Mostrar mensagens com a etiqueta Farim. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Farim. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 20 de julho de 2023

Guiné 61/74 - P24490: Tabanca Grande (550): João de Jesus Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72), que se vai sentar no lugar 878 do nosso poilão

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano, João de Jesus Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72), enviada ao Blogue no dia 15 de Julho de 2023:

Boa tarde Carlos Vinhal
Sou leitor do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné desde as primeiras publicações - ainda como "FORANADA.BLOGSPOT.COM - mas nunca me decidi em colaborar no mesmo.

Como ultimamente, o Luís Graça se vem queixando da falta de colaboradores e publicações para "alimentar" o Blogue, resolvi oferecer a minha colaboração.

Para isso, estive a reler a história da minha Companhia e a relembrar as várias situações e "estórias" vividas naquelas terras vermelhas, quentes e chuvosas.

Desdobrei a história da minha Companhia em várias partes, para não ficarem muito "pesadas" e levarem os nossos camaradas a desistirem da leitura antes de chegarem ao final.

Já tenho a história da minha COMPANHIA DE CAVALARIA 2721 em emails individualizados.
Só preciso que me informes a data a partir da qual posso começar a enviar-te para publicação.
Pensei em mandar um email por semana, para não ficar muito maçador.

Se concordares com este prazo, diz-me o dia de semana que preferes que envie.

Votos de saúde.
Abraço.
JOÃO MOREIRA
Ex-Furriel Miliciano


********************

2. No mesmo dia foi enviada resposta ao João Moreira

Caro João:
Muito obrigado pelo teu contacto e pela tua disponibilidade para aderires à nossa tertúlia, não para seres mais um, mas prometendo desde já colaborar "forte e feio" com as tuas memórias.
Na verdade estamos muito necessitados de sangue novo, não forçosamente em idade, mas de camaradas que queiram deixar, na nossa página, as suas memórias, escritas e fotográficas, destinadas a serem consultadas pelos nossos vindouros e pessoas que, de alguma maneira, queiram ler os testemunhos, na primeira pessoa, de quem "por lá" andou e sofreu na pele as consequências de uma guerra que não quis.

As tuas memórias militares começarão quando e como quiseres. A recruta foi o nosso começo mas o fim, esse parece vir só com o fim da nossa existência. Estás à vontade para começares até na inspecção militar.

A periodicidade para o envio e publicação dos teus textos e fotos, será conforme queiras, mas acho que semanalmente não estava mal.

Não esqueças que de ti queremos saber: o nome, posto, especialidade, unidade, datas de ida e volta da Guiné, locais de acção, etc.

As fotos que enviares deverão ser acompanhadas por legendas (à parte), onde constará a identificação dos retratados (caso não vejas inconvenientes nisso), data, local e situação. Quando as quiseres intercalar nos textos, ou as colocas tu, ou fazes uma nota no local para nós as localizarmos durante a edição.

Deves mandar as tuas coisas, sempre para: luis.graca.prof@gmail.com e para mim, carlos.vinhal@gmail.com, para assim teres a certeza de que eu e/ou o Luís vai ler.
Vamos fazer uma prévia apresentação tua à tertúlia, pelo que podes aproveitar para aí começares a contar a tua vida militar e outros pormenores que aches que possamos saber de ti, por exemplo, formação académica, profissão, etc.

Acho que o essencial está dito, mas estou sempre por aqui para qualquer dúvida.

Recebe um abraço do camarada, de há muito, e amigo desde hoje
Carlos Vinhal


********************

3. Nova mensagem do camarada João Moreira ainda no mesmo dia:

Carlos e Luís Agradeço a aceitação do meu pedido de inscrição no grupo.
Em resposta ao Carlos Vinhal, informo que tomei nota das tuas sugestões.
Comunicar-vos-ei os elementos que sugeriste. Não garanto que seja hoje, mas se se proporcionar ainda informo neste fim se semana. Se não puder, envio durante a próxima semana.

Informo-vos que enviarei um email por semana, para publicação e que neste ritmo posso tenho stock para mais de um (1) ano.

Abraço e bom fim de semana.

JOÃO DE JESUS MOREIRA
FURRIEL MILICIANO (porque não quis virar as divisas)

João Moreira na actualidade

********************

4. No dia 16 recemos a mensagem em que o nosso novo amigo, João Moreira, faz um resumo do seu percurso militar:

Boa tarde Carlos e Luís,

As sugestões do Carlos Vinhal, iriam ser satisfeitas ao longo das publicações que irei enviar.

De qualquer forma e para fazer a minha apresentação vou enviar os dados que o Carlos Vinhal sugeriu.

Chamo-me JOÃO DE JESUS MOREIRA-

Nasci no dia 05 de Junho de 1946, no lugar do Candal, freguesia de Santa Marinha, concelho de Vila Nova de Gaia.

Tirei o Curso Geral do Comércio na Escola Industrial e Comercial de Vila Nova de Gaia.
Fiz a Secção Preparatória para o Instituto Comercial, na Escola Oliveira Martins, no Porto.
Fiz a admissão e frequentei o Instituto Comercial do Porto mas não acabei o curso.

Fui trabalhar na secção de peças duma empresa Comercial do Porto, que entre outras actividades também vendia máquinas industriais.

Com o desenvolvimento dessa secção foi criado um departamento de contabilidade só para esse sector e eu fui transferido para a contabilidade até ir para a tropa.

Quando vim do ultramar fui reintegrado na secção de peças, que passei a chefiar e a ser o gestor de stocks.

Na vida militar fui furriel miliciano com a especialidade de atirador de cavalaria. Também tirei a especialidade de Minas e Armadilhas, em Tancos.

Em Janeiro de 1969 fui para Estremoz para formar batalhão para a Guiné, mas não embarquei por estar internado no Hospital Militar de Évora.

Quando tive alta do Hospital Militar vim gozar os 10 dias da mobilização para ir ter com a minha Companhia que estava em Ingoré. Ao 2.º ou 3.º dia recebi um telefonema do 1.º sargento da secretaria do RC 3 de Estremoz, a dizer para regressar ao quartel, porque tinha sido desmobilizado.

Fiquei lá até Dezembro de 1969, data em que fui transferido para o RC 4, em Santa Margarida, para formar a Companhia de Cavalaria 2721, novamente para a Guiné.

Embarquei no T/T Carvalho Araújo, no dia 04 de Abril de 1970, ou seja já tinha sido incorporado há 27 meses (21 meses de tropa efectiva mais 6 meses das 2 especialidades perdidas. Já era furriel desde Janeiro, embora ainda não me tivessem promovido.

Fui para o Olossato, que tinha um destacamento no Maqué. Ficavam na estrada Mansoa, Bissorã, Olossato, Farim. No final de Maio de 1971, metade da Companhia foi para Nhacra e a outra metade, onde estava o meu grupo de combate, só fomos no dia 09 de Junho.

Ao princípio da noite sofremos um ataque (penso que foi o primeiro ataque a Nhacra). Em Nhacra também passei pelos destacamentos de Dugal e Ponte de Ensalmá.

Regressamos num avião dos TAM, no dia 28 de Fevereiro de 1972.

Curiosamente o Vinhal foi e veio nos mesmos transportes, 2 semanas depois de eu ter ido, e esteve também na mata do Oio. Estávamos a cerca de 10 quilómetros de distância, em linha recta, com o mítico MORÉS, no meio.

Nhacra, 1971 - João Moreira

Reprodução, com a devida vénia, da pág. 512 do 7.º Volume - Fichas das Unidades - Tomo II - Guiné, da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), publicação do Estado-Maior do Exército.

********************

5. Comentário do Coeditor CV:

Caro amigo, e camarada de armas, João Moreira, como prometi, estás apresentado formalmente à tertúlia.
Tens reservado para ti o lugar 878 do nosso poilão.

Acho que sabes que tens na tertúlia um companheiro da tua CCAV 2721, o ex-Alf Mil Op Esp, Paulo Salgado, que escreveu o livro "Guiné - Crónicas de Guerra e Amor". Não sei estiveste na apresentação aqui no Porto.

