na Guiné Conakry, apesar de que as organizações surgidas na altura terem um carácter incipiente, reflectindo todos eles um certo idealismo.

O primeiro das organizações políticas a aparecer foi o MING (Movimento Nacional para a Independência da Guiné). Todavia, António E. Duarte Silva (13) atribui a paternidade da fundação do MING, em 1955, a José Francisco Gomes ("Maneta") e Luís da Silva ("Tchalumbé"), não obstante saber-se que o MING tinha por detrás a mão de Amílcar Cabral, não teve propriamente acções conhecidas e nem grande projecção.

Segui-se-lhe o PAI (Partido Africano para a Independência, fundado em 1956 por Amílcar Cabral (e que só se transformaria em 1962 em PAIGC), apesar deste Partido ter sido forçado a experimentar um período de profunda hibernação (1956-1959), dado que o Governador Peixoto Correia, depois de devidamente informado sobre as actividades de Amílcar Cabral, proibiu-o de estabelecer residência na Guiné, transferindo-o compulsivamente para Angola.

Portanto, é nesse hiato em que as actividades do PAI quase desaparecem, que é fundado o MLG (Movimento para Independência da Guiné), um movimento que integra sobretudo os guineenses, nomeadamente os dignatários com que Cabral havia começado a trabalhar desde 1952 e que, entretanto, assumem a liderança desse movimento.

João Rosa, um dos líderes históricos do MLG lembra (segundo o seu auto de interrogatório na PIDE datado de 1962) de ter integrado este movimento a convite de José Francisco Gomes e de ter participado na primeira reunião do MLG em princípios de 1958, na qual estiveram igualmente César Fernandes, Ladislau Lopes, este último mobilizado por Rafael Barbosa, elemento que viria a revelar a grande veia mobilizadora, chegando mesmo a protagonizar em entre 1959 e 1959 uma rotura que praticamente definhou a estrutura residual do MLG em Bissau, apesar de que em jeito de révanche e antecipação ao PAI, sempre ia desenvolvendo uma ou outra acção clandestina com o objectivo de demarcar-se publicamente do PAI, à semelhança do correio que enviou a todas as repartições públicas no dia 8 de Fevereiro de 1960, de um “Comunicado do Movimento de Libertação”, de resto, em tudo semelhante a “Representação” que o Lacerda produziu a pedido de César Mário Fernandes e José Francisco Gomes (assinada por várias pessoas) ao Presidente da República de Portugal em 1955, aquando da visita deste à Guiné.

Eram ainda da nata fundadora do MLG indivíduos tais como Tomás Cabral de Almada, Paulo Lomba Aquino Pereira e José Ferreira de Lacerda, o patriarca do MLG e líder consensual deste movimento, tido desde 1948 como o líder do Partido Socialista (14), que só não participou no acto da fundação do MLG porque à data da sua consumação encontrava-se em Lisboa, no gozo da licença graciosa na qualidade de funcionário administrativo, tanto mais que segundo palavras de Elisée Turpin, "(...) logo após a Segunda Guerra Mundial, uma organização que tinha como cérebro principal o guineense José Ferreira de Lacerda, funcionário público em Bolama, o qual liderava um movimento que de alguma forma tinha influência no Conselho do Governo colonial, chegando quase a ganhar uma eleição para o provimento desse órgão, quando foi abafado e reprimido pelas autoridades coloniais (...)(15)”.

Outra peça documental imprescindível para se compreender e enquadrar as acções do MLG, pelo menos do período que se estende de 1958 ao Pindjiguiti, são os clarividentes autos de interrogatório (16) da PIDE a Isidoro Ramos (ainda vivo). Aí ele é taxativo ao lembrar-se de, em princípios de 1958, ter visto um grupo de indivíduos em frente a Farmácia Lisboa que o abordarem sobre questões relativas a independência, aliás, reunião essa em que também se encontravam Ladislau Justado Lopes (enfermeiro), Epifânio Souto Amado (empregado de farmácia), César Mário Fernandes (empregado do trafego do cais de Pindjiguiti), Rafael Barbosa ( “ O Coxo”, ou “Patrício”, oleiro da construção civil), José de Barros (guarda-fios dos CTT).

Nos autos de interrogatório de Isidoro Ramos, este lembra de, uns dias mais tarde, ter sido abordado por Ladislau Justado Lopes que o informou de que iriam formar um Movimento de Libertação e que estavam a ver que pessoas é que podiam ser admitidas, pelo que imediatamente anuiu ao convite no sentido de integrar o Movimento de Libertação, após ter sido informado pelo seu interlocutor de que Fernando Fortes (funcionário da estação postal dos CTT) e Aristides Pereira (telegrafista dos CTT) também faziam parte desse grupo.

Aliás, salvo raras excepções, de 1958 a 1961, numa amálgama inextricável, alguns destacados dirigentes do MLG e do PAI, indistintamente, partilharam, voluntária ou involuntariamente o mesmo espaço político (17) coincidindo essa fase com o período em que ainda se acreditava ser possível, a breve trecho, sobretudo da parte do MLG, o início do processo que havia de conduzir a Guiné "dita portuguesa" à independência.

Na verdade, a criação em Bissau, em 1958, do MLG (Movimento de Libertação da Guiné), a par das perseguições das autoridades coloniais, constituiu-se no mais sério problema para os propósitos unitários que Amílcar Cabral postulava na luta contra o colonialismo português na Guiné. O MLG, que desenvolvia acções numa perspectiva política pouco elaborada, cedo hostilizou Amílcar Cabral, a quem alcunhou pejorativamente de "caboverdiano".

Este movimento acusava os caboverdianos de terem ajudado os portugueses na dominação colonial da Guiné e, perante a iminência de independência, pretenderem substituir os colonialistas. A miragem de uma independência prestes a concretizar-se, à semelhança do que ocorreu nas colónias francesas da Guiné "dita francesa" e do Senegal, precipitou nas hostes do MLG a tendência para a organização de um movimento que procurasse congregar no seu seio alguns poucos guineenses ilustres, dando assim primazia a necessidade de sublimação das inquietações mais personalizadas que colectivas, relegando para um plano secundário a preparação para a luta armada e a estruturação do movimento em termos populares.

O ambiente de luta pela independência, levou a que os nacionalistas guineenses e caboverdianos de Bissau se posicionassem a favor do candidato da oposição, Humberto Delgado, nas eleições presidenciais de 1958 que opuserem este a Américo Tomás. Conta Aristides Pereira que “(...)eu, o Fortes e outros patriotas organizámos as coisas de maneira a dominar a situação e fizemos um trabalho subterrâneo de forma a que chegasse às pessoas o que quiséssemos, por exemplo, as listas de voto de Humberto Delgado. Foi assim que a administração ficou perplexa quando apareceram em todos os círculos votos a favor do mesmo. Mas apesar de haver muito boa vontade da nossa parte, havia também muita falta de experiência. Porém, as nossas acções só começaram a ter alguma expressão prática depois da passagem do Amílcar na Guiné. Antes eram apenas ideias (18)".

Como quer que seja, é dado adquirido que o PAI, enquanto tal, até pelo hiato referido que caracterizou a sua quase inacção entre 1956 e 1959, não teve, pelo menos directamente, uma acção ou influência decisivas nas acções que viriam a desembocar em Pindjiguiti. Diferentemente do PAI, a mesma asserção já não pode aferir-se relativamente ao MLG que teve, de facto, uma assinalável e directa participação directa nos acontecimentos. Efectivamente, activistas do MLG tais como César Mário Fernandes (empregado do tráfego do cais de Pindjiguiti), Paulo Gomes Fernandes e José Francisco Gomes tinham-se há muito empenhado em acções de discreta mobilização e consciencialização política dos trabalhadores portuários em geral e dos marinheiros e estivadores do cais de Pindjiguiti em particular (19).

Com feito, Amílcar Cabral só regressaria a Guiné em Setembro de 1959 (14 a 21 de Setembro), isto é, um mês após Pindjiguiti, mas não antes sem ter feito um verdadeiro périplo aos países africanos recém independentes (Congo Kinshasa, Gana, Libéria, etc.) junto dos quais começou discretamente a procurar apoio político e material para a luta de libertação nacional. Assim, a reivindicação a posteriori da paternidade de Pindjiguiti por parte do PAI(GC) só se pode compreender na medida em que o MLG como o PAIGC partilhavam indistintamente o mesmo espaço político, a mesma clientela, chegando mesmo muitos membros do PAI a serem concomitantemente do PAI e vice-versa, de resto, tendência essa que em certa medida se acentua mesmo depois de consumada a rotura, sobretudo a partir do momento em que, a partir de Conakry e Dakar, Amílcar Cabral passou a produzir e a expedir para Bissau inúmeros panfletos que, à cautela, omitiam de propósito quer a sigla do PAI como a do MLG, para apenas se referir ao Movimento de Libertação da Guiné e Cabo-Verde, os quais, de resto, eram clandestinamente distribuídos em Bissau por elementos de filiação dupla (20), particularmente os que, não renegando o MLG, de alguma maneira permaneceram no PAI sob a influência de Rafael Barbosa, mesmo após a cisão.

Curiosamente, a PIDE conseguiu tardiamente reconstituir, através da sua rede informadores em África, todos os passos de Amílcar Cabral neste périplo (itinerário, autoridades contactadas, assuntos versados, etc.), na medida em que tal reconstituição só se concluiu quando Amílcar Cabral tinha já tinha saído de Bissau, onde, numa estada de cerca de uma semana (14 a 21 de Setembro de 1959), informou os correligionários que iria instalar a Sede do exterior do PAI em Conakry, a qual, doravante, se articularia com a Sede do PAI do interior, que acabou clandestinamente por ser instalada pouco depois numa palhota em Bissalanca (21).

Na sua meteórica passagem por Bissau, Amílcar Cabral acordou com os seus principais colaboradores, na altura Aristides Pereira, Luís Cabral, Fernando Fortes, Rafael Barbosa (22) e João da Silva Rosa em como largaria tudo e seguiria para a República da Guiné (Conakry) de onde enviaria directrizes. Efectivamente, a decisão de Amílcar Cabral de escolher um poiso de apoio na Guiné-Conakry foi devidamente sustentada com o exemplo de Pindjiguiti, pois que para ele era a prova iniludível da natureza permanentemente violenta do sistema colonial que, sintomaticamente, tinha maior força nos centros urbanos, donde a razão porque era preciso proceder a uma extensa e meticulosa preparação para a guerra de libertação e a mobilização dos camponeses para responder com violência à violência colonial.

É essa linha de raciocínio esse que presidiu ao envio, a 15 de Novembro de 1960, de um Memorandum a que Salazar nem sequer se dignou responder e que propunha uma série de medidas, “para a liquidação pacifica da dominação colonial "(23), secundando-o também, na mesma lógica, a “Nota Aberta ao Governo Português”, na qual, em jeito de “’ultima tentativa “para a liquidação pacifica da dominação colonial" (24), reitera o teor do Memorandum de Novembro de 1960.

No entanto, em Bissau, consumada que foi a rotura entre o PAI e o MLG, este último Movimento de Libertação quase que desapareceu, vindo todavia a ressurgir-se das cinzas no além fronteiras, a saber, em Dakar, Ziguinchor e Conakry, sobretudo a partir do momento em que um número relativamente considerável de nacionalistas guineenses tiveram que acorrer a essas países recém independentes, seja na qualidade de emigrantes económicos, seja para darem continuidade as acções políticas, ou motivados conjuntamente pelos dois factores, sobretudo após Pindjiguiti e a subsequente grande vaga de repressão que em Abril de 1961 foram efectuadas pela PIDE, seguindo-se-lhe uma outra, igualmente da responsabilidade da PIDE, ocorrida em Fevereiro de 1962 (25). Nestas correntes de emigração, divisam-se motivações que se reportavam a certo sentimento de concorrência em relação ao PAI, mas também era possível descortinar nelas um certo frenesim alimentado pela ideia imediatista da independência.

Foi o caso, por exemplo, dos enfermeiros que fugiram para a Guiné Conakry desde 1959 e que todos a trabalhavam todos no Hospital “Ballay” como, Paulo Dias (que veio posteriormente a ascender ao cargo de Presidente da FLING-COMBATENTE, uma das facções dissidentes da FLING (Frente de Libertação para independência Nacional da Guiné, surgida em Dakar a 3 de Agosto de 1962), João Fernandes (26) e Inácio Silva (27), Fernando Laudelino Gomes (28), sendo este último o locutor principal de um programa emitido semanalmente a partir da rádio Conakry, o qual era basicamente alimentado pelas notícias que basicamente denunciavam as reais ou pretensas atrocidades do colonialismo e que eram alimentadas sobretudo pelas notícias que César Mário Fernandes e Rafael Barbosa enviavam clandestinamente para Laudelino Gomes.

No Senegal, o MLG enraizou-se sobretudo entre os inúmeros refugiados guineenses ali instalados, calculados em cerca de 60.000 pessoas. Dakar acolheu ainda outras organizações tal como a UPG (União Popular para a Libertação da Guiné), a UPCG (União Popular para a Libertação da Guiné) o Rassemblement Democratique Africain de La Guiné (RDAG) que desde 1956 fez propaganda no sul da Guiné, em especial na área de Cacine e a UNGP (União dos Naturais da Guiné-Portuguesa), enquanto que em Conakry o médico e nacionalista angolano-santomense, Hugo Azancot de Menezes, propositadamente expedido para Conakry no quadro do Centro de Estudos Africanos (uma dissidência protagonizada no seio da Casa dos Estudantes do Império essencialmente por Amílcar Cabral, guineense-caboverdiano, Mário de Andrade, angolano e Francisco José Tenreiro, santomense) e do MAC (Movimento Anti-Colonial), passou a enquadrar embrionariamente os guineenses nacionalistas ali emigrados através do Mouvement pour l’indépendance des Territoires sous la domination portugaise.

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Notas do autor:

(12) Os registos desta greve cuja cópia não possuo ou não encontro de momento, mas que cheguei de manusear e ler, encontram-se nos arquivos da PIDE/DGS, na Torre do Tombo. O mesmo se dirá dos registos da PIDE sobre Pindjiguiti.

(13) Duarte, António E., A independência da Guiné-Bissau a descolonização portuguesa, Edições afrontamento, 1977, p. 32

(14) Entrevista de Rafael Barbosa a Leopoldo Amado.

(15) Entrevista de Elisée Turpin a Leopoldo Amado em Bissau.

(16) no seu auto de interrogatório do dia 10.3.1961

(17) Cf. Cabral, Amílcar, Evolução e Perspectivas da Luta, p. 12. Igualmente, nos processos da extinta PIDE, agora abertos à investigação do grande público em Portugal, é possível deduzir a asserção referida.

(18) Entrevista de Aristides Pereira, ex-Secretário-Geral do PAIGC a Leopoldo Amado.

(19) Entrevista de Paulo Gomes Fernandes a Leopoldo Amado.

(20) Eram, por exemplo, os casos de Alfredo Menezes D’ Alva, Epifânio Souto Amado ou um Fernando Fortes, entre tantos outros.

(21) O estabelecimento da sede do PAI em Bissalanca data de 1959, tendo funcionado até Fevereiro de 1962, altura em que foi detectada e tomada de assalto pela PIDE com a ajuda de elementos do Exército português, tendo aí sido presos Rafael Barbosa, Momo Turé, Paulo Pereira de Jesus e outros elementos proeminentes do PAI surpreendidos em pleno sono. Com a sede do PAIGC tomada de assalto pela PIDE e preso Rafael Barbosa, seu principal animador, foi desmantelada a rede clandestina do PAIGC em Bissau. A alguns nacionalistas foram fixadas residência em Chão Bom, Tarrafal, excepto Rafael Barbosa que a troco de "colaboração", foi-lhe fixada a obrigatoriedade de se apresentar todos os dias na sede da PIDE em Bissau. Foi apreendido na sede do PAIGC imenso material de propaganda que incluía inúmeros panfletos, correspondências de Amílcar Cabral, para além de armas.

(22) Rafael Barbosa foi acusado em reunião do MLG de ter escondido Cabral aquando da passagem deste último em Bissau, pois tinha anunciado numa reunião anterior deste Movimento a intenção de Amílcar Cabral em reunir com os dirigentes do MLG. Como à cautela Amílcar Cabral rodeou-se de todos os cuidados e apenas se encontrou com Luís Cabral Rafael Barbosa e Fernando Fortes, o facto reforçou as desconfianças nas hostes do MLG sobre as reais intenções de Amílcar Cabral e do PAI.

(23) Andrade, Mário, Obras Escolhidas de Amílcar Cabral – A prática revolucionária (Unidade e luta II), Vol. II, Comité Executivo de Luta do PAIGC, Seara Nova, 1977, pp. 27 à 31.

(24) Ibidem, p. 33-34.

(25) Em Maio de 1962, o PAIGC difundiu largamente um comunicado em que reclamava a libertação dos presos em Bissau, Cadique, Bedanda, Cafal, Cufar, Cantone, Catió, Cotumba, Cafine, Cassumba, Fulacunda, Empada, Tite e nas Ilhas de Bubaque, Canhabaque, Sogá, Caravela e Formosa. Era o período em que quer a mobilização do PAIGC como a consequente repressão dos agentes de mobilização (que apareciam armados de pistolas em diversas tabancas) ia no auge.

(26) Estudou com uma bolsa do Mouvement pour l’ independece des Territoires sous la domination portugaise. Regressou da URSS em 1967 e esteve em Dakar cerca de dois meses antes de partir para Bamako (Mali), onde foi assinalado pela PIDE, em 1970, quando ali exercia como médico cirurgião Bamako, Mali.

(27) Em 1970, encontrava-se em Dakar, segundo uma nota da PIDE.

(28) Em 1964, encontrava-se com problemas psíquicos em Dakar, pelo que a sua mãe foi buscá-lo a Dakar e levou-o a Bissau. Já em Bissau, foi preso pela PIDE em 1966 e acusado de ser o locutor principal que emitia notícias de incitação à revolta a partir da rádio Conakry.
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Nota de CV:

Vd. poste de 3 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6821: Efemérides (46): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (1) (Leopoldo Amado)

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5825: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (5): São Domingos, 21 de Julho de 1961: É o princípio do fim, Benedita

Guiné > Bolama >  Agosto de 1935 > "Guarda do Palácio do Governador. Foto de Manuel Emídio da Silva, no âmbito do 1º Cruzeiro de Férias às Colónias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Princípe e Angola, uma inciativa da revista O Mundo Português,  que juntou cerca de duas centenas de "estudantes, professores, médicos, engenheiros, advogados, artistas, escritores, industriais e comeriantes"... O Director Cultural do Cruzeiro foi o Dr. Marcelo Caetano.  Esta "revista de cultura e propaganda, arte e literatura coloniais", era dirigida pro Augusto Cunha, sendo propriedade da Agência Geral das Colónias e do Secretariado da Propaganda Nacional.




Guiné > Bolama > Agosto de 1935 > A chegada do vapor Moçambique, com os participantes do 1º Cruzeiro dee Férias às Colónias.


Fonte: O Mundo Português, Vol II, nºs 21-22, Setembro-Outubro de 1935 (Exemplar oferecido ao nosso blogue por Mário Beja Santos; fotos digitalizadas e editadas por L.G.; reproduzidas com a devida vénia).



1. Pré-publicação de excertos do próximo livro do nosso amigo e camarada Mário Beja Santos, Mulher Grande. Trata-se da terceira parte do Capº III(*):



Mulher Grande > III > A Guiné em chamas ou o “Tubabo Tiló”
por Mário Beja Santos




[III. 5]  Décimo terceiro solilóquio

Sinto-me um pouco mal com tantas interrupções que introduzo na narrativa da Benedita (**). Caí na asneira de lhe dizer que os poucos relatos que encontrei na Net são discordantes quanto ao número de feridos, até mesmo quanto à natureza dos estragos daquele ataque. Ficou furiosa, como se todos os outros pudessem duvidar da tragédia daquela noite e das suas implicações. Devem ter sido noites horríveis. É nestas descrições que eu mais aprecio o seu fio de memória, como narra os acontecimentos que a mais afectaram, a descrição que faz sobre a luz apagada à noite, o desaparecimento das pessoas, a chegada de uma tropa que vinha pouco convencida da possibilidade de um ataque.

O Albano procurava sacudir a pressão bebendo uísque, fumando e trabalhando naquelas questões da habitação que tanto o interessava. A Benedita também não esqueceu que acabou por ser influenciada pelos interesses do Albano e deu consigo a ler um calhamaço intitulado “A habitação indígena na Guiné Portuguesa” que lhe fora oferecido por um colega do Albano, Amadeu Nogueira. É preciso estar à beira de uma guerra, disse-me ela em tom trocista, para ler atentamente coisas como a casa dos Felupes e Baiotes, considerados em S. Domingos como os melhores construtores de casas em taipa, trabalhando para outras etnias como verdadeiros construtores.

A Benedita mostra-me uns papéis desbotados onde ela transcreveu o que lhe pareceu mais relevante. Leio o seguinte: as casas rectangulares são mais frequentes; a cobertura de todas as casas é feita sempre com palha; todas as casas possuem a sua varanda, cuja largura varia entre 1,50 e 2 metros, mas só na traseira; serve de sala de jantar para a mulher, de cozinha e de depósito de lenha; é aqui que se encontram os cachos de chabéu, cujo óleo há-de condimentar o arroz; a casa de Felupes e Baiotes dura uma vida e é demolida quando o seu proprietário morre; algumas casas apresentam exteriormente pinturas murais, geralmente zoomórficas e a tinta preta.

Estas palhotas têm portas fabricadas de uma só peça, geralmente em madeira de poilão, com 60 cm de largura, sendo sinal de grande desconsideração arrancá-las, indicando que os restantes elementos da povoação pretendem expulsar o proprietário; as janelas, quando as há, são pequenos rectângulos de cerca de 40 cm de cumprimento por 20 cm de largura, defendidos por pau de grossura de uma polegada; a iluminação é dada pela lenha que acendem no chão; o mobiliário reduz-se a uma cama que existe em cada quarto dos adultos, é nestes quartos que se podem encontrar bancos conhecidos por tripeças; as prateleiras são orifícios cavados, de cerca de 60 cm de cumprimento.

É espantoso como o ser humano descarrega a sua tensão transcrevendo num papel as suas impressões sobre as casas dos Felupes e dos Banhuns que ele vê todos os dias!

Interrompo a leitura destas folhas descoloridas para perguntar à Benedita se antes deste tiroteio de madrugada não houvera quaisquer outros sinais de agressão. Ela respondeu-me que sim, tinha havido uma tentativa de incendiar pontões entre S. Domingos e Bissau (havia 18). Tinha-se descoberto uma tentativa de incêndio de 2 pontões só que a chuva apagou o fogo.