Temos, como disseste, um percurso quase paralelo na Guiné, vocês embarcaram para lá no dia 4 de Abril de 1970, indo no "Carvalho Araújo", e nós no dia 13 do mesmo mês, no Porto do Funchal, no navio "Ana Mafalda". Fomos quase vizinhos, Olossato e Mansabá não ficavam asssim tão distantes, fazendo as duas localidades parte do "empreendimento turítico" do Morés.
Se a tua Companhia substituiu em Abril, no Olossato, a CCAÇ 2402 do BCAÇ 2851, a minha substituiu também em Abril, mas em Mansabá, a CCAÇ 2403 do mesmo batalhão.

Apesar de tudo, a CCAV 2721 teve mais sorte porque em Maio/Junho de 1971 se mudou para um local bem mais pacífico, Nhacra, enquanto a 2732 aguentou estoicamente, em Mansabá, até Fevereiro de 1972, chorando ainda a perda de dois camaradas, em Janeiro, na zona de Mamboncó, um dos carreiros de e para o Morés. A CCAV 2721 regressou a casa em 28FEV72 e a CART 2732 só em 19 de Março.

Ah! Ainda mais uma coincidência, temos ambos uma "pós-graduação" em Minas e Armadilhas.
Posição relativa do Morés, uma importante base estratégica do PAIGC. © Infografia Luís Graça & Camaradas da Guiné

A tua Companhia a partir do Olossato, e a minha, em Mansabá, foram forças activas no Plano de Operações Faixa Negra, que tinha como missão o apoio logístico e manter a segurança aos trabalhos de asfaltamento da estrada Mansabá-Farim, obra reatada no Bironque, até à margem esquerda do rio Cacheu. As nossas Companhias faziam parte das chamadas Forças de Intervenção, a minha integrada no Sub-Agrupamento "M", juntamente com a CCP 122, 2 GCOMB/CCP 121, mais 1 Pelotão(-) do EREC 2641. A tua 2721 fazia parte do Sub-Agrupamento "O", juntamente com a CCP 121(-) mais 21.º PelArt (10,5).

Posição relativa do Bironque na estrada Mansabá-Farim. © Infografia Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Ainda a propósito da tua ida tão tardia para a Guiné, e uma vez que já terias tempo suficiente para a promoção a Furriel Miliciano, antes do embarque, nunca chegou a sair à ordem a tua promoção a 2.º Sargento? Éramos mesmo muito mal tratados, no fim do curso de sargentos promoviam-nos(?) a cabos, e quando tatingíamos o tempo para promoção a 2.ºs sargentos, esqueciam-se de nós.

Como o poste já vai longo, resta-me deixar aqui um abraço de boas-vindas em nome dos editores e da tertúlia.

Estamos por aqui sempre disponíveis para qualquer dúvida que tenhas em relação ao funcionamento do Blogue, e já que nos indicaste a tua data de nascimento, a menos que não queiras, terás direito ao nosso singelo postalinho de aniversário. CV

____________

Nota do editor

Último poste da série de 1 DE MAIO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24275: Tabanca Grande (549): As "fotos da praxe" do cor inf ref Mário Arada Pinheiro, que completou 90 anos em 12/12/2022... Foi 2.º cmdt do BCAÇ 2930 (Catió, 1971/73) e Cmdt do Comando Geral de Milícias (1973)

segunda-feira, 3 de julho de 2023

Guiné 61/74 - P24448: Notas de leitura (1594): "Mariazinha em África, o bestseller de Fernanda de Castro com ilustrações de Ofélia Marques (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 Fevereiro de 2021:

Queridos amigos,
Fernanda de Castro teve para este best seller da literatura infantojuvenil colonial duas ilustradoras topo de gama da chamada segunda geração do Modernismo português: Sarah Afonso e Ofélia Marques, a primeira de um grande ecletismo, desde a pintura de trabalhos artesanais, a segunda inequivocamente uma grande ilustradora, aguarelista exímia, e de uma obra complexa, onde pôs a nu aspetos da sua vida íntima. O livro de Fernanda de Castro foi estudado não exclusivamente pelas razões do seu sucesso mas pelo significado da evolução das representações coloniais, é do maior interesse acompanhar o olhar da autora sobre o guineense, selvagem ou ingénuo, criado fiel, sempre atrapalhado com a linguagem, as mostras do deslumbramento pelo feitiço africano, e a memória autobiográfica que a autora jamais escondeu, ficou-lhe uma saudade enorme daquela Guiné onde lhe morreu a mãe em Bolama e aonde ela retorna numa poesia vibrátil, de grande poder evocativo, caso do livro África Raiz, já na década de 1960. É desta parceria entre Fernanda de Castro e Ofélia Marques que aqui se presta esta homenagem.

Um abraço do
Mário



Mariazinha em África, o bestseller de Fernanda de Castro com ilustrações de Ofélia Marques (1)

Mário Beja Santos

Em termos de literatura infantil de caráter colonial, não houve obra que competisse com as dez edições que conheceu "Mariazinha em África", obra de Fernanda de Castro. A primeira edição foi de 1925, teve desenhos de Sarah Afonso, a edição de 1940 e a seguinte, de 1947, teve desenhos de Ofélia Marques. Fernanda de Castro nunca escondeu que este livro era marcadamente autobiográfico, em pequena acompanhou a mãe e foi para Bolama, onde o pai dirigia a capitania. Há algo de catártico nesta história de ternura, a sua mãe morrerá inopinadamente na capital da colónia, Fernanda de Castro dedicar-lhe-á versos de uma grande beleza. De que trata esta consagrada obra de literatura infantil? Mariazinha tem vários irmãos, vamos vê-la em amena conversa com dois deles, Chico e João, Mariazinha dá-lhes conta que vai visitar o pai: “O pai destes meninos era oficial de Marinha, e havia perto de três anos que estava em África, na Guiné portuguesa, em comissão do Governo. Em todas as cartas mandava dizer que tinha muitas saudades da mulher e dos filhos e, um dia, acabada quase a época das chuvas, pediu à mulher que fosse passar uns meses com ele e que levasse Mariazinha, que era a mais velha, e Afonsinho, que era o mais novo, e não podia ainda separar-se da Mãe”. E começa a azáfama dos preparativos, sobretudo da roupa adequada aos trópicos, a mãe não esconde a inquietação de deixar os filhos, mas terá que ser.

Escolhi este desenho da partida porque nos dá conta do profundo talento de Ofélia Marques, ela aparece sempre classificada como uma exímia desenhadora de crianças, de traço seguríssimo, esculpindo imagens de desvelo e ternura, pois o que vemos neste seu primeiro desenho é uma justa proporção, o perfeito equilíbrio entre aqueles seres humanos que acenam em terra e no navio, a imagem fica completa com outro barco lá ao fundo e com as mercadorias e a própria figura do estivador que se agiganta diante de uma pequena multidão. Uma imagem com tudo o que é indispensável para nos falar de uma partida ali para os lados do Cais de Alcântara.

Mariazinha é irrequieta e travessa, sempre curiosa, começa por ter enjoos, passam depressa. Faz imensas perguntas à tripulação, no mar vê grandes animais luzidios que davam saltos e pergunta se são tubarões, afinal era toninhas, e fala-se de peixes voadores, quando se mostra uma lanterna, eles saltam e caem a nossos pés, no convés, e vemos na segunda imagem Mariazinha a olhar surpresa para o trabalho do marinheiro que parece estar a praticar a pesca do candeio, atenda-se ao fulgor que desponta da escuridão, na justa medida da luz que rompe da escuridão. E chega-se a terras de África, entra-se no canal do Geba, um rebocador traz pilotos que ajudam a navegar em segurança e assim se entra em Bissau onde o pai os espera e partem todos para Bolama.