Quando olhei, surpreso, a Benedita ela disse-me com a maior das naturalidades: “Não se esqueça que estávamos em Julho, naquela região Norte chove intensamente nesse tempo. Aproveitou para me recordar que havia uma grande lealdade das populações de S. Domingos com o Albano, ele era querido por todos, os seus próprios colaboradores da administração encarregavam-se de divulgar como ele era incorrupto, incapaz de uma maldade ou brutalidade.

Depois da sua vinda de Ziguinchor, onde assistiu à manifestação contra a política colonial portuguesa, o Albano reuniu-se com as famílias dos chamados civilizados, a todos contou que estava iminente um ataque. Reuniu também com a secção da tropa branca que fora mandada apresentar-se em S. Domingos depois do incêndio dos 2 pontões. A Benedita não recorda o nome de ninguém, lembra-se que havia um Alferes, que a tropa dizia muitos palavrões, era muito ruidosa, levantou muitos problemas no contacto com a população civil. Não resisto, peço-lhe todos os pormenores daquela noite do ataque, a noite que anunciou o princípio das hostilidades na Guiné.


Mais recordações da Benedita (décimo terceiro trabalho de casa)

Há 3 meses atrás, o assunto da Guiné era para mim um dossiê completamente arrumado, não me passaria pela cabeça partilhar com quem quer que fosse recordações tão queridas, íntimas e intensas, como o dia do meu casamento, o prazer que tive em viver em Bissorã, a admiração progressiva que fui ganhando ao Albano, ele foi um funcionário colonial exemplar, também considerava que era tabu o que eu vi em brutalidade no tratamento dos nativos.

Aprendi muito quando voltei a Lisboa, em 1963, apercebi-me que as pessoas só me ouviam porque tudo era exótico, mas era-lhes indiferente o modo como os guineenses viviam, a sua cultura, os seus costumes. Nunca me atrevi a contar a ninguém os comentários dos soldados brancos em S. Domingos, referindo-se àquelas gentes como se fossem uns atrasados.

Admiradora que sou da obra de Salazar, naquele tempo comecei a perceber que a revolta que veio depois tinha a ver com a necessidade de justiça e mais bem-estar. Tive o privilégio de conviver com Amílcar Cabral, era um homem de cultura superior, conhecia a literatura portuguesa como eu não conhecia, houve um serão em que falou de José Régio e de Miguel Torga, fiquei impressionada com os seus conhecimentos, a sua estatura moral.

Continuo indecisa acerca da utilidade deste relato. Eu fechei o dossiê da Guiné, é-me indiferente que tenha sido a FLING ou o PAIGC a atacar S. Domingos. Nunca tinha sentido qualquer tensão, qualquer comentário hostil à nossa presença na Guiné. É claro que vi muitos maus-tratos, havia claramente racismo, julguei que fosse tudo uma questão de tempo, a nova geração de brancos viria com outros sentimentos e certamente com muito mais amor cristão. O Albano e tantos outros funcionários exaltavam o trabalho do comandante Sarmento Rodrigues que eles consideravam o grande Governador da Guiné do século XX. Só vim a conhecer o Sarmento Rodrigues quando o Albano teve o primeiro ataque de coração e ele nos veio imprevistamente visitar. Fiquei com a noção de que se tratava de um homem superior, uma alma de eleição e que merecia os elogios do Albano.

Perdi todas as minhas memórias daquele tempo, os cadernos, os livros, as fotografias, tudo desapareceu. É a minha memória que esvoaça numa tremenda escuridão. Aquela noite do ataque alterou tudo, sobretudo o Albano tornou-se noutra pessoa, irei ouvi-lo vezes sem conta: “É o princípio do fim, Benedita, não tenho coragem de mudar de profissão, já me ofereceram lugares em Angola e S. Tomé, cheguei aqui imberbe, aprendi línguas, todos os rudimentos da administração colonial desde a tarimba, conheci homens muito estudiosos da mesma maneira que convivi com exploradores miseráveis, alguma da gente mais sórdida que há ao cimo da Terra. Não sei o que é que vou fazer deste amor que tenho pela Guiné. Talvez o melhor seja refazer a nossa vida na Europa”.

A doença acelerou esta previsão amarga. Em 1963, regressámos de armas e bagagens, o Albano doentíssimo, eu sem saber se não era necessário trabalhar, sabíamos que a pensão dele iria ser baixíssima. De 1961 a 1963, vi todos os dias o Albano, amargurado, a despedir-se da Guiné, a obra da sua vida.

E começa o ataque!
Não sei se já lhe disse, eu recusei partir com os civilizados, pedi mesmo ao Albano que a tropa branca recém-chegada ficasse a viver na administração, ficaram aquartelados em instalações improvisadas e combinou-se que, no caso de um ataque ao edifício da administração, nós iríamos pedir a protecção a esta tropa. Tínhamos 2 pistolas e havia na administração umas armas do tempo da 1ª Guerra, umas armas de repetição que já ninguém utilizava. Penso que foi na tarde de 20 de Julho que chegaram 2 funcionários para fazer o recenseamento, mas que logo ficaram contagiados pela grande tensão que havia entre nós. Mal sabiam eles o que os esperava!

Recordo que cerca de um mês antes do ataque tinha lá estado um dos administradores da Casa Gouveia, um tal engenheiro Norberto Velez, que olhou para as nossas coisas, os nossos haveres na casa e fez o seguinte reparo: “ Vocês não podem ter todos estes objectos à mostra, pode ser mais uma razão para eles vos assaltarem e esquartejarem!”. O Albano replicou que não queria mostrar medo, não aceitava mexer em nada. Mas, tempos depois da partida deste engenheiro Velez, ele reconsiderou e enviou encaixotados muitos dos nossos objectos pessoais para Bissau. Então, senti uma grande angústia. Fiquei despojada de muitos dos meus objectos, que me faziam tanta companhia, sentia-me praticamente uma reclusa.

Bom, vou voltar ao princípio do ataque, escusa de voltar a perguntar quem era o grupo, quem estava por detrás deles, eu não sabia, ninguém me deu informações, em Bissau, como verá mais adiante, ninguém me falou nessa FLING, falavam sempre em terroristas.

O Albano tinha combinado connosco como se iria organizar a defesa, cada um de nós tinha sempre a roupa à mão, a arma ao pé. O Albano não aceitava as instruções dos militares, isto é, de irmos a correr até ao aquartelamento deles, logo que começasse o tiroteio. Dizia-me frequentemente: “Estão doidos, fazem contas de cabeça, julgam que isto é aritmética, imaginam um pequeno grupo de selvagens, mal equipados e armados a dar uns tirinhos, quem sabe se não aparece aí um grupo bem armado que nos vai dizimar ou esquartejar. Não, Benedita, nós iremos a correr para o mato, conheço tudo como as minhas próprias mãos, ali não nos apanham”.

Eu ouvia isto tudo e estremecia, a pensar nas cobras e andar aos tropeções dentro da mata, a imaginar uma perseguição e ser morta à catanada. Mas eu confiava absolutamente no Albano e não me atrevia a pôr objecções. Então, pelas 2 da manhã, mais ou menos ouvi o primeiro tiro, partiu da mata em direcção à nossa casa, o Albano deu o grito: “Eles aqui estão!”, eu sei que isto não tem pés nem cabeça mas senti uma sensação de alívio, fomos todos até à varanda, de pistola em punho, quando digo nós incluo todo o pessoal da administração.

Continuo sem saber os termos militares, só posso contar aquilo que vivi, com os meus conhecimentos. Eles atiravam da mata para casa, senti as balas perfurar as paredes, a partir as telhas, a desfazer os vidros. Eu olhava na varanda a saída do fogo, o Albano ordenou que devíamos ir para a casa da alfândega, ali, como só havia uma varanda à frente, era mais fácil responder ao fogo deles. Um dos funcionários da administração gritou que estava ferido, caiu no chão. Juro-lhe que eu estava muito calma, o homem parecia desmaiado, tirámos-lhe as calças, estava bastante ferido numa das virilhas, fora um puro acidente, a pistola dispara-se quando ele escorregara. Alguém lhe deu uma injecção de morfina, lá o arrastámos para a casa da alfândega. Como não havia fogo sobre a casa da alfândega, procurámos ir até ao aquartelamento e aí disseram-nos que já havia 5 feridos. É nisto que damos conta que as luzes ali estavam todas acesas, foram então apagadas e começámos a transportar os feridos para este edifício onde o enfermeiro tinha mais meios.

Não sei quanto tempo depois voltou o silêncio total, tinham acabado os tiros. O Albano sentou-se a uma secretária e escreveu um relatório e disse-me: “Benedita, não sei se estou a proceder bem, peço-lhe que leve esta carta a Bissau, ao amanhecer tenho que dirigir a evacuação das mulheres e das crianças, vai com uma escolta militar, fico à espera que mandem mais reforços, ninguém pode adivinhar quando será o próximo ataque”.

Sentia-me embrutecida e distante, eu tinha uma outra ferida, muitíssimo profunda, não sei com que coragem lhe vou agora contar o que me atormentava. Durante aquele tempo que precedeu ao ataque, todas as noites ouvíamos a rádio Dakar, era ali que se referia sem nenhuma discrição que em breve as povoações com colonialistas, junto à fronteira com o Senegal, iam ser atacadas.

Uma noite ouvi mesmo dizer que onde o Albano estivesse (nunca referiram S. Domingos, só falaram no nome dele) eles fariam o menor número possível de mortos porque ele tinha sido sempre humano para os africanos. Uma noite fiquei gelada quando eles disseram num francês impecável: “Lembra-te Albano Toscano que já tiveste filhos africanos!”. Não foi uma sensação de traição que eu senti, o Albano tinha-me dito que não havia outra mulher na sua vida, o que eu verdadeiramente senti é que devia ter partilhado aquela informação, não era agora que ia perguntar ao meu marido se ele tinha filhos de outras mulheres, se estavam vivos ou mortos, aquela omissão recebi-a como uma bofetada, não era agora que eu ia perguntar ao meu marido se era verdade ou se era mentira, ele estava ao meu lado a ouvir a rádio Dakar, fez que não ouviu, senti-me maltratada, eu merecia uma explicação.

Sentia-me aturdida, aceitei partir para Bissau, vi à minha volta toda a gente a trabalhar, o Albano a içar a bandeira portuguesa e depois a liderar os preparativos para que todas as mulheres e crianças fossem retiradas de S. Domingos, nem todas aceitaram partir, mas muita gente foi de barco para Cacheu. Da janela do edifício da administração assisti àquela debandada., todos partiam com os olhos postos no chão.

Ao amanhecer, uma avioneta veio-me buscar, parti cheia de sofrimento, deixando ali o Albano, não tenho a menor recordação daquela viagem, só sei que quando cheguei a Bissalanca desmaiei. Lá me recuperei e segui para o Palácio do Governador. Acompanhada pelo comandante militar, fui prontamente recebida pelo Governador (****), leram os dois o relatório do Albano, disse-lhes que ele pedia sacos para fazer barreiras de protecção, tinha extrema necessidade de enfermeiros e, se possível, pedia mais reforços. É nisto que o governador me pergunta: “Onde é que a senhora quer que eu vá arranjar estes sacos?”. Respondi-lhe: “Não tem dificuldade, basta chamar o Turco, aquele comerciante que trabalha com o Pintosinho, ele vai falar com os arrozeiros, é um instante enquanto se arranjam os sacos, depois em S. Domingos é só enchê-los”.

Nesse mesmo dia, as autoridades enviaram para S. Domingos um pelotão para reforço daquele contingente que ficara tão combalido com o ataque da madrugada. Não me recordo bem, já disse várias vezes que todos estes papéis se perderam nas malas que vieram de S. Domingos para Bissau e que desapareceram sem deixar rasto, mas o Albano enviara no seu relatório a informação de que os atacantes só tinham utilizado armas de repetição entre as 2 e as 6.30 da manhã, hora em que tudo acabou.

Ah, espere, temos que voltar aos sacos. Depois de uma grande correria, lá se encontraram sacos, cerca de 600, e o Governador perguntou aos comerciantes como é que eles iam fazer chegar os sacos a S. Domingos. Eu estava com a cabeça tonta, meio adormecida, sedada por um tranquilizante que me tinham dado, olhava para aquilo tudo e perguntava-me qual a capacidade de resposta daqueles políticos perante uma emergência, se não eram capazes de encontrar uma solução apropriada para enviar 600 sacos vazios para S. Domingos.

Fiquei em casa da Ivone Leal, mulher de um advogado, lembro-me que dormi muito mal, foi um sono sobressaltado, sempre a pensar num próximo ataque, e eu longe do Albano., numa atmosfera de segurança. Na manhã seguinte, alugou-se uma avioneta que foi a S. Domingos levar mantimentos e os sacos, o Turco esteve a conversar uma hora com o Albano, as notícias que trouxe eram tranquilizadoras, tinha-lhe chegado informação que as dezenas de atacantes regressaram à região de Kolda.

Nessa noite voltei ao palácio do Governador onde me foi anunciado que este decidira que eu durante um mês não voltaria a S. Domingos, a justificação era que tinha a casa cheia de tropa. Só espero até morrer não voltar a viver um tempo de tanta ansiedade como aquele, a Ivone Leal e marido, os Nobre Lemos e outros casais tudo fizeram para eu me sentir bem, deram-me amparo e carinho, serenaram-me como puderam. Felizmente que o Governador dera ordens para que sempre que uma avioneta fosse a S. Domingos me levasse e trouxesse. Não imagina as peripécias que eu vivi! Oiça algumas.

Houve um piloto aviador que me deu uma palmada nas costas, em pleno aeroporto e à vista de toda a gente, eram um miúdo simpático, tratava-me por mana e bonitona, eu não sabia se me havia de rir ou zangar. Uma vez um outro piloto largou-me no Ingoré, disse-me que tinha de ir levar correio a Camamudo, vim numa carripana velha até S. Domingos, apareceu-me na estrada o Albano, afogueado, com uma escolta militar, o louco do piloto enviara uma mensagem a dizer que vira grupos estranhos à saída de Ingoré, talvez fossem salteadores, o melhor era protegerem-me. Na segunda visita ao Albano apercebi-me de grandes mudanças, as famílias brancas e até as de comerciantes mestiços consideravam o ataque a S. Domingos como o princípio da insurreição, anunciavam que iam partir, não queriam ser mortos à catanada.

Desculpe-me, começo agora a ter consciência que este relato é confuso, estou a misturar coisas, até escrevi aqui no meu caderno: “Dizer ao Mário que ao lado do nosso quarto, em S. Domingos, estavam 10 soldados e o rádio das transmissões. Quando voltei, estive quase um mês sem dormir a ouvir aquele besoiro, era uma gritaria em que o soldado no quarto ao lado usava uma linguagem codificada que me dava vontade de rir”.

Também escrevi no meu caderno: “Na mesma noite que os guerrilheiros atacaram S. Domingos igualmente flagelaram Suzana e o Albano mandou chamar o chefe de posto para S. Domingos, ele ficou aqui mas a mulher foi para Cacheu. Varela foi atacada mais duramente cerca de um mês depois, a bonita estância turística ficou completamente desmantelada, as casas turísticas desapareceram”. Agora peço-lhe que paremos, não pode imaginar a comoção que tive quando voltei a Varela e vi desaparecidos objectos pessoais que tinham para mim elevadíssimo valor estimativo. Quando vemos a nossa casa em derrocada, sentimos uma devassa incontrolável ao nosso património, ao mais nosso íntimo do nosso ser.


Décimo quarto solilóquio


Há qualquer coisa de patético neste funcionário colonial cujos avisos são ignorados em Bissau, impotente e talvez resignado com a incapacidade de resposta dos políticos, indiferentes à insurreição iminente. No último almoço, a Benedita contou-me que o Albano tivera a informação de que Varela iria ser destruída, nessa altura ela já tinha regressado a S. Domingos. Com o zelo de sempre, ele apelara para que houvesse movimentação de tropas para Varela, não houve, aquela linda praia que dispunha de um casario moderno ficou irreconhecível depois da depredação dos assaltantes.

Continuo a entusiasmar-me com os relatos da Benedita. As suas viagens da avioneta de Bissau a S. Domingos tiveram momentos delirantes, aquela história de um piloto que queria que ela visse os crocodilos e que baixou o aparelho até quase à linha de água, foi um dos maiores sustos da sua vida; e também aquela história em que viajou com um leitão destinado a S. Domingos, entretanto foi necessário ir a Cacheu de emergência e o funcionário local mal a viu desatou a chorar, agradeceu-lhe a amabilidade de ter trazido um leitão, ela nem teve coragem de lhe contar a verdade...

Nesse almoço com a Benedita também ficou claro que no círculo íntimo do Governador havia também quem, perversamente, insinuasse que o Albano estava feito com os africanos, seria um pro-independentista. Tomei igualmente nota das peripécias vividas em S. Domingos, com a tropa à volta. Por exemplo, estava a Benedita a dar aulas, rebentou um tiroteio, ela atirou-se para debaixo da secretária, afinal era um exercício na carreira de tiro, ninguém a avisara de nada.

Três semanas depois de estar em Bissau, o Governador autorizou que ela voltasse para o pé do Albano. Quando ela ali chegou já S. Domingos vivia um simulacro de estado de sítio, a tropa a circular permanentemente de Bula para cá e de cá para Bula, as ruas rasgadas por trincheiras, o Albano furioso sabendo que aquelas valas iam ficar cheias de água e inúteis, mal surgisse a época das chuvas. Acho que chegou o momento de registar esta coabitação com a tropa, as questiúnculas entre a tropa brancas e os Felupes, o fim das idas a Ziguinchor, quando o Senegal cortou relações com Portugal.




"Jangada no Rio Geba. Passagem entre Bafatá e Contuboel"... Imagem reproduzida  em O Missionário Católico, Boletim mensal dos Colégios das Missões Religiosas Ultramarinas dos Padres Seculares Portugueses, Ano VIII, nº 81, Abril de 1931, p.  169 (Exemplar oferecido ao nosso blogue por Mário Beja Santos). 

Imagem digitalizada e editada por L.G.


Em S. Domingos, à espera de uma guerra que não veio


Tudo mudou quando cheguei a S. Domingos, sabia perfeitamente que o meu idílio com a região acabara. Cercada pela tropa, a viver com a tropa em casa, a ouvir permanentemente os palavrões, com Varela destruída, com as medidas de segurança que nos obrigavam a circular com todas as cautelas, sem poder ir a Ziguinchor, refugiei-me na escola, nos livros, nos arranjos da casa, às vezes com a cabeça à razão de juros com aquele infortúnio, para mim incompreensível. Desforrei-me na cozinha, o Omaia foi dispensado de muitas actividades (é nesta altura, creio eu, que se descobriu que ele tinha lepra, antes de regressar a Portugal ainda o fui visitar à leprosaria, em Cumura), aprendi a fazer compota de caju e, pasme-se, atirei-me à jardinagem.

Eu nunca experimentara viver rodeada de arame farpado, agora estava a acontecer, tinha a tropa em casa, aquela convivência de caserna, os palavrões e o sargento a pedir-me desculpa pelos palavrões dizendo também mais palavrões...Embora isto pareça desusado, digo com toda a convicção que foi a fé que me valeu, eu escorregava naquela falta de valores, via o Albano triste e sobretudo muito doente, estava a sofrer muito de cálculo renal, houve momentos em que desesperei e, Deus me perdoe, cheguei a desejar um novo ataque para sairmos dali.

Pois bem, em Julho de 1962, depois de pedidos insistentes com relatórios médicos a comprovar o débil estado de saúde do Albano, ele recebeu autorização para irmos a Bissau. É precisamente na viagem de S. Domingos para Bissau que ele teve um aperto, saiu aos tombos do carro, ouviu-o dar um grito medonho dentro da mata, fui a correr em seu auxílio, ele disse-me com uma expressão aliviada, quando me aproximei ofegante: “Ai, Benedita, estou muito melhor, o cálculo renal já saiu!”.

Olhando para trás, posso dizer que vivi um tempo muito acinzentado. Depois de termos saído de S. Domingos, constou-nos que mataram um capitão num ataque àquela estrada e que continuaram de vez em quando a tentar destruir os pontões (havia na região de S. Domingos/Ingoré 18 pontões até Bissau como já lhe disse).

Agora apetece-me sorrir e até ser brincalhona no comentário que vou fazer: assentei praça em S. Domingos com a idade major e nem a cabo fui promovida, a recruta era de 3 meses, a minha excedeu um ano e meio.

Quando me vim embora, os soldados da companhia de S. Domingos colectaram-se para me dar um boné camuflado como presente. Até essa lembrança desapareceu naquelas malditas malas que se extraviaram, foi assim que perdi doces recordações.

O Albano fez tratamentos em Bissau, pela primeira vez senti que ele era um homem com o coração irremediavelmente destroçado e com a saúde arrasada e com cada vez menos sonhos. Quando comparo as fotografias que ele me enviou em solteiro, as que tirámos em Bissorã, em Teixeira Pinto ou no Gabu, com aquelas que guardámos dos últimos meses, em Bissau, que diferença! Ainda voltámos a S. Domingos, o Albano foi fazer a entrega oficial da administração ao seu substituto.

A despedida deixou-me debulhada em lágrimas. O aeroporto de S. Domingos, como em tantas outras pequenas localidades, limitava-se a uma pequena faixa de centenas de metros de terreno saibroso para o aterrar e o levantar voo das avionetas. Tínhamos uma multidão à volta da pista, os nossos criados com a tristeza estampada na cara, não sabiam quando voltariam a ver os seus patrões, vários régulos Felupes, Brames, Manjacos, trouxeram as suas numerosas famílias, o Albano e eu tínhamos um cortejo de afilhados com flores e outros presentes, não houve comerciante que não tivesse comparecido para nos ver partir. Guardo na retina aquela avioneta que deslizava aos roncos e os jovens a correr, com grande sorriso, e a saudar-nos entusiasticamente. Não aguentei, chorei muito.

Quero voltar à minha mágoa das malas desaparecidas. Tínhamos malas de porão, ali guardei a nossa roupa e os nossos haveres mais importantes. E foi graças a esta estúpida classificação que metemos em malas ligeiras as fotografias, os documentos, os livros e os mapas. Pedi ao condutor para entregar tudo (eram aí umas 5 ou 6 malas) em casa da Ivone Leal, dois dias depois de chegarmos a Bissau apurámos que as malas não apareciam, procurámos o condutor, ele garantiu a pés juntos que deixara tudo à entrada, ninguém assaltava as casas, naquele tempo. A verdade é que as malas nunca mais voltaram a aparecer, deve ter sido alguém que supôs que andavam por ali pratas e jóias, eu perdi coisas muito importantes para a minha memória, desapareceu a preciosa escultura dos Nalus, os panos Manjacos, os arcos de caça dos Felupes, lindos panos da Gâmbia, desenhos e aguarelas oferecidos por artistas locais.