E assomam outros motivos de curiosidade quando chegam a casa, foi-lhe preparado um quarto que Fernanda de Castro descreve assim:
“Era um lindo quarto pintado de azul, com uma porta para o jardim. A cama era de metal amarelo e tinha um colchão de arame. Nada ali faltava, nem mesmo uma secretária com tinteiro, papel de carta, mata-borrão e uma caneta de tinta permanente! Numa pequena estante, muito bem arrumados, estavam uns poucos de livros de aventuras, um dicionário Larousse Ilustrado e uma História de Portugal, em dois volumes. Mas o que a mais surpreendeu foi uma espécie de cortinado de tule que estava enrolado no teto, mesmo por cima da cama”. Era um mosquiteiro. Atenda-se às representações coloniais que nas sucessivas edições a autora foi polindo, por imposição do politicamente correto.

Aparecem os empregados da casa: Lanhano, um preto fardado de branco, com uma risca muito bem feita na carapinha; Adolfo, bom rapaz mas não vê dois palmos diante do nariz, Undôko, o jardineiro, trabalhador, fiel, boa pessoa mas é como os crocodilos: tem dentes a mais; Mamadi, filho de um dos régulos mais ricos da Guiné, estava lá em casa para aprender o português e para entreter o Afonso; e o cozinheiro Vicente, dele se dá imagem que fala uma língua de trapos, é muito engraçado e ingénuo.

Começam as aventuras naquela terra cheia de calor onde se fazia a cesta entre as onze da manhã e as três da tarde. A menina faz perguntas aos criados, vêm as respostas num português mascavado. “No jardim havia um mirante alto, uma espécie de caramanchão coberto de trepadeiras, alguns metros do solo, onde corria sempre uma leve aragem e onde Mariazinha costumava instalar-se para ler ou para estudar. Subiu as escadas do Mirante, seguida pelo cão Guiné, e instalou-se confortavelmente. Mas não tinha ainda lido três páginas quando um barulho ensurdecedor lhe chamou a atenção… Curiosa, espreitou para a rua através das trepadeiras. Dezenas de pretos, soltando gritos agudos, desciam a rua numa algazarra infernal. Traziam nas mãos grandes folhas de palmeiras e, ágeis como macacos, faziam extravagantes cabriolas”. Nova preciosidade de Ofélia Marques, o equilíbrio do conjunto de autóctones, a menina no alto, a economia de dois arbustos para marcarem as bermas da imagem garantem uma leitura pronta em toda a sua amplitude. Mesmo nas imagens mais pequenas o poder imaginativo de Ofélia Marques parece inesgotável. Mariazinha conhece Ana Maria, a filha do governador. Farão a viagem de automóvel bem acidentada, acabam por ser transportadas por quatro pretos robustos, já que o chão estava completamente enlameado, e Ofélia Marques desenha o que é preciso ver: dois transportadores, as meninas repimpadas, um pedaço de vegetação onde até aparecem catos e uma ave voa ao fundo do lado esquerdo, nada mais é preciso.

Haverá depois um passeio no mato, irão até ao Oio, os adultos vão preparados para uma caçada, a viagem é deslumbrante, vêm arrozais a perder de vista, depois a paisagem muda, surge o capim alto, uma fauna perigosa e hostil por ali proliferava e rastejava. Há uma avaria, põe-se o problema da gasolina, as meninas quase desfalecem porque precisam urgentemente de água, surgem cocos e depois chega uma caravana salvadora. Haverá uma caçada a valer, as meninas conversam com nativos, que admirados olham para aquelas meninas brancas. No acampamento há um ataque de formigas, tudo se resolve e na manhã seguinte partem para Farim. “Passaram o dia a ler, a dormir, a jogar o crapeau, a pôr talco nas mordeduras das formigas. À noite, foram para a cama com as galinhas. E na manhã seguinte, bem repousadas, partiram para Bolama, onde a mãe de Mariazinha começava a estar inquieta".

Para o leitor mais interessado no estudo das representações coloniais desta obra, recomenda-se o trabalho de Margarida Isabel Melo Beirão intitulado Mariazinha em África, de Fernanda de Castro – Representações coloniais, tese de Mestrado do Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro, 2018: https://ria.ua.pt/bitstream/10773/25216/1/Documento.pdf.

(continua)


Na antiga Calçada dos Caetanos, hoje Rua João Pereira da Rosa, muito perto do edifício da Liga dos Combatentes, que foi a habitação da escritora Ana de Castro Osório, perfila-se um prédio onde viveram Oliveira Martins, Ramalho Ortigão, José Gomes Ferreira, Fernanda de Castro e António Ferro, Ofélia Marques e Bernardo Marques. Lá em baixo é a Rua do Século e lá em cima o Conservatório Naiconal e a Igreja dos Inglezinhos. Felizmente que todo este património arquitetónico está classificado.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 30 DE JUNHO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24442: Notas de leitura (1593): Flora da Guiné-Bissau (2) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 19 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24414: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano; Parte XXX: A guerra pela população (pp. 204-206)


Guiné > Região do Oio > Farim > Aproximação à pista de Farim. Foto de Carlos Silva, ex-fur mil, CCAÇ 2548/BCAÇ 2879 (Jumbembem, 1969/71) (publicada, a preto e branco, no livro, na pág. 205)

Guiné > Região do Oio > Farim > O rio Cacheu em Farim.  Foto de Carlos Silva, ex-fur mil, (publicada, a preto e branco, no livro, na pág. 204)


Guiné > Região do Oio > Farim > O rio Cacheu em Farim.  Foto de Carlos Silva (publicada, a preto e branco, na pág. 206)

Fotos (e legendas): © Carlos Silva (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Capa do livro do Amadu Bailo Djaló,
"Guineense, Comando, Português: I Volume:
Comandos Africanos, 1964 - 1974",
Lisboa, Associação de Comandos,
2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.



O autor, em Bafatá, sua terra natal,
por volta de meados de 1966.
(Foto reproduzida no livro, na pág. 149


Síntese das partes anteriores:

(i) o autor, nascido em Bafatá, de pais oriundos da Guiné Conacri, começou a recruta, como voluntário, em 4 de janeiro de 1962, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama;

(ii) esteve depois no CICA/BAC, em Bissau, onde tirou a especialidade de soldado condutor autorrodas;

(iii) passou por Bedanda, 4ª CCaç (futura CCAÇ 6), e depois Farim, 1ª CCAÇ (futura CCAÇ 3), como sold cond auto;

(iv) regressou entretanto à CCS/QG, e alistou-se no Gr Cmds "Os Fantasmas", comandado pelo alf mil 'cmd' Maurício Saraiva, de outubro de 1964 a maio de 1965;

(v) em junho de 1965, fez a escola de cabos em Bissau, foi promovido a 1º cabo condutor, em 2 de janeiro de 1966;

(vi) voltou aos Comandos do CTIG, integrando-se desta vez no Gr Cmds "Os Centuriões", do alf mil 'cmd' Luís Rainha e do 1º cabo 'cmd' Júlio Costa Abreu (que vive atualmente em Amesterdão);

(vii) depois da última saída do Grupo, Op Virgínia, 24/25 de abril de 1966, na fronteira do Senegal, Amadu foi transferido, a seu pedido, por razões familitares, para Bafatá, sua terra natal, para o BCAV 757;

(viii) ficou em Bafatá até final de 1969, altura em que foi selecionado para integrar a 1ª CCmds Africanos, que será comandada pelo seu amigo João Bacar Djaló (Cacine, Catió, 1929 - Tite, 1971)

(ix) depois da formação da companhia (que terminou em meados de 1970), o Amadu Djaló, com 30 anos, integra uma das unidades de elite do CTIG; a 1ª CCmds Africanos, em julho, vai para a região de Gabu, Bajocunda e Pirada, fazendo incursões no Senegal e em setembro anda por Paunca: aqui ouve as previsões agoirentas de um adivinho;

(x) em finais de outubro de 1970, começam os preparativos da invasão anfíbia de Conacri (Op Mar Verde, 22 de novembro de 1970), na qual ele participaçou, com toda 1ª CCmds, sob o comando do cap graduado comando João Bacar Jaló (pp. 168-183);

(xi) a narrativa é retomada depois do regresso de Conacri, por pouco tempo, a Fá Mandinga, em dezembro de 1970; a companhia é destacada para Cacine [3 pelotões para reforço temporário das guarnições de Gandembel e Guileje, entre dez 1970 e jan 1971]; Amadu Djaló estava de licença de casamento (15 dias), para logo a seguir ser ferido em Jababá Biafada, sector de Tite, em fevereiro de 1971;

(xii) supersticioso, ouve a "profecia" de um velho adivinho que tem "um recado de Deus (...) para dar ao capitão João Bacar Jaló"; este sonha com a sua própria morte, que vai ocorrer no sector de Tite, perto da tabanca de Jufá, em 16 de abril de 1971 (versão contada ao autor pelo soldado 'comando' Abdulai Djaló Cula, texto em itálico no livro, pp.192-195) ,

(xiii) é entretanto transferido para a 2ª CCmds Africanos, agora em formação; 1ª fase de instrução, em Fá Mandinga , sector L1, de 24 de abril a fins de julho de 1971.