Olhe à minha volta, está aqui tudo que testemunha o mundo em que nasci, bisavós, avós, pais e o Toninho, veja-me aqui no dia do casamento, ali com o Albano em cima de um hipopótamo morto, em plena ria de Cacheu (sempre lhe chamei ria, o Teixeira da Mota dizia mesmo que a Guiné só tinha um rio, o Geba). Tenho aqui os álbuns organizados, naquelas caixas de sapatos estão as fotografias que entraram nos livros do Albano ou ilustraram os seus artigos, guardo memórias de quase tudo, pode imaginar a falta que me faz o extravio daquelas malas. Felizmente, que muitos dos livros voltaram a ser comprados ou oferecidos, já lhe disse que nos primeiros tempos não me sentia atraída por todas aquelas histórias e por aquela diversidade cultural. Tudo mudou quando fui para o Gabu, agarrei-me aos livros, procurei compreender.

Num dos nossos próximos encontros até lhe queria falar dos artigos que o Albano escreveu no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, os objectos que ele ofereceu ao museu, este funcionava no edifício do Centro de Estudos da Guiné Portuguesa onde o Mário esteve tantas vezes, como observei na leitura dos seus livros, estudiosos como o Armando Cortesão, o Teixeira da Mota, o Rogado Quintino pediram ao Albano para comprar artesanato, ele comprava e não foram poucas as vezes que comprou com dinheiro do seu bolso objectos que iam para o Museu. Eu sei que sou muito má «aluna», registo caoticamente as minhas lembranças, ando permanentemente para trás e para a frente, mas tomei ainda nota de duas coisas que ainda lhe queria falar, depois paramos, estou muito cansada.

Tenho aqui escrito: jantar no palácio, em minha honra. Houve um ror de brindes, toda a gente queria discursar, o reitor do liceu comparou-me com a D. Filipa de Vilhena, desta vez ia desmaiando de riso; o Albano era tido por “trouxa” porque não fazia negociatas, punha na rua todos aqueles que lhe vinham propor negócios escuros ou procurar envolvê-lo em corrupção.

Deixe-me contar mais uma história. Nos últimos tempos de S. Domingos, foi lá almoçar um funcionário de Bissau que passava criminosamente cartas de condução. Alguns dos soldados vieram pedir-me para meter uma cunha a este senhor para lhes emitir carta, eles explicaram-me que não tinham dinheiro. Em pouco mais de duas horas ele passou para cima de 30 cartas de condução. No final, voltou-se para mim e perguntou-me se eu também não queria uma carta. É nisto que chega o Albano, tinha ido à povoação de Barro, por cauda das obras da estrada. Vendo-me aflita, perguntou-me o que se estava a passar e eu respondi que me estava a ser oferecida uma carta de condução. Olhou furioso aquele funcionário de Bissau e disse-lhe sem papas na língua: “Já chega de asneiras! Espero que durma mal a pensar nos desastres que vai provocar com a sua irresponsabilidade».

Verá mais adiante que o Albano me trouxe dissabores e grandes desgostos. Eu prefiro exaltar o funcionário incorruptível que tratou sempre correctamente os nativos e cuidou dos interesses da Guiné, nunca pactuando com qualquer tipo de crime. Só casei duas vezes, foram amores distintos, talvez a idade pese no juízo que fazemos dos homens que amamos, mas eu tive muito orgulho neste marido que desde que me conheceu me disse a verdade sobre a Guiné, foi bondoso e carinhoso comigo, tudo fazia para me ver feliz.

Bom, estou quase a sair da Guiné, agora preciso de descansar, ainda há alguns episódios que lhe quero contar, prometa-me que só vai escrever 2 ou 3 histórias se acaso vai publicar algum livro com esta maçadoria, é para mim mistério insondável o Mário encontrar algum encanto ou pitoresco nestes episódios que têm quase 50 anos e que estão definitivamente perdidos no tempo., dispensados pela História. Ou não estão?

(Continua)



[ Revisão / fixação de texto / título: L.G.]

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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores da série:

31 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5737: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (1): Um Gabu de poucas e fracas recordações

2 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5747: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (2): Da Guerra do Turu-Ban ao Tubabo Tiló, passando pelo deslumbrante Corubal

4 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5758: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (3): Dois anos maravilhosos: S. Domingos, Varela, Ziguinchor, antes da guerra...

9 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5793: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (4): S. Domingos, 21 de Julho de 1961: Benedita, eles já aqui estão!

(**)  Sobre o processo narrativo, explicou o autor:
 
"Queridos amigos, o livro 'Mulher Grande' é uma narrativa ficcionada, um relato de uma vida de memórias (memórias de uma vida). É a Guiné que aproxima a narradora e o seu arquivador/escriba. Benedita Dantas Estevão possui uma memória prodigiosa, viveu as agonias e os êxtases de toda a gente. A estrutura da narrativa baseia-se num processo literário explorado magistralmente por John Dos Passos, limitei-me a seguir-lhe as pisadas: há um episódio inicial em que o narrador descreve acontecimentos, o arquivador/escriba reflecte sobre eles (solilóquio) e o narrador dá uma explicação íntima para o que contou (recordações e trabalho de casa), é um círculo fechado de duas pessoas que falam a três vozes.
 
"O que ofereço ao blogue é matéria que se prende com a essência do nosso blogue: a Guiné em vias de entrar na guerra. O resto, caso venha a entusiasmar os tertulianos, fica para a leitura de cabo a rabo. Sugiro a sua publicação em pequenos episódios de duas ou no máximo três páginas, em consonância com a própria construção dos diálogos. Aguardo a vossa apreciação. Um abraço de amizade, Mário" (...)


(***) Excertos do Cap I:

(...) Vim ao mundo ao nascer do dia 24 de Novembro de 1920, em Lisboa. Nasci na Avenida da República, 70, no rés-do-chão de uma moradia que também tinha 1º andar e mansarda. (...)




(...) A casa fora alugada pela minha avó brasileira, a vovó Januária ou vovó Xanoca. No dia em que vim ao mundo, bateu à porta da nossa casa o capitão Edmundo Barreto, um dos fiéis de Sidónio Pais, e que era muito amigo do meu pai, vinha almoçar, isto era muito comum assim, recebíamos informalmente todos os amigos, eram poucos os que se anunciavam. Sabiam que o meu pai acabava as consultas no Curry Cabral pelas 13 horas, e que vinha imediatamente para casa, quem batia à porta almoçava. O meu pai contou-me que o foi receber à entrada, eufórico, estava todo desalinhado, sem plastrão, e lhe dissera: “Olha, desculpa, hoje não pode ser, nasceu-me uma filha, sou pai pela primeira vez, estou radiante, isto está tudo uma desordem mas estamos felizes. A Estrelinha está de boa saúde!”. A Estrelinha era a minha mãe. (...)


(...) Nasci num meio burguês, filha de um clínico geral que trabalhava no Curry Cabral e no banco de S. José e tinha consultório na Praça José Fontana, e de uma brasileira de Santos, menina prendada. Era um casal que se amava muito. À distância destes anos todos, reconheço que tive o privilégio de nascer num meio excepcional, rodeada de pessoas excepcionais. O pai, a quem meio mundo chamava o Catarinho (Catarino Palma d’Abreu Dantas) viera estropiado da Flandres, era um homem de uma curiosidade insaciável, uma grande alma, um grande carácter. (...)


(...) O Catarinho era monárquico por tradição e convicção, mas era um homem verdadeiramente popular, não aceitava injustiças, falava com toda a gente com a mesma elegância de modos. Uma vez, era eu pequena, ele foi abordado nos Restauradores por alguém, eu, a minha mãe e o meu irmão, não percebíamos o entusiasmo daquela conversa. Despediu-se do senhor e depois disse-nos: ”Era um dos meus doentes lá da Penitenciária, creio que era um grande criminoso que se regenerou. Ainda bem que o voltei a ver”. (...)


(...) O meu pai vivia politicamente na oposição à balbúrdia republicana, veio a aderir à Liga 28 de Maio, admirava profundamente Salazar e a sua obra. Fez sempre campanha a seu favor, tudo à sua custa, nunca quis cargos, o que ele queria era ser médico, viver com a família, estudar genealogia, história de arte, até mineralogia, tudo lhe interessava. Não passava uma semana que não fosse investigar na Torre do Tombo. A minha mãe era adorável, acabou por ser a minha filha. Isto é difícil de compreender até se conhecer a relação que estabelecemos, sobretudo nos últimos anos da sua vida, morreu já nos anos 80. Sempre que falo da minha mãe emprego o termo que usei sempre: a Estrelinha (Maria Augusta dos Santos Pimenta), ela era de facto uma estrela reluzente ao pé de nós, delicada no trato e sempre delicada na sua saúde. (...)


(...) A abundância em que nasci começou a desaparecer quando eu tinha 10 anos. Com a crise de 29, o meu pai perdeu as economias amealhadas que pusera no Banco do Minho e a Estrelinha perdeu muito do que tinha nos negócios de Santos, tudo herança do avô Valentim, que não conheci, ele morreu quando a avó Januária veio com duas filhas até à Europa. É verdade que ele era um nome na medicina mas não era suficiente, houve que cortar nas despesas, desapareceu o chofer e desapareceram criadas. E desapareceram muitas das visitas lá em casa. (...)


(...) Com o desaparecimento do meu pai, tudo mudou, eu ia fazer 21 anos. (...)


(...) Em 1950, soube que havia uma vaga na Embaixada dos Estados Unidos da América, na Duque de Loulé, fiz provas, no Verão, fui aceite. O meu emprego não era propriamente na Embaixada mas sim junto do serviço do adido militar, eu depois explico o que fazia. Por essa altura, o Raimundo pediu à minha tia para ir ter com ele ao Norte. A Ada pediu-me para a acompanhar. E foi assim que fomos para a Póvoa, de 15 a 30 de Agosto. Na primeira noite, fiquei em casa da Luísa Palma. Fui com ela ao Casino (...).


(...) Nisto chegou o meu primo Manuel Dantas Amorim que vinha a falar com um outro senhor e apresentou-me o Albano da Graça Toscano. Pouco depois, fui dançar com este senhor que era funcionário colonial, tinha ido quase adolescente para a Guiné, vivia lá há muitos anos, mais de 16, estava agora de férias. Ia começar o meu romance. No Casino da Póvoa, mal sabia eu, tinha o meu destino traçado para ir para a Guiné, onde vivi momentos tão belos mas também tão dramáticos. Ao longo destes anos, digo-lhe agora sem ironia, eu achava que era exótico falar da Guiné, quando eu falava os outros ouviam com atenção, ninguém sabia onde é que era a Guiné e como é que lá se vivia. Dou comigo agora a pensar que ir contar tudo quanto eu vivi tem aspectos melindrosos, ainda há algumas pessoas vivas, nem sei se vou contar tudo.


(...) E foi assim que ficámos noivos. Mas o Albano tinha que partir em Setembro, tinham acabado as férias, só poderia voltar dentro de 4 anos, encarou-se logo a hipótese de casarmos por procuração. É bom não esquecer que eu ia trabalhar para a Embaixada, em Outubro assinei contrato como operadora telefonista. Eu vivia uma situação de grande dilema, nem ele nem eu tínhamos idade para perdermos mais tempo, naquela época só havia cartas uma vez por semana, não me estava a ver num namoro como se fosse uma adolescente.


Era um dilema: pela primeira vez na vida eu estava a ter um emprego que me interessava, que me entusiasmava verdadeiramente, mas também a Guiné estava no horizonte, eu queria casar com o Albano. (...)