(xiv) o final da instrução realizou.se no subsector do Xitole, regulado do Corunal, cim uma incursão ao mítico Galo Corubal.

(xv) com a 2ª CCmds, comandada por Zacarias Saiegh, participa, em outubro e novembro de 1971, participa em duas acções, uma na zona de Bissum Naga e outra na área de Farim.



1. Continuação da publicação das memórias do Amadu Djaló (Bafatá, 1940-Lisboa, 2015), a partir do manuscrito, digital, do seu livro "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada) (*).

O nosso  camarada e amigo Virgínio Briote, o editor literário ou "copydesk" desta obra,  facultou-nos uma cópia digital. O Amadu Djaló, membro da Tabanca Grande, desde 2010, tem cerca de nove dezenas de referências no nosso blogue.



Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano:


Parte XXX:  A guerra pela populaçãpo (pp. 204-206)


Depois de várias saídas, a nossa companhia comandada pelo Tenente Zacarias Saiegh, partiu para Bissau, com a missão de executar duas acções, uma na zona de Bissum Naga[1] e outra na área de Farim.

Na zona de Bissum Naga, tivemos contacto com o PAIGC por duas vezes. Num dia, um dos nossos grupos, junto ao rio, capturou armas e granadas ao PAIGC. No dia seguinte, outro grupo nosso foi apanhado pelo IN, quando estava numa fonte a transportar água[2] e teve um ferido.

Duas companhias incompletas, a 1ª e a 2ªCCmds, comandadas também pelo Saiegh, embarcaram de avião para Farim, onde chegámos às 11h00. Depois, seguimos, a pé, da pista para o cais, onde ficámos até cerca das 16h00.

Entrámos para uma embarcação comercial e partimos, como quem ia para Binta[3]. A meio do rio, o barco encostou à margem esquerda, amarrámo-nos às árvores e saltámos para terra. Depois de reagrupados, rumámos na direcção de Oio Tiligi[4]. Entrámos na mata, fizemos um alto para comer qualquer coisa e mudamos para um local onde pernoitámos.

Logo de manhã, bem cedo, dirigimo-nos para a zona onde tinham sido referenciados acampamentos do PAIGC.

A certa altura, não muito longe desses locais, ouvimos barulho de vozes e tomámos as disposições para o assalto. Não sabíamos se era pessoal armado ou só população. Como os sons das vozes vinham de vários locais, separámos o nosso pessoal.

Fomo-nos aproximando na direcção das vozes, deparámos com barracas com população civil e, sem dar um tiro, recuperámos as cerca de trinta pessoas que encontrámos.

Em marcha rápida saímos do local, com o objectivo de evitar contacto armado, uma vez que tínhamos entre nós crianças, velhos e mulheres. Sabíamos que eles conheciam a zona melhor que nós e mantivemos o ritmo da marcha até encontrarmos um local que nos pareceu relativamente seguro para dormir um pouco. 

Como estávamos no mês do Ramadão demos às pessoas a nossa ração de combate para quebrarem o jejum.

Ao romper da aurora dirigimo-nos para a margem do rio Cacheu e, depois de muito andar, avistámos o barco, que estava encostado a umas árvores, numa zona em que o rio faz uma curva. Não foi fácil meter toda a gente na embarcação mas conseguimos.

Chegámos ao cais de Farim, entre as 15 e as 16h00 e apresentámo-nos no comando do batalhão[5]. Um capitão disse que quem tivesse onde dormir que podia ir e regressar no dia seguinte, aí pelas oito horas.

Eu e mais alguns colegas fomos para o bairro de Sinchã, onde a maioria dos moradores era da minha etnia. Não estavam à nossa espera e não tinham condições para nos dar comer e alojamento mas nada nos faltou e dormimos bem até de manhã.

No dia seguinte, conforme estava determinado, encontrámo-nos na pista à espera dos aviões que chegaram por volta das 09h00[6].

(Continua)
_________

Notas do autor e/ou do editor literário (VB):

[1] Nota do editor: a cerca de 17km a norte de Binar.

[2] Nota do editor: esta acção na zona de Bissum Naga, executada pelas 1ª e 2ª CCmds, foi elaborada pelo COE, comandado pelo Major Almeida Bruno, e decorreu entre 18/22 Outubro 1971 na mata do Choquemone.

[3] Nota do editor: destacamento da CArt 3358.

[4] Tiligi, palavra mandinga que significa pôr-do-sol.

[5] Nota do editor: BArt 3844.

[6] Nota do editor: acção no Tancroal (rio Jagali, Ganturé-Cacheu), sector de Farim, comandada pelo Major Almeida Bruno, entre 29 Outubro/01 Novembro 1971.

[Seleção / Revisão e fixação de texto /  Subtítulo / Negritos:  LG]
_________

quarta-feira, 1 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24111: Historiografia da presença portuguesa em África (357): História das Ilhas de Cabo Verde e “Rios de Guiné” (séculos XVII e XVIII), por António Carreira; Edição do Autor, 1983 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Abril de 2022:

Queridos amigos,
Das suas andanças pelo Arquivo Histórico Ultramarino, António Carreira catou alguns documentos que haviam escapado ao grande pesquisador que foi o Padre António Brásio, autor de uma notável coletânea (5 volumes, de 1342 a 1650) dos melhores repositórios sobre a área dos rios de Guiné e Cabo Verde. "Estudados detidamente, pensei logo em divulgá-los, com anotações e comentários, alguns deles em edição fac-similada. Só que nenhuma instituição cultural e/ou científica se mostrou interessada em fazê-lo. Não é de estranhar. É a eterna contradição que caracteriza a sociedade portuguesa designadamente no campo da cultura. Apregoa-se insistentemente a existência de Centro de Estudos Africanos destinados a apoiar e a orientar este tipo de investigação; mas salvo uma ou outra exceção não o podem fazer dada a posição de apagada e vil tristeza em que vivem. Daí que a investigação de campo e o estudo e a publicação dos seus resultados se confine, em regra, a tarefas individuais de uns tantos maduros e destituída de apoios das instituições estatais e privadas". E António Carreira fez edição de autor, temos hoje livro raríssimo, obra que faz falta em qualquer desses Centros de Estudos Africanos, pôs na capa um dragoeiro, cuja goma ou resina foi utilizada durante largos anos na farmacopeia. Como ele escreveu: "Como se fala agora com tanta insistência na proteção da natureza, parece que ela deve ser objeto de medidas especiais que impeçam a sua destruição".