Casei na Igreja do Campo Grande, fui de braço dado com o maninho, fizemos a festa em nossa casa. E naquele mês de Setembro, com a Estrelinha e a Ada a chorar, emocionadas, parti da Portela, de madrugada. Eu saía pela primeira vez de Portugal. (...)

(****) Na altura dos acontecimentos em S. Domingos (21 de Julho de 1961), era governador da província da Guiné  António Augusto Peixoto Correia (1959-1962).  Sarmento Rodrigues tinha sido Governador do pós-guerra (25 de Abril de 1945 a 1950).

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5793: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (4): S. Domingos, 21 de Julho de 1961: Benedita, eles já aqui estão!


Guiné > Região do Cacheu > Varela > 1961 > Luta felupe, de Augusto Trigo. Painel que se encontra(va) numa parede de um restaurante/café, completamente em  ruínas. O painel foi restaurado, digitalmente, pelo Rui Fernandes. Foto de Rui Fernandes, cedida ao nosso amigo Pepito e aqui reproduzida com a devida vénia. (O Rui integra a nossa Tabanca Grande, desde Janeiro de 2008).

Augusto Fausto Rodrigues Trigo nasceu em Bolama, a 17 de Outubro de 1938. Órfão de pai em 1945, veio com mais dois dos seus irmãos para Portugal. A  mãe ficou  na Guiné, com o filho mais novo.

Esteve na Casa Pia até aos 19 anos (1957). Aí começou a revelar e a desenvolver o seu talento artístico. O seu primeiro emprego foi como pintor de publicidade. Regressa à Guiné para rever a mãe e os irmãos. Trabalha como desenhador cartográfico. Nos momentos livres, desenha e pinta (a óleo e a aguarela). Em 1964 realiza a sua primeira exposição de pintura. O Governo da província faz-lhe encomendas... O quadro, cuja imagem reproduzimos acima, data de 1961... Ainda viveu na Guiné-Bissau, a seguir à independência, tendo dirigido o Departamento de Artesanato Nacional, mas regressou definitivcamente a Portugal, em Setembro de 1979. É hoje um conhecido ilustrador e consagrado autor de Banda Desenhada (em parceria com o argumentista Jorge Magalhães). Para saber mais,  clicar aqui.


Foto: © Rui Fernandes / AD - Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados


1. Pré-publicação de excertos do próximo livro do nosso amigo e camarada Mário Beja Santos, Mulher Grande. Trata-se da terceira parte do Capº III (*):


Mulher Grande > III > A Guiné em chamas ou o “Tubabo Tiló”
por Mário Beja Santos


[III. 4] Décimo segundo solilóquio


O tempo esfriou, chuvisca, aproveito para ir ao Google ver o que aconteceu em S. Domingos, naquele dia 21 de Julho de 1961. Coisa estranha, parece que a luta armada só começou em Janeiro de 1963, com o ataque a Tite, desencadeado pelo PAIGC. No entanto, aos farrapos, fala-se da formação de rebeldes no Senegal, de um Movimento para a Libertação da Guiné, nalguns documentos fala-se mesmo da FLING. Imprimo tudo, algumas respostas podem ser encontradas nas entrelinhas.

Afinal, a FLING fora alimentada pelas autoridades de Dakar, tinha um projecto exclusivamente guineense, não queria o envolvimento dos cabo-verdianos. Noutro documento encontro referências à fuga de quadros, vejo mesmo o nome de Rafael Barbosa ligado à FLING, surpreende-me, pois o seu nome também aparece associado ao PAIGC.

No último almoço em casa da Benedita vi a emoção com que ela falou na degradação das relações com as novas autoridades senegalesas do Casamansa. Falámos na missão da Christine Garnier, ela ter-se-á encontrado com Senghor que mandou uma mensagem para Salazar apelando-lhe a um quadro de pequenas concessões imediatas e sugerindo-lhe um plano de transmissão de poderes com a duração de 20 anos. O que quer que tenha acontecido, Salazar, que recebeu Benjamim Pinto Bull em S. Bento, recusou qualquer modalidade de negociação. Segundo a Benedita, 15 a 20 dias antes do ataque atribuído à FLING apareceu o administrador do Casamansa em S. Domingos. Encontrou-se em privado com o Albano, ele partiu para Bissau com uma mensagem e entregou-a ao Governador. Soube-se mais tarde que foi uma derradeira tentativa para a negociação.

Dou comigo a pensar como certos protagonistas secundários têm às vezes entre mãos responsabilidades que podem levar à mudança da História. A acreditar-se no relato da Benedita, o Albano tinha consciência que se estava a dançar à beira do abismo. Seria muito interessante saber-se como Bissau transmitia para Lisboa a versão das hostilidades iminentes.

Estou a entusiasmar-me por um pedaço da história da Guiné que eu ignorava completamente. Mas o que mais me surpreendeu foram as respostas que me deram quando telefonei, por sugestão da Benedita, para um administrador e dois chefes de posto do tempo, bem como dois coronéis na reserva, alferes na Guiné em 1961. Foram muito cordatos ao telefone, ninguém se lembrava do nome dos rebeldes, aonde se situava o seu acampamento, embora se tenha falado que estava dentro do Casamansa ou em Kolda, nunca tinham ouvido falar na FLING ou no Movimento para a Libertação da Guiné.

Porque será que estes homens não querem falar? Pondo imediatamente de parte a hipótese de uma conspiração de silêncio, somos levados a pensar que ninguém acreditava que dois países independentes à volta da Guiné portuguesa iam ficar quietos, sem explorar o descontentamento existente nas várias linhas de independentistas guineenses. E não menos curioso é como esta sucessão de episódios não consta na história da Guiné-Bissau.

Mais recordações da Benedita (décimo segundo trabalho de casa)

Haverá o direito de eu estar a arrogar-me a um papel importante nos acontecimentos do ataque a S. Domingos? Tenho a consciência que a memória não me atraiçoa. Aí uns dez dias antes do ataque o Albano soube que ia haver um desfile contra Portugal, em Ziguinchor. Aquelas informações eram vitais, ele não podia ir nem ninguém da administração.

Vendo-o tão preocupado, sem saber o que fazer, tomei uma decisão sem hesitar: “Albano, eu vou, não se preocupe, toda a gente me trata bem em Ziguinchor, diga-me exactamente o que pretende saber”. Ele ainda tentou dissuadir-me, mas acabou por me dar razão. Ao amanhecer do dia previsto do desfile, parti com o chefe da central eléctrica de S. Domingos, pretextei uma indisponibilidade do Albano, referi que tinha umas compras urgentes, ao princípio da tarde estaríamos de regresso.

Em Ziguinchor, notava-se à vista desarmada um clima de grande tensão, as pessoas procuravam não falar comigo, ou respondiam-me com monossílabos. Estive na farmácia, no escritório de Hugues Lemaire, depois comprei tecidos a um mercador ambulante. Na farmácia, o farmacêutico que era claramente contra a presença portuguesa, perguntou-me por Monsieur le Commandant, senti-me bem tratada.

O desfile anti-português estava praticamente no fim, via papéis a convocar para a manifestação espalhados pelo chão, resolvi não apanhar nenhum. Na loja de um djila, senti que ele me estava a fazer perguntas acintosas, do tipo “o que é que eu pensava se ele abrisse um magasin em S. Domingos”, respondi que ficaria encantada. Hugues Lemaire recebeu-me imediatamente e advertiu-me: “O Albano que se organize e se defenda. O melhor seria vocês abandonarem já S. Domingos, eles vão atacar em breve”.

A mulher dele deu-me uma pistola e Hugues Lemaire precisou as últimas instruções: “Não posso escrever nada, a partir de agora, se souberem que estou a passar informações estamos perdidos. Estão a ser preparados 200 homens nas granjas de Tibelor, perto dos serviços de agricultura de Ziguinchor”. Ainda fui comprar umas conservas, livros e revistas.

Foi no carro que o Augusto, o chefe da central eléctrica, me mostrou os panfletos que tinham sido distribuídos na manifestação do tipo um capitalista gordo com charuto na boca às costas de um nativo, um cipaio com uma palmatória na mão a maltratar um indígena com as correntes nos pés e de mão estendida. Um dos panfletos falava na luta para expulsar os portugueses, admitindo se necessário recorrer à destruição de vidas. O Augusto disse-me: “Senhora, as coisas estão muito feias, eles têm espingardas e granadas”. Seguimos imediatamente para S. Domingos, o Albano não escondeu o seu alívio quando ali cheguei. Ouviu-me, escreveu uma longa mensagem, o secretário seguiu imediatamente para Bissau.


Antes do ataque a S. Domingos, em 21 de Julho de 1961


Pela primeira vez na minha vida, eu sentia-me no centro de uma agitação política que não entendia, onde não participava directamente, olhava, ouvia os comentários do Albano, lançaram-me avisos em Ziguinchor, mas como não via guerra nem era evidente qualquer hostilidade, continuei a viver sem alterar nada.

Enviaram de Bissau um novo secretário e um novo aspirante para S. Domingos, logo percebi que era para dar mais tempo ao Albano, libertá-lo das tarefas administrativas, os acontecimentos do Senegal e o espectro da guerra ocupavam-no cada vez mais. Nós estávamos preocupados com o que tinha acontecido em Angola, começava-se a pensar que íamos ser brutalmente atacados, até mesmo chacinados.

A mexer nos meus papéis, nas coisas que juntei nos últimos dias, tenho aqui registada a chegada de um homem que só nos deu dores de cabeça, Aventino Guerreiro, um aventureiro que chegou a S. Domingos com uma proposta de instalar um negócio de óleo de palma, queria que o Albano lhe concedesse mão-de-obra gratuita. Claro que o Albano recusou e pô-lo fora do gabinete.

Este Aventino Guerreiro só no ano de 1961 apresentou 15 queixas contra o Albano. Ele devia ter muitos apoios em Bissau, deve tê-los sugestionado com um conto do vigário, qualquer coisa como montar um sistema de informações ao longo de toda a fronteira, o pretexto seria a compra de mancarra, seria aí, durante as transacções, que se obteriam informações.

Um dia, vínhamos nós de Bissau, o Albano contou-me tudo no carro, como publicamente se manifestara contra este embuste, se Bissau queria boas informações, se queria confirmar e ampliar as informações que a PIDE oferecia, deviam estar atentos ao que ele escrevia, sobretudo às informações que ele recolhia em Ziguinchor.

O Albano tudo fazia para manter excelentes relações com os colegas do Casamansa. Ele sabia, desde 1960, que as relações iam ficar tensas, esforçou-se por fazer convites oficiais às novas autoridades senegalesas, recebemo-los em nossa casa, notámos da parte deles que não queriam muita intimidade, sentia-se no ar que em breve se iria chegar à ruptura. O Albano estava a sofrer muito, tinha recebido um telegrama a anunciar que a mãe estava a morrer, decidiu não vir a Portugal com tudo o que se estava a passar ali à volta.

Pode parecer contraditório, mas eu estava a receber novas alegrias. Fui admitida como professora no ano lectivo de 1960-1961, ninguém mais concorreu para S. Domingos. Comecei a juntar dinheiro, pois o ordenado de professora ia inteirinho para Lisboa, aproveitando o direito à transferência. Adorei ensinar, ver aquelas crianças que por vezes faziam quilómetros a pé a mostrar entusiasmo com a tabuada, começavam a soletrar e meses depois assistia àquele milagre das palavras serem ditas, mesmo aos solavancos.