Um abraço do
Mário



O dom de investigar, o dom de saber comentar:
António Carreira, aquele historiador sempre indispensável


Mário Beja Santos

A obra intitula-se Documentos para a História das Ilhas de Cabo Verde e “Rios de Guiné” (séculos XVII e XVIII), por António Carreira, Edição do Autor, 1983. Explica a razão da publicação: “Divulgação de documentos de grande interesse para o conhecimento da ação dos portugueses na costa ocidental africana nos anos de 1600 até final de 1700. Eles mostram as vicissitudes por que passaram os contratos de arrendamento de tratos e resgates, e as falcatruas cometidas pelos contratadores, falcatruas essas facilitadas pela impossibilidade do Governo controlar os negócios; e de outro lado, o contrabando de escravos e a desenfreada concorrência comercial de Franceses, Ingleses e Holandeses, por vezes apoiada na guerra de corso, visando pôr termo às atividades dos portugueses na costa a partir do Cabo Verde até à Serra Leoa”. É uma documentação úbere de informações de tempos e lugares em que a presença portuguesa esteve permanentemente em causa, tanto pela hostilidade de estrangeiros como pela guerrilha dos autóctones. O estudioso tem acesso a relatórios, cartas, pareceres, regimentos, despachos que permitem conhecer a agressividade dos régulos em torno da Praça de Bissau, os problemas alfandegários, a situação comercial na região, contratos de arrendamento, regimento do presídio e alfândega de Farim, reclamações dos comerciantes contra as taxas de direitos.

António Carreira foi um investigador modelar, encontrava nos arquivos manuscritos e sabia comentá-los como ninguém. Veja-se como ele introduz a questão do termo Rios da Guiné, que era a expressão mais utilizada na documentação antiga, precedeu o uso da expressão Guiné, mas sempre com sentido indefinido, fazia parte da área da jurisdição da Capitania de Cabo Verde, cujo governador entregava regimento ao capitão mor de Cacheu, o regimento de 1614 recomendava: a difusão da religião católica através da catequização dos gentios; a fiscalização da navegação e do comércio de e com os estrangeiros, impedindo a venda de escravos, de cera, de marfim e de ouro; impedir por todas as formas a entrada em Cacheu de algodão proveniente da Gâmbia e de outros pontos; exercer o controlo dos preços de compra dos escravos. Carreira comenta que os princípios de que os capitães mores, feitores e ouvidores dos rios de Guiné de estarem subordinados ao Governador das ilhas de Cabo Verde não tinha significado efetivo e real.

Aborda depois o investigador topónimo Guiné que designava uma larga zona sem limites compreensíveis. E recorda que o Padre Baltazar Barreira em carta escrita em Santiago a 1 de agosto de 1606 procurou esclarecer assim os limites da Guiné: “Esta parte de África que os portugueses propriamente chamam Guiné começa no rio Senegal e corre pela costa até a Serra Leoa, obra de 180 léguas de norte a sul”. Viajando no tempo, Carreira dá-nos conta dos ciclos económicos enquanto se apertava o cerco à presença portuguesa até que se chegou a uma situação, que precede as decisões da Conferência de Berlim em que a nossa presença na Senegâmbia era constituída por as praças e presídios de Ziguinchor, Cacheu, Farim, Geba, Fá, Bissau e Guinala. Estas praças e presídios, também designadas por feitorias, estavam instaladas nas margens dos rios, em limitados espaços formando pequenos povoados de comerciantes europeus, filhos da terra (grumetes) e mestiços cabo-verdianos, espaços ocupados mediante licença das autoridades tradicionais, contra o pagamento de renda anual (a daxa). Refere o autor a história destas feitorias, o aparecimento da primeira Fortaleza de Bissau, construída em 1696, a história das diferentes companhias comerciais de vida breve, a gradual presença portuguesa a partir do século XIX, observando Carreira que da soberania portuguesa só se deve falar a partir de 1915, dando-nos o contexto das turbulências vividas no solo continental por quase todo o século XIX: em 1840 eclodiu um conflito entre Fulas e Mandigas, que levou à derrota destes últimos e as guerras sucessivas que assolaram o Alto Geba, no Gabu e no Forreá. Lançara-se entre 1842 e 1845, no Quínara, a cultura da mancarra, que se mostrou florescente, mas com a guerrilha que se intensificou a partir de 1876, tudo se perdeu. E o autor não deixa de enfatizar que a chamada Guiné portuguesa é uma figura política e jurídica surgida da Convenção Luso-francesa de 1886.

Temos depois o rol dos documentos do século XVII, o autor chama à atenção para a incapacidade organizativa da Coroa em afastar ou punir a concorrência, limitava-se a estabelecer contratos de exploração por administração direta por vários anos; mostra igualmente o autor a existência de conflitos entre o Governador de Cabo Verde e os agentes do rei nos rios; e assim chegamos ao relato do feitor da Fazenda Real, em Bissau, José António Pinto, caminhamos para o final do século XVIII, dá-nos conta da situação nas praças e presídios, veja-se a pungente descrição que ele faz do presídio de Geba:
“O pequeno número de que se compunha a sua guarnição são negros, pardos e alguns brancos, tanto uns como outros ali são mandados degredados por tremendos crimes, os quais são brancos já não conservam sentimentos alguns da sua cor nem de costumes europeus vendo que ali são degradados por toda a vida, continuam em dar exercícios aos seus diabólicos costumes, roubando armazéns de noite. Sargentos, furriéis e cabos são da mesma natureza, brancos, negros, pardos, ladrões e facínoras, de forma que como sequazes dos soldados não só não há respeito, mas quando o pretendem ter, opõem-se-lhe e rebelam-se os culpados que ficam sem castigo (…)”. É extensa a denúncia, dá-nos depois a descrição do porto de Bissau, das ilhas de Cabo Verde e sua guarnição militar, refere a Fazenda e o negócio da panaria e da purgueira, refere as ilhas e as forças militares.

A obra de António Carreira faz-se acompanhar de muito texto em fac-simile, dos documentos aludidos dá por inteiro o regimento da Alfândega de Cacheu de 1797, temos igualmente um apenso documental com requerimentos, nota de emolumentos, reclamações, lista de navios chegados a Bissau no final do século XVIII.

Obra de indiscutível interesse para quem pretende estudar estes séculos da nossa precária presença naqueles pontos da costa ocidental africana.

Fortaleza do Cacheu
Planta da Praça de S. José, Bissau, 1864
Interior da Fortaleza de S. José da Amura, cerca de 1925
____________

Nota do editor

Último poste da série de 22 DE FEVEREIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24089: Historiografia da presença portuguesa em África (356): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (10) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24049: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XIX: Mais uma operação helitransportada no corredor de Sitató, junto à fronteira com o Senegal, em março de 1966 (Op Vamp)


Tabanca de Cuntima, na região do Oio, c. 1969/71.  Foto do álbum de Carlos Silva (Publicada, a preto e branco, no livro do Amadu Djaló, na pág. 142)


Operação helitransportada, em março de 1966. Lançamento na área de Sitató, um dos corredores de entrada do PAIGC, progressão junto à linha de fronteira até Faquina Mandinga e retirada para Cuntima. Carta de Colina do Norte (1956) (Escala 1/50 mil)

1. Continuação da publicação das memórias do Amadu Djaló (1940-2015):

Recorde-se aqui o seu passado militar:

(i) começou a recruta, como voluntário, em 4 de janeiro de 1962, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama;

(ii) esteve depois no CICA/BAC, em Bissau, onde tirou a especialidade de soldado condutor auto-rodas;

(iii) passou por Bedanda, 4ª CCaç (futura CCAÇ 6), e depois Farim, 1ª CCAÇ (futura CCAÇ 3), como sold cond auto;

(iv) regressou entretanto à CCS/QG, e alistou-se no Gr Cmds "Os Fantasmas", comandado pelo alf mil 'cmd' Maurício Saraiva, de outubro de 1964 a maio de 1965;

(v) em junho de 1965, fez a escola de cabos em Bissau, foi promovido a 1º cabo condutor, em 2 de janeiro de 1966;

(vi) voltou aos Comandos do CTIG, integrando-se desta vez no Gr Cmds "Os Centuriões", do alf mil 'cmd' Luís Rainha e do 1º cabo 'cmd' Júlio Costa Abreu (que vive atualmente em Amesterdão);

(vii) descreve-se a seguir  mais uma operação helistransportada, a Op Vamp, no corredor de Sitató, junto à fronteira com o Senegal, em março de 1966 (Gr Cmds "Os Centuriões" e "Os Diabólicos") 


 Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XIX:   

Mais uma operação helitransportada no corredor de Sitató, 
junto à fronteira com o Senegal, em março de 1966 
(Op Vamp) (pp. 138-143)

Outra vez os dois grupos, 15 homens dos “Centuriões” e 15 dos “Diabólicos”, para uma missão de nomadização [1]  na região a norte de Farim. Saímos de Bissalanca, em 6 helis, de manhã muito cedo, para sermos lançados na fronteira, junto a Sitató. 

A partir de uma certa altura, os pilotos defrontaram-se com muito nevoeiro e quando chegámos perto da linha de fronteira, não conseguiram distinguir bem se estávamos já no Senegal. Retiraram até à zona de Jumbembem e, depois, a voarem por cima das árvores, atingiram uma zona de bolanha, onde nos largaram. 

Estávamos nos finais de março [de 1966] e a água estava muito fria. Quando aterrei, a água deu-me até ao peito. Pão, bolachas, cigarros, fósforos, ficou tudo alagado. Saímos da água e ficámos um pouco de tempo abrigados, a auscultar os sons da mata. Depois, começámos a andar até atingirmos uma bolanha larga, por volta das 10 horas. Ficámos ali algum tempo a olhar para a mata em frente. Os dois alferes estiverem a conferenciar e decidiram atravessá-la. 

Abrimos em linha, distanciámo-nos uns dos outros e começámos a travessia com muito cuidado. Estávamos mais ou menos a meio, ouvimos um tiro. Agachei-me como os outros e ficámos na expectativa. Já sabíamos que o PAIGC estava à nossa frente. Retomámos a progressão em direcção da mata de onde partira o disparo, mais separados ainda. Depois outro tiro, momentos depois uma rajada e nem uma chicotada. 

Nós não íamos com o objectivo de fazer um golpe de mão. A missão que nos tinha levado a Sitató era progredirmos em direcção a Faquina Mandinga, ver bem os trilhos e se houvesse sinais montar uma emboscada. Mas não era isto que estava a acontecer. 

Os tiros que ouvimos, quando estávamos a atravessar a bolanha, alteraram a nossa missão. Continuámos, muito lentamente, a dirigirmo-nos para a mata, e começámos também a ouvir vozes e risos. Ficámos mais sossegados porque os tiros não devia ter nada a ver com a nossa presença naquele local. Ou então era o PAIGC que estava com grande confiança. 

Já sabia que o confronto era inevitável. Conseguimos chegar àquela pequena mata de palmeiras sem sermos vistos. Era uma mata escura, onde eles tinham armado um acampamento embora naquele momento ainda não soubéssemos. 

Logo à entrada vi um pequeno carreiro que entrava na mata e desaparecia dos meus olhos. Os alferes combinaram formar um L, o meu grupo ia progredir no carreiro enquanto o outro ficava em linha na orla da mata. Começámos a andar, um passo aqui, outro ali, com muito cuidado, até que ficámos de frente para umas barracas. Vimo-los a conversar uns com os outros, a rirem-se, sem saberem que tinham visitas. 

Eu pensei: E agora? Se não os atacássemos já éramos descobertos e poderíamos sofrer uma derrota inesquecível. O terreno tinha aquela pequena mata de palmeiras e à volta a vegetação era pouca. De certeza que eles conheciam a zona melhor que nós. Atacar já e retirar para Cuntima, foi a decisão que se tomou.  

A primeira fila de barracas estava mais ou menos a dez metros. Quando ouvimos a voz de fogo, eu, o cabo Raul e outros companheiros que estavam à minha beira, fizemos rajadas lá para dentro, a curta distância dos guerrilheiros. 

Uma grande gritaria ouviu-se quando parámos de atirar e depois tiros e gritos pararam de repente, ficou um silêncio total. Lançámo-nos lá para dentro, os companheiros do outro grupo romperam também e começámos a busca nas barracas. 

Depois de apanharmos material, já não havia mais nada para fazer a não ser chegar fogo ao acampamento. Lançámos granadas incendiárias e saímos a correr, para norte, a corta-mato. 

Uns minutos depois, já a uma ou duas centenas de metros das casas de mato, ouvimos fogo de morteiro, bazuca e armas automáticas. Eles queriam ver se nós respondíamos para depois concentrar o fogo em cima de nós. Mas nós não respondemos e eles ficaram sem saber nada a nosso respeito e nunca vieram a saber como nós chegámos junto deles. As morteiradas para a zona do acampamento continuavam e nós também continuávamos a andar, agora mais devagar. 

Estava muito calor e nós estávamos com sede. Logo, a sorte veio ter connosco outra vez, quando encontrámos um pequeno riacho. Momentos antes, o Mamadu Bari tinha caído com dores musculares. Parece que os músculos se tinham prendido e ele não podia andar. Tirámos-lhe a carga que ele trazia e demos-lhe ali uma massagem. Ele pareceu ficar melhor e nós recomeçámos a marcha. 

Quando entrei no riacho, meti a cabeça debaixo de água, para diminuir o calor e aumentar a força que já me faltava. Demos com a estrada que vinha da fronteira e de certeza que já não estávamos longe de Cuntima. Com o guia local que tínhamos levado, o milícia Pate Djamanca [2],  uma equipa meteu-se na estrada até ao arame farpado do aquartelamento de Cuntima [3] e, tempos depois, apareceram duas viaturas que nos transportaram até à povoação.

Fomos muito bem recebidos, tomámos banho e depois do jantar fomos visitar a tabanca com o nosso gira-discos. Passados uns minutos, juntaram-se rapazes e raparigas e foi música e dança até à meia-noite. 

No dia seguinte[4], depois do café, chegou uma coluna de Farim para nos recolher. Por volta das 10h00 ocupámos os nossos lugares nas viaturas e metemo-nos à estrada, que eu conhecia muito bem, e chegámos a Farim, ainda não eram 14h00.  

Fui para o quartel dos africanos, da antiga 1ª CCaç, onde tinha estado quase um ano como condutor “rebenta-minas”. Afinal, tinha sido daqui que eu tinha ido para os Comandos. O alferes, sobrinho do Governador Arnaldo Schulz, que era de informações e tinha vindo de Porto Gole, é que tinha sido o responsável pela minha saída de Farim. 

Ele costumava encarregar-se dos interrogatórios e usava a violência para obter informações dos prisioneiros. Naquela altura avisou-me, a respeito da carta do cabo-verdiano, para eu nunca mais receber fosse o que fosse de prisioneiros. Fiquei incomodado com a forma como ele reagiu à minha acção e lembro-me de ter regressado à caserna e de ter ficado uns tempos a matutar. O Adulai Djaló, meu colega, amigo e parente, andávamos sempre juntos, chegou-se a mim e perguntou se me doía a cabeça. Recordo muito bem esse episódio. 

Foi nessa altura que tiraram os bidões de água do meu carro e me puseram a “rebenta-minas”. Davam instruções para a segunda viatura, a que ia atrás da minha, manter a distância de, pelo menos, 100 metros. Nunca faltei a uma saída.

E foi por causa dele que eu e o Tomás Camará fomos para o grupo do Alferes Saraiva. 

Agora que estou a escrever este episódio da minha vida na Guerra da Guiné, recordo que na noite de 23 de Dezembro de 1971, o Adulai Djaló morreu nas minhas mãos, em Morés, numa noite em que tivemos cinco mortos e vários feridos, já não me lembro de quantos, só sei que um estava em estado muito grave. 

Agora, voltando ao regresso de Cuntima. Quando chegámos ao quartel de Nema, os colegas receberam-me com uma mesa cheia de bebidas. Ficámos ali até às 16h00, quando nos vieram buscar, e dali seguimos para a pista, entrámos num Dakota e pouco depois das 17 e tal estávamos em Brá.