É de repente que começo a sentir o desânimo do Albano por causa da indiferença de Bissau face aos seus avisos. Aquela indiferença deitava-o por terra. Já na festa da independência do Senegal ficara ao lado de um oficial reformado do exército francês que se mostrou muito glacial comigo. Perguntei ao meu amigo Hugues Lemaire o que levava aquele senhor a ser tão pouco gentil comigo e ele disse-me sem papas na língua: “Benedicte, tu não acreditas no que te andamos a dizer, tu jantaste ao lado do oficial que anda a treinar os rebeldes guineenses aqui no Senegal”. Fiquei sem saliva, olhei-o sem poder articular uma palavra. Hugues Lemaire também já avisara o Albano que Senghor queria marcar posição antes de Sekou Touré, iria apoiar insurreições no Norte da Guiné com rebeldes da nossa província. Senghor era a favor de uma Guiné para os guineenses, não apreciava os cabo-verdianos. Senghor dizia abertamente que o futuro desta nova Guiné independente iria ficar sob a sua custódia.

Vão seguir-se dias de tensão, nunca mais na minha vida tive uma espera tão dolorosa, inquietante, como aquela. Sentimos que muita gente estava a partir, até mesmo gente da população local deixou de vir a S. Domingos. Os comerciantes de Bissau, do Cacheu, de Bissorã ou Bula, nunca mais apareceram. O silêncio nocturno era horrível, nunca mais se ouviu um batuque, acabaram as fogueiras, as cerimónias e festas dos Felupes ou dos Manjacos. Eu procurava resistir dando aulas mas sentia também a falta de muitos alunos.
Estávamos todos à espera, num enervamento horrível. Chegara entretanto um contingente de tropa que ficou a viver dentro da povoação, e não muito longe de nós. Começava o nosso relacionamento com a tropa, que não foi nada feliz. Na noite de 21 de Julho, estávamos deitados quando se ouviram tiros, um deles partiu um vidro do nosso quarto. Como uma mola, saltámos da cama e rastejámos para a porta, punha-se assim termo a todos aqueles meses de expectativa.

Há quem diga que quando morremos a nossa vida passa no nosso cérebro como um filme acelerado, já me disseram que vemos e pensamos aquilo que mais no impressionou na existência. Pois eu sei que vou ouvir nesse momentos a voz do Albano gritar-me ao ouvido, plena de exaltação: “Benedita, eles já aqui estão!”.

(Continua)

[ Revisão  / fixação de texto / título: L.G.]
_____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 4 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5758: Pré-publicação de Mulher Grande, de Mário Beja Santos (3): Dois anos maravilhosos: S. Domingos, Varela, Ziguinchor, antes da guerra...

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3531: Controvérsias (14): PAIGC/FLING, Tite/São Domingos...(Carlos Silva)

Quando começou a Luta de Libertação?



Início da Guerra Colonial – Guerra do Ultramar [Guiné]
Início da Luta Armada – Início da Luta pela Libertação da Pátria [Guiné]
Início da Luta Armada pela Independência dos Territórios Ultramarinos da Guiné e Cabo Verde


As expressões referidas em epígrafe em minha modesta opinião e salvo o devido respeito, que é muito, por opiniões contrárias, consubstanciam ou podem traduzir vários sentidos ou interpretações, que neste momento, me dispenso de desenvolver.

Não sou Historiador e nem tenho formação académica na área de História e desconheço quais os factos relevantes que os Historiadores lançam ou irão lançar mão, neste caso concreto para qualificar o início da luta armada do povo da Guiné e Cabo Verde que conduziu à Independência destes dois territórios.

Da vasta bibliografia que possuo e li sobre a Guiné, Guerra da Guiné, Guerra Colonial, cerca de 200 livros, jornais, revistas e filmes que tenho visto na TV e em DVDs, sempre ouvi, li e vi referências que o início da luta armada pelo PAIGC que conduziu à independência daqueles dois territórios, iniciou-se com o ataque ao Aquartelamento de TITE, em 23 de Janeiro de 1963, levado a efeito pelos guerrilheiros nacionalistas, data invocada em todos os meios de comunicação referidos, sendo que, alguns fazem breves referências a tais acontecimentos, não desenvolvendo algo sobre os factos que ali se passaram, a não ser a data em que efectivamente teve lugar o início da luta armada levada a efeito pelo PAIGC.

Ataque ao Aquartelamento de Tite – 23-01-1963

Algumas Referências Bibliográficas

Sobre o começo das hostilidades ou início da luta armada pelo PAIGC em 23-01-1963 com o ataque ao Aquartelamento de Tite, situado no Centro-Sul da Guiné, por estranho que pareça, não encontramos qualquer narração escrita de forma desenvolvida sobre os factos que se passaram, quer do lado português, quer do lado do movimento nacionalista.

Da bibliografia aqui indicada, apenas se encontram breves referências alusivas a tão importante facto histórico no seguinte sentido:

1 - "... Em Janeiro de 1963, foi a sede do Batalhão atacada com armas automáticas e de repetição e granadas de mão. Deste ataque resultou 1 morto e 1 ferido das NT e 8 mortos confirmados e vários feridos graves IN. Depois deste ataque foram intensificados os patrulhamentos de que resultou a morte de Papa Leite, elemento IN que actuava na área e que facultou a recolha de valiosíssimos elementos da Ordem de Batalha IN..."

In, Carta de 7-07-1981 do Ten Cor Manuel José Morgado, enviada ao Director do Arquivo Histórico Militar, em resposta ao assunto " História das Unidades".

Resumo da Actividade do BCaç nº 237/BCaç nº 599 - Maio de 1963 a Maio de 1965 [Caixa nº 123 - 2ª Div/4ª Sec., do AHM]

2 - A propósito da detenção de alguns dirigentes do PAIGC em Conakry, por alegado contrabando de armas, diz Luís Cabral:

“... O Aristides respondeu em poucas palavras, justificando o nosso acto pelo interesse da luta comum e pedindo-lhe [ao Ministro da Defesa da República da Guiné-Conakry, Keita Fode] que transmitisse o nosso reconhecimento ao presidente pela sua fraterna compreensão. Quanto ao regresso do Amílcar, falando com toda a franqueza, não acreditávamos que ela pudesse ter lugar antes da nossa libertação, mesmo com a mensagem.

"Era lógico que ele fosse aconselhado a reflectir muito sobre a questão pois, se havia razões para estarmos ainda detidos, essas razões seriam certamente mais válidas em relação a ele, como primeiro dirigente do Partido.

"Entretanto, nas diferentes zonas do interior do país, ao tomarem conhecimento da nossa detenção, os combatentes decidiram juntar o pouco material de que dispunham e agir prontamente contra as posições colonialistas, onde isso fosse possível.
A 23 de Janeiro era realizado o primeiro ataque das forças nacionalistas do PAIGC, contra o quartel de Tite, sede administrativa da circunscrição de Fulacunda...”


In, Cabral, Luís – Crónica da Libertação, O jornal, 1ª edição 1984, pág. 144

3 – “…Malogradas as tentativas pacificas, só restaria a luta armada e, após uma declaração de Amilcar Cabral à Imprensa, em Dacar, de 26 de Agosto de 1962, verificou-se o ataque de guerrilheiros ao quartel de Tite, a 23 de Janeiro de 1963…
No caso do Senegal, conquanto inicialmente o seu apoio se evidenciasse mais favorável à FLING, Léopold Sédar Senghor viria a transferi-lo para o PAIGC…”

In, Sambu, Queba, TenCoronel – Dos Fuzilamentos ao caso das Bombas da Embaixada da Guiné, Edições Referendo, 1989, pág 18

4 - "... 23 Janeiro de 1963 - O PAIGC assalta o quartel de Tite e inicia a guerra na Guiné.

"Cabral tentou ainda fazer-se ouvir, com apelos ao diálogo, mas é pelo efeito das armas que a minúscula Guiné se torna a segunda frente de contra-ataque português...."


In Antunes, José Freire, A Guerra de África 1961-1974, volume 1, Temas & Debates, Outubro de 1996, pág. 34.

5 - António E. Duarte Silva, citando Amílcar Cabral "O Desenvolvimento..." Cit. Obras...Vol. II, pág.37, sobre este facto salienta:

"...b) O início da luta armada

"A luta armada de libertação nacional começou efectivamente em 23 de Janeiro de 1963 com o ataque, por uma centena de guerrilheiros ao quartel de Tite, na margem sul do Rio Geba, onde estava instalado o comando de um batalhão português:

"(...) vindos das florestas, das zonas pantanosas e das tabancas distantes surgiam então os combatentes do nosso partido. Não vinham mais com as mãos vazias. Vinham armados com material eficiente, com uma coragem e uma disciplina a toda a prova, assim como do conhecimento das condições concretas e dos objectivos da nossa luta e, como sempre, com o apoio incondicional do nosso povo. (...)

"Em Julho de 1963 a guerra atingiu as florestas de Oio, a norte do Geba, de modo que, ao chegar-se ao final de Agosto de 1963, a situação na enorme região que abrange Bissorã, Binar, Encheia, Mansoa, Mansabã e Olassato, não era muito diferente da existente em grande parte do sul da Província: populações fugidas, tabancas abandonadas ou destruídas, estradas obstruídas, a vida administrativa e actividade comercial profundamente afectada"...


In Silva, António E. Duarte, A Independência da Guiné-Bissau e a Descolonização Portuguesa, Edições Afrontamento, Março de 1997, pág. 47

6 - "... Na Guiné, as acções de guerrilha foram iniciadas pelo PAIGC em Janeiro de 1963, com um ataque ao quartel de Tite, a Sul de Bissau, junto ao rio Corubal [1], embora outras pequenas acções tivessem ocorrido antes. As operações estenderam-se rapidamente a quase todo o território, em contínuo crescendo de intensidade, que exigiu o empenhamento de efectivos portugueses cada vez mais numerosos..."

In Afonso, Aniceto, Gomes, Carlos Matos, Guerra Colonial - Angola, Guiné, Moçambique - Ed. Diário de Notícias, em fascículos.

[1] - Lapso dos Autores, porquanto, Tite situa-se a poucos quilómetros da margem esquerda do rio Geba. Enquanto o rio Corubal é um afluente da margem esquerda do rio Geba e desagua próximo das povoações de Ganjaurá, Ganturé e Ponta do Inglês, situadas a Norte de Fulacunda.


7 - "... O Partido procurou, deste modo, responder às reivindicações destes estratos, que pretendiam ascender a um patamar superior na hierarquia social. A mobilização dos camponeses iniciou-se após os acontecimentos do Pidjiguiti, altura em que foi decidida a preparação para a luta armada.

"O primeiro ataque armado eclodiu a 23 de Janeiro de 1963, contra as instalações de um aquartelamento das Forças Armadas Portuguesas, em Tite..."


In Pinto, Jorge, Paulo, Manuel, Duarte, Paula - Guiné Nô Pintcha! - Para uma análise Socio-económica da Guiné-Bissau, Edições Universitárias Lusófonas, Outubro de 1999, pág. 33

8 - "... Em 23 de Janeiro de 1963, o PAIGC desencadeia a luta armada na Guiné-Bissau. Três dias depois, o governo de Salazar fixa os vencimentos dos elementos das Forças Armadas em serviço nas Províncias Ultramarinas.....

"23 de Janeiro de 1963 - Início da luta armada, com ataque ao Quartel de Tite, no Sul da Guiné-Bissau. Chegam a Conakry os primeiros recrutas a fim de receberem treino militar..."


In Cabral, Amílcar - Sou um simples africano, Fundação Mário Soares, 2000, págs. 32 e 83.