(Continua)
_________

Notas do autor ou do editor literário ("copydesk") (VB):

[1] Nota do editor:  extraído do relatório: 28/03/66. Op Vamp: Faquina Fula, Colina do Norte, Cuntima, Farim. 

Informações relatavam a deslocação junto à fronteira com o Senegal de um numeroso grupo IN, prevendo-se a entrada por Sitató ou por Faquina Mandinga em direcção a Sulucó, Dando Mandinga-Cambajú. O plano previa a heliportagem para uma bolanha em Sitató, nomadização com a duração prevista de 48 horas, deslocação dos grupos até Cuntima pelos seus próprios meios e depois em coluna até Farim com regresso a Bissau em Dakota. 

30 elementos dos grupos “Centuriões” e “Diabólicos” saíram de Brá às 05h45. Partiram da BA 12 em seis Alouettes-III às 06h00. Às 7h00 foram largados na bolanha de Sitató. Cerca das 07h30 iniciaram a progressão rumo a Faquina Fula, que atingiram às 09h30. 

Por volta das 10h30, quando atravessavam uma bolanha entre Faquina Fula e Faquina Mandinga, ouviram um tiro. A seguir, risos e vozes. Uma rajada, gargalhadas, outra rajada de três ou quatro tiros, mais risos. Dirigiram-se para a orla da mata, depois progrediram na direcção das vozes. 

Cerca das 11h00 encontraram elementos INs a conversarem enquanto um limpava uma arma, numa pequena clareira com casas de mato em volta. Abriram fogo à queima-roupa e entraram nas casas de mato. Seguiram-se momentos de grande confusão que impediram o uso das armas. 

Na primeira fase, o IN limitou-se a fugir. Minutos depois, quando se procedia à recolha do material abandonado (2 metralhadoras-ligeiras Degtyarev, 2 Simonovs, 1 PM Thompson, 1 PM Shpagim, 1 PM Beretta, 1 esp. Mauser, 18 granadas de mão, 1 granada de RPG, 27 carregadores para vários tipos de armas, bornais, porta-carregadores, munições e documentação diversa), abriu fogo de morteiro para dentro do acampamento. 

Cerca de meia hora depois de lançado o ataque, os grupos abandonaram o acampamento a arder. Entraram em Cuntima às 13h30. A CArt 732, em coluna auto, transportou-os no dia seguinte para Farim. O regresso a Brá foi feito num Dakota um dia depois.

[2] Meio-irmão do Comando Abdulai Queta Jamanca. 

[3] Nota do editor: na altura ocupado pela CArt 732 / BArt 733. 

[4] Nota do editor: 29 Março 1966.
____________

Nota do editor LG:

terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23849: Fichas de unidades (29): BCAÇ 4616/73 (Bambadinca, 1974)

1.  O BCAÇ 4616/73 é uma daqueles unidades que podíamos pôr na série "Os nossos últimos seis meses"... ou nas "Memórias dos últimos soldados do império"...

Chegou ao CTIG já no início do ano de 1974 e regressou à metrópole oito meses depois, no início de setembro. Como  se tornou normal, nos últimos anos da guerra, o comandante da CCS era um capitão SGE (oriundo da Escola Central de Sargentos) e os comandantes das subunidades operacionais eram todos milicianos...

Lamentavelmente não tem história da unidade... Mas o livro da CECA, diz que na parte final da comissão, "adaptou a sua actividade à situação então vigente, comandando e coordenando a execução do plano de retracção do dispositivo e a desactivação e entrega dos aquartelamentos ao PAIGC."

Se repararmos na ficha da unidade, a seguir reproduzida, a 2ª C/BCAÇ 4616/73 (sediada no Xitole) em oito dias "fechou a porta duas vezes", primeiro a do Xitole e depois a de Bambadinca, o mesmo é dizer, desativou e entregou ao PAIGC o  setor L1 (parte importantíssima do "chão fula" (Bambadinca, Xime, Mansambo e Xitole):

(...) Em 1Set74, após desactivação e entrega do aquartelamento de Xitole, seguiu para Bambadinca, onde substituíu a 1ª Comp/BArt 6523/73 na responsabilidade do respectivo subsector. Em 8Set74, iniciou o deslocamento dos seus efectivos para Bissau e efectuou, em 9Set74, a desactivação e entrega do aquartelamento de Bambadinca, tendo recolhido a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.(...)

Vale a pena juntar (e reflectir sobre) estes factos (*)...


Ficha de unidade > Batalhão de Caçadores n.º 4616/73


Identificação: BCaç 4616/73

Unidade Mob: RI 16 - Évora

Cmdt: TCor Inf Luís Ataíde da Silva Banazol | TCor Inf Joaquim Luís de Azevedo Alves Moreira

2.° Cmdt: Maj lnf Joaquim Luís de Azevedo Alves Moreira

OInfOp/Adj: Cap lnf Bernardino Luís de Matos Pereira Torres

Cmdts Comp:

CCS: Cap SGE Domingos Roque

1ª Comp: Cap Mil lnf Augusto Vicente Penteado

2.ª Comp: Cap Mil lnf Luís Fernando de Andrade Viegas

3.ª Comp: Cap Mil lnf João Lontra Leite Martins


Divisa: "Conduta Brava e Distinta" 
 [de acordo com a imagem do brasão, acima reproduzida, colecção Carlos Coutinho, 2009, com a devida vénia]

Partida: Embarque em 30Dez73; desembarque em 05Jan74 |  Regresso: Embarque em 12Set74 (1*  e 2*: Comp), 15Set74 (3ª Comp) e 16Set74 (Cmd e CCS)


Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, de 9Jan74 a 6Fev74, no CML, em Cumeré, seguiu depois, com as suas companhias, excepto a 3ª Comp, para o sector de Bambadinca, a fim de efectuar o treino operacional e sobreposição com o BArt 3873, de 13Fev73 a 8Mar73.

Em 9Mar74, assumiu a responsabilidade do Sector LI, com a sede em Bambadinca e abrangendo os subsectores de Mansambo, Xime, Xitole e Bambadinca.

Desenvolveu a actividade operacional adequada às características do sector, com realização de várias operações, patrulhamentos, emboscadas dos reordenamentos de Nhabijões, Samba Silate e Bambadinca e de construção, manutenção e controlo dos itinerários da sua zona de acção. 

Na parte final, adaptou a sua actividade à situação então vigente, comandando e coordenando a execução do plano de retracção do dispositivo e a desactivação e entrega dos aquartelamentos ao PAIGC, sucessivamente efectuada nos subsectores de Xitole, em 1Set74, de Mansambo, em 2Set74 e de Bambadinca e Xime, ambos em 9Set74.

Em 2Set74, após desactivação e entrega dos aquartelamentos de Bambadinca, recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***

A 1ª Comp, após efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CArt 3494 na região de Mansambo, sob orientação do BArt 3873, assumiu, em 9Mar74, a responsabilidade do subsector de Mansambo, tendo destacado um pelotão para Bambadincazinho, este no subsector de Bambadinca, ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão.

Em 22Ago74, dois pelotões seguiram para Porto Gole e destacamento de Bissá, a fim de substituirem a 1ª Comp/BCaç 4612/72 a partir de 26Ago74, os quais ficaram na dependência do BCaç 4612/74, procedendo depois à desactivação e entrega dos aquartelamentos de Bissá, em 1Set74 e de Porto Gole, em 2Set74, após o que recolheram a Bissau.

Em 2Set74, após desactivação e entrega do aquartelamento de Mansambo, a companhia, então a dois pelotões, deslocou-se transitoriamente para Xime, recolhendo em 8Set4 a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***

A 2ª  Comp, após efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CArt 3492 na região de Xitole, sob orientação do BArt 3873, assumiu, em 9Mar74, a responsabilidade do subsector de Xitole, com um pelotão destacado na ponte do rio Pulom, ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão.

Em 1Set74, após desactivação e entrega do aquartelamento de Xitole, seguiu para Bambadinca, onde substituíu a 1ª Comp/BArt 6523/73 na responsabilidade do respectivo subsector.

Em 8Set74, iniciou o deslocamento dos seus efectivos para Bissau e efectuou, em 9Set74, a desactivação e entrega do aquartelamento de Bambadinca, tendo recolhido a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***

A 3ª  Comp cedeu, a partir de 5Jan74, um pelotão para reforço da 2ª Comp/BCaç 4512/72, o qual se instalou em Jumbembém. 

Em 11Fev74, a subunidade seguiu para Farim, a fim de efectuar o treino operacional com a CCaç 4944/73, sob orientação do BCaç 4512/72 e seguidamente reforçar este batalhão, a fim de fazer face ao agravamento da situação na sua zona de acção.

Em 23Mar74, mantendo-se no mesmo sector do BCaç 4512/72, foi toda colocada em Jumbembém, em reforço da actividade da guarnição local, tendo destacado um pelotão para Canjambari, também em reforço da guarnição local, de 23Mar74 a 2Jun74.

Em 6Jun74, substituindo a 1ª  Comp/BCaç 4516/73, assumiu a responsabilidade do subsector de Farim.

Em 7Set74, após desactivação e entrega do aquartelamento de Farim, recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações -  Não tem História da Unidade.

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pp.195/197. (**)
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23847: Casos: a verdade sobre... (32): o pós-25 de Abril no CTIG, as relações das NT com o PAIGC, a retração do dispositivo militar e a descolonização

segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23783: Fichas de unidades (28): BCAV 490 (Bissau e Farim), CCAV 487 (Farim), CCAV 488 (Jumbembem), e CCAV 489 (Cuntima), 1963/65


(Tem 117 referênias no nosso blogue)

Identificação BCav 490

Unidade Mob: RC 3 - Estremoz

Cmdt: TCor Cav Fernando José Pereira Marques Cavaleiro

2.° Cmdt: Maj Cav Alexandre António Baía Rodrigues dos Santos | Maj Cav Raul Augusto Paixão Ribeiro

OInfOp/Adj: Cap Cav Domingos Vilas Boas de Sousa Magalhães

Cmdts Comp:

CCS: Cap Cav Luís Augusto Rodrigues de éarvalho | Cap Cav Luís Alberto Paço Moura dos Santos | Cap Cav João Luís Moreira Arriscado Nunes | Cap Cav Manuel Correia Arrabaça
Cap SGE António Joaquim Marques

CCav 487: Cap Cav António Varela Romeiras Júnior | Cap Cav Rui Gonçalves Soeiro Cidrais

CCav 488: Cap Cav Fernando Manuel Lopes Ferreira | Cap Cav Manuel Correia Arrabaça | Ten Cav Lourenço de Carvalho Fernandes Tomás

CCav 489: Cap Cav António Ferreira Cabral Pais do Amaral | Cap Cav João do Nascimento de Jesus Pato Anselmo |  Cap Mil Cav António Tavares Martins

Divisa: "Sempre em frente"

Partida: Embarque em 17Ju163; desembarque em 22Jul63 | Regresso: Embarque em 12Ago65

Síntese da Actividade Operacional

Após o desembarque, permaneceu em Bissau em função de intervenção, com duas subunidades em reforço do BCaç 512, a partir de 2ago63, por rotação, a fim de actuarem intensivamente na região de Óio-Morés e Mansoa.

De 14jan64 a 24mar64, assumiu o comando das forças terrestres da  Op Tridente, realizada nas ilhas de Como, Caiar e Catunco, reforçado com outras subunidades, incluindo fuzileiros especiais e paraquedistas.

Em 23mai64, seguiu para Farim a fim de preparar a organização, deslocamento e instalação das forças no Sector C3, mais tarde, Sector 02, então criado e cuja área se encontrava incluída do antecedente na zona de responsabilidade 
do BCaç 512. 

Em 31mai64, assumiu a responsabilidade completa do referido sector, com a sede em Farim que abrangia os subsectores de Cuntima, Jumbembém, Bigene e Farim e a partir de 29jun64 o de Binta, então criado.

Em 25mar65, instalou forças para ocupação da povoação de Canjambari, no seu sector, tendo as suas subunidades ficado integradas no seu dispositivo e
manobra do Batalhão, a partir de 31Mai64.
 
O batalhão continuou a desenvolver assinalável actividade operacional de reconhecimentos, emboscadas, batidas, abertura e protecção dos itinerários e
acções sobre grupos inimigos.

Destacam-se, pelas baixas causadas e pela captura de bastante armamento e outro material, as operações "Jocoso", "Vouga" e "Invento", entre outras.

Dentre o armamento capturado mais significativo, destaca-se uma metralhadora
ligeira, 19 pistolas-metralhadoras, 36 espingardas, 10 minas e 9145 munições de armas ligeiras.

Em 15Jun65, foi rendido no Sector 02 pelo BArt 733 e recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso, tendo ainda destacado nesse período alguns efectivos das suas subunidades para segurança e protecção dos meios de travessia do rio Cacheu, em S. Vicente.

***


A CCav 487, enquanto na função de intervenção, foi empregada em diversas operações nas regiões de Encheia, Fajonquito, Bissorã e Morés, em reforço de outros batalhões e, integrada no seu batalhão, na Opperação Tridente, atrás referida.

Em 11Mar64, seguiu para Farim a fim de substituir a CArt 640 na função de subunidade de intervenção e reserva do sector, inicialmente na dependência do BCaç 512 e depois do seu batalhão. 

Em 15Ju165, após curto período na dependência do BArt 733, foi substituída em Farim pela CArt 731 e recolheu então a Bissau a fim de se integrar novamente no seu Batalhão até ao embarque de regresso.

***

A CCav 488, enquanto na função de intervenção, foi empregada em diversas operações nas regiões de Mansoa, Cutia, Bissorã e Morés, em reforço do BCaç 512 e, integrada no seu batalhão, na Op Tridente atrás referida.

Após deslocamento por Bafatá, Cambajú, Canhamina e Sitató, ocupou e instalou-se em Jumbembém em 31mai64, assumindo a responsabilidade do espectivo subsector e ficando integrada no dispositivo e manobra do seu
batalhão.

Em 06Jun65, foi rendida pela CArt 730, tendo recolhido seguidamente a Bissau com o seu batalhão e onde se manteve até ao seu embarque de regresso.

***


A
 CCav 489, enquanto na função de intervenção, foi empregada, com base emMansabá, em diversas operações efectuadas nas regiões de Mansabá, Bissorã e Morés, em reforço do BCaç 512 até 27dez63 e, integrada no seu Batalhão, na
Op Tridente,  atrás referida, tendo ainda sido atribuída temporariamente
ao BCaç 236 e depois ao BCaç 600 para colaborar na segurança e protecção das
instalações da área de Bissau, de 03Set63 a 210ut63, a fim de colmatar a saída
da CCaç 154.

Após deslocamento conjunto com a CCav 488 até Sitató, instalou-se em Cuntima em 31mai64, onde substituíu forças da CCaç 461 e da 1ª CCaç, assumindo a responsabilidade do respectivo subsector, então criado e ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão.

Em 6jun65, foi rendida pela CArt 732, tendo recolhido seguidamente a Bissau com o seu batalhão e onde se manteve até ao seu embarque de regresso.

Entretanto, a partir de 13jun65, dois pelotões estiveram temporariamente deslocados em Bula, em reforço do BCav 790, por períodos de 10 a 15 dias, com
vista à realização de patrulhamentos e contactos com as populações da região de
S. Vicente.

Observações  - Tem História da Unidade (Caixa n." 127 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pp. 253/255


Imagens: Cortesia de Coleção de Brasões, Guiões e Crachás de Carlos Coutinho (2009)
________

Nota do editor:

Último poste da série > 17  de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23714: Fichas de unidades (27): 1.ª CCAÇ/CCAÇ 3 (Bissau, Nova Lamego, Farim, Barro, Guidaje, Bigene, 1961/74)