9 - “ ... A Guiné apresentava características diferentes. De acordo com o censo de 1960, a sua população era de aproximadamente 500.000 habitantes, cerca de dez vezes menos do que a de Angola, estando concentrada no delta costeiro ocidental e dividida em vinte e oito grupos etnolinguísticos distintos. O PAIGC [Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde], fundado em Lisboa em 1956, arrancou para a luta armada em 23 de Janeiro de 1963 com um ataque ao Quartel de Tite.

"O seu líder era Amílcar Cabral, engenheiro agrónomo licenciado em Lisboa e aí convertido à doutrina marxista-leninista.

"As condições topográficas da província e o apoio de Conakry aos terroristas do PAIGC fizeram da guerrilha da Guiné a mais dura de todas as que se travaram nas frentes do Ultramar. Afectado por convulsões internas [como as que originaram o assassínio de Cabral em 1973], sem nunca ter conseguido resolver o problema da rivalidade existente entre guinéus e cabo-verdianos, o PAIGC, em 1974 e ao invés do que proclama a versão oficial estava disposto a entender-se com os portugueses e a abandonar o mato...”


In, Santos, Bruno Oliveira – Histórias Secretas da PIDE/DGS, Nova Arrancada, 2ª edi. 2000, pág. 93

10 - "... O primeiro ataque armado eclodiu a 23 de Janeiro de 1963, contra as instalações de um aquartelamento das Forças Armadas Portuguesa, em Tite..."

In Atlas da Lusofonia, 1º Vol. – Guiné-Bissau, Ed. Instituto Português da Conjuntura Estratégica e do Instituto Geográfico do Exército, Maio 2001, pág. 25

11 – "... Instalados nos territórios estrangeiros limítrofes, os atacantes preparados e armados por potências interessadas em expulsar os portugueses de África, à sombra da bandeira da independência, sob o lema da 'África para os africanos', passaram a realizar acções violentas com a continuidade, na Guiné, desde 23Set63, [ataque ao aquartelamento de Tite] {aqui, a data está errada e para a qual já alertei a Comissão…} e na sequência de alguns ataques esporádicos, o primeiro dos quais levado a efeito na noite de 20 para 21 de Julho de 1961, em S. Domingos por iniciativa do Movimento para a Libertação da Guiné [MLG], antecessor do PAIGC na luta pela independência do Território… “

………
"....Bat Caç nº 237 - Síntese da Actividade Operacional

Após o início das primeiras acções contra as NT, com o ataque ao aquartelamento de Tite, em 23 Janeiro de 1963, comandou e coordenou a actividade operacional das suas forças numa série de acções ofensivas nas áreas do Quitifane, Cantanhez, Quinara e Jabadá - Gã Chiquinho."


In Estado-Maior do Exército - Comissão para o Estudo das Campanhas de África - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África [1961-1974] - 7º Volume - Fichas das Unidades - Tomo II - Guiné, 1ª edição, Lisboa 2002 - p. 6 e 40

Posto isto, relativamente aos Postes nº 3294, 3298 e 3308 relativos ao ataque a Tite em 23-01-1963; Postes 3459 e 3492, CCaç 84 em Defesa de Guidage, Bigene, 1961; Poste 3503, Comentário de Santos Oliveira, e Post 3514, posição do nosso Camarada Mário Dias, publicados no Blogue, em que ressaltam os entendimentos destes Camaradas sobre o [início da guerra na Guiné??..] parece-me de salientar principalmente o seguinte:

Carlos Silva

1 – Parece que é aceite pela opinião pública em geral [portugueses, guineenses e cabo-verdianos] que o início das hostilidades pelo PAIGC que conduziram à independência dos dois territórios, tiveram lugar com o ataque ao Aquartelamento de Tite em 23 de Janeiro de 1963, para findarem apenas após atingido o seu objectivo principal, a independência alcançada após o 25 de Abril de 1974.

S. Domingos

2 – O nosso camarada Mário Dias no Poste 3514 diz que "...é falso. O PAIGC pretende os louros de ter iniciado o que se passou a designar por luta de libertação. Mas não foi assim. Em Julho de 1961, a FLING (Frente de Libertação e Independência da Guiné, liderada por François Mendy e sediada no Senegal) atacou com armas de fogo o quartel de S.Domingos onde se encontrava instalada parte (julgo que apenas um pelotão) da Companhia de Caçadores 5, destacada na Guiné…

(...) "Foi um ataque deliberado a um quartel e a uma unidade militar feito por um movimento que também lutava pela independência mas cuja existência o PAIGC procura ignorar e até negar….

(...) "Falei com alguns dos militares pertencentes a essa unidade destacada em S.Domingos e um furriel…

(...) "Quanto à posterior ocorrência de incidentes em Guidaje, conforme já relatei, não me recordo deles e, por isso, nada posso acrescentar…]"


Carlos Silva

O Mário tem a sua razão, depende da perspectiva de interpretação que cada um de nós dê à referida expressão.

Pois se a mesma significar um sentido global, então a Luta de Libertação não começou em 1961, mas, com certeza, começou após a ocupação do território ou a partir de outras campanhas, como por exemplo foi o caso no tempo de Teixeira Pinto, creio que em 1912 ou 1913 contra os revoltosos do Oio.

Carlos Silva


3 - Contudo, é de salientar o que é referido pela Comissão de História das Campanhas de África 1961-1974 “…e na sequência de alguns ataques esporádicos, o primeiro dos quais levado a efeito na noite de 20 para 21 de Julho de 1961, em S. Domingos por iniciativa do Movimento para a Libertação da Guiné [MLG], antecessor do PAIGC na luta pela independência do Território… “

vd ponto 11 das Referências Bibliográficas.

Daqui resultam informações contraditórias.

A Comissão, refere que o ataque que se verificou em S. Domingos é da iniciativa do MLG, antecessor do PAIGC…, embora eu, de momento, não me recorde de ter lido algo sobre este MLG e que o mesmo tivesse reivindicado tal ataque - o que tenho lido é sobre o MING -Movimento para a Independência da Guiné, fundado por Amilcar Cabral e Rafael Barbosa, e não li em parte alguma a reivindicação por este Movimento relativamente ao citado ataque.

O Mário refere-se à FLING - Frente de Libertação e Independência da Guiné, liderada por François Mendy e sediada no Senegal, como sendo quem efectuou o ataque.

Efectivamente eu não sei quem efectuou o ataque e desconheço, de momento, para além destas duas, outra qualquer referência a tal facto, ficando agora na dúvida. - Quanto às datas do ataque parecem ser coincidentes no que se refere ao mês e ano.

Bigene e Guidaje

4 – […Quanto à posterior ocorrência de incidentes em Guidaje, conforme já relatei, não me recordo deles e, por isso, nada posso acrescentar…], isto dito pelo Mário.

Carlos Silva

Eu também nunca ouvi falar sobre estes incidentes naquela localidade, assim como em Bigene, segundo vem referido no Poste 3459 do Alberto Nascimento [que não presenciou os factos] que diz:

“…Agora era só meter no saco o estritamente necessário para uso pessoal e desandar para Farim porque tinha havido um ataque em Bigene….

"…e toca a correr para Bigene, onde passámos a noite à espera “que o assassino voltasse ao local do crime”, mas como não voltou, de manhã cedo voltámos a Farim…

"…Estávamos a começar a entrar na rotina militar, quando se deu um ataque a Guidaje e lá fomos nós ver os prejuízos…

"É óbvio que nos limitámos a verificar as marcas deixadas pelos tiros que dispararam, a olhar para o armazém de mancarra parcialmente queimado e a conversar com alguns habitantes, após o que o comando da coluna decidiu, ao fim da tarde, regressar a Farim" (...).


Carlos Silva

Enfim, não há notícias de mortos, feridos, se eram muitos ou poucos os guerrilheiros, quais os estragos causados, porque não avançou para lá o mencionado Esq ou Pel de Cavalaria estacionado em Farim, não há registos militares elaborados por essa Unidade, etc, etc…

Poste 3492

“… a ida para Farim e o recebimento da G3 são um dado que está absolutamente correcto, seja qual fôr a data convencionada para o início da história da guerra na Guiné"…

Carlos Silva

Provavelmente serão estes ataques a que a dita Comissão se refere quando menciona “…e na sequência de alguns ataques esporádicos"!...

5 - Do atrás exposto verificámos:

A ausência de outras referências e outros testemunhos, pelo menos, ao nível do Blogue, embora daquilo que li e vi, como já disse, não registei qualquer alusão a estes factos.

Um lapso de tempo de ano e meio que vai de Julho de 1961 a Janeiro de 1963, sem se ouvir contar que houvesse continuidade de escaramuças.

6 – Prosseguindo, continuação do Poste 3459

“ 3. Comentário de L.G.:

"…Em terceiro lugar, os acontecimentos que tu nos relatas, obrigam-nos a rever a história da guerra da Guiné. Afinal, a guerra não começou em Tite, em 23 de Janeiro de 1963. Essa é a lenda que nos contam os camaradas do PAIGC, e que os historiógrafos (guineenses, portugueses e outros) tendem a reproduzir... tal como nós, aqui no blogue.

"Pelo que tu nos contas, já usavas G3 em meados de 1961, em substituição da velhinha Mauser. E devias também usar capacete de aço! Imagino o suplício, com aquela torreira toda... Esta é, de facto, uma história da velhice mais velha! Portanto, em meados de 1961, os camaradas - possivelmente gente da FLING, e não do PAIGC - já andavam aos tiros aos nossos comerciantes e aos seus armazéns de mancarra, lá na região do Cacheu , na fronteira com o Senegal, em Bigene e em Guidaje….”


Carlos Silva

7 – Donde, embora respeite a opinião do nosso Camarada Luís Graça, não comungo da mesma, com o fundamento no relato de apenas dois camaradas, quando afirma “... obrigam-nos a rever a história da guerra da Guiné. Afinal, a guerra não começou em Tite, em 23 de Janeiro de 1963. Essa é a lenda que nos contam os camaradas do PAIGC, e que os historiógrafos (guineenses, portugueses e outros) tendem a reproduzir... tal como nós, aqui no blogue... ”

8 – Porquanto, nesse sentido, tal como atrás referi, se considerarmos esses ataques esporádicos de Julho de 1961, como refere a Comissão e sem qualquer continuação, então poderemos considerar que o início da luta da libertação ou a guerra da Guiné, como lhe queiram chamar, remonta à época da sua ocupação... ou às campanhas de Teixeira Pinto, etc., etc.

9 - Tenho para mim, como facto assente, público e notório que o início da luta armada levada a efeito pelo PAIGC e que conduziu à independência dos dois territórios aqui mencionados, iniciou-se com o ataque ao Aquartelamento de Tite, em 23 de Janeiro de 1963, efectuado por guerrilheiros nacionalistas pertencentes àquele Partido, sem qualquer interrupção até atingirem o seu objectivo, a independência, que veio a concretizar-se após o 25 de Abril de 1974.

10 – Seria bom que outros Camaradas, presentes na Guiné em 1961 e posteriormente, conhecedores de elementos comprovativos destes factos relevantes para a História Contemporânea dos nossos Países, dessem a conhecer por qualquer meio sobre o que sabem ou presenciaram.

Aqui deixo o repto

Carlos Silva

Ex-Fur Mil CCaç 2548/Bat Caç 2879
Massamá, 26 de Novembro de 2008

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Notas de vb:

1. O nosso muito obrigado por este contributo do Carlos Silva, nosso ilustre camarada e jurista e que mantém um blogue com muita informação pouco conhecida.

2. Em referência ao artigo publicado em

25 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3514: Controvérsias (12): A G3, a FLING, o PAIGC, o Pdjiguiti, São Domingos, Tite e outras lendas (Mário Dias)